102Vicente François⤝⥈⤞A lua me caía como um manto negro. Uma bola branca no vazio escuro do céu. Eu me sentia tão vazio e sozinho quanto aquela lua.Recostei nas grades da varanda, sob uma noite enluarada, e suspirei, deslizando as mãos para dentro dos bolsos da calça após um dia cheio.—Me sinto só. Olhando a minha vida, desse ponto de vista, a solidão chega a me parecer normal…Minhas palavras de desabafo no vento, foram interrompidas pelas portas do meu quarto se abrindo, revelando minha mãe.—Meu filho? Não está muito frio aí fora? —Perguntou, fechando as portas novamente.Ela entrou em meu quarto com delicadeza. Um passo depois o outro em pisadas sofisticadas.Suspirei.—Eu só estou procurando paz, mãe. Apenas isso. Meus ombros caíram quando expirei, fechando a porta da varanda e adentrei ao quarto.—Eu sei o que é iss-—Não começa, mãe.Motivado a odiar Lisa Mary, eu recusei qualquer conselho que não fosse maltratá-la.—Eu sei, até o seu pai sabe, embora não possa opinar nes
103Vicente François⤝⥈⤞Eu via o futuro repetindo o passado. Eu estava disposto a mudar isso, mas meu coração não me atendia. Minhas ideias não correspondiam aos fatos. E isso era frustrante.Eu devia te odiar, Lisa Mary. Eu devia nunca ter aceitado você sob o mesmo teto. No entanto, eu criei situações que me levassem a aceitar você em minha vida novamente, e isso me crucifica. Eu só quero sobreviver a você sem nenhum arranhão… Se isso for possível.Me afastei de Lisa Mary, aos poucos, dando dois passos para trás após pausar aquele beijo acalorado com um selar simples e um suspiro sufocante. —Você vai me enganar outra vez, não é? O seu amor falso acalmou o meu silêncio, mas me deixou suas marcas profundas e violentas, Lisa Mary. Então, por favor, não me faça ver novamente que as coisas belas da vida perdem a beleza e o encanto com o tempo. Por favor.Minhas súplicas em forma de palavras que vagavam naquele momento, comoveram as lágrimas reais de Lisa. Ela passou as mãos pelos cantos
1 Lisa Mary ⤝⥈⤞ O burburinho de um bar lotado contrabalanceava com a música “Bonjofondo”, fazendo algumas pessoas dançarem descontraídas. Envolvi os dedos em torno do copo, virando a última dose de uísque. Ele me olhou por cima do copo, contendo o riso em seus lábios curvilíneos, e pôs a mão sobre a mesa tentando me alcançar, mas desistiu quando percebeu que aquilo atraiu olhares para nossa mesa. Você será meu, por mais que tente recuar. Querido Daniel, eu sou a peste que o perseguirá até o final dessa noite... Pensava, deslizando o bico da bota entre suas bolas. —Como vai ser, Daniel? Você vai me fazer perder tanto tempo aqui? Eu quero bolas na minha cara. B-o-l-a-s. —O olhei com desdém, mantendo o sorriso debochado que eu amava. Daniel relaxou, encostando as costas na cadeira. Cansada daquela cena, inclinei para a frente deixando amostra o busto prestes a saltar sobre o corpete, e pus as mãos sobre a mesa, o olhando com superioridade. Os longos cabelos negros caíram sobre meu
2 Lisa Mary ⤝⥈⤞ Em um vestido romântico rendado, atraí a atenção dos fiéis na principal igreja de Metz, a tão respeitada igreja matriz. Os bancos de madeira se preenchiam com pessoas que esperavam educadamente pelo início da missa, dividindo o espaço entre os ricos e os pobres. Em um salto modesto, foi a primeira vez em que eu estava usando algo abaixo dos joelhos. O sol que reluzia sobre meus cabelos recém pintados em castanho claro realçava o tom da minha pele pela manhã. Eu emanava pureza. Em tons discretos e frios, minha presença contrabalanceava com as pessoas em suas roupas com cores divertidas para a missa no domingo de manhã. Indo em direção ao banco próximo ao altar, sentei-me educadamente, sempre sorridente. Eu estava frequentando as missas durante uma semana e consegui me aproximar de algumas pessoas na intenção de parecer amigável. Uma parte dos meus cabelos caiu sobre meus ombros, mas logo tratei de passá-lo para trás da orelha, mantendo a ingenuidade aparente. Todos
3 Lisa Mary ⤝⥈⤞ Não tinha nada pelo que eu tivesse mais desprezo que fiéis conservadores me olhando prontos para chicotearem com suas línguas contra meus pecados. Estando naquela igreja, eu apenas queria correr o mais rápido possível para longe dos membros idiotas daquele inferno, e acabei me inscrevendo para me voluntariar na venda dos doces. Eu ficaria com o dinheiro de tudo o que vendesse, fácil, fácil. Eu percebi Charlotte e a senhora François passando em frente à barraca da qual eu estava cuidando, e as duas se direcionaram até a tenda que o padre mandou fazer para as mães com crianças e pessoas sensíveis. Meus olhos buscavam por Vicente quando o celular vibrou dentro da pequena bolsa branca, obrigando-me a atender. —Cadê o idiota do seu irmão? —Perguntei, ranzinza. Ele ainda não estava por perto. —Está tão pura, Lisa Mary... Se eu não te conhecesse diria que se converteu. —Sua voz pareceu sarcástica, debochando. —Diga, esse tom de cabelo tão claro não combina muito com voc
4 Lisa Mary ⤝⥈⤞ Era só abrir os olhos e sentir que eu estaria em contato total com a realidade, então por isso permaneci com os olhos fechados e me permiti beijá-lo por um pouco mais de tempo. A obrigação de ser uma boa moça me forçou a recobrar a consciência e eu apoiei as mãos contra seu peito, empurrando lentamente. Virei o rosto para o lado, e por mais que eu quisesse arrancar suas roupas feito um animal, ainda assim eu fui obrigada a me manter pura e falsamente ingênua. Percebi Vicente se controlando para não insistir em me beijar novamente, e meus olhos encontraram os dele. Estava ansioso. Seu peito subia e descia como se fosse explodir, embora tentasse se controlar. —Isso não foi certo... Senhor François. Você... Você... Não pode fazer isso na casa de Deus. —Disse ofegante, tentando controlar a respiração. A luz logo foi voltando e eu olhei seus olhos negros de luxúria. Ele deu dois passos para trás e pôs uma mão sobre a ponta de uma mesa velha, passando a outra pelo peito
5 Lisa Mary ⤝⥈⤞ —Nós somos amigos? —Aceitei o apoio e deslizei minha mão pelo seu bíceps, provocando-o de maneira que me fez parecer inocente. Vicente limpou a garganta e tossiu seco, piscando na tentativa de parecer decente. —Sim, n-nós somos. —Afirmou e então endireitou a cabeça, afirmando a postura. Nós então trocamos alguns passos até os poucos degraus e subimos até a varanda. Nos aproximamos da porta e ele a abriu. A governanta me analisou dos pés à cabeça e bloqueou o sorriso irônico que quase escapou em seus lábios, nos cumprimentando. No entanto, meu nervosismo quase expeliu pelos poros quando olhei sobre seu ombro direito e avistei Charlotte sentada na poltrona, ao lado de sua mãe que também estava em outra poltrona. —Senhor François, por favor, deixe que eu leve o seu casaco. A casa está aquecida, você vai acabar ficando soado. —Disse a governanta, esticando os dedos em direção à Vicente. —Obrigado. —Ele virou de costas para ela, saindo do meu lado momentaneamen
5 parte IILisa Mary⤝⥈⤞ Eu estava começando a observar o ambiente luxuoso e imparcial. Era como se os objetos daquela casa apenas existissem para sustentar o ego das pessoas que moravam ali. A imensidão dos corredores se alinhava perfeitamente com os móveis retos e limpos, em tons que escalonavam do preto para o cinza e se espalhava em branco e tons de areia. Apenas alguns quadros grandes e extravagantes que compunham o mural da família, demonstrava que naquela mansão moravam pessoas e não apenas o interesse de capa de revista que faziam matérias sobre “as mansões mais luxuosas da França”, ou coisas desse tipo. Enquanto caminhava ao lado da senhora François, por um corredor extenso, ouvi a origem da família, coletando o máximo de informações que eu pude. Mantive as mãos em frente ao corpo o tempo inteiro enquanto caminhava comportada e tímida, sempre com a imagem de uma boa moça puritana em construção. —Bom, como você já deve ter percebido, o Vicente tem uma aparência Irlandesa e,