Um Pestinha em minha vida
Um Pestinha em minha vida
Por: A. C. Barroso
Prólogo

ESTER

Deu certo.

Eram essas duas palavras que eu mais desejava ouvir quando me arrumei para ir ao consultório médico pela manhã. Já fazia quase duas semanas que tinha passado pelo procedimento e estava ansiosa para saber se tinha dado tudo certo. Um exame de sangue tinha sido feito e agora eu estava ansiosa para saber o resultado.

Fiquei sozinha na sala esperando a médica voltar trazendo o resultado e cada minuto de espera que passava era como uma tortura. Quando ouvi a porta ser aberta, notei que a médica trazia o envelope com o resultado do teste de Beta HCG e comecei a ficar nervosa, já sentindo as mãos suadas.

— E qual foi o resultado, doutora?

— A inseminação foi um sucesso e você está grávida.

Eu tinha certeza de que naquele momento eu tinha me tornado a pessoa mais feliz do mundo. Eu, finalmente, realizaria o sonho de todo casal: gerar o próprio filho. A diferença era que eu estaria sozinha durante esse processo.

— E está tudo bem com o... meu bebê? — tentei não soar muito nervosa.

— Tudo dentro da normalidade. — A médica tinha um largo sorriso estampado no rosto. — Temos que marcar uma ultrassonografia, mesmo que não dê para ver muito ainda.

Sem conseguir me contar de tanta alegria, apoiei a mão sobre minha barriga e não tentei esconder uma lágrima escorreu pelo seu rosto. Eu estava feliz demais para me importar com alguma coisa e, provavelmente, a doutora já devia estar acostumada com essas reações, afinal, quantas mulheres ela já não tinha atendido.

— Eu vou ter o meu tão sonhado bebezinho.

— Já pode preparar a surpresa para sua família, futura mamãe.

— Eles vão ficar muito felizes, com certeza.

Dentro do táxi e no caminho de volta para casa, passei suavemente a mão pela barriga, mesmo que ainda não houvesse nenhum volume. Era emocionante saber que eu estava carregando o filho do meu marido, Rômulo com certeza ficaria radiante e faria uma festa só para comemorar. Enquanto olhava a cidade correr pela janela do carro, fiquei tentando imaginar qual seria a reação da minha família.

Tinha optado pela fertilização depois da morte de Rômulo, porque ainda nutria o sonho de ser mãe. Enxuguei as lágrimas com o dorso da mão e tentei não deixar que a saudade tomasse conta de mim. Eu já tinha passado muito tempo de luto e, acho que nunca superaria o fato de ter perdido o grande amor da minha vida de uma forma tão trágica e honrosa.

Rômulo foi o meu primeiro e único amor durante uma vida inteira. Tínhamos nos conhecido na faculdade, casados desde a formatura, tudo o que queríamo era ter uma família, uma casa aconchegante numa vizinhança boa, mas infelizmente, foram interrompidos abruptamente.

Num minuto, Rômulo estava comigo e no minuto seguinte, ele já estava morto. Lembro como se fosse ontem, a notícia, o funeral, a homenagem dos companheiros do corpo de bombeiros. O nosso "até que a morte nos separe" jurado diante do padre e dos convidados tinha chegado mais rápido do que eu estava preparada. Eu tinha perdido o amor da minha vida para um prédio em chamas. 

Se antes tudo era só uma ideia, agora estava se tornando real e eu estava completamente encantada e apaixonada. O amor que sentia por aquela sementinha pareceu se multiplicar. Eu amaria meu bebê a cada segundo e comemoraria cada etapa do seu desenvolvimento mesmo que muitos nos olhassem estranho.

Antes de ir para casa, decidi passar numa loja de bebês. Enquanto olhava, admirada, tudo ao meu redor, acabei me vendo encantada por um antigo berço de carvalho, passei os dedos sobre o protetor de berço azul, mas que ainda não poderia levar porque não sabia se o bebê seria menina ou menino.

— O que a senhora achou do berço? — Uma atendente se aproximou.

— É adorável. — Tentei dirfarçar o meu desejo em levá-lo, mas não sabia se encontraria outro com entalhes tão delicados.

— Uma preciosidade e é único.

— Está falando sério?

— Sim. Ele foi feito pelo meu próprio pai.

— Vou levá-lo.

— Vocês entregam?

— Pode mandar entregar na minha casa junto com o protetor de berço amarelo?

— Mas é claro!

— Obrigada!

Decidi levar um par de tênis all star pretos tão pequenos que cabiam na palma da minha mão. Além do par de sapatinhos, decidi levar também um body escrito “Surpresa a caminho” bordado em um amarelo claro.

O berço foi entregue e instalado no antigo quarto do hóspedes da minha casa. Fiquei admirando o móvel por horas, sonhando acordada com o dia que meu filho dormiria bem ali. Ainda faltava muita coisa, pintar e forrar as paredes com papel de parede de bichinhos fofinhos, comprar uma poltrona de amamentação, uma cômoda, mas só de ter o berço ali já tornava tudo mais real.

Achei que depois do jantar seria o melhor momento para dar a notícia aos meus pais e quando entreguei a caixa de presente, eles ficaram sem entender, mas ao abrir e ver a roupa e os sapatinhos, minha mãe caiu no choro de felicidade. Com os pais de Rômulo não foi diferente, quando minha sogra ficou sabendo o que eu tinha feito, ela caiu em pranto.

— Nem acredito que eu vou ter um neto. 

— Logo logo terão uma criança correndo por aqui.

— Meu filho ficaria tão feliz.

— Ficaria sim.

— Muito obrigada por você fazer isso, Ester.

— Sorte a minha ter convencido seu filho a deixar "nosso filho" congelado.

— Quero que saiba que você não estará sozinha na criação dessa criança, você pode sempre contar com a gente.

— Muito obrigada, dona Vera.

Algum tempo depois vieram os sintomas: enjoos, vômitos e inchaço. Toda vez que me pegava sentada no chão e com a cara enfiada no vaso sanitário, ficava pensando que poderia existir um remédio para pular essa fase, passei a ter que trabalhar de casa até que essa fase ruim passasse. Por sorte, eu podia contar com Rita, alguém que trabalhava comigo já fazia muito tempo e, que era quase uma mãe para mim. Como eu evitava sair muito de casa, as pessoas passaram a vir ao meu apartamento para visitas.

O chá de fraldas foi a coisa mais linda, minha sogra e minha mãe fizeram surpresa para mim. Família e amigos reunidos para celebrar a vida que eu gerava dentro do meu ventre, mas a tristeza acompanhada da saudade bateu forte quando me lembrei de Rômulo. No momento que descobrimos que seria um menino, a alegria foi geral para ambos os lados da família.

— Sabe o nome que vai colocar? — Minha mãe perguntou curiosa.

— Caetano.

— Mas por que esse nome? Por que não coloca alguma homenagem ao pai?

— Rômulo gostava muito de ouvir Caetano Veloso e acho que seria uma boa homenagem.

— Se você está dizendo.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >
capítulo anteriorpróximo capítulo

Capítulos relacionados

Último capítulo