De volta à Paraisópolis, Gabriel tomou posse da casa que era do pai. Era um imóvel simples e discreto visto por fora, como a maioria das casas feitas de tijolo e coberta com telha eternit. No entanto, por dentro, a casa de três quartos, sala, cozinha, banheiro, área de serviço e garagem, estava equipada com móveis planejados, utensílios de cozinha Arno, geladeira inox duplex Brastemp, assim como o fogão Cooktop e o microondas cinza da mesma marca.
Todos os quartos tinham cama box de casal e home theater. Na sala, uma tv led de alta definição, ocupava toda uma parede de frente para o sofá de couro preto. A área de serviço também era funcional com tanque, máquina de lavar, secar, churrasqueira e um terraço com vista panorâmica de Paraisópolis. Na casa espaçosa também tinha vários notebooks Apple com as imagens das câmeras de segurança e informações sobre o tráfico de drogas, como os nomes dos fornecedores, quem estava na lista negra, membros da facção presos e a hierarquia de comando do PCC. Também havia nomes de policiais civis e militares corruptos, que faziam parte da folha de pagamento da maior organização criminosa de São Paulo. Gabriel ficou com o quarto ao lado do banheiro que era onde ele dormia quando passava o fim de semana na casa do pai. Max pulou na cama após ser bem alimentado e dormiu. O dono do morro amanheceu contando os pinos de cocaína e os papelotes. Ele fez a distribuição para os pontos de venda e tomou banho para começar o dia. O celular tocou quando Gabriel saía do box secando o cabelo. Ele parou de frente ao espelho e desbloqueou a tela do iPhone 14 Pro Max preto. O dono do morro suspirou ao ver a ligação do que seria o seu gerente responsável pelos vapores e o financeiro. - Fala, Renato. - A equipe do MC Vida Loka quer a sua permissão para gravar um videoclipe no morro. Gabriel se inclinou para frente e olhou a barba por fazer. Ele abriu o armário e pegou uma gilete fechada. - Permissão negada por enquanto. Diga que eu ainda estou colocando a casa em ordem, e retorno a ligação quando for mais seguro para o Vida Loka. Renato sorriu com o fuzil AK-47 na mão. Ele gostava mais de Gabriel do que de Pedro. O filho era mais firme nas decisões sem fazer questão de puxar o saco de ninguém, ao contrário do pai que dizia sim para tudo. - Positivo, patrão. Faltavam dez minutos para sete horas da manhã quando Gabriel saiu de casa. Max ficou latindo, mas depois ele se conformava. Como o posto era perto, Gabriel deixou a Hilux na garagem e foi a pé. Três soldados treinados e capacitados, faziam sua segurança pessoal disfarçados. Gabriel entrou na viela estreita onde a casa de Ana ficava. Ele sentiu a onda de calor que percorreu o seu corpo ao vê-la com uma camisola branca do Mickey. Ela estava sem sutiã e as pernas roliças estavam à mostra. O cabelo preto estava preso em um coque frouxo mal feito. Ela estava fascinante. Ana varria a frente da casa no fim da viela e tinha planos de ir no mercado comprar algumas frutas e legumes. Kelly era cuidadora de idosos e ainda não tinha chegado do turno da noite. Ana acordava cedo porque gostava e também para preparar o café da prima. Ao erguer a cabeça para ver se Kelly estava chegando, Ana ficou em choque. Gabriel se aproximou com um sorriso no rosto perfeito. - Bom dia. Passou bem de ontem? A garota não encontrou a própria voz. Ela ficou segurando a vassoura com o coração aos pulos. Céus, ela estava mal vestida e descabelada. E não era possível que Gabriel estivesse logo ali aquela hora da manhã. Ele chegou mais perto com um sorriso encantador e um cheiro de amaciante de bebê. - Eu estou morando aqui na favela porque é mais perto do trabalho. A casa do meu pai fica perto da sua. Ana sabia que tinha que dizer alguma coisa. Ela não podia ficar parada lá com cara de idiota enquanto Gabriel falava com ela olhando em seus olhos. - Bom dia. Eu passei bem. Que bom que você, digo, o doutor... vai morar aqui. Gabriel colocou as mãos nos bolsos do jaleco branco antes que pudesse avançar em Ana, e fode-la ali mesmo. A timidez dela fazia ele ansiar para vê-la chorando e gemendo no seu pau. Ele iria prescrever medicamentos para ela produzir leite em excesso. Ele tossiu para aliviar a boca seca e sedenta. Mal podia esperar para ser amamentado. - Você já tomou os remédios hoje? - Sim, em jejum. - Eu vou medir a sua pressão e aceito um copo de água gelada. Ana não teve tempo para pensar. Ela entrou na casa quando Gabriel deu um passo para frente, a deixando sem escolha. Alto e forte, ele usou o corpo para comanda-la. Trêmula, ela colocou a vassoura de lado e foi até a geladeira. Sua pressão deveria estar nas nuvens. Gabriel colocou a bolsa de couro preto sobre a mesa, abriu, afastou a pistola .40, pegou o medidor de pressão e o estetoscópio. Ele bebeu a água em um gole. Ana sentou e apoiou o braço esquerdo na mesa. Sua camisola subiu e ela colocou a mão direita em cima do vão das coxas, onde a barra do jaleco de Gabriel encostou. Ele também encostou as mãos no seu seio esquerdo ao colocar o medidor de pressão e começar a apertar. Ela fechou os olhos negros. - 14x09. Eu acredito que a taquicardia seja porque você estava varrendo. Ana abriu os olhos a tempo de ver Gabriel guardando o aparelho. Ela não tinha ingerido aquelas quantidades absurdas de sódio no jantar. Mesmo com a pressão até boa para alguém obesa como ela, Ana estava nervosa com a presença do médico na sua casa. Ele entregou uma chave para ela. - Rua 2, número 321. Eu vou te pagar quinhentos reais por semana para você fazer a minha comida. Eu vou almoçar meio dia. Eu tenho um rottweiler, mas não se preocupe. Ele não morde. Ele é manso e inofensivo igual ao dono. Gabriel saiu com um sorriso safado, deixando uma Ana petrificada para trás. O pai tava on. Por enquanto, ele seria um perfeito cavalheiro. Depois de conquistar sua bebezinha linda, ele ficaria extremamente possessivo.Gabriel começou a atender às 07:30h em ponto. A recepção estava lotada, mas ele não teve pressa para ouvir as queixas dos pacientes, examina-los, solicitar exames e prescrever remédios para os casos mais simples que não precisavam de uma investigação mais profunda.Uma cheirada de pó na madrugada o deixou em estado de alerta, ao mesmo tempo que ouvia gritos tenebrosos e via vultos rastejando no consultório. Para ele, o inferno existia e o mundo espiritual era uma realidade paralela ao seu mundo real. Gabriel pegou a receita de Betaistina de 24mg que saiu na impressora, carimbou, assinou e entregou para o último paciente da parte da manhã.- Aqui, seu João. Se não parar de beber, essa labirintite não vai melhorar.O senhor negro pegou a receita com as mãos trêmulas pela abstinência.- Eu bebo pra esquecer os problemas.- Sua saúde está muito deteriorada. Se não parar de beber, em poucos meses, essa cirrose vai virar câncer, e a sua preocupação não será com o próximo gole, e sim, em c
Ana serviu o almoço saindo fumaça e colocou a jarra de vidro com o suco de laranja gelado no centro da mesa oval. Ela quase foi de arrasta pra cima ao ver Gabriel entrar na cozinha só com a calça jeans branca, e a borda preta da cueca Calvin Klein aparecendo. Seu corpo lindo e perfeito, era coberto por várias tatuagens. Gabriel pegou um frasco de vitamina no armário, e Ana arregalou os olhos com a caveira que cobria suas costas largas. Era sinistra.Abaixo do seu olho esquerdo estava escrito a palavra Chaos. Traduzida para o português Caos. Que significa o Deus Primordial Do Universo. Ele foi até ela depois de colocar o frasco na mesa e estendeu um bolo de notas de cinquenta reais.- Aqui tem mil reais. Você tem duas semanas de atestado, e vai cozinhar pra mim. Eu fiz mercado ontem, e você pode fazer o que sabe.Ana olhou para o dinheiro, para o corpo de Gabriel, e mordeu o lábio inferior antes de erguer a cabeça e olhar nos olhos dele.- Por que você sorriu quando o seu pai passou
Ana levou um tempo para assimilar tudo o que tinha acontecido. Seu primeiro beijo não foi com seu médico bonito e gostoso, e sim, com o dono da favela de Paraisópolis. Era realmente inacreditável como Gabriel conseguia ser um profissional atencioso e prestativo, e um traficante frio e calculista. Eram dois extremos que somente uma mente brilhante, ou doentia, poderia colocar em prática.De qualquer forma, Ana decidiu que não iria mais cozinhar para Gabriel. Ela queria distância dele. Por isso, ela terminou de limpar a cozinha, fez um carinho em Max que dormia no sofá, deixou o dinheiro em cima da mesa da sala e voltou para casa. Como trabalhava à noite, cuidando de idosos acamados, Kelly dormia quando Ana chegou. Suada, ela pegou a toalha e foi tomar um banho gelado por causa do calor infernal, e das fortes emoções que a atormentavam. Ana fechou os olhos debaixo da ducha e se permitiu relaxar. Ela tinha dinheiro para fazer os exames, mas os levaria para outro médico. Nunca mais ela
Gabriel colocou Max na coleira e saiu de casa. De capuz branco, sem camisa, calça jeans preta e Adidas branco, o dono do morro foi para a casa usada para o setor financeiro, onde era feito os recebimentos e pagamentos. Com uma população de cem mil habitantes, Paraisópolis e região, dava uma renda semanal de três milhões de reais entre a venda de maconha, cocaína, crack, cigarro e álcool. Os dois últimos, de cargas roubadas. Havia pontos de venda de drogas no Morumbi, Cidade Dutra, Cidade Jardim, Vila Andrade e Itaim Bibi.Gabriel não era só o dono do morro de Paraisópolis, ele também tinha o controle armado dos pontos de venda de drogas, as chamadas bocas de fumo, como também dos territórios que cercavam a favela. Dono absoluto da comunidade, ele manda e desmanda na vida social dos moradores, se impõe como juiz dos desenrolos, interfere nas associações e escolhe candidatos para os quadros administrativos.O traficante iria seguir os passos do pai. Importar drogas e armas do exterior e
Ana colocou o despertador do iPhone para tocar às 06:00h. Após o banho, ela colocou camiseta branca, calça jeans claro, meias e um Nike branco. Como Gabriel tinha acertado o tamanho de tudo, inclusive das lingeries sensuais, era um mistério. Pelo menos, ele teve o bom senso de comprar também calcinhas e sutiãs para o dia a dia, que era o que ela estava usando para ir tirar sangue. Ana o encontrou na sala brincando com Max. Ele estava de camisa social branca, gravata preta, calça social preta e sapato social da mesma cor. Ana fingiu não sentir o baque ao vê-lo todo no estilo de filhinho de papai.- A Kelly ainda está dormindo. Isso é normal?- A Codeína tem um efeito sedativo. Enquanto estiver dormindo, ela não vai sentir dor.Ana dobrou o pedido dos exames e colocou no bolso da calça junto com os documentos. Os mil reais estavam entre as compras e ela estava levando para pagar os exames.- Eu tenho que voltar logo para ficar com a minha prima.Gabriel se aproximou com um sorriso. El
Gabriel parou a Hilux na entrada da favela e o Soldado Farias, vestido com o uniforme da PM, entrou no carro. O dono do morro pegou o envelope pardo, e abriu, tirando documentos e fotos. Ele franziu a testa com ceticismo.- Quem é esse tanque de guerra?- Renan Tavares. Ele é Policial Civil e lutador profissional de Muay Thai. Ele vai chegar em Paraisópolis como um ex-presidiário. Com a morte do seu pai, a missão dele será descobrir quem assumiu o comando do tráfico de drogas. O disfarce de médico é perfeito.- Eu acho que ele vai chegar fungando no meu cangote.- Se ele tentar uma aproximação, você já está na mira da Polícia Civil. Ele vai fazer uma varredura na favela para descobrir quais são os pontos fracos. Depois, se ele confirmar que você é o chefe do tráfico, ele vai montar uma operação de busca e apreensão, e na sequência, a sua prisão.Gabriel deu uma olhada no dossiê sobre Bruno Alcântara e nas fotos do Policial Federal. Farias coçou a nuca e disse com receio:- Se ele for
Ana ouviu a porta do quarto fechar atrás dela. O sol do meio-dia entrava pela porta corrediça de vidro que dava acesso para uma varanda com um jogo de sofá de couro branco. Na suíte havia banheiro com banheira de hidromassagem, e no quarto, apenas uma enorme cama de casal forrada com lençol branco e dois travesseiros com fronhas da mesma cor. Reflexos do sol iluminavam todo o ambiente. Ana olhou para trás. Com um sorriso safado, Gabriel levou as mãos no nó da gravata.- Não diga que tem vergonha do seu corpo porque está acima do peso. Eu não ligo pra isso.- Mas eu ligo e não estou pronta para fazer isso. Eu não me sinto confortável.Mesmo não querendo que a primeira vez dela fosse com um estranho, e de uma forma precipitada, uma necessidade inexplicável, fez Ana arfar ao ser agarrada pela cintura, e ser puxada de encontro ao peitoral definido de Gabriel. Ela o tocou por cima da camisa social branca e franziu a testa negra.- Seu coração está disparado e você está gelado. Gabriel
De regata preta e shorts verde militar, o Policial Civil estava deitado na cama com um rasgo na coxa direita. Ele era maior e mais forte do que aparentava nas fotos. Com a prancheta em mãos, Gabriel olhou os dados da triagem.- Acidente de moto?Renan observou o médico jovem e de boa aparência. Ainda não havia nada que o ligasse ao comando do tráfico de drogas em Paraisópolis. Entretanto, Gabriel era filho de Pedro Paiva, um dos chefões do PCC que a Polícia Civil nunca conseguiu chegar perto. E com a morte do pai, ele começou a atender no posto de saúde de Paraisópolis. Coincidência ou não, Renan decidiu começar a investigação pelo herdeiro de Pedro. Ele teria trinta dias para achar indícios de que Gabriel estava ocupando o lugar do pai no comando de Paraisópolis. Se não conseguisse provas o suficiente para concluir a investigação e prende-lo, o inquérito policial seria encaminhado para o Ministério Público para ser arquivado.Mas isso não iria acontecer. Renan era um homem inteligen