Ela era a única que podia silenciar as vozes dentro da mente dele. E então, ela permaneceu, mesmo sabendo que deveria fugir do seu amor bandido.
Ler maisEPÍLOGOCinco anos depois...Belíssima, elegante, magra, saudável e toda trabalhada no pretinho básico, a Advogada Criminalista Ana Luísa de Paiva, chegou no Fórum Criminal da Barra Funda para uma Audiência de Custódia.Sua cliente, Isabela Magalhães, estava presa sob a acusação de ter matado o marido quarenta anos mais velho para ficar com a herança milionária. Ela foi forçada a se casar aos dezesseis anos e passou por vários abusos físicos, sexuais e psicológicos. Entretanto, isso não constava nos autos do inquérito policial. A justiça pendia para o lado de um empresário renomado que foi assassinado pela sua ninfetinha. Para o Ministério Público, Isabela era uma vadia interesseira. Para Ana, sua cliente de vinte e um anos, era uma sobrevivente.De forma fria e calculista, com o salto alto preto fazendo barulho no piso de madeira, Ana se aproximou do banco das testemunhas. O médico da família seria o próximo a depor, e ele estava do lado da acusação.Com sua feição controlada e post
Ana tomou banho enquanto a roupa de cama era trocada pela camareira. Ela se vestiu com a ajuda de Kelly, e os seguranças permaneceram no quarto, deixando claro que não iriam sair até Gabriel voltar. Eles tinham respeito pelo comandante de Paraisópolis, e medo também, de forma que as suas ordens eram cegamente obedecidas.Vanessa entrou no quarto seguida por Daniel. Há mais de vinte e cinco anos no ramo de hotelaria, a empresária bem sucedida e milionária já tinha visto homens bonitos, elegantes e ricos. A maioria deles eram egocêntricos, e não tinham nada a oferecer para uma mulher que tinha tudo o que o dinheiro podia comprar. Vanessa era solitária e orgulhosa. Por isso, ela ficou emocionada quando a geladeira duplex a acordou com um beijo no rosto. Sua carência era foda demais, ao ponto de gostar do inimaginável.A empresária ignorou o olhar raivoso de Kelly e sentou na cama. Ela olhou para o curativo no ombro de Ana.- Ainda bem que você está viva. Caso contrário, Gabriel teria co
Renato ouviu o barulho do tiro. Um ruído quase imperceptível atravessou o vidro que não era blindado. Depois, ele ouviu o grito animalesco de Gabriel.- NÃO!Renato usou o cartão para entrar no quarto. Uma das razões pelas quais ele decidiu ser o segurança de Ana, foi porque ele sabia que Gabriel tinha esquizofrenia. Renato descobriu por acaso quando ele ainda era o vapor de Pedro. Gabriel tinha o estranho hábito de entrar em uma espécie de transe. Ele se desligava de tudo ao seu redor, e fixava o olhar perdido em algum ponto específico como se estivesse vendo alguma coisa. Aquilo não durava mais do que alguns minutos, e Gabriel voltava para a realidade como se nada tivesse acontecido. Entretanto, em um dos surtos psicóticos, ele descarregou a arma atirando contra a parede.Renato gelou ao ver a quantidade de sangue sobre a cama. Gabriel vestiu uma cueca boxer preta e pegou uma mala com as mãos trêmulas. Lágrimas do mais absoluto pavor, nublavam os seus olhos escuros.- Tem um snipe
Um casamento no Cartório de Registro Civil demora cerca de trinta dias para ser realizado. Os noivos entram com um pedido de habilitação, o cartório verifica se estão aptos para casarem e solta uma nota na imprensa. Contudo, Gabriel de Paiva só conhecia as suas próprias leis. Sendo assim, ele comprou o par de alianças BVLGARI a caminho do cartório que estava fechado por ser domingo, mas seus homens já estavam cuidando daquele pequeno detalhe.Ana teve a venda retirada dos olhos e na sua frente, na sala do Cartório do Morumbi; um Juiz, um Escrevente, um Padre, e cinco bandidos perfilados com fuzis AK-47. A Bebezinha arfou.- Meu Deus, Gabriel. Você foi longe demais.O traficante pegou a sua mulher pela cintura com firmeza para ela não fugir. Ele já tinha bebido para comemorar o grande dia da sua vida.- Bora dizer o sim antes que o seu leite fique pedrado. Ana ficou mortificada ao ver todos os presentes ficarem chocados. Vanessa estava só o ódio ao lado da geladeira duplex que se cham
Gabriel foi levado para o 89º Distrito Policial, no Portal do Morumbi, onde a denúncia foi feita. Conduzido até a sala do delegado Mauro Lopes, ele teve as algemas retiradas por um dos policiais. O traficante tinha deixado a pistola .40 com André ao sair da favela porque desde que passou a ser alvo de investigação, não andava armado fora de Paraisópolis.No seu celular pessoal, Gabriel não tinha nada comprometedor. Calmo e posturado, ele sentou na cadeira na frente da mesa do delegado de meia idade, alto, magro, cabelos negros e miúdos olhos azuis.- A sua mãe, a senhora Vanessa Vilela, registrou um boletim de ocorrência na noite de ontem, alegando que foi vítima de violência da sua parte. Você tem direito a um advogado.Com uma expressão vazia, Gabriel disse secamente:- Eu não preciso de advogado porque isso não aconteceu, e eu não deveria estar aqui. Aliás, eu nem deveria ter sido abordado de forma tão violenta por uma coisa que eu não fiz. No máximo, uma intimação para depor, esta
Belíssimo, estiloso, todo trabalhado no preto e com um ar de arrogância, Gabriel chegou no baile funk às 23:00h. Mais cedo ele tinha se reunido com o MC Vida Loka e sua equipe, e dado a permissão para a gravação de um videoclipe para o DVD do artista. Gabriel pagou o cachê de vinte mil reais. Ele sabia separar as coisas, e não colocava preço no trabalho dos outros. Constrangido, MC Vida Loka quis cobrar menos, mas o dono do morro pagou o justo.A quadra da escola de samba fervia de gente, assim como de demônios que se mostravam enlouquecidos por estarem no meio de álcool, sexo e drogas. Gabriel chegou a conclusão que além de esquizofrênico, ele via o plano espiritual. Aquilo não era parte do seu quadro clínico complexo. De fato, ele tinha visão espiritual. Tanto é, que ele estava usando um esparadrapo no umbigo.Na última semana ele descobriu que estava sendo seguido pela polícia, e se não fosse o antipsicótico, e acima de tudo a sua Bebezinha que era o seu porto mais seguro em suas
Ana foi arremessada no meio da cama sem nenhum cuidado. A porta fechou e Gabriel foi para cima dela com um sorriso diabólico.- Eu estava louco para chegar nessa parte.Ana o segurou pelos ombros com um olhar aflito.- Que parte?Ela ganhou um beijo nos lábios e um olhar penetrante.- Na parte que você vai entregar a sua alma para mim. - Minha alma?- Você é mulher de bandido, Bebezinha. Eu vou cuidar de você, mas eu não posso e nem vou ter uma mulher fraca ao meu lado.Ana começou a ficar preocupada com a forma agressiva de Gabriel.- Eu quero ser mulher de médico. Eles são amáveis. - Opção indisponível. Nós vai foder no modo hard. Você vai gostar e aprender a me satisfazer. Eu sou um homem de muita fome.Ana sentiu a adrenalina voltar a correr nas suas veias, e era exatamente aquilo que Gabriel queria. Ele estava fazendo dela uma mulher forte e ousada.- Você quer uma puta?- Eu quero tudo com você, meu amor.Ana foi despida, virada de costas e teve a boca tampada. Ela tentou mord
Ana nunca soube como lidar com os seus sentimentos e emoções. Ela era gorda desde que se entendia por gente. Por causa de problemas respiratórios na infância, um médico receitou um xarope que a fez inchar antes dos cinco anos de idade. O bullying sofrido na escola era descontado na comida. Como aquilo a fazia se sentir menos pior, sua mãe deixava ela comer tudo o que queria. E desde então, Ana aprendeu a comer e chorar para tornar a vida um pouco mais suportável, mesmo sabendo que estava se maltratando por não ser uma pessoa forte e corajosa.Ela tinha vergonha do seu corpo e da cor da sua pele, já sabendo que muitas portas se fechariam na sua cara. Ana viu moças bonitas e sem experiência conseguirem vagas de emprego apenas pela aparência, sem ao menos saberem desempenhar a função para as quais foram contratadas. Aquilo era humilhante e degradante, uma pessoa ter mais importância do que outra apenas pela beleza. A vida a fodia na cara dura todos os dias. "Você nunca vai ser alguém
A temperatura caiu enquanto a chuva continuava caindo, e não dava sinais de que iria parar tão cedo. Janeiro era um mês frio e chuvoso. Gabriel gostava daquele clima frio e cinzento, igual ao seu estado de espírito. Desde que se lembrava, ele sempre esteve em um mundo nublado e sem vida.Por volta dos seus cinco, seis anos de idade, ele percebeu que a mãe estava sempre ocupada, expandindo a sua rede de hotéis de luxo, e não ligava que ele ficasse mais tempo com o pai.Apesar de ter nascido em berço de ouro, Gabriel cresceu em Paraisópolis. Seu pai parecia muito orgulhoso de ter um herdeiro homem, e desde cedo o ensinou o beabá do crime organizado.Gabriel não sabia se era um dom ou uma maldição a facilidade que ele tinha para manusear armas, cometer pequenos e grandes delitos, e embalar drogas. Era algo muito natural para ele separar os bons dos maus, e decidir quem deveria viver, e quem deveria morrer pelo tribunal do tráfico.Ele tinha só treze anos quando matou pela primeira vez. U