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Capítulo XII - Miguel

Estava conversando com os chefes dos outros morros, resolvendo as tretas que eram da conta de todos nós.

O complexo eram várias favelas unidas e sempre mantemos assim. Nós fomos "pacificados" há uns anos atrás, recebíamos até turistas agora, uns subiam pra ver a vida aqui, outros querendo usar o teleférico e ter uma vista top do Rio.

Mas essa merda era coisa só pra iludir quem estava de fora, quem morava dentro da comunidade sabia que esses polícias não estavam nem aí pra pacificação. No começo o povo da comunidade toda acreditou, mas depois que muita gente inocente começou a morrer, a ser levada pra depor e nunca mais voltar, a apanhar sem motivo, aí eles viram que não tinha esse negócio de pacífico no nosso mundo.

O problema é que polícia é gente e qualquer pessoa pode ser corrompido, o que eles queriam era dinheiro. E depois de ver que bater de frente não ia resolver, começamos a pagar aí pra eles um valor, a gente trabalhava em paz, eles saiam como herói e o povo da comunidade ficava em paz.

Mas estava parecendo que o acordo não estava mais valendo.

— Nós temo que resolver essa parada. Eu não vou dar mais dinheiro pra aqueles pé no saco!

Todos os chefes dos outros morros se recusavam a pagar o valor que eles estavam pedindo agora.

Eu então, que ainda estava sendo roubado dentro da minha própria favela, algum filho da puta metido a esperto estava me passando pra trás.

— Ninguém aqui vai aumentar o valor semana que vem, se um aumentar eles vão saber que tão lidando com um bando de otário.

— É, mas vamos se preparar pra ter guerra. Porque é isso que eles vão fazer! — falei, eu não queria pagar um centavo a mais pra aqueles merdas, mas também não era cego, sabia bem como polícia fazia por ali, foi assim que meu pai morreu.

— E vamos tá preparado pra eles, quando eles vier pra briga nós mete chumbo grosso.

— Já avisa geral dos morros, quero morador zanzando e levando tiro a toa não.

É pelo visto na próxima semana teríamos uma guerra nos morros em volta. Porra de vida difícil!

Sai de lá já com a cabeça doendo, detestava lidar com essas merdas, porque eu sabia o que acontecia, vi de perto meu pai e mais um monte de homem cair junto com ele, sangrando no chão igual porco sem que ninguém se importasse.

— Aí chefe, tenho uma parada pra te falar. — Bruno falou no rádio e eu já praguejei.

— Anda logo, desembucha!

— A babá lá estava dando um passeio com Juninho, eles ficaram na sede, mas já voltaram pra casa.

Quis dar um soco em alguém, mas não tinha ninguém ali perto. Merda de gente que não escuta, não faz o que eu mando!

— Já estou indo, fica de olho nela aí, se tentar sair de casa não deixa.

Camila estava me dando mais dor de cabeça do que pensei, a mina era esperta, falei que tinha tudo ali que o garoto precisava, pra que ficar andando com ele na rua inferno.

Não gostava de Juninho perambulando por ali, qualquer pessoa com pensamento ruim podia usar ele pra chegar até a mim.

Talvez a melhor coisa fosse mandar ela embora e arrumar outra pessoa, sei lá uma velha, que assim Vitinho também não ia ficar dando em cima.

Não demorei em chegar em casa, Bruno estava na porta e eu acenei com a cabeça já entrando. Passei no banheiro e vi Juninho brincando no chuveiro e quando alcancei o quarto dele meu corpo ferveu.

Vitinho estava com a mina presa entre ele e o guarda roupa, as mãos dele tocando o corpo dela enquanto ele devorava a boca da mina.

Porra eu ia socar aquele filho da puta! O que ele estava pensando? A gente combinou de nenhum dos dois tocar nela, caralho! Agora eu não podia confiar nem no meu irmão?

— Que porra é essa aqui! — rosnei chamando a atenção dos dois.

Camila me olhou com os olhos arregalados, certeza que estava surpresa por ter sido pega, mesmo depois de eu ter dito pra ficar longe.

— Meu Deus, o que foi que eu fiz? — ela sussurrou antes de sair correndo do quarto, esbarrando em mim e indo direto para o banheiro.

Vitor ergueu os olhos, descarado, me dando um sorriso cínico, safado desgraçado! Ainda estava só de samba canção, agora marcando a porra da ereção.

Eu ia matar ele! Ia matar aquele merda e mandar Camila pra bem longe daqui!

— Você tinha que aparecer, não é? Só pra atrapalhar...

— Atrapalhar? Atrapalhar o que seu merda, nós tínhamos um acordo! Camila estava fora dos limites, ela é só babá do Juninho e era pra ficar longe, qual parte do ela não é mina pra nós você não entendeu? Qual parte não entrou na merda da tua cabeça?

— Eu achei que tínhamos um trato, até que me toquei que você chegou nela antes não foi? — entrei dentro do quarto indo em direção a ele, pronto pra socar a cara bonitinha. — É você chegou nela antes, por isso não queria que eu me aproximasse, queria a mina só pra você!

— Tá maluco porra? Eu disse que garota novinha e maluca quero distância, Camila não faz meu tipo, eu gosto de mulher não de pirralha! — gritei com fúria e bati a mão no peito dele. — Mas você tinha que colocar seu pau pra funcionar, não é? Mesmo tendo transado com qualquer vagabunda a noite toda, você não perdeu tempo em agarrar a garota!

— Graças a você só tive tempo de dar um beijo nela!

Me virei e dei um soco na parede, sentindo a dor subir pelos dedos e se espalhar no meu punho, mas era isso ou arregaçar a cara do meu próprio irmão por causa de mulher.

— Porque não deixa a mina em paz? Ela é cheia de problema na cabeça, ficou chorando e tremendo no dia da chuva no meio da rua. É isso o que você quer? Uma maluca pra ter de lidar com os dramas dela?

— Não porra tá maluco? Porque não me contou essa merda? — ele franziu as sobrancelhas e de afastou mudando o olhar pra incredulidade e medo.

— Porque era problema dela e achei que tu ia ficar longe. — falei mais baixo, me sentindo até mais calmo ao ver a cara dele.

— Eu achei que você tinha pegado ela, a mina não estava nem me olhando quando chegou aqui. Nem quando me viu só de toalha, ela só pegou Juninho e saiu. — ele falou como se não fosse nada, mas eu ia voltar nesse assunto. — Aí eu fui atrás dela, achando que se você tinha pegado eu ia pegar também.

Que merda, ela tinha feito o que pedi, ficado longe e não ido atrás das gracinhas dele. Mas claro que meu irmão não podia segurar o pau dentro das calças.

— Eu mandei ela ficar longe de você, falei que estou pagando pra ela cuidar do Juninho e não pra se agarrar com você.

— Então ela só estava seguindo as ordens. Merda cara, se eu soubesse tinha ficado longe, não pensei direito só achei...

— Só achou que eu tinha ficado com ela e resolveu colocar as mãos em cima dela. — me aproximei dele ficando bem perto, reuni toda a raiva que tinha passado hoje de manhã e coloquei nas minhas palavras. — Escuta aqui eu nunca vou encostar naquela menina, entendeu bem?

Sai de lá pisando duro, mas dei de cara com ela no corredor, Camila estava com os olhos vermelhos e molhados, Juninho segurava seu rosto acariciando suas bochechas, mas assim que me viu ela entrou correndo no quarto me deixando para trás.

Vitor saiu no mesmo segundo de dentro do quarto, sacudindo a cabeça entrou no quarto ao lado, que era o seu e trancou a porta.

Agora eu sabia que ele ia ficar longe, a última coisa que Vitor queria era ter que se importar com os problemas de alguém que não fosse da sua família.

Os olhos vermelhos da mina me diziam que com certeza ela ouviu a conversa toda, aqui fez meu coração se apertar incomodado com o que ela devia tá pensando. Mas que se foda, era a única forma de manter ela longe, era melhor chorar agora que depois.

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