— Talvez seja melhor você convidar alguém da sua idade, do seu círculo de amizades.— O quê? Não posso acreditar que estou ouvindo isso!— É isso mesmo. Você precisa estar cercada de pessoas da sua idade. O meu tempo já passou.Ouço sua risada, e logo ele se vira.— De onde você tirou essa ideia de que seu tempo passou? Você é jovem, muito linda.A palavra “linda” escorrega de seus lábios, quase se demorando no ar, como se ele quisesse destacar cada sílaba, tornando-a mais especial, mais intensa.Linda e jovem?A ideia parece tão distante da minha realidade que não consigo segurar e começo a rir. E, para minha surpresa, Eduardo também se solta, rindo junto comigo. Rimos tanto que minha barriga começa a doer, e o ar vai se escapando de mim, até que sou obrigada a parar, só para recuperar o fôlego. Ele faz o mesmo.Viro-me para ele, observando seu sorriso e os olhos brilhando com a diversão, ainda marejados de lágrimas enquanto tenta controlar a risada. Há algo de encantador nesse momen
Ao chegarmos em nossa sala, Eduardo solta um suspiro profundo, enquanto anda de um lado para o outro.— Esse Gustavo realmente ultrapassou todos os limites. Não consigo entender como alguém pode ser tão desrespeitoso — Ele murmura mais para si do que para mim.Acompanho o rosto do meu assistente ganhar um tom avermelhado, e apesar de estar usando blazer, os músculos de seus ombros e braços se tornam visíveis. Eduardo está realmente incomodado, e sua indignação me atinge de uma forma que não sei decifrar. Há algo reconfortante, em saber que tenho alguém disposto a enfrentar situações em meu nome.Resolvo ficar quieta, sento na minha cadeira, e discretamente mantenho meus olhos nele, que ainda anda de um lado para o outro. Até que finalmente resolve ir para seu lugar e se volta para os documentos espalhados pela mesa.Quando a respiração dele fica visivelmente mais tranquila, me permito retomar para as minhas planilhas de vendas do mês. No entanto, de tempos em tempos, nossos olhos se c
Entro na minha sala, bufando de raiva. Se tivesse uma arma na minha frente, com certeza daria um tiro na cabeça do meu ex. Passo por Eduardo, que se mantém em silêncio, e caminho em direção à janela, mas nem a bela paisagem consegue me acalmar. Como pude ter sido tão cega em relação ao Gustavo? Realmente, não importa o tempo que passamos com alguém, nunca vamos conhecê-lo verdadeiramente. Nunca chegaremos ao miolo da cebola.De repente, uma xícara aparece na minha frente, interrompendo o turbilhão de pensamentos. Olho para o lado e encontro Eduardo com a sobrancelha levantada.Aceito agradecida, aproximo a xícara do meu rosto e respiro fundo o aroma reconfortante de camomila. Sorvo um pequeno gole, que não só aquece meu corpo, mas também acalma a minha mente agitada.Fito Eduardo que está ao meu lado, também segurando uma xícara de chá nas mãos. Nesses dois meses, ele incorporou esse ritual à minha rotina. É estranho como uma conexão entre nós se formou, algo que eu nunca consegui ter
Desejando espantar as borboletas, caminho pelo meu apartamento em direção ao banheiro. A cada passo, uma peça de roupa cai, e a necessidade de um banho se torna urgente. Quando a água gelada toca minha pele, me permito relaxar, deixando que ela leve embora o calor que queimava por dentro. Esse calor estranho, que muda meus pensamentos, que me faz imaginar situações que nunca deveriam acontecer entre mim e meu assistente.Mais relaxada, saio do banheiro envolta no roupão, e me jogo na cama. Por que, Deus, eu aceitei esse convite? Sem vontade de ir, observo o teto, enquanto busco uma solução para esse dilema, porque sim, isso é um problema. Será que posso enviar uma mensagem, alegando dor de cabeça? Ou talvez uma cólica? Não, nenhuma das opções parece convincente o suficiente.Eduardo já me mostrou que não é burro, e muito menos inocente. Mas que droga! Será que é pedir muito não querer misturar o profissional com o pessoal?Me reviro na cama pela décima quinta vez. Nunca pensei que
— Sim, vamos usar a mesinha de centro — anuncia. — Fique à vontade. Pode deixar sua sapatilha no carpete da entrada, se preferir.— Espera, Eduardo, como assim, jantar aqui? No chão? — pergunto, levando as mãos à cintura.Eduardo solta uma gargalhada contagiante diante da minha pergunta. — O que foi? O que achou engraçado? Olhando-me divertido, ele se aproxima, cruza os braços e levanta uma sobrancelha. — Nunca jantou sentada no chão? — questiona.— Claro que sim, mas... — hesito, procurando uma resposta adequada. Como posso dizer que me sentirei boba e infantil? — É no mínimo estranho, não é? — respondo finalmente. Sem tirar o sorriso dos lábios, Eduardo se aproxima e, para minha surpresa, seus dedos acariciam suavemente meu queixo. — Se permita, Júlia, você não vai se arrepender. Sente-se e relaxe. — Deixando-me sem jeito, ele se dirige para a cozinha. Sem saber o que fazer, decido seguir o que ele disse. Tiro a sapatilha e a coloco próxima à porta. Volto e encaro a mesi
Acordo sobressaltada, ainda presa entre a névoa do sono e da realidade. Por alguns instantes, demoro a reconhecer onde estou. Sento-me devagar, com o coração acelerado, e ao olhar para o lado, encontro Eduardo dormindo tranquilamente. Ele está cercado por travesseiros e coberto por uma manta. Sem saber que horas são, me levanto com cuidado para não acordá-lo. Pego minhas sapatilhas e saio do apartamento na ponta dos pés, fechando a porta atrás de mim sem fazer o menor ruído. Ao entrar no meu apartamento, sou recebida pelo frio vazio do lugar. A diferença entre o calor acolhedor da sala de Eduardo e a solidão da minha sala é gritante. Caminho direto para o quarto e me jogo na cama, esperando que o sono volte e me permita aproveitar o restante da madrugada. Mas ele não vem. Quanto mais eu tento, mais impossível parece. Frustrada, fico olhando para o teto, ciente de que algo está faltando. A lembrança de Eduardo dormindo tão tranquilamente ao meu lado me invade. É pensando nele que
A sensação ruim persiste, mesmo agora na sala de reunião, com quinze pessoas ao meu redor. Não consigo parar de lembrar a forma como Gustavo olhou para nós, nos julgando como se estivéssemos fazendo algo de errado.Mas não estávamos, mas por que sinto como se estivéssemos? O cansaço começa a pesar, e uma leve dor de cabeça ameaça surgir, enquanto o senhor Roberto, do departamento de crise, repete pela centésima vez que as lojas da New Lux têm reclamado da falta de produtos. O problema é real, mas o pior é saber que os donos da empresa não estão dispostos a investir na produção.Finalmente a reunião acaba, entro na minha sala e dou de cara com Eduardo segurando uma xícara de café e em seguida me oferece.De prontidão aceito e levo a xícara aos lábios, ansiando sentir o calor da bebida, mas sou interrompida pelas batidas na porta. Ao me virar, vejo Gustavo entrando na minha sala. — Quero falar com você na minha sala.Nossos olhares se encontram, e uma onda de desconforto me invade.—
Desesperada para ocultar meu sofrimento, cubro o rosto com as mãos, respiro fundo, tentando colocar ordem no caos dentro de mim, mas é inútil. A humilhação e a raiva continuam pulsando, vivas demais. — Ei. A voz suave de Eduardo atravessa a barreira do meu desespero. Sinto o calor das mãos dele envolvendo as minhas, afastando-as do meu rosto com uma gentileza que desmonta qualquer resistência que ainda tento impor.Evito olhar para ele. Não quero sua piedade. Não quero que ninguém me veja assim. Mas Eduardo não recua, permanece ali, sua presença forte e silenciosa. As mãos firmes pousam em meus ombros, como uma âncora que me segura no presente, me impedindo de ser arrastada de volta ao momento que acabei de passar. — O que aconteceu, Júlia? Não consigo responder. Como dizer em voz alta as palavras venenosas que Gustavo jogou sobre mim? Meu silêncio é tudo o que consigo oferecer, mas Eduardo não parece se incomodar. Ao invés de insistir, ele se aproxima e me envolve em seus bra