O salão estava voltando ao seu ritmo festivo após o breve susto, mas a energia não era mais a mesma. A presença do grupo recém-chegado pairava como uma nuvem escura sobre todos.
Lucian se manteve em pé, a mão de Selena ainda entrelaçada à sua. Seus olhos estavam fixos na mulher que liderava o grupo. Alta, com cabelos longos e escuros presos em um coque elegante, seus olhos cinzentos varriam o salão como se tudo aquilo lhe pertencesse. Estava vestida com roupas finas demais para alguém que não havia sido convidada — como se soubesse que teria atenção. — Maedra... — disse Lucian, com um tom controlado, mas carregado de desprezo. A mulher sorriu de lado, como se o nome na boca do rei fosse uma melodia nostálgica. — Sobrinho — respondeu, com um leve aceno de cabeça. — Que cerimônia encantadora... embora um pouco simples para algo tão grandioso quanto a coroação de uma rainha. — Não me lembro de ter enviado um convite — rebateu Lucian, estreitando os olhos. — Talvez tenha sido um erro do mensageiro. — Oh, não — disse ela com falsa surpresa. — Nós não viemos por convite. Viemos por cortesia. A família deve estar presente em momentos como este, não acha? Selena franziu levemente o cenho, olhando para Lucian. — Depois te explico — ele sussurrou entre os dentes, mantendo o olhar firme em Maedra. Atrás dela, os dois filhos pareciam ainda mais arrogantes. O mais velho, Darian, usava um manto escuro e um medalhão de prata pendurado no peito. Os olhos dourados analisavam o salão com tédio. Selisse, sua irmã, parecia da mesma idade de Selena. Seu vestido vermelho sangue chamava atenção, e o sorriso que lançou à rainha recém-coroada foi mais uma provocação do que cortesia. — Que pena não podermos ficar — disse Maedra com teatralidade. — Mas fizemos questão de vir pessoalmente desejar sorte ao novo casal real. Lucian soltou um suspiro pesado, os músculos do maxilar contraídos. — Agradecemos sua... presença — respondeu, a palavra forçada em sua boca. — E seus votos, embora tardios. Mas é uma pena que tenham que ir tão cedo. Ainda temos muito a celebrar — disse, já dando um passo para a frente, como quem conduz o visitante até a porta. Maedra riu. — Não queremos incomodar. Imagino que estejam... exaustos da noite passada. O comentário arrancou uma risadinha debochada de Selisse, que lançou um olhar malicioso a Selena. Celeste, sentada ao lado, ergueu uma sobrancelha. — Que gente desagradável — murmurou, e Selena teve que conter uma risada nervosa. Antes de se virar, Maedra olhou para Lucian uma última vez e, com uma voz suave, mas cheia de veneno, acrescentou: — É só uma pena, não é... que sua escolha de rainha não tenha vindo de sangue real. Minha Selisse, por exemplo, tem um sangue antigo, nobre. Uma escolha mais... apropriada para um trono. O salão congelou. Um rosnado ecoou no peito de Lucian antes que ele pudesse conter. — Você ousa... — começou ele, a voz carregada da fúria do lobo. — Lucian... — Selena o segurou pelo braço, firme. — Não. Não aqui. Eles não valem isso. A mão dele tremia, mas ele cedeu ao toque da companheira. O olhar que lançou a Maedra foi puro aço. — Cuidado com o que diz... tia. E com os lugares onde pisa. Esta não é mais a sua corte. Este é o meu reino. Maedra manteve o sorriso. Darian fez menção de falar algo, mas o olhar de Rylan foi o suficiente para silenciá-lo. O beta não havia parado de rosnar desde o primeiro segundo, e Caden, do outro lado da mesa, estava pronto para saltar. — Vamos, crianças — disse Maedra, girando nos calcanhares. — Já vimos o suficiente. Selisse lançou um último olhar a Selena antes de virar com o vestido arrastando no chão. O grupo deixou o salão como havia chegado — com arrogância, com veneno, com promessas veladas de conflitos por vir. Lucian soltou o ar lentamente e voltou a se sentar. Os ombros ainda estavam tensos. — Agora você vai me contar quem diabos eram eles — disse Selena, ainda com a mão sobre o braço dele. Lucian assentiu. — E eu vou contar tudo. Você merece saber o que essa família fez… e do que ainda pode ser capaz. Todos à mesa estavam em silêncio. A noite ainda não tinha acabado — mas já tinha deixado suas marcas. O salão, aos poucos, recuperou o brilho e os risos que haviam sido interrompidos. Os convidados retomaram suas conversas, brindes foram erguidos, e a música voltou a preencher o ambiente com alegria e orgulho. Selena foi cercada por membros da alcatéia e aliados que queriam parabenizá-la pela coroação. Sorrisos sinceros, abraços apertados e palavras calorosas se sucederam, e, por um tempo, a lembrança amarga da visita indesejada ficou em segundo plano. Lucian, ao lado da companheira, fazia o possível para acompanhar o ritmo da celebração. Ele sorria, acenava e agradecia, mas sua expressão denunciava que, por dentro, a tempestade ainda rugia. Rylan se aproximou dele, com Celeste ao lado. — Não vai me dizer que vai deixar aquilo passar em branco? — murmurou o beta, discreto. Lucian respondeu com os olhos fixos em Selena, que conversava animada com Leora. — Ainda não — disse, baixo. — Mas o dia dela não vai ser manchado por sangue. Eles não vão tirá-la da luz que merece. — Eu confio em você — disse Celeste suavemente. — E ela também. Lucian assentiu. Mesmo com o sangue em ebulição, respirava fundo, buscando forças onde antes havia apenas raiva. Aquela noite era sobre Selena. Sobre o futuro. E ele não deixaria ninguém tirar isso dela. Horas depois, o salão já esvaziava. Os últimos convidados se despediam com sorrisos e olhares emocionados. O céu lá fora estava pintado de estrelas, e a brisa noturna trazia um frescor acolhedor pelas varandas. Lucian e Selena caminhavam pelos corredores em direção aos aposentos reais, cada um com um bebê nos braços. Luke estava aninhado no colo de Lucian, adormecido com um suspiro leve. Lucy, de olhos entreabertos, brincava com um dos fios soltos do cabelo de Selena. — Ela está lutando contra o sono — comentou Selena, sorrindo cansada. — Já é guerreira como a mãe — respondeu Lucian, com um pequeno sorriso, embora seus olhos ainda refletissem uma sombra. Chegaram aos aposentos e, juntos, colocaram os pequenos em seus berços. Selena cobriu Lucy com uma manta leve e ajeitou os fios dourados sobre a testa da bebê. Lucian ajeitou Luke, que resmungou baixinho, e sussurrou algo carinhoso ao filho. Quando se afastaram dos berços, Selena fechou as portas de vidro que davam para a varanda e puxou Lucian pela mão até o sofá perto da lareira. — Agora sim — disse ela, sentando-se ao lado dele. — Quer me contar? Lucian passou as mãos pelo rosto, como quem tentava afastar os últimos vestígios de controle.O bar estava lotado como sempre. Erin deslizava entre as mesas, equilibrando bandejas cheias de cerveja, ouvindo as risadas roucas e os comentários sussurrados dos clientes. O cheiro de álcool, fumaça e algo mais — algo selvagem — impregnava o ar. Ela se acostumara com isso. Trabalhar em um bar de lobisomens não era para qualquer um, mas Erin não conhecia outro lar.Então, ela sentiu.O olhar.Forte, intenso, queimando sua pele como fogo.Ela se virou, o coração batendo rápido. Encostado no balcão, um homem a observava com uma atenção que a deixou sem ar.Ele era alto, de ombros largos, a sombra da barba marcando seu maxilar. O cabelo escuro caía de forma rebelde sobre sua testa, e seus olhos dourados pareciam brilhantes demais sob as luzes fracas do bar. Um uísque repousava em sua mão, intocado.Mas ele só olhava para ela.Erin tentou ignorar. Continuou atendendo, rindo de piadas sem graça, desviando de clientes embriagados. Mas sempre que olhava para o balcão, lá estava ele.Na terc
O sol ainda não havia surgido completamente quando Erin abriu os olhos.Por um momento, ela não reconheceu onde estava. Lençóis macios, um colchão absurdamente confortável, um aroma amadeirado e masculino preenchendo o ar. Então, a memória da noite passada a atingiu como um raio.Lucian.Ela virou a cabeça devagar e viu o homem dormindo ao seu lado. Mesmo adormecido, ele exalava poder. O lençol cobria parte de seu corpo, mas ela podia ver os músculos definidos, os traços fortes, a pele quente contra a luz fraca do amanhecer.Seu coração acelerou.O que diabos ela tinha feito?Uma onda de pânico tomou conta dela. Ela nunca tinha feito algo assim. Passara a vida toda se protegendo, construindo barreiras para que ninguém se aproximasse. E agora… havia se entregado a um estranho.Um estranho que, claramente, era rico.Seus olhos percorreram o quarto luxuoso. O lustre no teto, os móveis de design sofisticado, a vista imponente da cidade. Ele não era um lobo comum. Não era um cliente qualqu
Rylan e Caden estavam sentados na luxuosa sala de estar da suíte do hotel, observando o rei com cautela.Lucian andava de um lado para o outro, visivelmente irritado.— Então… — Rylan começou, escolhendo as palavras com cuidado. — Quem é Erin?Lucian parou e lançou um olhar afiado para ele.— Isso não é da sua conta.Caden trocou um olhar rápido com Rylan antes de tentar outra abordagem.— Certo, mas… você quer que a encontremos. Isso significa que ela é importante. Só precisamos entender o quão importante.Lucian passou a mão pelos cabelos e respirou fundo, controlando a frustração.— Eu não sei quem ela é. Mas… ela é minha.Rylan e Caden franziram a testa ao mesmo tempo.— Sua… como? — Rylan perguntou, cruzando os braços.Lucian não respondeu de imediato. O silêncio prolongado apenas aumentou a tensão no ar.— Apenas encontrem-na — ele ordenou, a voz firme, deixando claro que não havia mais espaço para perguntas.Os dois assentiram, sabendo que o rei raramente ficava tão perturbado
Erin sentia sua mente girar.O silêncio no quarto era quase palpável enquanto ela absorvia o que acabara de ouvir.— Você… está dizendo que sou sua irmã? — sua voz saiu hesitante, como se o simples ato de falar as palavras tornasse tudo mais real.Celeste assentiu, seus olhos brilhando com emoção.— Não apenas minha irmã… minha irmã gêmea.O coração de Erin martelava em seu peito.— E você é minha mãe? — Ela olhou para Helena, que sorriu suavemente, com os olhos marejados.— Sim, minha querida. Você é minha filha.Isla, a mais nova, se aproximou com um sorriso caloroso.— E eu sou sua irmã caçula.Erin piscou algumas vezes, tentando processar tudo. Por anos, ela se perguntou quem eram seus pais, de onde veio… e agora, a verdade estava bem diante dela.Helena suspirou e pegou a mão de Erin com delicadeza.— Vou te contar tudo.Ela respirou fundo antes de continuar.— Quando você e Celeste tinham quatro anos, houve uma guerra. Nossa matilha, a Matilha da Lua Escarlate, foi chamada para
Lucian sentou-se na cabeceira da grande mesa do conselho, entediado antes mesmo da reunião começar.O salão da Matilha Real estava repleto de anciões e líderes de matilhas menores que vieram para a reunião anual. Ele já sabia quais seriam os assuntos: Segurança das fronteiras, Alianças com outras matilhas e O futuro do trono – esse era o tema que ele mais odiava.— Majestade — começou o ancião Alaric, um dos mais velhos e respeitados do conselho. — Já está com 29 anos. A linhagem real precisa ser assegurada.Lucian bufou, sem esconder sua irritação.— Já falamos sobre isso antes. Não vou escolher uma parceira aleatoriamente.— Mas precisa haver um plano! — insistiu outro ancião. — Se não encontrar sua companheira, deve escolher uma loba adequada para acasalar e garantir a continuidade da linhagem real.Lucian cruzou os braços.— Eu vou encontrar minha companheira.— Tem certeza de que ela existe? — um ancião perguntou com cautela.Lucian rosnou, sua paciência se esgotando.Ele não tin
Erin ainda estava sentada na cama, processando a notícia de sua gravidez. Sua mente girava, e o peso da revelação deixava seu peito apertado.Celeste e Isla estavam sentadas ao seu lado, enquanto Helena permanecia perto da porta, observando-a com carinho e paciência.— Então… — Celeste começou, inclinando-se para frente. — Como você conheceu o pai do bebê?Erin engoliu em seco, sentindo suas bochechas queimarem.— Bom… — Ela olhou para as irmãs, hesitante. — Foi em um bar…Isla arregalou os olhos, animada.— Um bar? Isso já está ficando interessante!Helena franziu levemente a testa, mas não disse nada. Erin sabia que sua mãe não a julgaria, mas ainda se sentia estranha contando aquela história.— Eu… — Erin respirou fundo. — Eu estava trabalhando no bar onde servia drinks e ele apareceu. Um homem alto, forte, de presença marcante. Eu juro, assim que bati os olhos nele, foi como se o ar tivesse ficado pesado.Celeste sorriu de canto.— Atração instantânea?Erin revirou os olhos.— Mui
O escritório de Helena era um espaço acolhedor, repleto de livros, documentos e o aroma de chá de ervas. Erin estava sentada em uma poltrona confortável, acariciando distraidamente sua barriga arredondada de seis meses. A porta se abriu de repente, e Celeste e Isla entraram em meio a uma discussão animada. — Eu aposto que Erin vai querer as frutas que eu trouxe — Celeste disse, segurando um pratinho com pedaços coloridos de morango, manga e mirtilo. — Ah, por favor! — Isla revirou os olhos, segurando uma tigela de mingau de aveia fumegante. — Mingau é muito mais nutritivo! Helena, que estava sentada atrás da mesa, riu da pequena disputa. — Vocês duas agem como se pudessem prever os desejos de uma grávida — brincou. Erin, com um sorriso divertido, olhou para as irmãs e pegou as duas porções sem dizer nada. Em seguida, despejou as frutas dentro da tigela de mingau, misturando tudo. Celeste e Isla fizeram expressões de puro espanto. — Eca! — Isla fez uma careta. — Isso parece er
A lua cheia pairava sobre o céu límpido, iluminando o castelo da matilha real. Dentro dos muros de pedra imponentes, os preparativos para o grande baile estavam finalizados. O evento era aguardado com ansiedade por muitas fêmeas em busca de seus companheiros, mas para o rei, Lucian, aquilo era apenas uma formalidade exaustiva. Ele já sabia o que esperar: uma noite longa, cheia de lobas tentando seduzi-lo, esperando que fossem a escolhida de seu lobo.Mas aquela noite seria diferente.A uma hora dali, na matilha da Lua Escarlate, Erin e suas irmãs estavam quase prontas para partir. Isla resmungava enquanto prendia um grampo nos cabelos escuros.— Não é justo! Celeste e Erin já foram quando eram crianças, e eu nunca tive essa chance.— Isso porque você ainda não tinha nascido, sua tonta — Celeste zombou, ajeitando o vestido azul-claro que realçava seus olhos.— Na verdade, não é bem assim — Erin interveio, lançando um olhar curioso para a irmã mais nova. — Mamãe não sabia que estava grá