Capítulo 03

Ana

Parei o carro de frente à mansão. O jardim continuava da mesma forma que me lembrava, cheio de rosas brancas. A casa grande, branca e imponente, permanecia intacta. Decidi que entraria pela porta da frente; seria a primeira vez que Anny estaria aqui, e ela não merecia entrar pela entrada dos fundos. Ela era tão dona deste lugar quanto os demais, mesmo que nunca fosse saber, mesmo que ninguém além de mim soubesse um dia. Peguei Emily, que dormia no banco de trás. Ela estava cansada. Queria acordá-la para que visse onde havíamos chegado, mas fiquei com pena. Apenas a peguei; não teríamos uma entrada triunfal, não como um dia eu sonhei, mas ao menos estávamos entrando pela porta da frente.

Toquei a campainha e esperei para ouvir a voz de Josefa.

— Residência dos Alcântaras. — Ela falou pelo interfone, e senti meu coração martelar. Eu realmente estava fazendo aquilo.

— É Ana. — Falei, sentindo meu coração acelerar.

— Graças a Deus, chegou na hora do almoço. Vou abrir o portão. — E o portão se abriu. Antes, havia um porteiro aqui, mas imagino que, com a tecnologia, isso tenha se alterado.

Fui entrando, passando pelo jardim. O caminho de pedras brancas guiava até a porta da mansão. Dona Helena mantinha tudo em seu lugar. Se eu fechasse os olhos, conseguiria lembrar de cada canto. Mas afastei os pensamentos. Junto com essa lembrança, vinham também as lembranças com ele. Caminhei até a porta e não precisei bater; Josefa abriu a porta antes mesmo que eu tivesse tempo para isso. Ela sorriu.

— Estava com tanta saudade. — Ela falou me olhando. Ela continuava a mesma: rechonchuda, seus cabelos negros amarrados para trás. Seus olhos negros demonstravam ternura e bondade. Josefa era a melhor amiga de minha mãe, e sim, seus olhos brilhando de lágrimas eram verdadeiros.

— Eu também. — Falei por fim. Minha vontade era desabar nos braços de Josefa, assim como fazia quando era mais nova. Queria dizer a ela tudo que passei, queria seu carinho e afago. Eu não sabia que precisava tanto de seu abraço como agora, que a encarava.

Ela olhou para meus braços. Emily ainda dormia, alheia ao que acontecia ao seu redor.

— Não me diga. — E lá estava o motivo pelo qual não procurei todos esses anos. Ela saberia. Assim que colocasse os olhos sobre Emily, ela saberia. Balancei a cabeça em negação. Não admitiria isso para ela nem para ninguém. Morreria com esse meu segredo.

— Emily é filha da minha filha com o meu ex-namorado. Terminamos há pouco tempo, e eu não tinha para onde ir. — Falei, dando a ela uma explicação a qual ela duvidava a cada palavra que saía dos meus lábios, mas ela não ousou me questionar ali.

— Venha, entre. Deve estar cansada. — E eu entrei. O chão branco e polido, o lustre grande no alto, e as escadas para os quartos dos patrões, que sempre deixavam clara a posição que eu estava. Tudo da mesma forma.

— Não mudaram nada. — Falei analisando o lugar, o sentimento de nostalgia me tomando. Cresci aqui, corri muito por esse lugar. Henrique e eu, uma vez, destruímos o vaso — no caso, eu, mas foi ele que tomou a culpa porque eu chorei implorando isso para ele.

— Colocaram tecnologia em tudo, mas dona Helena pediu para manter as coisas como sempre. Sabe, ela tem apego a esse lugar. — Josefa falou, seguindo para a sala de visitas e não para a cozinha, como eu estava acostumada. — Venha, ela está ansiosa para te ver.

Puxei o ar e segui. Me vi sentindo falta de ar. Encarar dona Helena e seus questionamentos me fez me arrepender de ter vindo. Assim que entramos na sala de visitas, eu a vi. Seus cabelos castanhos estavam amarrados. Ela estava mais magra que da última vez. Seus olhos violetas estavam um pouco cansados, mas ela mantinha a mesma postura inabalável e sorriso gentil.

— Nunca a perdoarei por ter partido sem me dar uma explicação. — Ela me repreendeu de maneira gentil. Ela se aproximou de mim, selando um beijo em minhas bochechas. — Está muito magra. Não tem se alimentado direito. E esta pequena?

Meu coração começou a acelerar. Se ela reconhecesse Emily como sua neta, eu estaria perdida. Apenas sorri.

— Ela se chama Emily, é minha filha. — Ela sorriu e passou a mão no rosto de Emily.

— Venha, sente-se. Deve estar cansada. — Ela falou, se sentando em seu largo sofá branco.

E eu estava. Josefa saiu rápido, sem dizer nada. Eu queria ter ido com ela.

— Tem muito a me explicar, mocinha. Aquela carta que deixou não foi suficiente. Procurei sua tia e ela disse que você nunca a procurou. — E eu jamais a procuraria. Minha tia era uma megera amargurada. Quando minha mãe morreu, ela deixou claro que eu nunca deveria procurá-la, que devia me virar. Mas na carta que deixei para eles, disse que estava indo morar com ela.

— Eu ia, de fato. Pensei em ir, mas uma amiga me convenceu a morar com ela em seu apartamento, e eu aceitei. Queria morar na cidade grande. — Menti e dona Helena parecia saber disso.

— E o que a cidade grande te deu além de uma criança? — Ela perguntou de mau humor. Helena estava magoada comigo, conseguia sentir. Ela queria um futuro brilhante para mim, prometeu isso à minha mãe. Sempre incentivou meus estudos e sei que me ver aqui pedindo emprego de empregada novamente a magoa.

— Eu fiz péssimas escolhas, mas Emily é tudo para mim. Não me arrependo de tê-la. — Isso era verdade. Apesar de que, se eu pudesse, teria esperado mais para que ela pudesse ter tudo que merece, Emily era inocente demais para entender o que eu tirei dela, mas um dia talvez ela me cobre por um pai.

— Não irei perturbá-la com isso por enquanto. Vejo que está cansada e deve estar faminta. Pedi que fizessem um almoço para nós. Apenas irei esperar os garotos chegarem para pedir que sirvam. E sobre a sua pequena, é melhor que a coloquemos em algum dos quartos. — Isso era um pesadelo. Dona Helena tem apenas três filhos, e com sorte seria Henrique e Heitor.

— Os meninos? — Ela sorriu orgulhosa, para dona Helena não existia nada mais importante que os filhos.

— Sim. Avisei Henrique que você estava vindo e ele insistiu em vir almoçar aqui. Deve estar com saudade. Vocês eram um grude quando crianças. — Ela se levantou e me senti aliviada. Gostava de Henrique, e Heitor era um adolescente mal-humorado da última vez que eu o vi.

Mas, assim que me levantei para segui-la até os quartos, eu o vi. Ali, parado com seus olhos de mel, tão bonito como antes, mas agora estava mais velho e com um sorriso mais confiante.

— Que prazer é tê-la de volta, Ana. — E minha vontade era pegar Emily e correr para o mais longe dali.

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