ESTER
A noite de sexta-feira chegou mais rápido do que esperava. Já estava próximo do horário de sair para o aeroporto quando ouvi a campainha tocar e, instintivamente, corri para abrir a porta, mesmo estando descalça. Sabia que devia ser a babá, mas para minha surpresa, dei de cara com um homem, muito bonito por sinal.
— Senhora Ester?— Sim, sou eu. — Estranhei ele saber meu nome e estar na minha porta. — Quem é você?— Meu nome é Bruno. Fui enviado pelo My nany para ficar com o seu filho durante o final de semana.— Deve haver algum engano, pois eu solicitei uma babá.— Não há engano algum, senhora. Eu sou o babá que vai ficar com o seu filho.— Mas você... Você é um homem.— Isso é um problema para a senhora?— Não. Quero dizer, sim, porque não tenho certeza se conseguirá lidar com um garotinho de 6 anos.— Não tem motivo para se preocupar porque eu fui muito bem treinado para ficar com crianças de qualquer idade, senhora.— Como poderei ter certeza disso? — perguntei desconfiada.— Terá que confiar em mim, senhora.— De qualquer forma, não tenho tempo para pedir outra babá.
— Quantos anos você tem?
— Vinte e oito.
— Ótimo! Pelo menos sei que meu filho não está com nenhum irresponsável.
Cheguei para o lado e dei passagem para o rapaz, que educadamente pediu licença e passou por mim. Não pude deixar de sentir o cheiro do seu perfume cítrico. Bruno era um rapaz um pouco mais alto do que eu, com um porte atlético de dar inveja, que fazia parecer que ele tinha acabado de sair de algum quartel. Quando saímos do hall em direção a sala de estar, chamei meu pequeno pestinha, que veio correndo do quarto.
— Caetano, este é o Bruno, o babá que vai ficar com você enquanto a mamãe viaja.Pensei que haveria certa resistência por parte do meu filho, mas o garoto pareceu gostar da ideia de ter um babá.— Maneiro! Você sabe jogar videogame?— Mas é claro que sim!— Oba! A gente vai poder jogar muito.— Lembre-se que só é permitido jogar 1h por dia.— Tá bom, mãe.Aproveitei para mostrar ao Bruno o quarto de hóspedes onde ele ficaria e também a lista pregada na porta da geladeira com toda a rotina que meu filho seguia, além de uma lista com todas as suas alergias e alguns contatos de emergência caso acontecesse alguma coisa.
— Um garotinho de 6 anos precisa mesmo de tudo isso? — perguntou incrédulo.— Mas é claro. Disciplina é tudo na vida de uma criança.— Por que não pode deixá-lo simplesmente ser uma criança? — perguntou enquanto passava os olhos pela lista mais uma vez.— Você está querendo me ensinar a como devo criar o meu filho?— Longe de mim Sra. Ester, mas acho que uma criança deveria ter mais tempo para brincar.— É melhor mesmo, Bruno, pois se tratando do meu filho eu sei o que é melhor para ele.Pude notar seu olhar assustado, talvez não estivesse acostumado a ser confrontado pelas mães das crianças de quem já tinha cuidado antes ou nunca tinha se deparado com uma casa cheia de regras, mas teria que se acostumar, nem que fosse por um final de semana.— Por acaso sabe cozinhar?— Sim.— Ótimo, porque não temos empregada no final de semana e não gostaria que meu filho comesse muitas porcarias.— Pode ficar tranquila, porque eu cuidarei muito bem do pequeno Caetano, Senhora Ester.— Pode me chamar só de Ester.
— Tudo bem, Ester— Também quero receber fotos de uma em uma hora. Ok?— Pode deixar comigo.Depois de dar uma conferida rápida no meu relógio, percebi que se não saísse naquele exato momento, acabaria chegando atrasada no aeroporto e, tudo o que eu não queria era ecorrer o risco de perder o voo. Voltando à sala, me despedi do meu pequeno com um abraço de urso e um beijo no topo da cabeça. Com os seus bracinhos ao redor do meu pescoço, senti que estava deixando para trás um pedaço do meu coração.— Boa viagem, mamãe!— Obrigada, meu anjinho e você obedeça ao Bruno. Ok?— Tá bom.Bruno, muito educado, me ajudou a carregar a mala até o táxi e colocou-a no porta-malas. Enquanto o motorista dava partida no carro, pude perceber um par de olhos azuis-acinzentados tristonhos me olhando da porta de casa. Com a mão joguei um beijo na direção do meu filho que, imediatamente, fingiu pegar no ar e colocar sobre o coração, como sempre fazíamos ao nos separar. Eu confesso que estava com medo de deixar o meu maior tesouro nas mãos de um desconhecido por mais que ele fosse bem treinado, não tinha como saber se algo de ruim aconteceria.A caminho do aeroporto, ouvi meu celular vibrar dentro da bolsa e resgatei-o na mesma hora. Era uma mensagem de um número desconhecido, mas que resolvi abrir assim mesmo e, para minha surpresa, era uma foto do meu pequeno com Bruno. Salvei o número de telefone na minha agenda: o babá.Embarquei naquele avião rumo a São Paulo com o coração apertadinho, mas tentei relaxar durante o voo, tinha preparado um breve discurso para quando subisse ao palco para receber o prêmio tão importante para minha carreira. Além de produzir minhas animações, minha empresa vinha produzindo muitas animações de artistas desconhecidos, uma forma de dar oportunidade a novos talentos que tenham um grande potencial e, muitos dos meus estagiários estavam me surpreendendo.Depois de 1 h 5 min dentro do avião, eu finalmente consegui desembarcar, peguei um táxi e pedi ao motorista que me levasse ao Haus Stay Luxo na Vila Mariana, onde o pessoal da organização tinha feito uma reserva de flat para que e ficasse mais a vontade. Depois de me ajeitar, liguei para casa e Caetano atendeu o telefone.— Alô? — Eu seria capaz de reconhecer aquela voz no meio de uma multidão.— Oi, meu filho.— Mamãe!— Está tudo bem aí?— Sim! O tio Bruno é muito legal.Tio Bruno. Meu pequeno pestinha já tinha se apegado ao rapaz que mal conhece.— É mesmo? E o que vocês já fizeram?— A gente foi até a praia e agora ele está fazendo o almoço.— Coma direitinho, hein.— Pode deixar, mamãe.— Posso falar com o tio Bruno?— Tá bom.— Eu te amo muito, filho.— Eu também.Assim que o telefone foi passado para o adulto que estava responsável pelo meu pequeno, senti minhas pernas ficarem bambas com aquela voz rouca e extremamente sexy do outro lado da linha. Pare com isso, Ester. Ele é só o babá do seu filho.— Ester?— Oi, Bruno. Só estou ligando para saber se está tudo bem com o meu pequeno.— Estamos nos dando muito bem. Caetano é um garotinho de ouro.— É, eu sei.— A senhora fez uma boa viagem?
— Sim. Obrigado por perguntar.
— Era só isso? Preciso desligar e voltar ao fogão para não queimar o nosso almoço.
— Tudo bem, vai lá. Só não deixe de me dar notícias.BRUNO Eu só comecei a trabalhar de babá no My Nany porque uma amiga me indicou a empresa e eu precisava de um emprego que pudesse me ajudar a terminar de pagar a minha faculdade. O que eu não esperava era que fosse ter tantos clientes fiéis. Eu estava fazendo minha corrida matinal na beira da praia quando meu celular começou a tocar. Parei e desconectei os fones de ouvido e levei o aparelho ao ouvido. — Bom dia, Bruno. — A voz da velha recrutadora soou do outro lado da linha. — Bom dia, Paulina. — Você está disposto a trabalhar no final de semana? — Ela foi direto ao assunto. — Sim. — Então eu tenho o trabalho perfeito para você. O menino tem seis anos e a mãe precisa de alguém que possa cuidar dele durante o final de semana porque ela tem uma viagem de trabalho. — Mas e o pai? — Ao que tudo indica não existe ou simplesmente não faz parte da vida do garoto. — Posso te passar as informações por e-mail? — Fico no aguardo! Depois que encerrei a ligação, reconectei os fones e
ESTER Se eu tinha achado estranho um homem como babá? Achei muito estranho, mas não tinha nada que eu pudesse fazer e meu pequeno parecia estar gostando de ter um homem como babá. Pensando pelo lado do meu filho, era mais fácil se identificar com um homem do que com uma babá. Depois que consegui descansar um pouco, comecei a me arrumar para ir até o evento, queria dar uma volta, por lá, conhecer o ambiente e até fazer networking com outras pessoas do ramo de animações, era a oportunidade perfeita para divulgar a minha empresa e recrutar novos talentos. Estava andando em meio a multidão quando senti meu celular vibrar no bolso de trás da calça e quando o peguei, vi que tinha recebido uma mensagem de Bruno, rapidamente abri porque sabia que eram notícias do meu pestinha. Quando deslizei o dedo pela tela, uma foto abriu, Caetano estava brincando com Heitor, filho da vizinha, e um sorriso surgiu em meu rosto. — Desculpa interromper, mas você é Ester Aguilar? — Alguém perguntou atrás d
ESTER Eu tinha passado o restante do dia sem notícias do meu filho, por estar tão ocupada e envolvida com o evento, acabei nem tendo tempo de ligar para Bruno. Só quando voltei para o hotel foi que consegui ligar o babá, mas para minha infelicidade, ele não atendeu. Tentei de novo por mais umas quatro vezes, mas sem sucesso e isso me fez começar a pensar que algo de ruim tinha acontecido. Quando tentei mais uma vez, ele atendeu, eu estava pronta para soltar os cachorros em cima dele, mas a voz do outro lado da linha soou tão calma que entendi que estava tudo bem e a única pessoa neurótica ali, era eu. — Bruno, aconteceu alguma coisa com o Caetano? — Foi a primeira coisa que saiu da minh boca. — Não, ele está muito bem. — E por que não atendeu as minhas ligações? — Eu estava ocupado e não tinha escutado o celular tocar. — Posso falar com o meu filho? — Claro, só um instante que vou entregar o celular a ele. Deu para ouvir quando ele afastou o celular do rosto porque o som da s
BRUNO Depois de colocar Caetano na cama novamente, tive que ler uma história e me certificar de que ele estava mesmo dormindo, saí do quarto dele e fui até a sala. Fechei o meu caderno de desenhos e o levei para o quarto onde eu ficaria. Só o quarto de hóspedes juntamente com o banheiro era maior do que o meu pequeno apartamento. Deitado na cama, não consegui dormir quase nada, acho que estava estranhando a cama, o colchão até mesmo o ambiente. Fiquei ali, olhando para o teto enquanto esperava o sono aparecer. Peguei o meu leitor digital e continuei a leitura de um livro. Quando acordei, apurei os ouvidos e tudo ainda estava silencioso, o que era um sinal de que o pestinha ainda estava dormindo e não tinha colocado fogo na casa. Depois de lavar o rosto no banheiro, saí do quarto e fui ao quarto de Caetano. Para minha surpresa, a cama estava vazia então fui até a sala e o encontrei vendo televisão. — Caetano, o que você está fazendo acordado a essa hora? — Eu estava vendo televisã
ESTER O dia tinha começado tão bem, nada era melhor do que poder dormir confortavelmente e acordar sem precisar me preocupar com horário e nem com criança. Aproveitei para descer e desfrutar do farto café da manhã oferecido pelo hotel e depois fui curtir a piscina e um pouco da sauna. Assim que voltei ao meu quarto, já comecei a me arrumar para ir ao evento, estava enrolando meu cabelo na toalha quando meu celular começou a tocar, peguei o aparelho em cima da cama e deslizei o dedo pela tela sem nem ver quem estava ligando. — Oi, mamãe. — Oi, meu amorzinho. Como você está? — Eu tô bem. — Dormiu direitinho? — Sim e nem tive pesadelo. — Mas que notícia boa. — Eu tô com saudades, mamãe. — Eu também estou, filhotinho. — Quando você vai voltar? — Amanhã quando você acordar, já vou estar aí com você. — Tá bom. Eu te amo, mãe. — Eu também te amo, filho. Assim que encerrei a ligação, voltei a me arrumar, pois sabia que um carro passaria para me buscar por volta das dez e meia.
BRUNODepois que pegamos Miguel na casa da Nádia, o menino veio correndo em minha direção, passando os braços ao redor do meu pescoço e deu um beijo na minha bochecha. Era tão bom poder revê-lo depois de tanto tempo.— Você conhece o tio Bruno? — ouvi Caetano perguntar para o amiguinho enquanto voltava para o banco do motorista.— Claro, né.— Legal!— Por que você não disse que conhecia o Miguel, tio Bruno?— Queria fazer surpresa para você.— Você me enganou. — Ele fingiu estar irritado e cruzou os braços na frente do corpo.— Preparados para aprender a soltar pipa?— Sim! — Eles disseram em uníssono.— Que cor você vai querer a sua pipa, Miguelito? — chamei-o pelo apelido carinhoso que tinha lhe dado no primeiro dia que tinha ficado com ele.— Vermelho.— Eu sabia!Levar os meninos para brincar fora de casa foi a melhor coisa que já fiz. Conhecendo Miguel, sabia que ele tinha muita energia acumulada para gastar, com Caetano não era diferente e os dois juntos era impensável. Depois
ESTERPegar o avião de volta para casa foi um pouco mais tranquilo do que a ida para São Paulo, saber que logo estaria em casa e com meu filho nos braços era mais reconfortante do que imaginei que seria. Acho que estava me tornando o que eu mais temia, uma mãe superprotetora.Quando finalmente desembarquei, entrei num táxi e passei o endereço ao motorista. Ao destrancar a porta, tentei não fazer muito barulho para evitar acordar ninguém, mas acabei me assustando ao me deparar com Bruno sentado à mesa da sala de jantar enquanto mexia no computador.— Que susto, Bruno.— Ester! — Ele ficou de pé rapidamente parecendo assustado também.— Não esperava te encontrar acordado a essa hora.— Estava esperando a senhora chegar para poder ir embora.— Mas vai sair assim no meio da noite como um ladrão?— Prefiro deixar que você tenha a sua privacidade agora que está de volta.— Pode ficar, dormir e ir pela manhã, Bruno.— A senhora tem certeza?— Sim!— Obrigado.Deixei a mala ao lado do sofá e
BRUNO Depois de um jantar mais leve, Caetano foi jogar um pouco de videogame e aproveitei para arrumar minhas coisas na mochila, eu esperaria Ester chegar para poder ir embora, até porque não era certo que eu ficasse depois que ela já estivesse em casa. Assim que fui avisar ao pequeno pestinha que estava na hora de desligar o aparelho e ir dormir, ele prontamente desligou, trocou de roupa e se deitou. Quando fui vê-lo, me surpreendi por ele ter pedido que lesse um livrinho para ele e, claro que aceitei. O livro escolhido por ele foi Os Três Mosqueteiros, mas uma versão mais resumida para crianças. Quando ele finalmente dormiu, peguei meu computador e levei para a sala, coloquei-o sobre a mesa de jantar para adiantar a minha animação. Fiquei tão distraído que nem percebi que a hora tinha passado e acabei me assustando quando a porta foi aberta. — Que susto, Bruno. — Ester! — Fiquei de pé rapidamente. — Não esperava te encontrar acordado a essa hora. — Estava esperando a senhora c