Capítulo 2

Ivy tentou resistir, lutar contra as sensações que inundavam seu corpo. O cheiro de Lucian parecia invadir cada fibra de seu ser, enquanto a conexão que surgia entre eles pulsava como uma corda apertada ao redor de seu coração. Ela sentia o peso de sua fome, de sua fraqueza.

E o seu corpo acabou por ceder, desabando como se finalmente estivesse entregando tudo o que tinha lutado para segurar nos últimos anos.  As correntes em seus pulsos tilintaram quando ela caiu no chão de pedra, seu cabelo rubro se espalhando ao redor de seu rosto pálido.

Antes que possa apagar completamente, Ivy sente braços fortes e calorosos amparando sua queda. Aquele toque, aquele calor enviam conjuntos de faíscas sobre todo o seu corpo frágil, a deixando ainda mais desnorteada. 

Lucian reage antes que qualquer outro pudesse se mover. Em um movimento rápido, ele a segurou antes que seu corpo atingisse o chão completamente. Sua mão firme a amparou, mas o toque fez o laço entre eles pulsar ainda mais forte. Era insuportável e inegável.

Ivy consegue sentir a própria frieza de sua pele, e ela percebeu com um choque que era mais frágil do que ela havia permitido acreditar. Os dois anos de cativeiro, a falta de comida decente, de luz, de  dignidade - tudo havia cobrado seu preço.

— Levem-na de volta à masmorra — ordenou um dos anciãos, tentando restabelecer a ordem.

Lucian se virou lentamente, os olhos cheios de uma fúria contida.

— Não. — Sua voz era baixa, mas carregava o peso de uma autoridade que ninguém ousava questionar. — Ela vem comigo.

Os guardas hesitaram, trocando olhares, mas nenhum deles ousou se mover contra o alfa. Ele ergueu Ivy com cuidado, sua expressão impenetrável, mas dentro dele, uma guerra estava sendo travada.

Enquanto carregava Ivy para longe, o cheiro dela ainda pairando no ar, ele sabia que as coisas haviam mudado. Aquela mulher não era apenas uma prisioneira, nem apenas um inimigo. Ela era sua companheira. E agora, ele teria que decidir o que isso significava.

***

Ivy despertou em um sobressalto, sentindo o cheiro de madeira polida e lavanda; uma combinação que a enojou por saber a quem pertencia. Seu corpo ainda estava exausto, e sua cabeça latejava com a memória do que havia acontecido horas antes.

Ela tenta se levantar da cama, apenas para ser interceptada pelas duas lobas que estavam presentes no quarto em que ela se encontrava.

— Você precisa tomar banho e se arrumar. —  disse uma das fêmeas, repetindo a ordem do alfa, uma loba alta de cabelos castanhos presos em um coque apertado. Seu tom era firme, mas havia uma pitada de compaixão em sua voz.

Ivy cruzou os braços, erguendo o queixo em desafio.

— Eu só quero ver meu irmão. Onde está Ethan? O que fizeram com ele?

— Seu irmão está seguro —  disse a outra loba, menor e mais jovem, com olhos tão dourados quanto os de Lucian. —  O Alfa quer vê-la. É importante que esteja apresentável.

— Apresentável? —  Ivy riu com escárnio. — Não vou me enfeitar para o monstro que matou minha família. Podem esquecer!

As lobas trocaram um olhar antes de se aproximarem dela novamente.

—  Não é uma escolha, garota. —  disse a mais velha. — Faça o que dizemos, ou sofrerá as consequências.

Ivy, com o coração acelerado e a fúria queimando em seu peito, decidiu que não aceitaria aquele tipo de tratamento. Quando as duas lobas a conduziram ao banheiro, ela entrou na banheira cheia de água morna apenas para sair imediatamente. Com um movimento rápido, empurrou Lyra, a loba mais jovem, que tropeçou e caiu no chão.

— Eu não vou me submeter! Vocês podem me forçar a vir para cá, mas não vou me enfeitar para ele — gritou, os punhos cerrados. — Não enquanto meu irmão estiver longe, e eu não tiver respostas!

Helena, a loba mais velha, estreitou os olhos, mas permaneceu estoica.

— O Alfa decidirá como lidar com você — murmurou antes de sair do quarto, puxando Lyra consigo.

Por alguns minutos, o silêncio reinou. Ivy respirava com dificuldade, seu corpo tremendo de raiva e medo. Ela buscou um roupão ao lado e em seguida colocou ao redor de si e encarou o seu reflexo no espelho e tudo que viu foi uma mulher assustada, perdida em um jogo de poder que não compreendia completamente. Além disso, a sua própria aparência fez seu estômago revirar. Estava magra, com olheiras enormes e escuras ao redor do seus olhos índigo.

Naquele momento, ela se dá conta de que apenas não morreu por causa do poder de cura dos lobos, mas seu estado era deplorável. Sua situação era ainda mais cruel por conta das correntes de prata que usara durante os anos em que ficara presa, o que impedia a sua transformação. Ivy sentia-se desprezada, pavorosa e culpava o alfa Lucian por toda a fatalidade que percorria sua existência. 

Minutos depois, passos firmes e lentos ecoaram pelo corredor. O ar ficou pesado, e Ivy soube que ele estava perto antes mesmo de vê-lo. A porta se abriu, e lá estava Lucian, com sua presença avassaladora. Ele usava roupas simples, mas a aura de autoridade que emanava dele era impossível de ignorar.

— Um escândalo por um banho? —  Sua voz era baixa, mas carregada de um tom perigoso.

— Não quero conversar com você. — Ivy rebateu, puxando o roupão ao redor de si com mais força. — Quero meu irmão.

Lucian fechou a porta com um movimento calmo, o clique da tranca soando como um trovão no silêncio do quarto. Ele deu um passo em direção a ela, e Ivy se obrigou a não recuar, mesmo quando o cheiro amadeirado e intimidante dele invadiu seus sentidos.

— Quero conversar com você. — ele disse, como se sua decisão fosse incontestável. — Mas antes, você vai tomar banho e se alimentar.

— Eu disse que não vou. — Ivy começou, mas sua frase foi interrompida quando Lucian cruzou a distância entre eles em um movimento rápido e a ergueu como se ela não pesasse nada.

— Solte-me! —  ela gritou, socando o peito dele. — Eu odeio você!

— Pode me odiar depois. —  ele disse, sem sequer piscar diante de sua resistência.

Com passos firmes, ele a levou até a banheira. Ivy se debateu com mais força, mas não teve chance quando ele a jogou na água quente sem hesitar.

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