Gregório Smith
Odeio eventos beneficentes.
O salão impecável, as pessoas falando com falsa cordialidade, as risadas exageradas… todo aquele teatro me incomoda. Sou obrigado a aturar as abordagens de pais desesperados tentando casar suas filhas comigo, cada uma mais maquiada e engomada que a outra. É ridículo e, no mínimo, exaustivo. As mães me lançam olhares cúmplices, cheias de segundas intenções, como se eu estivesse ali, prestes a dar um passo rumo a um casamento. São esses os motivos pelos quais sempre trago Amélia comigo.
Amélia é minha amiga desde a infância. É elegante, discreta e inteligente o suficiente para entender a natureza do nosso acordo: ela me acompanha, eu compro algo extravagante para ela. Essa combinação nos livra de conversas complicadas e mantém os parasitas sociais afastados. No instante em que passamos pela entrada do evento, ela se agarra ao meu braço, já rindo de alguma piada qualquer. Estávamos nos encaminhando para o salão principal quando uma jovem me estendeu um catálogo do leilão da noite, e tudo ao redor pareceu se silenciar.
— Boa noite, Sr. Smith — ela diz, me oferecendo um sorriso profissional, embora um pouco tímido.
Ela me entregou o catálogo e eu o peguei quase sem perceber. Minha atenção estava completamente voltada para ela. Seu crachá no vestido, em letras discretas, trazia o nome “Maitê”. É claro que não a conheço; me lembraria dela com certeza. Mas o que mais me intrigou foi o fato de eu estar sentindo algo incomum — uma certa curiosidade quase instantânea, que não costumo nutrir por ninguém, muito menos uma recepcionista em um evento como esse.
Ela usava um vestido preto, que delineava suas curvas de forma discreta, e sua postura era composta, como se estivesse absolutamente ciente do ambiente e de tudo ao redor. Havia um misto de determinação e gentileza em seu olhar, algo que a diferenciava das outras pessoas que circulavam pelo evento. E eu, absurdamente, me peguei querendo puxar conversa. Um simples “como vai?” parecia adequado, mas hesitei. Afinal, Amélia estava ao meu lado, e esse tipo de distração não combinava com meu estilo.
— Gregório, você já deu uma olhada nas peças que vão leiloar? — Amélia perguntou, interrompendo meus pensamentos.
Olhei para ela e fiz um esforço para me concentrar no que dizia. Não queria ser rude, claro, mas minha atenção estava dividida.
— Ainda não, Amélia, mas agora que mencionou… que tal escolher uma peça? Considere isso um presente pela companhia — sugeri, em parte querendo manter Amélia feliz e em parte querendo que ela estivesse ocupada.
Amélia sorriu, animada. Sabia que adorava esses “mimos”, e eu cumpria bem o papel de oferecer esse tipo de distração. Seguimos para o salão e aos poucos fui me deixando envolver pelo jogo do leilão, mas minha mente voltava constantemente à recepcionista de nome incomum, voltava para aquele par de olhos grandes e cheios de uma timidez que chegava a me excitar.
Conversei com alguns executivos e fechei alguns acordos comerciais rápidos enquanto disputávamos algumas peças. Ainda que não gostasse desses eventos, sabia aproveitar as conexões e oportunidades. A cada palavra que trocava, porém, sentia algo se agitando em minha mente. Como um vício que surge aos poucos, eu queria vê-la novamente. Queria voltar à entrada, encontrá-la, ver seu sorriso — aquele mesmo sorriso que tinha me cumprimentado.
— Esse é o colar de diamantes que você mencionou? — perguntei a Amélia, apontando para uma peça no leilão, era o que ela queria e estava prestes a começar os lances por ele.
Ela assentiu, os olhos brilhando.
— É perfeito! Sabe, sempre gostei desse tipo de colar — disse ela, se inclinando para ver melhor.
Fiz o lance e, em poucos minutos, o colar era nosso. Amélia estava encantada, como esperado, e enquanto ela observava o diamante reluzente, algo prendeu minha atenção novamente. Entre as próximas peças do leilão, um anel de uma safira parecia brilhar especialmente para mim. A safira era pura, cercada por pequenos diamantes e montada em um aro prateado. Um trabalho artesanal de raro refinamento.
Imaginei, sem nem perceber, aquele anel no dedo de alguém. Maitê. A safira contrastaria perfeitamente com o preto de seu vestido, com sua pele clara e seu sorriso. A ideia era absurda, claro. Eu mal a conhecia. Mas ali estava eu, considerando como seria sua reação ao receber uma joia daquele calibre. E, antes que pudesse racionalizar, ergui a mão para fazer o lance.
As ofertas cresceram rapidamente, mas eu não recuei. Ao contrário, aumentei o valor com determinação. Quando a disputa se encerrou, o anel era meu. Amélia me olhou surpresa.
— Não sabia que você gostava de safiras. Nunca mencionou isso antes — ela disse, rindo.
— Gosto de coisas bonitas — eu respondi como se fosse alguma verdade e Amélia riu.
— Por isso gosta de mim.
Sorri.
— Claro, por que mais poderia ser?
— Gregório! — ela disse meu nome como se estivesse se sentindo ofendida, mas eu apenas a vi rir, e sorri de volta, mas minha resposta foi vaga. Não era algo que Amélia entenderia. Na verdade, nem eu entendia direito o que estava fazendo. Eu apenas sabia que queria fazer aquele gesto — mesmo que fosse um capricho, mesmo que fosse apenas para ter aquela peça para mim.
O leilão continuou, mas minha paciência estava se esgotando. Eu tinha feito o que vim fazer. E agora, por algum motivo, queria voltar para a entrada, ou talvez apenas encontrar uma desculpa para cruzar com ela no salão. Ela certamente não perceberia o efeito que tinha causado, mas isso tornava tudo ainda mais intrigante.
Eu sabia que era impulso, sabia que não podia sair por aí pegando qualquer uma, ainda mais por conta da minha fama, mas ainda assim eu não conseguia ignorar a ideia de ir até aquela mulher.
O que tinha acontecido comigo eu não sabia, mas de alguma forma ela mudou algo dentro de mim, algo que eu sequer conseguia explicar.
Gregório SmithDepois de um certo tempo, finalmente consegui sair, mas a mulher que tanto me chamou atenção não estava mais lá.Eu saí do salão com uma irritação palpável crescendo dentro de mim. Tudo parecia preparado, calculado; era apenas um anel, algo sem significado… pelo menos, deveria ser. Mas agora ele queimava no meu bolso como um lembrete de uma oportunidade que escapou. Por um lado, queria me livrar dessa sensação irritante, esquecer a ideia absurda de ter um anel de safira guardado para uma recepcionista de evento. Por outro, eu queria vê-la de novo, ver como reagiria ao receber algo como aquilo.Ainda tentando me convencer do contrário, segui até onde Amélia me esperava, ao lado da saída principal. Ela estava exausta, mas o sorriso de satisfação ainda estava estampado no rosto ao acariciar o colar de diamantes pendurado no pescoço.— Gregório, foi uma noite maravilhosa! — Ela me puxou para um abraço rápido e sorria com a confiança de quem sabia que aquele colar era apenas
Maitê BellNa semana seguinte ao evento, a vida voltou ao normal. O evento beneficente parecia uma experiência distante e quase surreal, como se aquele vislumbre do mundo dos ricos e glamurosos fosse algo fora do meu alcance. Voltei para o trabalho e a rotina de economizar cada centavo, ainda determinada a fazer meu caminho para a faculdade. Sabia que precisava encontrar um jeito de tornar esse sonho possível, mesmo que parecesse quase inalcançável às vezes, principalmente com todos os problemas que meus pais e minha avó vinham passando.Eu estava no sofá do apartamento, revisando os detalhes do processo seletivo de uma universidade quando Stayce chegou, largando-se ao meu lado com um suspiro pesado. Olhei para ela, notando o cansaço estampado em seu rosto. Havia algo diferente em sua postura, algo tenso.— Tá tudo bem, Stayce? — perguntei, tentando captar o que estava acontecendo.Ela hesitou, mordendo o lábio. Depois de alguns segundos, soltou um suspiro e passou a mão pelos cabelos
Gregório SmithMason estava debruçado sobre a mesa de reuniões, analisando com atenção o calendário de eventos do próximo semestre, e eu já sabia para onde essa conversa iria. Já tinha ouvido falar sobre as expectativas de todos para comemorar os 25 anos da empresa, mas agora, vendo aquele olhar determinado nos olhos dele, percebi que estava oficialmente sem saída.— Gregório, não tem como fugir dessa. Precisamos marcar uma festa para os 25 anos e você sabe que esperam algo grande — começou ele, cruzando os braços como se quisesse me desafiar a dizer o contrário.Suspirei e passei a mão pelo queixo, tentando disfarçar o tédio.— É, eu sei que precisamos fazer isso. Não é como se fosse uma questão de escolha, não é? — falei, tentando esconder a irritação.— Exato. E, olha, eu entendo seu desânimo, mas pensa bem: uma festa dessas não é só uma noite chata com discursos vazios e elogios forçados. Você sabe que isso é mais do que um evento. Vai ser a oportunidade de reforçar parcerias, fec
Maitê BellMorar em Baltimore. Nunca imaginei como seria fazer isso sozinha. Quer dizer, a cidade tem seu charme, mas me deixou com a sensação de estar em um mundo diferente desde que tive que encará-la de outra forma, principalmente depois de São Paulo. Minha vida virou de cabeça para baixo por causa da mudança repentina dos meus pais para o Brasil, e agora sou só eu aqui. Dona Estela, minha vózinha, adoeceu e eu sabia que não tínhamos muita opção nesse quesito, não podíamos deixá-la sozinha no Brasil e trazer ela para Baltimore? Por Deus... fora de questão. Nós estávamos bem, não me entenda errado, mas a minha família nunca foi rica e a saúde pública fora do Brasil era inexistente, ainda mais... quando se tratava dos EUA. Eu amo a minha vózinha, claro. Gosto dela demais, mas, caramba, ninguém se prepara para uma mudança assim. Só não pirei de verdade porque eu tinha Stayce. Ela é a minha amiga mais leal, daquelas que te faz rir no meio do caos e nunca solta a sua mão.Depois de algu
Maitê BellNo dia seguinte, eu acordei com o som insistente das notificações no celular. Uma parte de mim queria ignorá-las, voltar para o sono tranquilo que parecia me prometer um pouco de paz. Mas, ao ver o nome da minha mãe piscando na tela, percebi que não dava para adiar. Respirei fundo e abri a mensagem, porque eu sabia que se minha mãe tivesse me enviado uma mensagem a essa hora, era porque era importante.[Mamãe]: Filha, sua avó precisa de uma cirurgia no coração. A situação aqui não está fácil, mas vamos dar um jeitoMeu coração apertou quando li aquelas palavras. Minha avó sempre foi uma fortaleza na nossa família. A ideia de que agora ela estava vulnerável, precisando de ajuda e eu tão longe, me deixava aflita. Era nessas horas que a distância parecia um abismo. Pensei em responder imediatamente, mas as palavras não vinham. O que eu poderia dizer? Que estava preocupada? Que sentia culpa por estar aqui enquanto eles lidavam com tudo sozinhos?Em vez disso, fechei os olhos po
Maitê BellEu trabalhei a noite praticamente inteira, então, quando eu cheguei em casa, apenas apaguei e no dia seguinte... eu estava exausta, mas não tinha como escapar — e nem queria —, e por mais que eu tentasse disfarçar, eu estava nervosa. Muito. Naquela manhã, Stayce apareceu no meu apartamento, vestida de jeans e blusa larga, com um saco de compras na mão e um sorriso travesso no rosto.— Trouxe um presente especial — anunciou, balançando a sacola. — Você vai estar impecável.Ela disse com diversão e tirou um vestido preto de cetim, com um caimento que parecia feito sob medida. As alças eram finas, o decote discreto, mas ainda assim elegante. Eu o segurei, sem acreditar.— Stayce, isso é lindo demais… não precisava.— Precisava, sim. Hoje é um dia especial. — Ela me olhou com carinho, como se dissesse que sabia da importância desse momento pra mim. — Eu sei que você tem um crushzinho no Gregório. Eu quero que você esteja maravilhosa hoje, afinal, você está me ajudando.O celula