Meu coração estava batendo disparado, por muito pouco Juninho não foi atropelado, eu tinha medo de imaginar o que ia acontecer com ele se aquela moto tivesse acertado nele.
Apertei ainda mais os braços em volta do seu corpinho e o ouvi resmungar que estava esmagando. Mas que se foda, eu ia esmagar se isso fosse tirar o medo de dentro de mim.
Depois de perder meu pai e minha mãe, me apeguei de mais a família, não aguentaria perder nenhum dos dois.
Assisti Vitor se afastar com a garota no colo. E a vi olhando pro meu irmão, preocupada com o pequeno em meu colo. Mas ele estava bem, quem tinha se ralado toda foi ela.
Porra, não acreditava que agora tinha que agradecer aquela maluca.
— O dona Isabel, o que estava pensando em deixar o moleque sair assim na rua? — questionei a velha entrando na mercearia.
— Aí meu filho, me desculpa! Eu pedi pra Nina olhar ele enquanto eu fechava a compra de um cliente.
Olhei pra garota de cabeça avoada que me encarava com um sorriso sem graça. Que se foda, ela arriscou a vida do meu irmão, ele podia ter morrido.
Ela chegou perto de mim passando a mão na perna de Juninho e se aproveitou pra colocar a mão em meu braço.
Eu sabia bem o que aquela dali queria, e estava bem longe de conseguir. Ela e as amigas costumavam vim cheia de graça pro meu lado, mas dessas garotas sem juízo eu queria distância. Gostava de mulher não de garota recém saída das fraudas, que só quer fazer escândalo e show.
— Tá querendo que meu irmão morra?
— Não! Meu Deus, não. — ela falou espantada e deslizou as unhas enormes por meu braço. — Só me distrai por um segundo e quando eu vi esse lindinho tinha fugido.
Juninho deu língua pra menina, mostrando que não gostava dela nem um pouco, eu nem podia julgar o menino.
— Da próxima vez ela vai prestar mais atenção. — Dona Isabel falou se aproximando e a sobrinha concordou acenando com a cabeça.
— Vai ter próxima vez não. — fui direto ao ponto. — Vou arrumar uma babá pro Juninho pra hoje!
— Mas o que isso João? — Nina me chamou esfregando a unha no meu braço e me irritando com aquilo e por chamar meu primeiro nome, todo mundo ali sabia que eu detestava isso. — Foi só um descuido.
— E se não fosse a outra garota ele podia ter morrido! Tem sorte que ele está bem, ou você ia pagar pelo "descuido". — usei todo deboche pra repetir a palavra dela. — Não sou homem de contar com a sorte. Depois acerto o valor de hoje com você. — falei me virando para a tia dela, que tinha uma expressão fechada.
Sai de lá sem me despedir e quando me virei Juninho aproveitou pra dar língua de novo.
Ele não era uma criança fácil, mas a culpa era toda minha e de Vitor, o deixamos mimado dando tudo o que ele queria.
— Vamos ter uma conversa séria rapazinho. O que falei de atravessar a rua sem olhar?
— Mas quelia você, ela chata. — ele falou baixando os olhos.
Era difícil ficar nervoso com ele por muito tempo quando fazia aquela cara.
— Não pode fazer isso, nunca mais me ouviu? Poderia ter se machucado todo se a moto te pegasse.
— A usinha me salvou. — falou como se fosse fácil e simples.
Para ele com certeza era, já que não tinha preocupação nem nada.
— O nome dela não é ursinha. — só o que faltava agora era ele inventar um apelido pra garota. Achei ridículo o apelido, mas quem podia julgar o pequeno, quando a doida estava usando uma blusa de ursinho. Do tipo bem de criança mesmo.
— Nome? — ele perguntou querendo saber.
Eu lembro de ter ouvido Bianca gritar chamando ela de Camila. Mas fingi de que não sabia e dei de ombros.
Finalmente chegamos na casa da Nalva, mãe da Bianca e se me lembro bem a maluca tá ficando aqui.
Entrei pedindo licença e avistei meu irmão do lado da garota no pequeno sofá.
— Entra aí meu filho. — Dona Nalva falou já me puxando mais pra dentro da sala.
A casa ali era pequena e do jeito que eu me lembrava desde pequeno, fazia tempão que eu não entrava lá, mas me lembrava da época de moleque. O filho dela, que Deus o tenha, vivia andando comigo pra cima e pra baixo nesse morro.
— E aí, machucou muito? — perguntei pra tia da garota.
Bem na hora meu irmão se ajoelhou na frente da maluca, o safado fez questão que segurar bem no meio das coxas dela, alguma coisa se remexeu dentro de mim, quando vi que ela estava tentando segurar a mão dele, não deixando ele subir mais nenhum pouco, também se subisse mais Vitinho ia tá com a mão bem em cima da boceta dela, ele não tinha nenhum pingo de vergonha.
Ela ergueu os olhos castanhos e ficou ali me encarando. O que a garota tinha de maluca, ela também tinha de linda essa era a verdade.
O shorts colado marcando sua bunda e as coxas era uma tentação, o cabelo alisado ia até a cintura dela e mesmo com aquela blusa de bichinho me deu vontade de beijar. Mas ela era nova e maluca, não fazia meu tipo.
— Rasgou toda a perna da coitadinha, o braço acho que foi uma torção boba. Vai melhorar rapidinho, ela é forte! — não entendi a última frase da tia, como assim a mina era forte?
Mas eu estava com os olhos vidrados nela, encarando a boca carnuda, os lábios entreabertos e meu sangue ferveu de pensar que ela podia tá assim meio ofegante pelo toque do Vitor. Porra o que tinha de errado comigo?
— Ahh merda! — ela gritou com dor quando meu irmão colocou o algodão no machucado. — Isso arde de mais.
— Vai ficar tudo bem, calma filha.
Não vou negar que estranhei ela não ter soltado uma penca de palavrão, mas ela parecia certinha de mais pra falar do nosso jeito.
Tinha que sair dali e parar de reparar nela, caralho!
— E como posso agradecer aí, já que ela salvou meu irmão?
— Que isso Miguel, não precisa de nada não! — ela se afastou abanando a mão. — Quem ia deixar o menino morrer homem?
— Não tem essa não dona Nalva! Eu insisto, não gosto de dever a ninguém não!
— Já que insisti então eu aceito um beijo dele. — me virei surpreso pela coragem da garota, acho que não é tão inocente quanto eu pensei. — É só o Juninho me dar um beijinho aqui. — ela falou apontando pra bochecha e eu soltei o ar.
Eita cassete, porque tinha logo pensado que a mina estava falando de mim?
Meu irmão se debateu e eu coloquei ele no chão, que correu direto pro sofá junto dela.
— Você gosta, não é safadinho? — Vitinho falou encarando nosso irmão jogar os braços em volta da garota e dar um beijo, só pra ganhar um monte em troca.
O garotinho gargalhava com as cócegas e os beijos dela, Camila parecia até que tinha esquecido da dor.
— Mas isso não paga minha dívida. — exclamei voltando ao assunto.
Já não bastava o desentendimento da porra que tivemos hoje cedo, só o que faltava era agora ela salvar meu irmão e eu não fazer nada em troca.
— Eu disse que não...
— Arruma um emprego pra ela. — dona Nalva nem deixou ela terminar. — Ela chegou agora do interior, vai ser difícil arrumar emprego e se adaptar ao Rio rápido, se puder arrumar um emprego pra ela já ajuda.
A garota não retrucou dessa vez, ela ficou quieta parecendo pensar no que a tia tinha falado.
Encarei ela, que peste de trabalho eu ia arrumar pra garota? Podia indicar ela pra trabalhar em alguma casa lá no asfalto, ou no escritório dos amigos advogado do Vitinho. Mas porra isso não parecia certo.
Juninho pulou agarrado ao seu pescoço e colou mais um beijo na bochecha dela. Isso me deu um estalo na hora, tinha acabado de achar a babá pra ele.
— Então tá contratada pra ser babá do Juninho!
— Ainda não acredito que você se jogou na frente da moto, sem nem conhecer meu irmão.Estava carregando a heroína gostosa no meu colo, podia facilmente me acostumar em ter aquele corpão dela em meus braços sempre.Claro que eu preferia que as circunstâncias fossem outras, primeiro brigando e agora ela toda machucada, não eram nada favoráveis.— Ele é uma criança, não me interessa quem ele é. — ela se remexeu em meu colo, parecendo envergonhada por ter minhas mãos sobre ela. — Já falei que eu posso andar sozinha! — protestou novamente.— E eu já disse que é um prazer carregá-la, ursinha.Ela desviou o olhar, aposto que com as bochechas pegando fogo. Dava pra ver toda inocência e timidez transbordando daquele rosto angelical, mas era quase um pecado quando vinha acompanhado de um corpo de parar o trânsito.— Você sabe que me chamo Camila e não ursinha. — sorri com sua irritação quanto ao apelido.— E você sabe que se passar o braço em volta do meu pescoço vai ficar mais confortável. — p
Babá, aquela palavra se repetia em minha mente desde que saiu da boca de Miguel. Não era uma má ideia e muito menos um mau emprego, eu estava acostumada a cuidar de crianças, muitas vezes mais de uma de uma só vez. Mas depois de saber quem eles eram e o que faziam, não sabia se seria a opção mais segura.Se isso não bastasse João Vitor quase tinha me beijado, meu rosto queima só de lembrar que poderíamos ter sido pegos pela minha tia. Ainda conseguia sentir seu toque quente, o dedo traçando um caminho em meu lábio inferior e sua voz rouca dizendo que ia me beijar.Eu não sou puritana nem nada, mas minhas experiências com homens podem ser resumidas a zero, tirando dois garotos que beijei no ensino médio não havia mais nada. Eu vivia para minha casa e a igreja, não fazia nada além de sair com minha mãe e a cidade onde eu morava era tão pequena que todos nós se conheciam, o que dificultava toda a coisa da paquera.Fiquei ansiosa esperando o beijo dele, mas o irmão que tem cara de poucos
Sai da casa de dona Nalva com Juninho no colo e Vitor atrás de mim, resmungando sem parar. Eu sabia que o safado estava querendo pegar a mina, ele fez questão de deixar bem claro tocando ela daquele jeito.— Precisava colocar ela de babá do Juninho porra? Como que fica agora eu levar ela pra cama e ficar esbarrando nela dentro de casa?— Isso nunca te impediu antes, você já pegou mais minas desse morro do que consegue lembrar.— É, mas nenhuma dela estava dentro de casa, a garota vai começar a ter ideia errada. — ele passou na frente abrindo o portão de casa. — Você tinha de ver, ela toda sem jeito quando quase a beijei.— Quase? Desde quando tu fica no quase? — eu sabia bem a fama do safado, bem antes de completar dezesseis anos ele já tinha levado a filha de muita gente pra cama.— Desde que você e a dona Nalva viraram empata foda, estava já pertinho daquela boca carnuda e você chega gritando.Não consegui evitar de sorrir, era bem feito que ele tivesse pagado de otário e não conseg
O som do trovão parecia retumbar por meu corpo, se concentrando em meu coração, ditando o ritmo que ele batia. Enquanto minha mente se enchia de imagens daquela noite, o frio do vento, o gelo das aguas cobrindo minhas pernas e as gotas grossas que molhavam todo o meu corpo.Meu corpo tremia involuntariamente e as lágrimas pesadas rolavam por meu rosto. Eu tinha uma vaga noção de ter braços em volta de mim, me segurando firme e acariciando minhas costas, mas eu só conseguia me concentrar na imagem dos meus pais me olhando do outro lado da cratera, os rostos marcados da vida dura, as marcas de expressões profundas apesar da pouca idade.Mesmo com tudo isso eles me olhavam conformados com o que estava prestes a acontecer, não havia medo ou desespero nos rostos deles quando me deram uma última olhada.“Nós amamos você!” as últimas palavras da minha mãe se repetiam em um loop, eu desejava que aquilo pudesse me acalmar, mas não tinha esse efeito mais, só me trazia a solidão.— Camila olha p
Estava me sentindo um caco quando cheguei em casa já de manhã, alguns amigos advogados me chamaram pra inauguração de uma boate. Tinha me cansado de tentar arrastar Miguel para uma dessas festas, mas ele se recusava. Dizia que era pra evitar pessoas esnobes, mas eu sabia bem que ele não queria era evitar algum encontro indesejado com a polícia, ali no morro tínhamos segurança, mas já no asfalto a conversa era outra.Passei a noite na balada e de lá fui para o motel com uma morena, não tinha conseguido tirar Camila da cabeça e acabei me agarrando com a mulher mais parecida com ela. Sabia que aquilo era fodido de mais, mas não consegui evitar, minha mente ficava a todo momento criando cenas com ela e em minha cama, me chupando, cavalgando em cima de mim, gemendo meu nome, por isso precisei tentar suprir minha vontade dela com outra.— Bom dia. — falei entrando em casa e vendo Miguel entregando a mamadeira pra Juninho. — Já acordado.Bufei sabendo que Miguel ia sair e eu teria que cuidar
Quando cheguei na casa de Juninho pela manhã, achei que encontraria o menino dormindo ainda, mas ao invés disso dei de cara com ele terminando a primeira mamadeira do dia, enquanto assistia um desenho na televisão.— Bom dia, chegou bem na hora. — Miguel cumprimentou não demorando o olhar em mim.— Bom dia, bom dia lindinho. — falei apertando a bochecha fofinha, mas os olhos dele nem se desviaram da tela. — Minha tia avisou que você precisava de mim o mais rápido possível. — ele se afastou voltando para o irmão. — Não sabia que eu teria que cuidar dele aqui, na sua casa.— Aqui é mais seguro que na casa da tua tia. Vou ter que sair agora de manhã, resolver umas tretas que apareceram aí. Vem vou te mostrar a casa. — ele se virou seguindo pelo corredor antes mesmo de ver se eu o seguia.Dei passos apressados atrás dele, que começou a me mostrar os cômodos. A casa não era pequena como a de tia Nalva, além da sala havia três quartos, um para cada um deles, uma varanda e a cozinha.— Junin
Estava conversando com os chefes dos outros morros, resolvendo as tretas que eram da conta de todos nós.O complexo eram várias favelas unidas e sempre mantemos assim. Nós fomos "pacificados" há uns anos atrás, recebíamos até turistas agora, uns subiam pra ver a vida aqui, outros querendo usar o teleférico e ter uma vista top do Rio.Mas essa merda era coisa só pra iludir quem estava de fora, quem morava dentro da comunidade sabia que esses polícias não estavam nem aí pra pacificação. No começo o povo da comunidade toda acreditou, mas depois que muita gente inocente começou a morrer, a ser levada pra depor e nunca mais voltar, a apanhar sem motivo, aí eles viram que não tinha esse negócio de pacífico no nosso mundo.O problema é que polícia é gente e qualquer pessoa pode ser corrompido, o que eles queriam era dinheiro. E depois de ver que bater de frente não ia resolver, começamos a pagar aí pra eles um valor, a gente trabalhava em paz, eles saiam como herói e o povo da comunidade fic
As palavras de Miguel rondavam minha mente, eu nunca pensei que poderia me sentir tão mal assim por algo que as pessoas falassem de mim, mas cada palavra dele, me diminuindo, colocando pra baixo e querendo mostrar qual era o meu lugar, foram como uma faca cravando cada vez mais fundo em meu coração.Depois do banho peguei Juninho e fui para a cozinha fazer o almoço dele, o menino tinha sido tão fofo quando viu que eu estava chorando, ele apoiou as mãos em meu rosto e ficou acariciando minhas bochechas querendo que eu me acalmasse. Era bom ver que ao menos um dos homens daquela família tinha um coração.Por sorte não vi nenhum dos dois mais velhos, não sabia como lidaria com nenhum deles. Ouvir que Vitor passou a noite com outra garota não deveria ter me feito tão mal, mas fez. Mesmo que Bianca tivesse me contado sobre a má fama dele, saber que ele dormiu com outra e poucas horas depois estava me beijando fez eu me sentir ainda pior.Esperei Juninho dormir depois das duas da tarde, par