BRUNO
Eu só comecei a trabalhar de babá no My Nany porque uma amiga me indicou a empresa e eu precisava de um emprego que pudesse me ajudar a terminar de pagar a minha faculdade. O que eu não esperava era que fosse ter tantos clientes fiéis.
Eu estava fazendo minha corrida matinal na beira da praia quando meu celular começou a tocar. Parei e desconectei os fones de ouvido e levei o aparelho ao ouvido.
— Bom dia, Bruno. — A voz da velha recrutadora soou do outro lado da linha.
— Bom dia, Paulina.
— Você está disposto a trabalhar no final de semana? — Ela foi direto ao assunto.
— Sim.
— Então eu tenho o trabalho perfeito para você. O menino tem seis anos e a mãe precisa de alguém que possa cuidar dele durante o final de semana porque ela tem uma viagem de trabalho.
— Mas e o pai?
— Ao que tudo indica não existe ou simplesmente não faz parte da vida do garoto.
— Posso te passar as informações por e-mail?
— Fico no aguardo!
Depois que encerrei a ligação, reconectei os fones e dei o play na música, voltando a correr logo em seguida. Quando, finalmente, cheguei em casa, tomei um opo de água gelada e então abri o notebook que estava sobre a mesa e comecei a verificar minha caixa de e-mails.
Cliquei no documento que Paulina tinha me enviado e assim que o arquivo abriu, fiquei surpreso ao me deparar com a foto do garotinho, seus cabelos loirinhos e, se, não fosse o brilho travesso estampado em seus olhos azuis-acinzentados, eu o teria comparado a um anjinho.
Pela ficha descobri que o nome d garotinho era Caetano, tinha seis anos de idade, filho único e morava apenas com a mãe. Pensei logo que seria um daqueles meninos mimados demais que se jogam no chão para conseguir o que querem e me daria um trabalhão.
Os meninos costumavam ser os meu prediletos para tomar conta, talvez porque eu me identificasse com eles. Eu fui uma criança levada, dava trabalho para minha mãe, na escola ia sempre parar na diretoria por atormentar as meninas na hora do recreio.
Tomei um banho para me livrar do suor e depois comecei a arrumar minha mochila com tudo necessário para passar o final de semana fora de casa: roupas, necessaire de couro preto com itens básicos de higiene e, claro que, não poderia deixar para trás o meu caderno de desenho.
Na parte da tarde, decidi passar clínica para ver minha mãe porque não poderia vê-la no sábado como já era de costume. Uma cuidadora a trouxe para o jardim, reparei o quanto ela caminhava devagar, as rugas em seu rosto demonstravam o quanto ela já tinha vivido. Ficarmos sozinhos, passamos um tempo juntos conversando sobre como tinha sido a nossa semana.
— Mãe, eu não vou poder vir no sábado porque vou precisar trabalhar.
— Tudo bem, meu filho. Sei que você precisa pagar para que eu possa estar aqui.
— Eu prometo que ainda vou te dar uma vida melhor.
— Para mim já está bom assim, não preciso de mais nada.
— Eu te amo, mãe.
— Eu também, meu filho.
Assim que voltei para o meu pequeno apartamento, terminei de arrumar minhas coisas, aproveitei para terminar um rascunho que tinha começado no dia anterior. No horário combinado com Paulina, peguei o ônibus e fui para o endereço indicado.
Quando toquei a campainha, tive que esperar um pouco até que a porta fosse aberta e quase não acreditei quando vi aquela mulher na minha frente. Ester Rabello. Simplesmente a mulher que era a minha maior inspiração na parte dos desenhos. Tive que respirar fundo e me controlar para parecer profissional.
— Senhora Ester?
— Sim, sou eu. — Ela parecia confusa. — Quem é você?— Meu nome é Bruno. Fui enviado pelo My nany para ficar com o seu filho.— Deve ter algum engano, pois eu solicitei uma babá.— Não há engano algum, senhora. Eu sou o babá que vai ficar com o seu filho.— Mas você... é um homem.Mesmo estando meio atordoada por ter sido pega de surpresa por um babá, ela me deixou entrar, chamou o filho, que veio correndo de algum ponto da casa. Eu já tinha visto o filho dela em algumas matérias em revistas e blogs, mas não ousaria falar nada.
— Caetano, este é o Bruno, o babá que vai ficar com você enquanto a mamãe viaja.
— Maneiro! Você sabe jogar videogame? — Mas é claro que sim!— Oba! A gente vai poder jogar muito.A megera simplesmente cortou a alegria do menino lembrando que ele só poderia jogar por uma hora. Que mulher desalmada. Mesmo estando ainda um pouco desconfiada, ela me mostrou o quarto onde eu ficaria e a lista de tarefas pregada na geladeira.— Um garotinho de 6 anos precisa mesmo de tudo isso? — perguntei sem conseguir acreditar naquilo.
— Mas é claro. Disciplina é tudo na vida de uma criança.— Por que não pode deixá-lo simplesmente ser uma criança?— Você está querendo me ensinar a como eu devo criar o meu filho?— Longe de mim Sra. Ester, mas acho que uma criança deveria ter mais tempo para brincar.— É melhor mesmo, Bruno, pois se tratando do meu filho eu sei o que é melhor para ele.Não percebi que a encarava até ela erguer uma sobrancelha e continuar o interrogatório:
— Por acaso sabe cozinhar?
— Sim.— Ótimo, porque não temos empregada no final de semana.— Pode ir tranquila para a sua viagem Sra. Ester, eu cuidarei muito bem do pequeno Caetano.— Pode me chamar só de Ester.
— Tudo bem.— Também quero receber fotos de uma em uma hora. Ok?— Pode deixar.Ela olhou o relógio em seu pulso e, apressadamente, voltou à sala, despedindo do filho. Uma cena emocionante, mas dava para perceber que não era a primeira vez que ela deixava o menino sob os cuidados de alguém.— Boa viagem, mamãe!
— Obedeça ao Bruno. Ok?— Tá bom.Ajudei Ester a carregar a mala até o táxi e coloquei-a no porta-malas. Enquanto o carro e afastava, pude perceber que era complicado para ela confiar em mim. Entramos em casa e Caetano ficou atrás de mim pela casa, quando nos sentamos na sala, tentei saber um pouco mais dos gostos dele. Suas brincadeiras favoritas, suas comidas prediletas. Peguei o celular no bolso da calça e tirei uma foto nossa, peguei o número de telefone de Ester na lista da geladeira e enviei.— Tio Bruno, quer jogar futebol comigo?
— Vamos lá ver se você aprendeu alguma coisa na escolinha que você frequenta.
Fomos para praia do outro lado da rua e jogamos algumas partidas de futebol e, constatei que o menino era muito melhor do que eu jogando. Só paramos de jogar quando Caetano avisou que estava com fome, então voltamos para casa e, depois de lavar os pés, comecei a pensar no que faria.
— Posso te ajudar?
— Claro que pode.
Caetano correu até o quarto dele e pegou o seu banquinho e já estava voltando quando ouvimos o telefone tocar, ele correu para atender.
— Alô?Parei de cortar os tomates e passei a prestar atenção na conversa do menino, afinal, não tinha como eu saber quem estava do outro lado da linha e, foi somente quando ele falou mamãe, que eu relaxei um pouco.
— Sim! O tio Bruno é muito legal.Tio Bruno. Eu gostava de ser chamado assim pelos pequenos de quem eu cuidava. Fazia parecer que eu era parte da família. — A gente foi até a praia jogar bola e agora ele está fazendo o almoço.A mulher do outro lado da linha deve ter pedido para falar comigo, pois o pequeno pestinha passou o telefone para mim.— Ester?— Oi, Bruno. Só estou ligando para saber se está tudo bem com o meu pequeno.— Estamos nos dando muito bem. Caetano é um garotinho de ouro.— É, eu sei.— Era só isso? Preciso desligar e voltar ao fogão para não queimar a comida.— Tudo bem, vai lá.ESTER Se eu tinha achado estranho um homem como babá? Achei muito estranho, mas não tinha nada que eu pudesse fazer e meu pequeno parecia estar gostando de ter um homem como babá. Pensando pelo lado do meu filho, era mais fácil se identificar com um homem do que com uma babá. Depois que consegui descansar um pouco, comecei a me arrumar para ir até o evento, queria dar uma volta, por lá, conhecer o ambiente e até fazer networking com outras pessoas do ramo de animações, era a oportunidade perfeita para divulgar a minha empresa e recrutar novos talentos. Estava andando em meio a multidão quando senti meu celular vibrar no bolso de trás da calça e quando o peguei, vi que tinha recebido uma mensagem de Bruno, rapidamente abri porque sabia que eram notícias do meu pestinha. Quando deslizei o dedo pela tela, uma foto abriu, Caetano estava brincando com Heitor, filho da vizinha, e um sorriso surgiu em meu rosto. — Desculpa interromper, mas você é Ester Aguilar? — Alguém perguntou atrás d
ESTER Eu tinha passado o restante do dia sem notícias do meu filho, por estar tão ocupada e envolvida com o evento, acabei nem tendo tempo de ligar para Bruno. Só quando voltei para o hotel foi que consegui ligar o babá, mas para minha infelicidade, ele não atendeu. Tentei de novo por mais umas quatro vezes, mas sem sucesso e isso me fez começar a pensar que algo de ruim tinha acontecido. Quando tentei mais uma vez, ele atendeu, eu estava pronta para soltar os cachorros em cima dele, mas a voz do outro lado da linha soou tão calma que entendi que estava tudo bem e a única pessoa neurótica ali, era eu. — Bruno, aconteceu alguma coisa com o Caetano? — Foi a primeira coisa que saiu da minh boca. — Não, ele está muito bem. — E por que não atendeu as minhas ligações? — Eu estava ocupado e não tinha escutado o celular tocar. — Posso falar com o meu filho? — Claro, só um instante que vou entregar o celular a ele. Deu para ouvir quando ele afastou o celular do rosto porque o som da s
BRUNO Depois de colocar Caetano na cama novamente, tive que ler uma história e me certificar de que ele estava mesmo dormindo, saí do quarto dele e fui até a sala. Fechei o meu caderno de desenhos e o levei para o quarto onde eu ficaria. Só o quarto de hóspedes juntamente com o banheiro era maior do que o meu pequeno apartamento. Deitado na cama, não consegui dormir quase nada, acho que estava estranhando a cama, o colchão até mesmo o ambiente. Fiquei ali, olhando para o teto enquanto esperava o sono aparecer. Peguei o meu leitor digital e continuei a leitura de um livro. Quando acordei, apurei os ouvidos e tudo ainda estava silencioso, o que era um sinal de que o pestinha ainda estava dormindo e não tinha colocado fogo na casa. Depois de lavar o rosto no banheiro, saí do quarto e fui ao quarto de Caetano. Para minha surpresa, a cama estava vazia então fui até a sala e o encontrei vendo televisão. — Caetano, o que você está fazendo acordado a essa hora? — Eu estava vendo televisã
ESTER O dia tinha começado tão bem, nada era melhor do que poder dormir confortavelmente e acordar sem precisar me preocupar com horário e nem com criança. Aproveitei para descer e desfrutar do farto café da manhã oferecido pelo hotel e depois fui curtir a piscina e um pouco da sauna. Assim que voltei ao meu quarto, já comecei a me arrumar para ir ao evento, estava enrolando meu cabelo na toalha quando meu celular começou a tocar, peguei o aparelho em cima da cama e deslizei o dedo pela tela sem nem ver quem estava ligando. — Oi, mamãe. — Oi, meu amorzinho. Como você está? — Eu tô bem. — Dormiu direitinho? — Sim e nem tive pesadelo. — Mas que notícia boa. — Eu tô com saudades, mamãe. — Eu também estou, filhotinho. — Quando você vai voltar? — Amanhã quando você acordar, já vou estar aí com você. — Tá bom. Eu te amo, mãe. — Eu também te amo, filho. Assim que encerrei a ligação, voltei a me arrumar, pois sabia que um carro passaria para me buscar por volta das dez e meia.
BRUNODepois que pegamos Miguel na casa da Nádia, o menino veio correndo em minha direção, passando os braços ao redor do meu pescoço e deu um beijo na minha bochecha. Era tão bom poder revê-lo depois de tanto tempo.— Você conhece o tio Bruno? — ouvi Caetano perguntar para o amiguinho enquanto voltava para o banco do motorista.— Claro, né.— Legal!— Por que você não disse que conhecia o Miguel, tio Bruno?— Queria fazer surpresa para você.— Você me enganou. — Ele fingiu estar irritado e cruzou os braços na frente do corpo.— Preparados para aprender a soltar pipa?— Sim! — Eles disseram em uníssono.— Que cor você vai querer a sua pipa, Miguelito? — chamei-o pelo apelido carinhoso que tinha lhe dado no primeiro dia que tinha ficado com ele.— Vermelho.— Eu sabia!Levar os meninos para brincar fora de casa foi a melhor coisa que já fiz. Conhecendo Miguel, sabia que ele tinha muita energia acumulada para gastar, com Caetano não era diferente e os dois juntos era impensável. Depois
ESTERPegar o avião de volta para casa foi um pouco mais tranquilo do que a ida para São Paulo, saber que logo estaria em casa e com meu filho nos braços era mais reconfortante do que imaginei que seria. Acho que estava me tornando o que eu mais temia, uma mãe superprotetora.Quando finalmente desembarquei, entrei num táxi e passei o endereço ao motorista. Ao destrancar a porta, tentei não fazer muito barulho para evitar acordar ninguém, mas acabei me assustando ao me deparar com Bruno sentado à mesa da sala de jantar enquanto mexia no computador.— Que susto, Bruno.— Ester! — Ele ficou de pé rapidamente parecendo assustado também.— Não esperava te encontrar acordado a essa hora.— Estava esperando a senhora chegar para poder ir embora.— Mas vai sair assim no meio da noite como um ladrão?— Prefiro deixar que você tenha a sua privacidade agora que está de volta.— Pode ficar, dormir e ir pela manhã, Bruno.— A senhora tem certeza?— Sim!— Obrigado.Deixei a mala ao lado do sofá e
BRUNO Depois de um jantar mais leve, Caetano foi jogar um pouco de videogame e aproveitei para arrumar minhas coisas na mochila, eu esperaria Ester chegar para poder ir embora, até porque não era certo que eu ficasse depois que ela já estivesse em casa. Assim que fui avisar ao pequeno pestinha que estava na hora de desligar o aparelho e ir dormir, ele prontamente desligou, trocou de roupa e se deitou. Quando fui vê-lo, me surpreendi por ele ter pedido que lesse um livrinho para ele e, claro que aceitei. O livro escolhido por ele foi Os Três Mosqueteiros, mas uma versão mais resumida para crianças. Quando ele finalmente dormiu, peguei meu computador e levei para a sala, coloquei-o sobre a mesa de jantar para adiantar a minha animação. Fiquei tão distraído que nem percebi que a hora tinha passado e acabei me assustando quando a porta foi aberta. — Que susto, Bruno. — Ester! — Fiquei de pé rapidamente. — Não esperava te encontrar acordado a essa hora. — Estava esperando a senhora c
ESTERDepois de deixar meu pequeno na escola, fui para a empresa e, mal tinha pisado na minha sala quando a minha secretária entrou, me informando que tinha alguém na minha linha querendo falar comigo. Estranhei porque não estava esperando falar com ninguém.— Sabe dizer quem é?— A pessoa não se identificou, mas a voz é masculina.— Vou atender. Obrigada.Ela se retirou e fechou a porta atrás de si, me dando privacidade. Peguei o fone do gancho e apertei o botão para aceitar a ligação. Tinha esperança de que Bruno tivesse pensado a respeito da minha proposta, mas era só um jornalista local querendo fazer uma matéria sobre o prêmio que eu tinha ganhado.A parte da manhã foi uma verdadeira loucura, tive que participar de algumas reuniões importantes que tinham sido adiadas, da uma olhada nos trabalhos que já estavam sendo desenvolvidos e ainda tinha combinado de almoçar com minha mãe. Quando saí da sala de reuniões e cheguei na minha, tomei um susto ao me deparar com uma pessoa de cost