CAPÍTULO 2.1

Eu passei o resto da semana com os nervos em frangalhos. Eu não acessei o f******k e nem o e-mail da “Gi”. E me dediquei a escrever meus artigos para o meu blog sobre arte. Não estive na minha cafeteria predileta em nenhum desses dias e nem escrevi sequer uma linha sobre o meu novo projeto literário. Eu recebi críticas boas e também algumas cruéis sobre os meus livros e eu posso viver com isso, mas as coisas que esse estranho falou me feriram na alma. Não foi uma crítica ao meu trabalho, foi uma crítica a mim como ser humano, como mulher e isso mexeu comigo de tal maneira que eu estou tendo dificuldades de lidar.

- Você ainda está aí? - Eu estava deitada na cama, relendo um exemplar da Divina Comédia. – Você precisa correr, nós só temos duas horas para chegar à Mansão Mazza.

- Penny, eu não vou a essa festa.

- Por favor, eu estou contando com você.

- Eu não serei uma boa companhia.

- Você não tem que ser. Pode ficar parada e muda como uma estátua. Eu só quero que você esteja lá. Você nunca vai a lugar nenhum, nunca faz nada para se divertir.

- Eu leio.

- Eu não acho que o seu príncipe encantado vai pular das páginas de um livro. Ou você vai busca-lo lá fora ou você vai morrer sozinha – Ok. Ela não tinha como acertar mais na mosca.

- Eu não estou procurando um homem – rebati.

- Eu sei. Eu também não estou. Mas se por acaso ele aparecer, não vai ser entre essas quatro paredes. Vamos lá, esqueça os homens. Apenas me faça companhia.

Eu sabia que eu não ia ganhar essa batalha – Tudo bem. Eu vou. Mas eu não vou demorar. Duas horas no máximo e eu estarei fora. Você pode ficar lá. Eu não me importo.

- Tudo bem, duas horas. Agora, mexa-se. Eu coloquei o vestido azul novo no seu guarda roupas.

- Penny, eu só experimentei ele por que você me disse que seria para você e você queria vê-lo vestido em alguém. Mas eu não poderia usar aquele vestido. Não tem nada nas costas e eu não acho que tenho seios suficientes para ficar bem com ele. 

- Apenas vista – ela gritou enquanto se dirigia para o seu quarto para se arrumar. Ela havia passado a tarde em um spa fazendo tudo que ela acha que precisa para ficar bem. A verdade é que ela não precisava de nada disso. Ela é linda. Eu, porém, não sabia o que fazer com meu cabelo que estava quase sempre trançado e não tinha ideia de onde eu arrumaria coragem para desfilar com esse vestido. Era nu demais nas costas e os seios ficavam em evidência. Não tinha nenhum casaco que eu pudesse usar durante toda a festa. Um bolero, talvez. Resignada, eu fui até o meu banheiro e tomei um banho. Lavei os cabelos, mesmo sabendo que gastaria um bom tempo secando e não poderia fazer nada com ele de última hora a não ser deixa-lo solto. Mas isso era bom, afinal, ele poderia me ajudar a cobrir parte das minhas costas à mostra.

Eu não poderia colocar um sutiã por baixo, pois apareceria sem dúvidas e eu também não tinha nenhum daqueles adesivos que a maioria das mulheres usa.

Depois de secar meus cabelos, a mim restou apenas vestir o bendito vestido e me olhar no espelho. Estava nu demais. Deus do céu!

Quando Penny entrou no meu closet e viu minha cara de desgosto, ela trazia consigo um par de sapatos de saltos na cor preta e uma minúscula bolsa preta com strass azuis – Não faça essa cara. Você está linda. Basta colocar esses saltos e eu vou fazer uma bela maquiagem.

- Eu não gosto de maquiagem.

- Não se trata de gostar... tem que colocar um pouco de cor em seu rosto. Uma sombra azul turquesa, vai ficar excepcional. Eu prometo que vou colocar apenas um brilho labial e um pouco de rímel. Nada mais.

Eu sabia que não adiantava protestar. Ela já tinha tudo decidido, eu só precisava obedecer e daqui a duas horas eu estaria livre dela.

Meia-hora mais tarde, nós estávamos em um táxi a caminho da festa. A mansão Mazza não ficava muito distante de onde morávamos. Mas estava localizada no centro histórico de Milão, nas proximidades do Parco Sempione, um belo parque no estilo londrino intrinsecamente ligado à história do país. Em torno dele há prédios históricos belíssimos, como a biblioteca Sempione e o Castello Sforzesco.

Quando paramos em frente a uma bela Mansão do século XIX, eu senti meu coração parar uma batida. Eu já havia visto a mansão muitas vezes por fora. Porém, sendo uma amante da arte, eu não poderia deixar de me empolgar com a possibilidade de vê-la por dentro. Quantas obras de arte será que existiam ali dentro? Era o que eu me perguntava.

Havia carros luxuosíssimos parando na entrada da mansão. De dentro deles desciam toda a sorte de passageiros impressionantemente ricos. No final, eu fiquei feliz por Penélope ter comprado esse vestido pra mim. Eu não tenho vestidos como esse e não é por uma questão de preço. Eu apenas não estava habituada a tanto cetim e brilho. Minhas roupas são, em sua maioria, simples, confortáveis e funcionais. Nem sabia como andar sem tropeçar em tanto tecido.

Quando o táxi conseguiu parar no pátio central, onde os outros convidados estavam desembarcando, um homem bem vestido em um terno preto elegante, abriu a porta do táxi e nos deu as boas-vindas. Penélope lançou algumas notas para o motorista e nós descemos do carro.

Dirigimo-nos para a grande porta de madeira artisticamente trabalhada e entramos em um belo salão. Havia, como eu tinha previsto, verdadeiras relíquias nas paredes e, o próprio mobiliário era um verdadeiro tesouro. Se não fosse por essa quantidade expressiva de pessoas em volta eu me sentiria no paraíso.

Eu me senti mais desconfortável do que de costume. Homens e mulheres desfilavam deslumbrantes pelo salão e logo eu e Penélope estávamos com uma taça de vinho cada uma. Não pude deixar de ficar impressionada com a naturalidade que ela conseguia imprimir em cada passo e em cada gesto. Apenas eu sabia o quanto ela estava nervosa. Eu sabia que ela, assim como eu, não era de família abastada. Tivemos pais que nos deram o que precisávamos, mas nada se comparava ao que essa família e os seus convidados estavam acostumados. Mas ainda assim ela conseguia parecer natural depois de tudo. Enquanto eu me sentia como se tivesse uma melancia na cabeça.

Ela caminhou, quase que me arrastando, em direção a um pequeno grupo – Olá, pessoal. – Ela cumprimentou – Giovanna, você já conhece Benito – ela disse sinalizando para o rapaz a nossa direita. Na verdade eu não o conhecia de fato, mas poderia identificar seus gemidos se ele o fizesse agora. Eu sabia que ela era o único que frequentou o nosso apartamento algumas noites. Felizmente ele chegava depois que eu já estava no refúgio do meu quarto e saía antes que eu estivesse de pé – e esses são Isabel e Dino. Nós trocamos cumprimentos educados e logo a conversa começou a rolar solta entre eles. Todos estavam na equipe de Penny e o assunto em questão era sem dúvida sobre trabalho. Havia muita gente pelo salão. A música soava em um volume agradável, mas as conversas e os risinhos iam ficando cada vez mais altos à medida que o vinho e o champanhe circulavam.

Meia-hora depois eu já estava entediada, mas quando pensei em me despedir de Penny, eu me lembrei do que o estranho do f******k havia me dito: Você é uma mentira. Então eu queria ousar. Eu queria ser mais como as minhas personagens. Eu queria provar a mim mesma que eu podia contar a minha própria história e viver além das páginas de um livro.

- Eu vou dar uma volta pela mansão – avisei a Penny.

- Você não está fugindo, não é? Você nem sequer teve um vislumbre do Senhor Mazza.

- Não. Eu não estou fugindo. Apenas dando uma volta. Quero ver as obras de artes que tem por aqui. – expliquei. E, de certo modo, eu queria.

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