EPÍLOGOCinco anos depois...Belíssima, elegante, magra, saudável e toda trabalhada no pretinho básico, a Advogada Criminalista Ana Luísa de Paiva, chegou no Fórum Criminal da Barra Funda para uma Audiência de Custódia.Sua cliente, Isabela Magalhães, estava presa sob a acusação de ter matado o marido quarenta anos mais velho para ficar com a herança milionária. Ela foi forçada a se casar aos dezesseis anos e passou por vários abusos físicos, sexuais e psicológicos. Entretanto, isso não constava nos autos do inquérito policial. A justiça pendia para o lado de um empresário renomado que foi assassinado pela sua ninfetinha. Para o Ministério Público, Isabela era uma vadia interesseira. Para Ana, sua cliente de vinte e um anos, era uma sobrevivente.De forma fria e calculista, com o salto alto preto fazendo barulho no piso de madeira, Ana se aproximou do banco das testemunhas. O médico da família seria o próximo a depor, e ele estava do lado da acusação.Com sua feição controlada e post
São Paulo, ParaisópolisGabriel está cursando o último ano de medicina, mora com a mãe em uma mansão no Morumbi, e ajuda o pai no tráfico de drogas em Paraisópolis. Seus pais pertencem a mundos diferentes, eles tiveram um lance de uma noite, e ele nasceu. Sua mãe é uma renomada empresária, dona de uma grande rede de hotéis de luxo em São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.Gabriel não tinha planos de ir para a faculdade depois de concluir o ensino médio, mas sua mãe o obrigou, dizendo que não teria filho vagabundo. Como se um diploma, fosse garantia de alguma coisa. Por orientação do seu pai, Gabriel optou por medicina e ele até gostava do curso. Ele decidiu por fazer residência após a graduação, para descobrir em qual área da medicina iria se especializar. Provavelmente, seria cardiologia, e com o final do ano chegando, assim como a formatura, Gabriel já tinha planos para fazer a residência no posto de saúde de Paraisópolis. Sua mãe iria ter um surto. Ela não sabia ainda que ele t
Há seis meses, Ana Luísa se mudou do interior de Minas Gerais para morar em São Paulo com a prima Kelly. Ela morava em uma casa alugada na favela de Paraisópolis, e as duas dividiam o aluguel de quinhentos reais.Do manequim 38, Ana passou para o 54 ainda na adolescência quando sua mãe era viva e fazia marmitex para vender. Fornadas de pães de queijo, roscas, bolos e pudim de leite condensado, não faltavam na sua casa. Ela estudava e ajudava a mãe com as marmitas, comendo em excesso e não se preocupando com a saúde. Ana nunca conheceu o pai, e quando a mãe morreu vítima de um AVC fulminante, ela descobriu que tinha hipertensão. Losartana e furosemida passaram a fazer parte da sua rotina diária.Mesmo com sobrepeso, perto de pesar cento e vinte quilos, Ana não mudou a alimentação. Ao se mudar para São Paulo, ela conseguiu emprego em um restaurante em Alphaville através da prima Kelly. A dona do local deixava os funcionários comerem e levarem as sobras para casa.Ana também conheceu o
Ana não conseguiu sair do lugar nem mesmo com toda confusão que tomou conta do restaurante. Helena e todos os funcionários entraram em pânico. Uma ambulância do SAMU foi chamada. O homem continuava no chão se contorcendo como se estivesse tendo uma convulsão, e o cara do lado dele, segurava sua cabeça raspada para evitar que ele se machucasse.Seus olhares se encontraram mais uma vez e um tremor percorreu o corpo de Ana. Ela ficou presa naqueles olhos escuros e sombrios. Suas pernas pareciam pesar mais de duzentos quilos cada uma, e ela ficou onde estava. A ambulância não demorou a chegar e o homem foi colocado na maca.Gabriel entregou a chave da Hilux SW4 preta cabine dupla para André, e foi na ambulância com o pai. No trajeto para o hospital, ele deixou o paramédico fazer a massagem cardíaca no pai, e mandou uma mensagem para um dos soldados.Ana aceitou o copo de água que Felipe deu para ela. Helena fechou as portas do restaurante e passou a mão trêmula na cabeça branca.- Parecia
Ana mordeu o lábio inferior para não gemer de dor à medida que o medidor de pressão apertava o seu braço gordo. Ela começou a sentir um alívio momentâneo quando o médico parou de apertar, porém, ele voltou a apertar, para em seguida, tirar o estetoscópio dos ouvidos e pendurar no pescoço.- Está sentindo alguma coisa?Ana massageou o braço dolorido.- Tontura. Está muito alta?- Está 16x10.- Nossa Deus!Gabriel voltou a sentar, pegou uma folha de sulfite e dobrou ao meio, no tamanho que cabia no envelope pardo de cada paciente. Ele estava usando o computador só para as receitas e pedidos de exames. No mais, preferia conversar com os pacientes e anotar tudo à mão.Por alguns segundos, ele se perdeu na beleza natural de Ana, e teve que fazer um esforço para se lembrar que ali, eram médico e paciente.- A sua ficha está em branco. É a sua primeira vez aqui?Ana assentiu, não deixando de notar que Gabriel era muito novo para ser médico. Provavelmente, ele era um residente. - Eu vim de M
De volta à Paraisópolis, Gabriel tomou posse da casa que era do pai. Era um imóvel simples e discreto visto por fora, como a maioria das casas feitas de tijolo e coberta com telha eternit. No entanto, por dentro, a casa de três quartos, sala, cozinha, banheiro, área de serviço e garagem, estava equipada com móveis planejados, utensílios de cozinha Arno, geladeira inox duplex Brastemp, assim como o fogão Cooktop e o microondas cinza da mesma marca. Todos os quartos tinham cama box de casal e home theater. Na sala, uma tv led de alta definição, ocupava toda uma parede de frente para o sofá de couro preto. A área de serviço também era funcional com tanque, máquina de lavar, secar, churrasqueira e um terraço com vista panorâmica de Paraisópolis.Na casa espaçosa também tinha vários notebooks Apple com as imagens das câmeras de segurança e informações sobre o tráfico de drogas, como os nomes dos fornecedores, quem estava na lista negra, membros da facção presos e a hierarquia de comando d
Gabriel começou a atender às 07:30h em ponto. A recepção estava lotada, mas ele não teve pressa para ouvir as queixas dos pacientes, examina-los, solicitar exames e prescrever remédios para os casos mais simples que não precisavam de uma investigação mais profunda.Uma cheirada de pó na madrugada o deixou em estado de alerta, ao mesmo tempo que ouvia gritos tenebrosos e via vultos rastejando no consultório. Para ele, o inferno existia e o mundo espiritual era uma realidade paralela ao seu mundo real. Gabriel pegou a receita de Betaistina de 24mg que saiu na impressora, carimbou, assinou e entregou para o último paciente da parte da manhã.- Aqui, seu João. Se não parar de beber, essa labirintite não vai melhorar.O senhor negro pegou a receita com as mãos trêmulas pela abstinência.- Eu bebo pra esquecer os problemas.- Sua saúde está muito deteriorada. Se não parar de beber, em poucos meses, essa cirrose vai virar câncer, e a sua preocupação não será com o próximo gole, e sim, em c
Ana serviu o almoço saindo fumaça e colocou a jarra de vidro com o suco de laranja gelado no centro da mesa oval. Ela quase foi de arrasta pra cima ao ver Gabriel entrar na cozinha só com a calça jeans branca, e a borda preta da cueca Calvin Klein aparecendo. Seu corpo lindo e perfeito, era coberto por várias tatuagens. Gabriel pegou um frasco de vitamina no armário, e Ana arregalou os olhos com a caveira que cobria suas costas largas. Era sinistra.Abaixo do seu olho esquerdo estava escrito a palavra Chaos. Traduzida para o português Caos. Que significa o Deus Primordial Do Universo. Ele foi até ela depois de colocar o frasco na mesa e estendeu um bolo de notas de cinquenta reais.- Aqui tem mil reais. Você tem duas semanas de atestado, e vai cozinhar pra mim. Eu fiz mercado ontem, e você pode fazer o que sabe.Ana olhou para o dinheiro, para o corpo de Gabriel, e mordeu o lábio inferior antes de erguer a cabeça e olhar nos olhos dele.- Por que você sorriu quando o seu pai passou