Quando cheguei na casa de Juninho pela manhã, achei que encontraria o menino dormindo ainda, mas ao invés disso dei de cara com ele terminando a primeira mamadeira do dia, enquanto assistia um desenho na televisão.
— Bom dia, chegou bem na hora. — Miguel cumprimentou não demorando o olhar em mim.
— Bom dia, bom dia lindinho. — falei apertando a bochecha fofinha, mas os olhos dele nem se desviaram da tela. — Minha tia avisou que você precisava de mim o mais rápido possível. — ele se afastou voltando para o irmão. — Não sabia que eu teria que cuidar dele aqui, na sua casa.
— Aqui é mais seguro que na casa da tua tia. Vou ter que sair agora de manhã, resolver umas tretas que apareceram aí. Vem vou te mostrar a casa. — ele se virou seguindo pelo corredor antes mesmo de ver se eu o seguia.
Dei passos apressados atrás dele, que começou a me mostrar os cômodos. A casa não era pequena como a de tia Nalva, além da sala havia três quartos, um para cada um deles, uma varanda e a cozinha.
— Juninho tem horários para comer? Dormir?
— Ele come quando tem quer, sempre pede. Mas o garoto ama doce e precisa de um controle, ele também gosta de ficar assistindo, mas tem brinquedos no quarto dele. — ele estava todo profissional enquanto me explicava tudo. — Se precisar de alguma coisa é só me ligar, meu número é esse. — falou me estendendo um papel com o número anotado.
— Ok.
— E mais uma coisa, Vitinho tá em casa. Provavelmente vai passar o dia dormindo, já que chegou da farra agora. — ele semicerrou os olhos e deu um passo se aproximando. — Vê se lembra do que tá sendo paga pra fazer aqui, é cuidar do Juninho e não ficar arrastando asa pro outro.
Engoli em seco querendo mandar ele tomar naquele lugar e sair dali, mas fiquei quieta, tia Nalva tinha me lembrado de não fazer nenhuma besteira, pois esse dinheiro ia ajudar e já que eu estava morando de favor, não podia ficar retrucando quando não tinha nem mesmo outro trabalho em vista.
— Tchau Juninho, já volto. — ele falou bagunçando os cachinhos loiros e dando um beijo no topo da cabeça do irmão.
Parecia até mesmo outra pessoa e não o cara que fez questão de mostrar qual era o meu lugar aqui.
— Que tal se a gente for passear na rua? — eu precisava de ar e ele de sol, dar uma volta ia fazer bem pra nós dois.
— Vamo! — ele gritou animado.
— É sim, vamos colocar o tênis e brincar lá fora.
Estava tão distraída que não reparei em nenhum barulho a minha volta, e quando me virei dei de cara com João Vitor, apenas de toalha com a água escorrendo por seu corpo.
Merda! Se concentra Camila, as palavras de João Miguel se repetiam em minha mente e eu fiz de tudo para me livrar rapidamente dele.
Na rua comecei a andar, vi alguns homens olhando esquisito pra mim, enquanto Juninho falava com eles, acenando ou chamando pelo nome.
Eu não conhecia nenhum deles, mas quem eu conhecia ali não é mesmo?
— Usinha, quê doce! — ele falou quando estávamos passando pela rua da mercearia.
— A ursinha não tem dinheiro aqui, depois compro pra você.
Eu não tinha nenhuma moeda sequer nos bolsos, ainda tinha sim um pouco de dinheiro, mas estava em casa, não tinha trazido nenhum dinheiro comigo.
— Mas o Miguel dexa. — ele falou dengoso e errando as palavras.
— A ursinha também deixa, mas preciso pegar o dinheiro primeiro. — me abaixei na frente do menino antes que ele começasse um show ali. — A gente vai dar uma volta até na sede e vamos em casa buscar um dinheiro antes de pegar, pode ser?
Se tivesse sorte ele desistiria do doce antes que descêssemos.
— Binado! — ele falou querendo dizer combinado. Era fofo de mais, não tinha como não se apaixonar.
A sede ficava mais ao topo do morro e eu sabia que lá teriam crianças brincando na rua.
E foi dito e feito, o menino brincou, jogou bola, pulou e rolou na terra. Se cansando e brincando como uma criança normal, era assim que devia ser seu dia e não enfurnado em casa assistindo televisão.
Estávamos voltando, Juninho saltitava todo sujo e assim que viramos duas ruas perto da casa da minha tia, dois garotos apareceram na nossa frente fechando a rua.
— Olha só quem tá aqui.
— É a vadia do outro dia.
Merda, eram os mesmos que tentaram me roubar no dia em que cheguei aqui.
— Eu não quero confusão, só estou levando o Juninho na sede. — falei segurando o menino mais perto de mim. — É só me deixarem passar e está tudo bem.
— É, mas a gente não vai deixar. — um deles chegou mais perto e eu recuei, sabendo que não conseguiria correr muito com Juninho no colo e uma perna ainda machucada.
Quando o outro mexeu na cintura puxando uma arma, eu fui rápida em virar a cara do menino contra meu peito. Crianças não deveriam ficar vendo aquilo, mesmo que essa fosse a realidade dos seus irmãos.
— Eu vou voltar pra casa então.
— Tu não vai pra lugar nenhum, ainda não esqueci o chute nas bolas que tu me deu. Tá me devendo e muito piranha.
Recuei não querendo esperar para ver o pior, quando minhas costas acertaram algo duro.
— Tão ficando doido, porra? Não tão vendo que é o irmão do chefe? E a mina agora é babá dele, vai querer mesmo mexer com ela e encarar Miguel depois? — a voz grossa e imperiosa soou atrás de mim, fazendo meu corpo todo arrepiar.
— Foi mau ai Bruno, a gente não sabia.
— Vamos dá no pé! — falou me olhando feio.
E como em um passe de mágica os dois saíram do meu caminho, voltando pelo mesmo lugar por onde tinham vindo.
Me virei com medo de quem eu encontraria atrás de mim, mas respirei mais aliviada quando vi que era o homem do outro dia, o mesmo que João Miguel tinha mandado para me seguir.
— Obrigada. — murmurei quase sem voz.
Não confiava nele, mas ele tinha me salvado, então não podia reclamar.
— Volta pra casa menina, Miguel não vai gostar nenhum pouco de saber que tu tá andando com o garoto por aí sem proteção.
Franzi o cenho sem entender o que aquilo deveria dizer, que tipo de proteção eu deveria carregar para o menino? Mas não disse nada, sai de lá rápido seguindo o seu conselho.
Corremos para casa, eu fiz cócegas e brincadeiras com o menino nas ruas pulando os degraus, subindo e descendo na calçada, queria distrai-lo para que não ficasse com uma imagem ruim daquele momento.
Quando entrei Juninho ria no meu colo e eu dei de cara com Vitor, usando apenas uma samba canção e parado na soleira da porta. Aquilo até me fez esquecer o perigo que passamos minutos atrás.
Que merda, parecia até que ele queria me testar, ver o quanto eu resistiria de olhar para o seu corpo. Podia até ser virgem, mas não era cega e tinha desejos.
Seguir o que Miguel falou estava se tornando impossível com o irmão me provocando daquela maneira.
Levei Juninho para o banheiro, brincamos enquanto ele jogava água e eu tirava toda a sujeira do seu corpinho.
Sai do quarto em busca de uma toalha, realmente desejando poder tomar um banho e acalmar o calor que Vitor insistia em me instigar. Mas o desgraçado me seguiu até lá, me encurralando contra o guarda roupa.
— O que você quer, Vitor?
— Você! — ele afirmou me fazendo erguer os olhos de pressa. — Quero você, ursinha!
Vitor se curvou e, sem esperar dessa vez, colou a boca contra a minha. As mãos que estavam no guarda roupa voaram para meu corpo, os dedos longos se apertaram na minha cintura me puxando mais para si, enquanto os outros se enfiaram em meus cabelos.
Não tinha como resistir aquilo, não importava o que João Miguel tinha dito, ou qual era o meu lugar ali, eu só conseguia sentir os lábios dele.
Abri a boca dando passagem a sua língua e gemi sem conseguir me conter quando ele a deslizou sobre a minha, me arrepiando dos pés a cabeça.
Vitor sugou meu lábio, mordiscando a pontinha e fazendo meu corpo entrar em combustão. Era pra um beijo ser tão bom assim?
— Que porra é essa aqui! — a voz de Miguel fez com que eu o empurrasse no mesmo instante e encarasse o mais velho.
O que eu tinha feito?
Estava conversando com os chefes dos outros morros, resolvendo as tretas que eram da conta de todos nós.O complexo eram várias favelas unidas e sempre mantemos assim. Nós fomos "pacificados" há uns anos atrás, recebíamos até turistas agora, uns subiam pra ver a vida aqui, outros querendo usar o teleférico e ter uma vista top do Rio.Mas essa merda era coisa só pra iludir quem estava de fora, quem morava dentro da comunidade sabia que esses polícias não estavam nem aí pra pacificação. No começo o povo da comunidade toda acreditou, mas depois que muita gente inocente começou a morrer, a ser levada pra depor e nunca mais voltar, a apanhar sem motivo, aí eles viram que não tinha esse negócio de pacífico no nosso mundo.O problema é que polícia é gente e qualquer pessoa pode ser corrompido, o que eles queriam era dinheiro. E depois de ver que bater de frente não ia resolver, começamos a pagar aí pra eles um valor, a gente trabalhava em paz, eles saiam como herói e o povo da comunidade fic
As palavras de Miguel rondavam minha mente, eu nunca pensei que poderia me sentir tão mal assim por algo que as pessoas falassem de mim, mas cada palavra dele, me diminuindo, colocando pra baixo e querendo mostrar qual era o meu lugar, foram como uma faca cravando cada vez mais fundo em meu coração.Depois do banho peguei Juninho e fui para a cozinha fazer o almoço dele, o menino tinha sido tão fofo quando viu que eu estava chorando, ele apoiou as mãos em meu rosto e ficou acariciando minhas bochechas querendo que eu me acalmasse. Era bom ver que ao menos um dos homens daquela família tinha um coração.Por sorte não vi nenhum dos dois mais velhos, não sabia como lidaria com nenhum deles. Ouvir que Vitor passou a noite com outra garota não deveria ter me feito tão mal, mas fez. Mesmo que Bianca tivesse me contado sobre a má fama dele, saber que ele dormiu com outra e poucas horas depois estava me beijando fez eu me sentir ainda pior.Esperei Juninho dormir depois das duas da tarde, par
Eu estava com uma puta dor de cabeça quando acordei, passei boa parte da tarde me revirando na cama, tentando dormir enquanto minha mente se negava a desligar, ficava voltando desde o momento em que finalmente tive aquela boca gostosa contra a minha, e o inferno de momento quando meu irmão me contou tudo.Se tinha uma coisa que eu gostava de manter simplificada na minha vida era o quesito mulheres, todo o resto já era complicado, ter me formado no que meu pai queria só pra ajudar nas coisas ilegais, ajudar criminosos e ser um.Eram várias coisas confusas e fodidas na minha vida, quem passava por minha cama tinha que ser o mais simples possível. Não queria ter que lidar com uma garota que surtava sem mais nem menos, também não queria ter relacionamentos, gostava da minha liberdade.Mas em contrapartida tinha aquela garota com os lábios carnudos e doce, porra sim, ela tinha um gosto doce e o gemido que soltou quando enfiei a língua em sua boca me deixou duro como pedra.Eu queria ter ti
O baile estava lotado como sempre e eu gostava daquele jeito, geral se divertindo, dançando, bebendo e se pegando. Estava no camarote, era como uma varanda enorme, muitos queriam subir até ali, principalmente as garotas que sempre ficavam tentando chamar atenção.Mas essa noite não estava parecendo a mesma coisa, nem Vitinho estava no clima, parecia mais ocupado em conversar com o amigo racker do que nas garotas rebolando na batida do funk.— Está distraído hoje. — Dany falou deslizando as unhas afiadas por meu pescoço. — Quer uma ajudinha?Eu tinha ido buscar ela com outras ideias, era a pessoa perfeita pra tirar todo o estresse dessa semana de cão e pra me fazer parar de pensar em lábios carnudos, olhos castanhos e uma pele negra macia de mais, vulgo Camila.Mas mesmo com ela ali no meu colo, sacudindo a bunda no ritmo da música, isso não me animava para nada. Meu pensamento estava toda hora voltando pra aquela garota e eu me perguntando o que ela deve tá fazendo.— Mais tarde gata.
Não sei bem em que momento peguei no sono ao lado de Juninho, me deitei ali para fazer um cafuné até que ele dormisse, mas fiquei tão envolvida com as vagas de emprego que adormeci ali mesmo, com o celular em cima da minha barriga.Acordei com algumas vozes e passos pela casa, com certeza os dois tinham chegado, mas não ia me arriscar a sair e dar de cara com nenhum deles, muito menos com a mulher linda que ele trouxe mais cedo.Graças a Deus o barulho acabou bem rápido, eu me aconcheguei mais na cama junto com Juninho e tentei voltar a dormir, mas minha mente parecia bem acordada, era em torno de seis da manhã o que explicaria a falta de sono, eu costumava acordar bem cedo.Desbloqueei meu celular e vi mensagens de Bianca, um monte delas mostrando o desespero dela.Bia: primaaaaaaBia: Camila, responde sua vaca!Bia: pelo menos lê mulher!Bia: tá bom, mas fica avisada se qualquer um deles perguntar do trampo diz que arrumei sim, que vai trabalhar comigo na loja.Bia: eu abri a boca e
Acordei já tarde e demorei a perceber o que tinha feito eu acordar, até que os gritos de Miguel recomeçaram, me dando a resposta que eu precisava.Me levantei correndo jogando a coberta pro lado e colocando uma cueca e calça as pressas. Miguel não gostava de gritar dentro de casa, não queria Juninho vendo aquilo.— Você não manda em mim! — ouvi Camila gritar quando sai no corredor. — Eu não quero ficar aqui e o dinheiro que estão me oferecendo é muito bom, além das gorjetas...— Tu não vai trabalhar na Rubi porra! — o que? Camila queria trabalhar na boate? — Não sei onde Dany estava com a cabeça de te dar essa ideia idiota.— A garota precisava de um trampo, só estou ajudando ela...— Ajudando levando a mina pra tirar a roupa em troca de dinheiro? — Miguel estava puto pelo tom.Passei pela sala e vi Juninho ignorando tudo, tomando sua mamadeira e assistindo. Quando cheguei na porra da cozinha vi os três se fuzilando com os olhos.— Você bem que gosta de dar dinheiro pras meninas de lá
Eu tinha saído de casa jurando que não ia me importar com o que Camila quisesse aprontar com Dany e a prima, as três eram surtadas e podiam dar as mãos e ser feliz.Mas a todo momento do dia a imagem dela dentro da Rubi vinha na cabeça, enquanto eu resolvia as tretas meu pensamento ficou na diaba, parecia até que a mina tinha feito trabalho pra mim, não conseguia tirar da cabeça.Eu conhecia a Rubi a muito tempo, tinha pegado a maioria das garotas de lá, e mesmo sabendo que não era puteiro ali, muitas delas faziam programa com os clientes.Se o pensamento de todos os playboys, velhos e os malandros de lá tudo olhando ela tirar a roupa no palco, não fosse suficiente pra me enlouquecer, a ideia de um deles tocando nela e querendo levar a garota pra cama me enfureceu e me fez ver vermelho.Eu estava decidido, ia acabar com a graça dela antes mesmo que ela saísse de casa, mas quando parei na frente da casa da dona Nalva e vi Camila e Bianca subindo cada uma em um moto táxi, soube que ia t
Eu tinha seguido o plano de Dany e Bianca, todo mundo ali sabia que minha prima seria a nova garota, mas quando Miguel ou Vitor aparecessem, eles iam achar que estavam falando de mim.Ela tinha ficado louca com essa ideia e não consegui fazê-la desistir. As duas estavam confiantes, na cabeça delas algum dos dois ia aparecer ali pra me impedir, ou até mesmo os dois.Mas eu não botei, não até ouvir a voz de Miguel nas minhas costas. Não conseguia acreditar que ele tinha mesmo ido até ali atrás de mim e quando o vi socar o homem, querendo me defender meu sangue ferveu pela primeira vez em dias sem ser de raiva.Só que eu tinha que manter em mente tudo o que conversei com Dany e Bianca, Miguel assim como o irmão tinha as mulheres aos seus pés, eu tinha que fazer ele correr atrás ainda mais.— Sabe porque falei aquela par de coisa? Porque queria que tu ficasse longe de do meu irmão...— Eu já entendi não precisa repetir não! — revirei os olhos e me virei querendo ir embora, não ia aguentar