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Quando você mordeu o anzol

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Lisa Mary

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Era só abrir os olhos e sentir que eu estaria em contato total com a realidade, então por isso permaneci com os olhos fechados e me permiti beijá-lo por um pouco mais de tempo. A obrigação de ser uma boa moça me forçou a recobrar a consciência e eu apoiei as mãos contra seu peito, empurrando lentamente. Virei o rosto para o lado, e por mais que eu quisesse arrancar suas roupas feito um animal, ainda assim eu fui obrigada a me manter pura e falsamente ingênua.

Percebi Vicente se controlando para não insistir em me beijar novamente, e meus olhos encontraram os dele. Estava ansioso. Seu peito subia e descia como se fosse explodir, embora tentasse se controlar.

—Isso não foi certo... Senhor François. Você... Você... Não pode fazer isso na casa de Deus. —Disse ofegante, tentando controlar a respiração. A luz logo foi voltando e eu olhei seus olhos negros de luxúria. Ele deu dois passos para trás e pôs uma mão sobre a ponta de uma mesa velha, passando a outra pelo peitoral como forma de aliviar outras vontades. Desabotoou um ou dois botões e esticou o pescoço de um lado para o outro, soprando entre os lábios.

—Eu peço que me perdoe novamente, eu não sei o que deu em mim... —Abaixando a cabeça, o garoto inocente logo demonstrou arrependimento. Ele encarou os próprios pés sendo incapaz de me olhar novamente por alguns segundos. Lentamente, Vicente levantou a cabeça e me olhou, mapeando o meu rosto.

—Eu não posso. Eu sinto muito, mas, não posso. 

Troquei passos e tropeços até a porta rapidamente, saindo daquela sala empoeirada. Nervoso, ele desenterrou os pés do chão e correu atrás de mim.

—Espera... Lisa! Lisa, por favor...

Corri pelo corredor enquanto as luzes ainda estavam voltando, e percebi alguns membros religiosos se aproximando. Não mais ouvi Vicente quando passei pelos superiores. Saindo daquele maldito lugar, finalmente avistei o jardim, e a luz do sol invadiu os meus olhos provocando forte incômodo. Estiquei o braço para a frente de modo que minha mão impedia o sol em meu rosto, e uma voz familiar chamou o meu nome.

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Lisa Mary...

Eu estava pronta para me virar e comprovar minhas suspeitas, mas o padre veio caminhando em nossa direção e chamou o seu nome, explicando o que havia acontecido logo em seguida.

—Senhor François, vocês estão bem? Ouvi algumas pessoas me dizerem que vocês estavam aí dentro no momento em que aconteceu isso... —Disse o religioso, passando as mãos pelos cabelos de forma agoniada.

—É, nós estávamos sim, senhor. O que houve? 

Era ele. Pude sentir sua presença atrás de mim, e o mesmo se limitou apenas a isso diante das pessoas.

—Alguém tentou provocar um curto-circuito no quadro de energia da igreja, mas já chamamos alguém para concertar e... O gerador ainda está funcionando. Também não foram danos para todas as distribuições, como percebeu, algumas ainda funcionam aparentemente bem. Bom, saiam daqui. Não sabemos o que mais pode acontecer. Saiam, por favor. Estou pedindo que evacuem o local...

—Mas, senhor padre, e os doces? E as famílias que precisam dessa renda?

Ele respirou fundo pondo a mão no peito. Tinha que admitir que temi provocar um infarto no padre. 

—Por favor, deixe que cuidemos disso... —Pedi, mas minha fala foi interrompida por Vicente no exato momento em que puxei o ar para continuar falando.

—Não, melhor não. Está perigoso demais por aqui. Já que todos estão indo embora eu vou procurar minha família. Eu posso deixar você em casa, se quiser.

—Não precisa. —Finalmente me virei para ele encarando seus olhos assustados. —Eu não quero atrapalhar...

—Não está atrapalhando. —Vicente olhou para o padre, por cima dos meus ombros. —Tudo bem se formos?

—Claro. Por favor, saíam. Tudo o que foi arrecadado será transferido para a diocese. —Falou o homem em um tom de voz acelerado e logo passou entre Vicente e eu, entrando na capela.

A movimentação no jardim começou a dar início a inquietação em Vicente. Percebendo que eu estava disposta a recusar sua proteção, ele reproduziu o que eu havia feito para levá-lo comigo até aquela sala.

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 Vicente segurou firme em minha mão, de maneira desajeitada, e correu me puxando inesperadamente até seu Bugatti Chiron azul, estacionado entre dois carros pretos do mesmo modelo.

Parei os pés bloqueando os passos rapidamente. Meus olhos grandes encararam os três carros ligeiramente e eu sacudi a mão, soltando-me de Vicente. 

—Por favor, não podemos ficar aqui fora. Vamos entrar no carro, pelo amor de Deus... —Ele dizia em palavras aceleradas. 

Ofegante, percebi o desespero em sua face, até quatro seguranças surgiram entre a movimentação louca das pessoas, e formaram um círculo protetor em volta de nós dois.

—Senhor, por favor, entre em seu carro. Nós o escoltaremos até sua casa. Estamos sob ameaça desconhecida. —Disse um deles, sacando uma pistola. O brilho metálico em sua mão garantia sua capacidade em nos tirar daquela citação. Vicente mergulhou a mão dentro do bolso do paletó e tirou um bolo de chaves, em seguida, apertou o botão na chave de seu carro e o barulho discreto pôde ser ouvido. Enquanto isso, manteve seus olhos fixos nos meus, e em nossa volta, o caos acontecia. 

Eu precisava realmente prosseguir com o plano, então dei um passo à frente e segurei seu dedo como se estivesse tentando apenas sair dali. Ele esticou os dedos e os flexionou entre os meus, entrelaçando.

—Estamos prontos para entrar no carro. —Disse Vicente, ainda mantendo seu olhar nervoso em mim.

Naquele momento, os seguranças se dividiram e dois deles me acompanharam até a porta da Bugatti, enquanto os outros dois escoltaram Vicente. Depois de entrarmos no carro, os seguranças se dividiram em duplas e formaram um comboio de três carros.

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Ergui a mão, puxando o cinto de segurança e o abotoei em silêncio. Juntei os pés sentada no banco de couro branco, e ouvi Vicente passar o cinto ao meu lado. O carro tinha um cheiro bom de produto novo e o couro proporcionava um toque macio, embora ainda fosse couro. Ele enfiou a chave na ignição e apertou o botão, ligando a máquina. O barulho do motor chamou a atenção de pessoas no jardim, e os carros à nossa frente e atrás de nós logo sinalizaram que iriam sair.

Virei o rosto para a janela e observei as pessoas ainda correndo por temerem ser outro ataque à igreja, e senti meu celular vibrando dentro da pequena bolsa branca, forçando-me a tirá-lo para visualizar a notificação.

Charlotte, eu tô tentando trabalhar aqui, porra... Pensei, lendo a mensagem que recebi de Charlotte:

Os seguranças me informaram da situação... Aonde você tá, porra?”

Reduzi o brilho do celular ao mínimo possível enquanto digitava em silêncio, quase tendo que esconder o celular.

“No carro do seu irmão. Pode me dar os parabéns, se quiser, porque provavelmente hoje ele nem vai ver vocês. Quero meu milhão, hein!”

Bloqueei a tela do celular e o joguei de volta no fundo da pequena bolsa, fechando o zíper. Com as mãos sobre a bolsa que estava nas pernas, eu me mantive como uma boa moça, mas estava em silêncio, ainda protestando contra a atitude de Vicente. Se ele soubesse o que eu teria feito com ele ali dentro daquela igreja...

—Ainda está brava comigo? —Perguntou, reduzindo a velocidade. Nós estávamos parando quando o sinal ficou vermelho.

Vicente pôs a mão direita sobre a coxa grossa enquanto a outra permaneceu no volante. Apoiando as costas no banco do carro, tombou a cabeça para trás lentamente e virou para mim, deixando o pomo de adão amostra. 

Minha nossa senhora... Até o pescoço desse homem me atrai. Credo! Eu preciso mesmo dá pra alguém antes de conquistar esse idiota, ou vou acabar colocando tudo a perder apenas pelo fogo na b...

Pisquei, fugindo de meus pensamentos enquanto ele aguardava por minha resposta, educadamente. Mordeu o lábio, pigmentando a região mordiscada.

—Não estou “brava” com você, apenas envergonhada. —Encolhi os dedos, espremendo os joelhos de cabeça baixa.

—Por quê? Fui eu quem beijou você e eu me desculpei. —Soltou um ar pelo nariz, sinalizando um sorriso. —Como eu me desculpo com você, hein? 

Ele sofria com o remorso por pensar ter me causado desconforto e aquilo só me deixava cada vez mais satisfeita. Percebi cruzando os braços relutante, e virei a cabeça em sua direção, o encarando.

—Eu sei o que pensa.

—O que? —Arqueou as sobrancelhas e se controlou em manter uma expressão serena embora o sorriso em seus lábios estivesse sendo espremido.

—Que apenas por ser uma pessoa com muito dinheiro pode fazer o que quiser e bem entender, mas não é assim. Senhor François...

Vicente. —Ele me indagou e logo, desprendeu a atenção de mim, tornando a envolver os dedos no volante para voltar a dirigir. 

—”Vicente”, eu não quero que pense que... Eu sou uma garota fútil. Não gosto disso. —Cruzei os braços, esperando que ele me deixasse em algum lugar, mas percebi que Vicente estava apenas seguindo o comboio e precisava me mostrar preocupada. —Por favor, pare em algum lugar, eu vou descer e pedir um carro por aplicativo. Não estamos mais em perigo.

—Alguém pode ter nos seguido e pode querer seguir você. —Defendeu, mantendo a atenção no painel do carro. Ele mordeu fortemente o lábio inferior como se estivesse reprimindo sua própria ansiedade.

—Meu carro ficou na igreja.

—Você dirige?

—O que pensa que sou?? Uma dondoca?

Minha frase despertou o humor em seus lábios e a pele de seu rosto ruborizou, levando brilho aos seus olhos que levemente se espremeram no ato.

—Você é engraçada... —Sussurrou.

—O que está dizendo aí? Vamos, eu preciso ir para casa e depois vou pedir que levem meu carro. —Ele se manteve em silêncio e os carros aceleraram um pouco mais, o que nos fez seguir no mesmo padrão. —Por que não me ouve?

—Porque é uma ideia perigosa e estúpida. —Respondeu seco. Ele não me olhou, mas ouvi seu suspiro impaciente e logo olhei para ele, o fazendo falar. —Tá bom, abre o porta-luvas, por favor, e pega o meu outro celular. —Bufei, esticando o braço e abri o porta-luvas, em seguida, flexionei os dedos e tirei o telemóvel de lá, fechando novamente.

—Pronto. —Pus o telefone sobre sua coxa lutando para ignorar o volume entre suas pernas.

—Qual o modelo do seu carro?

—Um Auditt99 azul. —Franzi o cenho, deixando nítida a minha confusão com sua pergunta. O quê? Vai comparar um Audi com uma Bugatti, por acaso? Pensei.

—Esse celular não tem senha, procure pelo número “14” e disque. Não se esqueça de colocar no viva voz.

Reproduzi exatamente o que Vicente havia me pedido para fazer, e quando chamou, não mais que dois bipes, um homem atendeu do outro lado da linha, iniciando uma conversa breve com ele enquanto o mesmo mantinha a atenção na movimentação à nossa frente.

—Sim, senhor. Pode falar.

—Por favor, Sebastian, assim que chegarmos na mansão eu quero que esteja disponível para me fazer um serviço.

—Como quiser, senhor. Mais algum desejo?

—Não, obrigado. Por ora é só. —Ele me olhou e acenou como se indicasse para eu encerrar a chamada, e assim eu o fiz. —Pronto, problema resolvido. Quando a gente chegar entregue sua chave para o segurança da minha irmã e ele vai buscar o seu carro. Está tranquila agora? —Voltou a atenção para o painel do carro.

Eu me mantive em silêncio e devolvi seu celular para dentro do porta-luvas. Meus pensamentos trabalhavam a todo momento para que eu não transparecesse meu medo diante de Charlotte. 

—Pra onde a gente vai agora?

Mansão François. Eu peço que... Não se assuste quando entrarmos, apesar das pessoas armadas na muralha e das muitas câmeras... Eles não vão disparar contra você.  —Seu tom de voz foi irônico, embora eu soubesse que tinha um fundo de verdade.

Eu não estava preocupada em correr o risco de ter uma bala na cabeça, e sim, em não saber disfarçar diante de Charlotte François. A própria peste. 

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Ao passarmos pelos portões e as muralhas, os meus olhos brilharam com interesse, ao ver a imensidão do império construído para durar por milênios. Era simplesmente a fórmula certa de como deixar as pessoas saberem que você era bem afortunado.

Os carros estavam estacionados de maneira estratégica. Era como se a qualquer momento os seguranças entrassem e pudessem tirá-los sem nenhuma complicação, e havia marcações por toda a imensidão do estacionamento feito apenas para as Bugattis e Ferraris que os seguranças usavam justamente para conseguirem acompanhar seus patrões, afinal de contas, eles eram seguranças e motoristas da família François, nada menos que isso.

Se esses são os carros que os seguranças usam, imagine meus futuros presentes...

O segurança desviou a rota ao passarmos por um caminho longo de pedras entre duas áreas extensas de árvores e jardins, deixando Vicente livre do comboio. O outro segurança também seguiu para o mesmo estacionamento dos outros carros. O sol iluminando as árvores as tornava mais verdes e vivas.

—O que houve? Por que eles saíram? —Eu me segurei no banco do carro, quase tirando o couro do assento nas unhas.

—Porque estamos em solo seguro agora. —Disse Vicente, descendo o vidro das janelas. —Se eu pudesse, sairia dirigindo com a janela do carro sempre aberta. —E manteve a velocidade constante até chegarmos em frente à enorme fonte de água em frente à mansão.

—Por quê? —Estreitei os olhos, sem entender seu desejo simples e anormal.

—É bom sentir a brisa no rosto, mas esse é um dos muitos privilégios que eu não tenho e não posso ter.

—É só um carro... —Tive a ousadia de sorrir alto com escarneio.

—Esse carro é inteiramente blindado e eu não posso simplesmente correr o risco de perder a vida por causa de uma brisa. —Concluiu sereno, tirando o sorriso dos meus lábios em segundos.

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Aos poucos, o carro estacionou em frente; depois da fonte. Vicente desceu e bateu a porta, mas se manteve em pé diante do carro olhando para mim, confuso. Arranquei o cinto e abri a porta, pondo um pé para fora do carro. Até o ar era puro. Saindo da Bugatti, pisquei enquanto Vicente dava a volta em frente ao veículo com as mãos dentro dos bolsos da calça, vindo em minha direção.

—Tá se sentindo bem? —Ele sorriu de canto de boca, ironizando minha reação que lutei para manter discreta.

—Estou. —Bati a porta, amassando os pés nos sapatos.

—Minha nossa, você parece mais pálida que quando a conheci. —Ele tirou a mão do bolso e flexionou o braço, oferecendo-me como apoio. —Prometo que apresento você como uma amiga que acabei de conhecer, e não vou tentar te beijar outra vez. —Disse Vicente, no auge de seu comprometimento com a serenidade. 

Eu odiei tanto aquilo que poderia facilmente seduzi-lo e lhe fazer esquecer até o próprio nome.

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