Belíssimo, estiloso, todo trabalhado no preto e com um ar de arrogância, Gabriel chegou no baile funk às 23:00h. Mais cedo ele tinha se reunido com o MC Vida Loka e sua equipe, e dado a permissão para a gravação de um videoclipe para o DVD do artista. Gabriel pagou o cachê de vinte mil reais. Ele sabia separar as coisas, e não colocava preço no trabalho dos outros. Constrangido, MC Vida Loka quis cobrar menos, mas o dono do morro pagou o justo.A quadra da escola de samba fervia de gente, assim como de demônios que se mostravam enlouquecidos por estarem no meio de álcool, sexo e drogas. Gabriel chegou a conclusão que além de esquizofrênico, ele via o plano espiritual. Aquilo não era parte do seu quadro clínico complexo. De fato, ele tinha visão espiritual. Tanto é, que ele estava usando um esparadrapo no umbigo.Na última semana ele descobriu que estava sendo seguido pela polícia, e se não fosse o antipsicótico, e acima de tudo a sua Bebezinha que era o seu porto mais seguro em suas
Gabriel foi levado para o 89º Distrito Policial, no Portal do Morumbi, onde a denúncia foi feita. Conduzido até a sala do delegado Mauro Lopes, ele teve as algemas retiradas por um dos policiais. O traficante tinha deixado a pistola .40 com André ao sair da favela porque desde que passou a ser alvo de investigação, não andava armado fora de Paraisópolis.No seu celular pessoal, Gabriel não tinha nada comprometedor. Calmo e posturado, ele sentou na cadeira na frente da mesa do delegado de meia idade, alto, magro, cabelos negros e miúdos olhos azuis.- A sua mãe, a senhora Vanessa Vilela, registrou um boletim de ocorrência na noite de ontem, alegando que foi vítima de violência da sua parte. Você tem direito a um advogado.Com uma expressão vazia, Gabriel disse secamente:- Eu não preciso de advogado porque isso não aconteceu, e eu não deveria estar aqui. Aliás, eu nem deveria ter sido abordado de forma tão violenta por uma coisa que eu não fiz. No máximo, uma intimação para depor, esta
Um casamento no Cartório de Registro Civil demora cerca de trinta dias para ser realizado. Os noivos entram com um pedido de habilitação, o cartório verifica se estão aptos para casarem e solta uma nota na imprensa. Contudo, Gabriel de Paiva só conhecia as suas próprias leis. Sendo assim, ele comprou o par de alianças BVLGARI a caminho do cartório que estava fechado por ser domingo, mas seus homens já estavam cuidando daquele pequeno detalhe.Ana teve a venda retirada dos olhos e na sua frente, na sala do Cartório do Morumbi; um Juiz, um Escrevente, um Padre, e cinco bandidos perfilados com fuzis AK-47. A Bebezinha arfou.- Meu Deus, Gabriel. Você foi longe demais.O traficante pegou a sua mulher pela cintura com firmeza para ela não fugir. Ele já tinha bebido para comemorar o grande dia da sua vida.- Bora dizer o sim antes que o seu leite fique pedrado. Ana ficou mortificada ao ver todos os presentes ficarem chocados. Vanessa estava só o ódio ao lado da geladeira duplex que se cham
Renato ouviu o barulho do tiro. Um ruído quase imperceptível atravessou o vidro que não era blindado. Depois, ele ouviu o grito animalesco de Gabriel.- NÃO!Renato usou o cartão para entrar no quarto. Uma das razões pelas quais ele decidiu ser o segurança de Ana, foi porque ele sabia que Gabriel tinha esquizofrenia. Renato descobriu por acaso quando ele ainda era o vapor de Pedro. Gabriel tinha o estranho hábito de entrar em uma espécie de transe. Ele se desligava de tudo ao seu redor, e fixava o olhar perdido em algum ponto específico como se estivesse vendo alguma coisa. Aquilo não durava mais do que alguns minutos, e Gabriel voltava para a realidade como se nada tivesse acontecido. Entretanto, em um dos surtos psicóticos, ele descarregou a arma atirando contra a parede.Renato gelou ao ver a quantidade de sangue sobre a cama. Gabriel vestiu uma cueca boxer preta e pegou uma mala com as mãos trêmulas. Lágrimas do mais absoluto pavor, nublavam os seus olhos escuros.- Tem um snipe
Ana tomou banho enquanto a roupa de cama era trocada pela camareira. Ela se vestiu com a ajuda de Kelly, e os seguranças permaneceram no quarto, deixando claro que não iriam sair até Gabriel voltar. Eles tinham respeito pelo comandante de Paraisópolis, e medo também, de forma que as suas ordens eram cegamente obedecidas.Vanessa entrou no quarto seguida por Daniel. Há mais de vinte e cinco anos no ramo de hotelaria, a empresária bem sucedida e milionária já tinha visto homens bonitos, elegantes e ricos. A maioria deles eram egocêntricos, e não tinham nada a oferecer para uma mulher que tinha tudo o que o dinheiro podia comprar. Vanessa era solitária e orgulhosa. Por isso, ela ficou emocionada quando a geladeira duplex a acordou com um beijo no rosto. Sua carência era foda demais, ao ponto de gostar do inimaginável.A empresária ignorou o olhar raivoso de Kelly e sentou na cama. Ela olhou para o curativo no ombro de Ana.- Ainda bem que você está viva. Caso contrário, Gabriel teria co
EPÍLOGOCinco anos depois...Belíssima, elegante, magra, saudável e toda trabalhada no pretinho básico, a Advogada Criminalista Ana Luísa de Paiva, chegou no Fórum Criminal da Barra Funda para uma Audiência de Custódia.Sua cliente, Isabela Magalhães, estava presa sob a acusação de ter matado o marido quarenta anos mais velho para ficar com a herança milionária. Ela foi forçada a se casar aos dezesseis anos e passou por vários abusos físicos, sexuais e psicológicos. Entretanto, isso não constava nos autos do inquérito policial. A justiça pendia para o lado de um empresário renomado que foi assassinado pela sua ninfetinha. Para o Ministério Público, Isabela era uma vadia interesseira. Para Ana, sua cliente de vinte e um anos, era uma sobrevivente.De forma fria e calculista, com o salto alto preto fazendo barulho no piso de madeira, Ana se aproximou do banco das testemunhas. O médico da família seria o próximo a depor, e ele estava do lado da acusação.Com sua feição controlada e post
São Paulo, ParaisópolisGabriel está cursando o último ano de medicina, mora com a mãe em uma mansão no Morumbi, e ajuda o pai no tráfico de drogas em Paraisópolis. Seus pais pertencem a mundos diferentes, eles tiveram um lance de uma noite, e ele nasceu. Sua mãe é uma renomada empresária, dona de uma grande rede de hotéis de luxo em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.Gabriel não tinha planos de ir para a faculdade depois de concluir o ensino médio, mas sua mãe o obrigou, dizendo que não teria filho vagabundo. Como se um diploma, fosse garantia de alguma coisa. Por orientação do seu pai, Gabriel optou por medicina e ele até gostava do curso. Ele decidiu por fazer residência após a graduação, para descobrir em qual área da medicina iria se especializar. Provavelmente, seria cardiologia, e com o final do ano chegando, assim como a formatura, Gabriel já tinha planos para fazer a residência no posto de saúde de Paraisópolis. Sua mãe iria ter um surto. Ela não sabia ainda que ele t
Há seis meses, Ana Luísa se mudou do interior de Minas Gerais para morar em São Paulo com a prima Kelly. Ela morava em uma casa alugada na favela de Paraisópolis, e as duas dividiam o aluguel de quinhentos reais.Do manequim 38, Ana passou para o 54 ainda na adolescência quando sua mãe era viva e fazia marmitex para vender. Fornadas de pães de queijo, roscas, bolos e pudim de leite condensado, não faltavam na sua casa. Ela estudava e ajudava a mãe com as marmitas, comendo em excesso e não se preocupando com a saúde. Ana nunca conheceu o pai, e quando a mãe morreu vítima de um AVC fulminante, ela descobriu que tinha hipertensão. Losartana e furosemida passaram a fazer parte da sua rotina diária.Mesmo com sobrepeso, perto de pesar cento e vinte quilos, Ana não mudou a alimentação. Ao se mudar para São Paulo, ela conseguiu emprego em um restaurante em Alphaville através da prima Kelly. A dona do local deixava os funcionários comerem e levarem as sobras para casa.Ana também conheceu o