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Capítulo IV - Camila

Ainda estava em estado de choque, depois de tudo o que aconteceu não era pra menos.

Ouvi minha prima tagarelar pelo caminho todo, sobre quem eram aqueles homens, cada um deles. Os dois garotos que correram atrás de mim, mas que nem dei importância para sua explicação.

Mas então ela chegou no tatuado com marra de assustador, e que pelo jeito as pessoas tem mesmo medo dele. João Miguel, o chefe do morro, quem mandava em tudo, o mais perigoso. O nome de anjo não parecia combinar com ele, quando a cara parecia do próprio capeta.

Mas diferente do que eu deveria sentir ao vê-lo, eu não me intimidei, não fiquei com medo ou mesmo senti repulsa. Ele era lindo e dava pra ver, mesmo com todas aquelas tatuagens ele era de tirar o fôlego.

Nunca tinha visto um homem como aquele, todo másculo, com a expressão fechada, as sobrancelhas grossas franzidas e coberto de tatuagens.

Ela me disse que ele era muito cobiçado por todas as meninas do morro. Mas o galinha era na verdade o irmão do meio. João Vitor, o loiro que ficou me segurando. Ele tinha um peitoral forte e não recuou com meus t***s, senti suas mãos segurando minha cintura, me puxando contra si, tentando me prender. Quase podia dizer que ele estava se aproveitando, enquanto eu o estapeava tentando alcançar seu irmão com minha mochila.

— Eu ainda não consigo acreditar que você fez isso Camila! — minha tia falou. — Filha do céu, por muito menos eu vi Miguel dar um corretivo na pessoa.

— Que isso mãe? A prima vai pensar que ele b**e em mulher! — Bianca gritou interrompendo a mãe.

Eu mal conhecia ela, me lembrava vagamente de termos sido apresentadas por chamada de vídeo apenas.

— Não! Miguel não tolera isso e desde que o pai dele comandava aqui o morro, se bater em mulher leva surra deles. — tia tratou de explicar. — Mas o que eu estou falando é que você gritou pra todo mundo ouvir que ele estava te roubando e ainda quis bater nele.

— Mas eu estava com a razão! — protestei, não me interessa se era chefe do morro ou o Rei da cocada preta, eu estava com a razão e ia me defender até o fim.

— Ainda sim, senta e conversa! Pelo amor de Deus, não vai me gritar com o homem de novo, a paciência tem um fim!

Ela continuou tagarelando, mas Bianca apenas revirou os olhos e fez mímica atrás da mãe, antes de me agarrar pelo pulso e me puxar para dentro do quarto dela.

A casa era simples e bem pequena, mas eu estava acostumada com a simplicidade e de certa forma isso me deixou de coração quentinho, pois mesmo que não fosse minha casa me lembrava muito.

— Gata, vão falar disso por tanto tempo, você não tem ideia. — ela abriu o guarda roupa e atirou alguns tops e shorts. — Anda tira esse moletom, antes que caia dura nesse calor.

Ela se sentou na cama junto às roupas atiradas e eu fiquei parada em pé.

— Minhas roupas estão...

— Na mala, eu sei, mas a gente precisa ir até a mercearia da dona Isabel. Com a confusão toda eu me esqueci de pegar o macarrão que minha mãe pediu.

— Mas eu posso...

— Vai demorar o dobro, até abrir sua mala e escolher as roupas. — ela bufou. Já vi que eu não era a única na família a ser difícil de ceder. — Pega qualquer um aí, certeza que a gente veste o mesmo tamanho.

Arranquei meu moletom, ficando com minha blusa estampada com ursinhos. Tirei meu tênis e a calça jeans e peguei o shorts mais próximo de mim.

Eu não tinha vergonha do meu corpo, muito pelo contrário, sabia que era linda, com uns peitos grandes pra alguém magra como eu e a bunda arrebitada. Minha mãe sempre dizia o quanto eu parava o trânsito, mas nunca usei nada extravagante como aqueles shorts.

O tecido fininho da malha estava colado, marcando cada curva do meu bumbum.

— Vamos. — murmurei ainda sem graça, rodando de um lado para o outro tentando cobrir o máximo que conseguisse com minha blusa.

— Não vai tirar essa blusa? Parece tão de criança.

Podia mesmo parecer, mas eu não me importava. Então neguei com a cabeça e ela se deu por vencida.

Bianca e eu andávamos pelas ruas, enquanto ela não parava de falar sobre o baile que ia acontecer amanhã ou me apresentando as pessoas na rua, como sua prima e nova moradora do complexo.

— Ei Bianca! — um homem falou e minha prima parou no mesmo instante.

— Vem aqui gata.

Quando eu vi um movimento diferente na cintura dele, percebi na hora o que era. Não ia me aproximar daquilo nem ferrando.

— Eu não vou lá não. — falei antes mesmo que a me arrastasse.

Talvez minha prima tenha notado meu estado, ou só queria ficar sozinha com o cara.

— Tá, a mercearia é ali, bem na esquina. Fica lá e me espera na porta, não vou demorar.

Só acenei com a cabeça e me afastei o mais rápido possível daqueles dois. Andava de cabeça baixa, tentando evitar o olhar dos curiosos e imaginando o que minha prima estaria falando com aquele cara.

De repente uma cabeleira loira passou por mim, correndo pela rua. Olhei de um lado para o outro, tentando ver se avistava quem estava com o menino, mas ninguém apareceu. Então o freio de uma moto soou alto, só consegui olhar para a moto descendo a rua em alta velocidade e mesmo que o motoqueiro desviasse ainda bateria no menino.

Não pensei mais e corri na direção do pequeno. Abracei seu corpo e girei, mas ainda senti o impacto da moto em minhas costas, me jogando para o lado.

Cai no chão rolando um pouco pelo asfalto e me recriminei por não ter ficado com a calça. Mas ao menos o garoto estava salvo!

Várias pessoas nos circularam, tentando ver o que tinha acontecido, como eu e o menino estávamos. Até que aquela voz preencheu meus ouvidos novamente.

— Saiam da frente! Sai agora! — eu sabia que era Miguel antes mesmo de vê-lo.

Então ele e o irmão surgiram no meio de todos, a multidão de abriu como um mar dando espaço.

— Como vocês estão? — os olhos de João Vitor oscilaram, do menino para mim.

— Juninho! — Miguel gritou agarrando o pequeno nos braços e o virando de um lado para o outro, procurando qualquer ferimento. — O que você estava pensando menino?

— Eu quelia você. — o menino disse com tanto dengo que derreteu meu coração também.

— Vamos pra casa. — não sei se as outras pessoas notaram, mas vi quando ele apertou ainda mais forte os braços em volta do pequeno.

— Ajuda, ajuda ela. — o garotinho falou segurando o rosto do mais velho e virando para mim. — Ajuda.

— Sim, ela te ajudou. Agora vamos!

— Na, não, não. Ajuda usinha! — ele insistiu e Miguel finalmente pareceu compreender.

— Vitor, ajuda a garota a levantar. — bastou a ordem para que eu saísse do transe e me mexesse.

— Consigo fazer isso sozinha. — apoiei as mãos no chão e peguei impulso pra levantar, mas gritei de dor no mesmo instante. — Aaaaa merda!

— O braço dela machucou. — Vitor constatou o óbvio e passou o braço em volta do meu corpo me levantando. — A perna também irmão.

Corri meus olhos para onde todos olhavam e vi um pedaço da pele rasgada, com certeza pelo asfalto, e o sangue vermelho escorrendo por minha perna.

— Porra Vitor! — o vi trincar o maxilar me olhando, como se tomasse uma decisão. — Pega a garota no colo e leva ela pra casa da tia, estou indo lá já

— Não precisa... — estava protestando, quando os braços fortes passaram em baixo das minhas pernas me erguendo no colo do loiro assanhado.

— Precisa sim, ursinha. — ele usou o apelido que o bebê me deu, mas com um sorriso cínico e uma piscadela safada.

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