Maitê Bell
Eu trabalhei a noite praticamente inteira, então, quando eu cheguei em casa, apenas apaguei e no dia seguinte... eu estava exausta, mas não tinha como escapar — e nem queria —, e por mais que eu tentasse disfarçar, eu estava nervosa. Muito. Naquela manhã, Stayce apareceu no meu apartamento, vestida de jeans e blusa larga, com um saco de compras na mão e um sorriso travesso no rosto.
— Trouxe um presente especial — anunciou, balançando a sacola. — Você vai estar impecável.
Ela disse com diversão e tirou um vestido preto de cetim, com um caimento que parecia feito sob medida. As alças eram finas, o decote discreto, mas ainda assim elegante. Eu o segurei, sem acreditar.
— Stayce, isso é lindo demais… não precisava.
— Precisava, sim. Hoje é um dia especial. — Ela me olhou com carinho, como se dissesse que sabia da importância desse momento pra mim. — Eu sei que você tem um crushzinho no Gregório. Eu quero que você esteja maravilhosa hoje, afinal, você está me ajudando.
O celular dela vibrou em cima da mesa antes que eu pudesse responder. Eu vi certo desconforto no rosto dela e então pigarreei e aproveitei o momento para perguntar:
— Amiga... você disse que estava com o tornozelo machucado na escada mas... e o seu pulso? — perguntei encarando o pulso dela, enfaixado.
Stayce olhou para o telefone, desconfortável, e deu de ombros.
— Ah, sabe como sou desastrada. Escorreguei na escada e me machuquei toda… Mas vamos falar de você! Já pensou no penteado? Maquiagem? Porque eu trouxe tudo pra te ajudar.
Ela desviou tão rápido que nem tive tempo de insistir. No fundo, eu sabia que havia algo a mais, mas hoje estava nervosa demais para insistir. Resolvi aceitar e focar no que realmente importava: não podia perder minha única chance de participar de um evento desse porte e ajudar minha família ao mesmo tempo.
Stayce pegou a maquiagem e começou a trabalhar no meu rosto enquanto eu observava, tentando disfarçar o nervosismo. Ela fez minha pele parecer de porcelana, destacando meus olhos e dando um toque suave nos lábios com um batom nude.
— Pronto! — disse ela, dando um passo atrás para observar o resultado. — Você vai roubar a cena, Maitê. É hoje!
Eu olhei no espelho e, por um instante, nem reconheci meu reflexo. Parecia mais madura, mais confiante. Respirei fundo, tentando me convencer de que aquela era a versão de mim que todos veriam no evento.
— Obrigada, Stayce. Não sei o que faria sem você.
Ela sorriu e segurou minha mão.
— Vai arrasar, amiga. Agora vai lá e faz o que você sabe fazer de melhor.
***
Cheguei ao evento com as mãos trêmulas, me posicionando ao lado da entrada, onde fui instruída a ficar. Meu trabalho era simples: receber os convidados com um sorriso, garantir que tudo estivesse em ordem e ajudar qualquer pessoa que precisasse de orientações. Em teoria, parecia fácil, mas na prática, cada vez que alguém entrava, meu coração disparava. Eu queria causar uma boa impressão, queria que todos percebessem que eu estava à altura de representar a empresa dos pais de Stayce.
As primeiras horas passaram num piscar de olhos. Consegui manter o sorriso, ser cordial e, pouco a pouco, fui ganhando confiança. Mas tudo mudou quando ele chegou.
Gregório Smith entrou como quem não precisava de anúncio. Era imponente, mais ainda do que eu imaginava. O ar ao redor dele parecia diferente, como se todos os olhares automaticamente se voltassem para ele, mesmo que ele passasse discretamente pelo salão. O terno impecável em tom escuro, o olhar firme e penetrante. Era como se ele controlasse a atmosfera da sala, sem nem precisar tentar.
Respirei fundo, tentando não transparecer o turbilhão de emoções. Quando ele se aproximou da entrada, não consegui evitar olhar para ele diretamente. E, surpreendentemente, ele me olhou de volta. Seus olhos se fixaram nos meus, sérios e intensos, e ele esboçou um sorriso breve e educado.
— Boa noite, Sr. Smith. Seja bem-vindo — eu disse, sentindo a voz quase falhar.
— Boa noite. Obrigado por nos receber tão bem — ele respondeu com um aceno sutil.
Trocar aquelas poucas palavras já foi o suficiente para eu sentir as mãos suadas e o rosto queimando. Ele entrou no salão e começou a conversar com os outros convidados, mas mesmo assim, eu pude jurar que de tempos em tempos, sentia o olhar dele em mim. Uma ideia absurda, eu sabia, mas parecia tão real que até me fazia esquecer do nervosismo.
Passei o restante do evento cumprindo minhas funções, mas sempre atenta aos movimentos de Gregório. A presença dele na sala era magnética, e a forma como ele falava com cada pessoa, com um ar de segurança e inteligência, só aumentava minha admiração. E sim, eu sabia que ele era inalcançável, mas poder vê-lo de perto e trocar algumas palavras com ele já parecia uma pequena vitória.
Finalmente, quando o último convidado chegou, me senti relaxar pela primeira vez. Cumpri meu trabalho, fui profissional e ainda tive a sorte de ver de perto o homem que admirei tanto. Essa era a minha noite mágica, e senti uma satisfação genuína ao perceber que tudo havia corrido bem.
Uma mulher alta e bem-vestida se aproximou e me deu um sorriso gentil.
— Oi, Maitê. Agora que todos os convidados já chegaram, vou assumir daqui, tá bem? Você fez um ótimo trabalho, meus pais estão muito satisfeitos. Agora é só relaxar.
— Ah, obrigada, Olívia! — falei, aliviada, enquanto a irmã mais velha da Stayce começava a organizar os brindes para a despedida dos convidados. Eu sabia que ela estava ali para ajudar Stayce, então me senti à vontade para partir.
Quando saí do salão, minha cabeça ainda girava com tudo que tinha acontecido. Ao entrar no táxi, peguei o celular e mandei uma mensagem para meus pais, porque para minha surpresa, eu recebi muito mais do que esperava, então, eu aproveitei e comecei avisando que eu tinha conseguido um bom pagamento e que iria transferir o valor para ajudar nos custos da cirurgia da minha avó.
[Você]: Mãe, vou transferir um valor extra hoje à noite. Não é muito, mas espero que ajude.
A resposta veio alguns minutos depois, enquanto eu ainda estava no táxi, olhando as luzes da cidade pela janela.
[Mamãe]: Maitê, obrigada, filha. Você não precisava fazer isso. Já estamos vendo com os médicos o que é melhor para sua avó. Mas isso vai ajudar muito. Te amamos.
Fechei os olhos, sentindo o peso de uma responsabilidade que não era exatamente minha, mas que eu escolhi carregar. Saber que ao menos essa parte do plano deu certo me encheu de uma calma que eu não sentia há muito tempo.
Gregório SmithOdeio eventos beneficentes.O salão impecável, as pessoas falando com falsa cordialidade, as risadas exageradas… todo aquele teatro me incomoda. Sou obrigado a aturar as abordagens de pais desesperados tentando casar suas filhas comigo, cada uma mais maquiada e engomada que a outra. É ridículo e, no mínimo, exaustivo. As mães me lançam olhares cúmplices, cheias de segundas intenções, como se eu estivesse ali, prestes a dar um passo rumo a um casamento. São esses os motivos pelos quais sempre trago Amélia comigo.Amélia é minha amiga desde a infância. É elegante, discreta e inteligente o suficiente para entender a natureza do nosso acordo: ela me acompanha, eu compro algo extravagante para ela. Essa combinação nos livra de conversas complicadas e mantém os parasitas sociais afastados. No instante em que passamos pela entrada do evento, ela se agarra ao meu braço, já rindo de alguma piada qualquer. Estávamos nos encaminhando para o salão principal quando uma jovem me este
Gregório SmithDepois de um certo tempo, finalmente consegui sair, mas a mulher que tanto me chamou atenção não estava mais lá.Eu saí do salão com uma irritação palpável crescendo dentro de mim. Tudo parecia preparado, calculado; era apenas um anel, algo sem significado… pelo menos, deveria ser. Mas agora ele queimava no meu bolso como um lembrete de uma oportunidade que escapou. Por um lado, queria me livrar dessa sensação irritante, esquecer a ideia absurda de ter um anel de safira guardado para uma recepcionista de evento. Por outro, eu queria vê-la de novo, ver como reagiria ao receber algo como aquilo.Ainda tentando me convencer do contrário, segui até onde Amélia me esperava, ao lado da saída principal. Ela estava exausta, mas o sorriso de satisfação ainda estava estampado no rosto ao acariciar o colar de diamantes pendurado no pescoço.— Gregório, foi uma noite maravilhosa! — Ela me puxou para um abraço rápido e sorria com a confiança de quem sabia que aquele colar era apenas
Maitê BellNa semana seguinte ao evento, a vida voltou ao normal. O evento beneficente parecia uma experiência distante e quase surreal, como se aquele vislumbre do mundo dos ricos e glamurosos fosse algo fora do meu alcance. Voltei para o trabalho e a rotina de economizar cada centavo, ainda determinada a fazer meu caminho para a faculdade. Sabia que precisava encontrar um jeito de tornar esse sonho possível, mesmo que parecesse quase inalcançável às vezes, principalmente com todos os problemas que meus pais e minha avó vinham passando.Eu estava no sofá do apartamento, revisando os detalhes do processo seletivo de uma universidade quando Stayce chegou, largando-se ao meu lado com um suspiro pesado. Olhei para ela, notando o cansaço estampado em seu rosto. Havia algo diferente em sua postura, algo tenso.— Tá tudo bem, Stayce? — perguntei, tentando captar o que estava acontecendo.Ela hesitou, mordendo o lábio. Depois de alguns segundos, soltou um suspiro e passou a mão pelos cabelos
Gregório SmithMason estava debruçado sobre a mesa de reuniões, analisando com atenção o calendário de eventos do próximo semestre, e eu já sabia para onde essa conversa iria. Já tinha ouvido falar sobre as expectativas de todos para comemorar os 25 anos da empresa, mas agora, vendo aquele olhar determinado nos olhos dele, percebi que estava oficialmente sem saída.— Gregório, não tem como fugir dessa. Precisamos marcar uma festa para os 25 anos e você sabe que esperam algo grande — começou ele, cruzando os braços como se quisesse me desafiar a dizer o contrário.Suspirei e passei a mão pelo queixo, tentando disfarçar o tédio.— É, eu sei que precisamos fazer isso. Não é como se fosse uma questão de escolha, não é? — falei, tentando esconder a irritação.— Exato. E, olha, eu entendo seu desânimo, mas pensa bem: uma festa dessas não é só uma noite chata com discursos vazios e elogios forçados. Você sabe que isso é mais do que um evento. Vai ser a oportunidade de reforçar parcerias, fec
Maitê BellMorar em Baltimore. Nunca imaginei como seria fazer isso sozinha. Quer dizer, a cidade tem seu charme, mas me deixou com a sensação de estar em um mundo diferente desde que tive que encará-la de outra forma, principalmente depois de São Paulo. Minha vida virou de cabeça para baixo por causa da mudança repentina dos meus pais para o Brasil, e agora sou só eu aqui. Dona Estela, minha vózinha, adoeceu e eu sabia que não tínhamos muita opção nesse quesito, não podíamos deixá-la sozinha no Brasil e trazer ela para Baltimore? Por Deus... fora de questão. Nós estávamos bem, não me entenda errado, mas a minha família nunca foi rica e a saúde pública fora do Brasil era inexistente, ainda mais... quando se tratava dos EUA. Eu amo a minha vózinha, claro. Gosto dela demais, mas, caramba, ninguém se prepara para uma mudança assim. Só não pirei de verdade porque eu tinha Stayce. Ela é a minha amiga mais leal, daquelas que te faz rir no meio do caos e nunca solta a sua mão.Depois de algu
Maitê BellNo dia seguinte, eu acordei com o som insistente das notificações no celular. Uma parte de mim queria ignorá-las, voltar para o sono tranquilo que parecia me prometer um pouco de paz. Mas, ao ver o nome da minha mãe piscando na tela, percebi que não dava para adiar. Respirei fundo e abri a mensagem, porque eu sabia que se minha mãe tivesse me enviado uma mensagem a essa hora, era porque era importante.[Mamãe]: Filha, sua avó precisa de uma cirurgia no coração. A situação aqui não está fácil, mas vamos dar um jeitoMeu coração apertou quando li aquelas palavras. Minha avó sempre foi uma fortaleza na nossa família. A ideia de que agora ela estava vulnerável, precisando de ajuda e eu tão longe, me deixava aflita. Era nessas horas que a distância parecia um abismo. Pensei em responder imediatamente, mas as palavras não vinham. O que eu poderia dizer? Que estava preocupada? Que sentia culpa por estar aqui enquanto eles lidavam com tudo sozinhos?Em vez disso, fechei os olhos po