— Não importa o que aconteça, Ivy, eles já nos condenaram. O único consolo que me resta é que, ao menos, estaremos juntos até o fim.
Os corredores escuros da masmorra vibravam com o eco da voz de Ethan e das gotas d'água que caíam das paredes frias de pedra.
Ivy estava sentada contra a parede, o metal gélido das correntes apertando seus pulsos e tornozelos. Ela havia perdido a noção do tempo ali dentro. Dois anos pareciam uma eternidade, um ciclo interminável de escuridão, fome e silêncio quebrado apenas pelos gemidos baixos de dor de seu irmão preso na cela ao lado.
— Juntos até o fim, sim. — Ivy finalmente responde. — Mas isso não significa que vamos morrer sem lutar.
Ethan não tivera tempo de rebater a resposta coberta de resignação e coragem de sua irmã, porque no mesmo instante, surgiu uma luz no fundo do corredor. A luz fraca das tochas iluminava os passos calculados de Lucian, o alfa. Ele era uma figura intimidante, com ombros largos e olhos que pareciam queimar de raiva eterna.
Ivy o observava de soslaio sempre que ele aparecia, mas nunca o encarava diretamente. Não por medo — ela havia perdido a capacidade de temer após o que ele fizera a seus pais —, mas porque sabia que seus olhos carregavam a mesma chama desafiadora que os de sua mãe, algo que parecia enfurecê-lo ainda mais.
Quando Lucian parou diante de sua cela naquela noite, algo estava diferente. Ele não trouxe as ameaças habituais nem a lembrança cruel de suas derrotas. Em vez disso, suas palavras eram curtas, mas carregadas de um peso que fazia o ar na masmorra parecer mais denso.
— Amanhã, os anciãos decidirão o destino de vocês.
E simples assim, ele se foi, deixando apenas o som de suas botas ecoando no corredor. Ivy sentiu um aperto no peito, mas não disse nada. Sabia que aquele dia, mais cedo ou mais tarde, chegaria.
Ethan, porém, murmurou com a voz rouca outra vez:
— Eles não vão nos poupar, Ivy. Você sabe disso.
Ela apertou os punhos, sentindo o metal das correntes cortar sua pele.
— Eu sei. — Confessa, ainda que mentalmente faça planos de como poderia escapar do seu destino inevitável.
***
Na manhã seguinte, a praça da alcateia Lúgubre estava tomada. Os lobos se reuniram, murmurando entre si, os olhares curiosos e famintos por justiça, enquanto aguardavam pela chegada dos criminosos.
Ivy e Ethan foram levados da masmorra sob o olhar vigilante dos guardas. O brilho do sol era quase insuportável depois de tanto tempo no escuro, mas Ivy ergueu a cabeça, recusando-se a demonstrar fraqueza.
Com um único olhar para seu irmão, demonstrou força e nenhum tipo de arrependimento sequer.
Assim que chegaram no centro da praça, os anciãos estavam sentados em um semicírculo elevado, suas expressões eram de pedra, apáticos; como se não estivessem prestes a decidir algo cruel.
O mais velho deles se levantou, e sua voz ecoou pela praça:
— Ivy e Ethan Kaelen, da Alcateia Sanguínea, os declaro culpados pela traição de seus pais. Por suas ações, nossa alcateia perdeu um líder. Justiça será feita; vossas execuções serão no amanhecer.
O veredicto foi rápido. Ivy sentiu o peso da decisão como uma pedra sobre seu peito, mas não vacilou. Antes que os guardas pudessem arrastá-los de volta a masmorra, a praça inteira ficou silenciosa de repente, dominada pela presença recém chegada e esmagadora de Lucian.
Ele entrou com passos firmes, seu olhar implacável varrendo a multidão de lobos reunidos. O alfa não precisava falar; sua aura de poder e autoridade falava por si. Ele caminhou até o centro, onde os anciãos estavam reunidos, suas figuras altas e severas como as pedras que cercavam a praça.
Apenas a leve brisa fazia as folhas das árvores ao redor se moverem. As correntes de Ivy e Ethan faziam um som metálico, um lembrete do destino cruel que os aguardava.
O olhar de Ivy foi direto para Lucian, mas sem emoção. Ela já havia aprendido a se fechar, a não ceder a nada que fosse vulnerabilidade. Mas Ethan, seu irmão, estava ao seu lado, mais tenso que nunca, as mãos tremendo nas correntes.
Lucian, no entanto, permanecia impassível. Ele observou Ivy de longe, como um predador que sentia o aroma da caça no ar. A execução parecia inevitável, mas algo o incomodava. Seus olhos, frios e calculadores, se fixaram na jovem à sua frente.
— Levem-nos de volta para a masmorra. — O ancião anuncia, chamando a atenção dos guardas.
Quando os guardas começaram a arrastar Ivy e Ethan, algo no ar mudou.
A fragrância de Ivy, o cheiro doce e quente de sua pele, invadiu os sentidos do alfa, de Lucian. Um cheiro que ele nunca havia notado antes, mas que agora parecia penetrar em sua alma, uma atração que o puxava como um ímã.
Lucian deu um passo em direção a ela, seu coração batendo mais forte, uma sensação estranha e indomável surgindo dentro de seu peito. Ele fechou os olhos por um momento, tentando controlar o turbilhão de sentimentos que o assolava. Mas o cheiro… aquele cheiro inconfundível… ele sentiu sua respiração mudar, seus sentidos aguçados se alinhando de uma maneira que ele nunca havia experimentado.
Ivy. Era ela. A companheira destinada que ele jamais esperaria encontrar ali, diante de seus olhos, no meio de sua vingança, no sofrimento de sua própria alcateia. O destino, implacável e cruel, o havia colocado diante dela.
A sua prisioneira era a sua companheira destinada; a mulher que ele deveria desprezar, que ele deveria destruir, mas que agora, em sua presença, lhe fazia sentir algo muito mais complexo. Algo que ele não estava preparado para aceitar.
Com um movimento brusco, ele olhou para os guardas, que estavam empurrando Ivy para as escadas da masmorra. O instinto foi mais forte que sua razão. Ele se aproximou deles com passos rápidos, sua presença poderosa, que imediatamente fez com que os guardas parassem e o olhassem, tensos.
— Deixe-a. — Sua voz saiu fria, cortante, mas algo em seu tom carregava uma ordem que não poderia ser ignorada.
Os guardas, apesar do desconforto, obedeceram. Ivy foi solta de suas correntes momentaneamente, e ela olhou para Lucian com uma expressão que não se encaixava em sua dor. Ela não sabia o que ele queria, mas algo no fundo de seu ser sabia que aquela presença significava mais do que parecia.
Ivy tentou afastar o olhar de Lucian quando ele se aproximou, mas algo nela não permitiu. Seus olhos azuis estavam fixos nele, como se fossem puxados por uma força invisível. O cheiro dele atingiu seus sentidos com intensidade — um aroma amadeirado e profundo, com um toque de algo selvagem e indomável, que fez seus pulmões se encherem involuntariamente.
De repente, foi como se algo se rompesse dentro dela. Um calor estranho percorreu seu corpo, aquecendo até os cantos mais frios de sua alma. Ela sentiu um peso no peito, uma pressão inexplicável, como se o ar ao redor tivesse mudado. Seu coração acelerou, batendo contra suas costelas como se quisesse sair dali e encontrá-lo.
— Não… — Ivy sussurrou para si mesma, baixinho, quase sem som, tentando afastar o que estava acontecendo.
Lucian se aproximou, os olhos fixos nela com intensidade. Ivy tentou não ceder, mas o cheiro dele, a presença esmagadora do alfa, a fazia sentir um turbilhão de emoções que ela mal podia compreender.
— Você… — Lucian começou, sua voz baixa, quase um sussurro. — Você é minha companheira destinada.
O mundo ao redor parecia parar, e Ivy sentiu um arrepio percorrer sua espinha. Ela não sabia o que aquilo significava, mas o olhar de Lucian falava por si. O ódio, a vingança, tudo o que ela sentia por ele parecia se desintegrar diante daquela revelação. O destino havia jogado suas cartas, e agora ela estava entrelaçada a ele de uma maneira que não podia ser desfeita.
Um calor repentino subiu pelo corpo de Ivy, a visão escurecendo nas bordas. Sua respiração ficou pesada, e ela cambaleou para trás, as pernas falhando sob o peso de sua exaustão.
— Ivy! — A voz de Ethan foi a última coisa que ela ouviu antes de tudo se apagar.
Ivy tentou resistir, lutar contra as sensações que inundavam seu corpo. O cheiro de Lucian parecia invadir cada fibra de seu ser, enquanto a conexão que surgia entre eles pulsava como uma corda apertada ao redor de seu coração. Ela sentia o peso de sua fome, de sua fraqueza.E o seu corpo acabou por ceder, desabando como se finalmente estivesse entregando tudo o que tinha lutado para segurar nos últimos anos. As correntes em seus pulsos tilintaram quando ela caiu no chão de pedra, seu cabelo rubro se espalhando ao redor de seu rosto pálido.Antes que possa apagar completamente, Ivy sente braços fortes e calorosos amparando sua queda. Aquele toque, aquele calor enviam conjuntos de faíscas sobre todo o seu corpo frágil, a deixando ainda mais desnorteada. Lucian reage antes que qualquer outro pudesse se mover. Em um movimento rápido, ele a segurou antes que seu corpo atingisse o chão completamente. Sua mão firme a amparou, mas o toque fez o laço entre eles pulsar ainda mais forte. Era
Ivy emergiu, tossindo e completamente furiosa. Seus cabelos molhados grudaram no rosto enquanto ela o encarava com ódio puro.— Você é um tirano! Um monstro!— E você é teimosa. — Lucian cruzou os braços, observando-a com uma calma que só a irritou mais. — Agora, faça o que pedi, ou a próxima vez não será tão gentil.Ele saiu do banheiro antes que ela pudesse dizer outra palavra, deixando-a sozinha, molhada e cheia de raiva, mas sem opções. Ivy jurou que ele não venceria, mesmo que tivesse que lutar com cada fibra do seu ser.Ciente de que naquela altura do tempo, lutar contra Lucian seria uma imensa perca de tempo e ela precisava fazer o que ele ordenara, até certo ponto, para assim conseguir notícias do seu irmão, Ivy mergulha completamente.Não sabia que precisava de um banho e que se sentia tão suja até o momento em que saiu da banheira e se secou completamente. Se sentiu melhor, e um pouco mais determinada. Esticando as mãos, ela encontrou um vestido azul celeste ao lado do biomb
Ivy estava presa no grande salão, e naquele instante, tudo que ela desejava era desaparecer entre as sombras. O espaço era amplo, com paredes de pedra e tetos altos que amplificavam cada som, mas para ela, parecia sufocante. Porque ela sempre soubera que não era bem-vinda, e a hostilidade estava presente em toda a atmosfera.Principalmente naquele instante, quando aquela loba avançou suas garras afiadas contra ela, os olhos prateados e cobertos por um ódio cego e latente.O movimento foi rápido demais para Ivy reagir, e a garra daquela loba rasgou sua bochecha antes mesmo que ela pudesse chamar por sua loba. Aquela fêmea parece disposta a continuar com seu golpe e Ivy sente seu sangue gelar, porque percebe que não teria chance alguma contra ela. Principalmente com a situação deplorável e fraqueza que seu corpo se encontrava.— Você é tão covarde quanto os fracassados dos seus pais. — A loba volta a rosnar e se prepara para atacar Ivy novamente, que só desvia os olhos e espera pelo gol
O carcereiro deu uma risada grave diante da determinação cega e a coragem imprudente de Ivy. Lentamente ele avança em sua direção, o sorriso diabólico presente em seu rosto duro e cruel.— Ora, ora... a ovelhinha decidiu enfrentar o lobo. Pena que não vai durar muito. — Ele resmunga, ficando cada vez mais próximo.Ivy tremeu, mas não cedeu. Seu coração batia tão forte que sentia como se fosse rasgar seu peito, mas sua convicção era maior que o medo. Enquanto encarava o carcereiro, ouviu o irmão atrás dela.— Saia daqui, Ivy! Ele vai te machucar... como fizeram comigo.— Eu não vou deixar você sozinho — respondeu, sem desviar os olhos do homem à frente.O carcereiro levantou o chicote novamente, pronto para desferir o golpe, mas algo aconteceu. O som grave de passos ecoou pelo corredor. Pesados, firmes, inconfundíveis.Lucian. Lucian não hesitou. Um rosnado profundo e ensurdecedor escapou de sua garganta quando entrou com violência no recinto.O carcereiro hesitou, os olhos piscando na
Os gemidos fracos de Ethan ecoavam na masmorra enquanto dois curandeiros da alcateia o colocavam cuidadosamente em uma maca improvisada.Ivy permaneceu ao lado dele, segurando sua mão com firmeza, sentindo cada fragmento de dor do irmão como se fosse dela mesma.— Você precisa cuidar das suas feridas, Ethan — disse Ivy, a voz embargada.— E você precisa sair daqui — ele respondeu, tossindo. A fraqueza era evidente, mas havia fogo em seus olhos, mesmo quando estavam pesados de exaustão.O curandeiro lhe aplicou um unguento nas feridas abertas enquanto Ivy se inclinava, acariciando os cabelos suados dele.— Não se preocupe comigo. Eu vou dar um jeito, Ethan. Prometo.Mas antes que pudesse dizer mais, a porta de ferro rangeu. Lucian entrou, sua presença preenchendo o espaço como uma tempestade.— Ele vai viver. — Disse Lucian, de maneira seca, com os olhos focados em Ivy. — Agora você vem comigo.Ivy lançou um último olhar ao irmão, sabendo que ele seria levado à enfermaria. Seus lábios
Ivy sentiu os olhares perfurando sua pele enquanto caminhava ao lado de Lucian. Os membros da alcateia estavam em silêncio, mas seus olhos eram cortantes. Ela sabia o que diziam. Sabia o quanto os desprezavam. E pior: sabia que a presença de Lucian ao seu lado não fazia as coisas mais fáceis. Para todos ali, ela era apenas uma intrusa, a nova Luna que precisaria se provar a todo custo. E Ivy, embora tentasse ocultar, se sentia perdida nesse jogo.— Você está bem? — A voz de Lucian, finalmente, cortou o silêncio.Ele a olhava de lado, com seus olhos frios como a noite. Não havia preocupação no tom, apenas uma indiferença calculada.— Claro. — Ela respondeu, tentando manter a compostura. Ela não iria ceder ao desconforto deles. Não agora, não nunca. — Só me sinto em casa aqui. — Disse com sarcasmo.Lucian ignorou, sua expressão de pedra nunca vacilando. Eles avançaram mais alguns metros até estarem no lado interno da casa da alcatéia, e seguiram até o que Ivy percebeu, ser o salão de m
Ivy se virou em frente ao espelho pela última vez enquanto as mulheres ao seu redor terminavam de ajustar o seu vestido. O azul celeste abraçava seu corpo delicadamente, realçando a palidez de sua pele e o brilho de seus olhos intensos. Apesar da indignação de ser moldada como um objeto, por um momento, ela não reconheceu o próprio reflexo.Ela mal suportava o peso daqueles toques "delicados". Como alguém poderia achar que um vestido ou cabelos trançados poderiam mascarar o furacão que ela sentia por dentro? Ela não era apenas outra peça naquele jogo implacável. Não poderia ser.Antes que pudesse mergulhar mais fundo nesses pensamentos, a porta do quarto se abriu, revelando Lucian.— Está pronta? — ele perguntou, sua voz firme preenchendo o ambiente antes que pudesse vê-la completamente.Quando seus olhos a captaram, Lucian parou. Ele não era um homem facilmente surpreendido, mas ali estava ela, uma versão de Ivy que ele não esperava. Seu olhar deslizou do cabelo vermelho, agora caind
O peso no ar parecia maior conforme os anciãos avançavam em direção a Ivy. Eles eram vultos de autoridade, com passos lentos e olhares que intimidavam até os lobos mais experientes. Ivy respirou fundo, seus dedos entrelaçados em um esforço visível para disfarçar o nervosismo.Quando ficaram próximos, ela os saudou com um pequeno aceno de cabeça, mantendo um tom educado, embora sua voz traísse um leve tremor. — É uma honra conhecê-los pessoalmente, senhores. — Ivy falou, tentando manter um sorriso, apesar de não tolerar nem um pouco a existência daqueles homens.No entanto, Ivy percebeu que se quisesse sobreviver naquele lugar, precisaria aprender a fingir e ignorar seus reais sentimentos.Mesmo assim, os anciãos sequer reagiram a sua tentativa de aproximação. Suas expressões permaneceram imóveis, suas vozes inaudíveis enquanto sussurravam entre si. Sem nem dirigir uma palavra a Ivy, ou mísero olhar, fizeram um gesto chamando Lucian.— Alfa. Precisamos falar em particular. — a voz gra