A casa se erguia solitária no meio de um amplo terreno abandonado, onde o mato atingia mais de um metro de altura. A pintura branca, gasta pela contínua exposição ao tempo, estava descascando por toda a extensão das paredes, e a porta de tela, solta das dobradiças, estava caída na varanda. A madeira envelhecida dos batentes das janelas ainda revelava restos de tinta verde, e, de frente para a rua, um vidro quebrado brilhava como uma teia de aranha prateada sob o sol de fim de tarde. Apesar do mato, eu conseguia distinguir uma calçada de cimento em torno da residência, com plantas crescendo pelas rachaduras, revelando os vários meses de total negligência. Apenas as quatro grandes árvores alinhadas no fundo do terreno se salvavam da atmosfera de destruição e descaso que permeava todo o local.
Apertei as mãos úmidas e respirei fundo antes de descer do caminhão, tentando disfarçar a profunda decepção que me invadiu. Por um breve instante, uma onda de pânico quase me dominou, mas consegui me controlar, mesmo vendo minha última esperança evaporar-se diante dos meus olhos. — É aqui, mamãe? É esta a casa que sua avó lhe deixou? — perguntou Trevor, meu filho de nove anos, com um tom de surpresa. Forcei um sorriso e me virei para ele, que estava apoiado na janela do velho caminhão, examinando a casa abandonada. — Sim, querido, é aqui. — Você disse que era bonita e que nós íamos gostar muito. — Havia um tom de acusação em sua voz. — Ela era bonita, mas faz muito tempo que eu não vinha aqui — respondi, sem saber como ainda conseguia manter o sorriso nos lábios. — Nós vamos reformá-la. Uma nova sensação de medo começou a tomar conta de mim, e desviei o olhar para que as crianças não percebessem o quanto eu estava abalada. Eu tinha contado tanto com essa casa e, no fim, tudo parecia ser mais uma tentativa inútil. Agora eu realmente estava num beco sem saída. Três filhos pequenos, uns poucos milhares de dólares que sobraram do seguro, nenhum emprego e tudo o que eu possuía para recomeçar a vida era uma casa caindo aos pedaços. Respirei fundo mais uma vez, encarando outro aspecto da fria realidade: se as coisas piorassem muito, eu teria que vender o caminhão. Olhei para as crianças novamente e vi Ryan se apertando ao lado do irmão para também apoiar-se na janela e observar a casa. — É bem feia, não é, mamãe? Parece mal-assombrada! Vai ver tem uma bruxa morando lá. Segurei a maçaneta da porta e lancei um olhar de repreensão para Ryan, meu filho de oito anos. — Chega, Ryan. Você vai deixar Megan assustada com essas bobagens. Ele olhou para a irmãzinha e sorriu. — Não, mamãe, ela ainda está dormindo. — Ótimo, então desçam do caminhão. Eu vou pegá-la. — Os meninos saíram do veículo, e eu sacudi gentilmente Megan. — Meg, querida, chegamos. Megan se espreguiçou, e eu a levantei nos braços. Em seguida, tirei um chaveiro do bolso da calça e o entreguei a Trevor. — Vá à frente e abra a porta, está bem? Ryan, você poderia apanhar minha bolsa? — Tentando mostrar-me forte, ajeitei Megan no colo e caminhei em direção à velha residência da minha avó, rezando fervorosamente para que o interior não estivesse tão ruim quanto a aparência do lado de fora mostrava. Meus filhos precisavam de um lugar para morar. Sentia a ansiedade me sufocar ao ver Trevor abrir a porta. Não tinha outro lugar para ir e ninguém a quem recorrer. Nada. — Venha, mamãe — Ryan chamou, aproximando-se. — O que você está olhando? Vamos entrar. Apertei Megan com mais força e subi os degraus da varanda. Contornei a porta de tela caída no chão, parei por um instante para que meus olhos se adaptassem à penumbra e entrei. O lugar era tão pequeno! Dez vezes menor do que eu me lembrava. Havia poeira por toda parte, mas tudo estava exatamente como minha avó deixara: os móveis velhos, os enfeites de porcelana, as cortinas bege, os quadros de flores nas paredes, a lareira em um dos cantos. A casa cheirava a mofo e umidade, mas eu mal atentei para isso enquanto me recostava ao batente da porta com um suspiro de alívio. O interior não estava num estado tão deplorável quanto o lado externo. Eu poderia transformar essa casa numa moradia decente, compensando os meses de abandono e negligência com uma boa arrumação geral. Sabia que iria ter trabalho, mas isso não me incomodava. O importante era que tínhamos um lar. — Chegamos? — Megan perguntou, esfregando os olhinhos sonolentos. — Sim, querida. Estamos em casa. — Eu quero ver. A menina agitou-se nos meus braços, querendo ir para o chão. Abaixei-a, e, vendo-a correr para longe, estiquei o corpo para dissipar a tensão que se acumulava nas minhas costas e pescoço. Olhei em volta com mais cuidado e reparei que nada havia mudado. O aposento à esquerda da entrada servia como sala de jantar, com seu pequeno espaço sobrecarregado de móveis pesados e antigos. À direita, ficava a sala de estar e, ao fundo desta, uma porta levava a um dos dois quartos. O lugar ficaria agradável quando eu removesse parte da mobília e limpasse tudo. Afastando o cabelo do rosto com ambas as mãos, caminhei até o quarto da minha avó. Controlando a emoção, revi a cama antiquada junto a uma das paredes. Apenas um plástico transparente cobria o colchão, que parecia relativamente novo. Havia um pequeno criado-mudo ao lado da cama, uma penteadeira com espelho e um grande armário ainda repleto de roupas. Senti os olhos molhados de lágrimas ao perceber os velhos vestidos pendurados em cabides de madeira, mas logo fechei a porta do guarda-roupa e saí do cômodo. Precisava me concentrar na situação presente e avaliar as possibilidades. A única mobília que possuía eram as camas das crianças, mas o quarto era tão pequeno que não havia espaço sequer para o berço de Megan. A cozinha mostrava sinais de mudanças recentes, que incluíam dois armários novos e uma lavadora de pratos. O chão, contudo, conservava o mesmo piso escurecido que eu observei em minha última visita, há dez anos. Abri a torneira da pia por mero acaso e me surpreendi ao ouvir um ruído nos canos e, em seguida, deparar-me com um jato de água límpida. Experimentei o interruptor de luz, e as lâmpadas fluorescentes piscaram e encheram o ambiente com sua luz clara. Fechei a torneira e franzi a testa, intrigada. Talvez o advogado que cuidou do patrimônio da minha avó tivesse providenciado para que a água e a luz fossem ligadas novamente ao receber o comunicado de que eu não queria mais vender a casa, mas pretendia morar lá. Nem pensei em indagar sobre esses detalhes quando fui buscar as chaves com a secretária dele. Me virei para a geladeira, esperando pelo pior. Porém, a porta entreaberta mostrava que o interior parecia ter sido limpo. Talvez tivessem cuidado disso também, pensei. O segundo quarto, que se situava além da cozinha, estava vazio, exceto por uma velha máquina de costura, uma enorme penteadeira, uma cadeira e a estrutura de uma cama de campanha. O aposento era pequeno, mas, por sorte, os meninos dormiam em beliche, e seria possível acomodá-los bem. Afinal, o tamanho da casa era um problema irrelevante; pelo menos agora tínhamos um lar. Dei uma olhada rápida no banheiro antes de retornar à cozinha e abrir a porta dos fundos, curiosa por saber por onde as crianças andavam. Reparei no pequeno galpão que fora construído há poucos anos e que agora servia como depósito para móveis velhos. Entre as peças ali armazenadas, havia um fogão a lenha que devia ter mais de cem anos. Examinei a relíquia com cuidado. Antes de me casar, eu trabalhava para um comerciante de móveis usados que se interessava imensamente por antiguidades. Com certeza, ele adoraria aquela peça. O fogão estava em excelentes condições e poderia valer uma pequena fortuna se fosse vendido para a pessoa certa. De repente, possuir tal preciosidade em minha própria casa me fez sentir mais segura e, pela primeira vez em muitos dias, respirei aliviada. Levantei os olhos na direção da garagem e vi uma mulher baixa e roliça aparecer junto ao portão. Observei o rosto sorridente e sardento, o andar apressado, e deduzi que só poderia ser Liz Crawford. Minha avó a descreveu em suas cartas e sempre se referia a ela com grande afeição.Assim que a recém-chegada acenou para mim, abriu um sorriso ainda maior ao se aproximar. Era como se já nos conhecêssemos, e sua energia era quase contagiante. — Oi! Você é a Holly, certo? Eu a reconheci pelas fotos que sua avó me mostrava. Já estou aqui esperando desde cedo e achei que vocês não viriam mais! — Ela estendeu a mão quando chegou perto o suficiente. Seu rosto irradiava uma alegria genuína, refletindo sua natureza extrovertida. — Sou Liz Crawford, moro a duas casas daqui, descendo a rua. Seja bem-vinda a Jennings. — Obrigada — respondi, devolvendo o sorriso. — Também achei que não chegaríamos mais. Foi uma viagem longa. — Imagino, ainda mais com crianças, não é? — Liz riu, parecendo entender perfeitamente o que eu passara. — Os meus brigam, discutem e reclamam até estarmos a uns dez quilômetros de casa. Só então encostam a cabeça no banco e dormem. — Os meus passaram os últimos mil e duzentos quilômetros brigando pela janela. — Suspirei, lembrando da jornada exaustiv
Eu nunca me senti tão pressionada como no dia em que fui conversar com o advogado. Precisava urgentemente arranjar uma babá para as crianças. Não era justo continuar dependendo da boa vontade de Liz por muito tempo, mesmo sabendo que minhas condições financeiras estavam longe de permitir isso. Mas como eu pagaria? Acabara de gastar uma quantia considerável para instalar um telefone, e minhas economias estavam acabando depressa. Depois de comprar mantimentos e outros produtos essenciais para a casa, restaram-me exatamente quinhentos e quarenta dólares. Se eu controlasse rigorosamente cada centavo, poderia manter a família por mais umas seis semanas.— Sra. Simpson, o Sr. Brown vai recebê-la agora — avisou a secretária.Respirei fundo e, tensa, peguei a bolsa antes de me dirigir ao escritório que ela indicou. O homem magro, parado junto à escrivaninha abarrotada de papéis, levantou-se ao me ver entrar e estendeu a mão com um sorriso amistoso.— Sou Ned Brown. Seja bem-vinda à nossa cida
Eu afastei o cabelo do rosto e apoiei a cabeça na madeira fria da porta, sentindo o peso do desânimo no olhar. Precisava me lembrar constantemente dos aspectos positivos da minha situação: a casa estava paga, as crianças tinham saúde, e eu ainda era capaz de trabalhar duro. Poderia ser pior, eu dizia a mim mesma.Admirei o nascer do sol por mais alguns momentos, antes de desviar o olhar para a rua tranquila. A casa da minha avó era muito bem localizada. A rua em frente à propriedade já fora parte de uma auto-estrada, e, desde que a nova rodovia foi construída há alguns anos, tornou-se a principal via de acesso à cidade. Não havia muitos sinais de desenvolvimento na região, até a estrada de ferro: uma oficina reformada com uma grande placa dizendo "O'Neil Veículos", um posto de gasolina, a velha estação ferroviária e um grande prédio que pertencia a um comerciante de implementos agrícolas. Mais adiante, do outro lado dos trilhos, erguiam-se quatro enormes elevadores de grãos, que abast
Megan, por outro lado, sempre tentou agradar o pai, apesar de ele deixar claro que não a suportava. Ele vivia chamando-a de "bebê mimado", o que a tornou tímida e insegura. É curioso como os sentimentos se desenvolvem, pensei. Apesar de tudo, era Megan quem mais sentia falta dele. Já os meninos, especialmente Trevor, reagiram à morte de Derek com uma raiva que beirava o ódio, como se a morte fosse mais uma maneira dele os irritar.Entrei na sala com a xícara nas mãos, coloquei-a sobre a mesa e me agachei na frente do meu filho.— Você sente falta dele, Trevor? — perguntei suavemente.— Não — ele respondeu, balançando a cabeça e desviando o olhar.— Não tem problema nenhum falar sobre isso, querido. — Apoiei o queixo nas mãos, esperando pacientemente.Ele levantou os olhos para mim e repetiu com firmeza:— Não sinto falta dele, mamãe. Ele só fazia você sofrer, e eu não suportava isso.A dor nos olhos dele me atingiu como uma faca. Ele enxugou uma lágrima antes de continuar:— Estou fel
Eu estava sentada à mesa da cozinha, tentando desesperadamente equilibrar as contas. O caminhão vendido, os impostos pagos, e ainda assim, o dinheiro parecia evaporar antes de eu conseguir respirar aliviada. Era como se a vida jogasse contra mim. O pagamento pelo serviço na escola ainda estava distante, e o pouco que ganhara ajudando a limpar as salas mal cobria a babá. Minha cabeça latejava, mas eu precisava me concentrar.— Mamãe, eu preciso falar com você. — A voz de Ryan cortou minha concentração.— Só um minuto, Ryan. Deixe-me terminar estas contas. — Respondi sem tirar os olhos da coluna de números.Mas ele insistiu, e algo na sua voz me fez largar a caneta.— O que foi, Ryan? Não vê que estou ocupada?— Eu e Trev tivemos uma espécie de acidente. — Ele parecia ansioso, pálido até.Meu coração apertou.— Acidente? Trev está machucado?— Não, ele está bem. Foi um tipo diferente de acidente.— O que aconteceu desta vez? — Perguntei, já prevendo algum estrago.Então, Ryan confessou
Mulher Irresistível Por Grady O’neill Eu saí da oficina naquele dia com a intenção de dar um tempo para a mente. Tinha passado a manhã inteira resolvendo problemas de clientes, negociando preços e lidando com mais papelada do que eu gostaria. Tudo o que eu queria era um café forte e uns minutos de silêncio. Mike e os outros já estavam do lado de fora do café quando cheguei. Eles conversavam animadamente sobre qualquer coisa que homens discutem para matar o tempo. Eu mal prestei atenção até que notei algo na rua. Um caminhão. Não, mais que isso... uma mulher saindo dele com um ar visivelmente tenso. — Ei, moça, você sabia que está com um pneu furado? — Mike apontou, sempre o primeiro a notar tudo e a se intrometer. Assim que os olhos dela se levantaram, fui atingido por um instante de algo que não acontecia há anos: curiosidade. A mulher tinha um jeito que mesclava fragilidade e força, como alguém que já carregou mais do que deveria, mas ainda assim se mantém em pé. Eu
Enquanto atravessávamos a rua, percebi que meu coração estava mais leve. Grady O’Neil não era apenas o carrancudo que aparentava ser. Ele havia demonstrado bondade e compreensão. Isso me fez refletir: Se ele foi capaz de ajudar os meninos com esse trabalho, talvez pudesse ter algo para mim também.Nos últimos meses, a situação financeira tinha se tornado insustentável. Era como se cada dia trouxesse mais contas, mais dificuldades e menos soluções. Eu estava disposta a aceitar qualquer trabalho: faxina, lavagem de carros, organização do pátio... qualquer coisa que pudesse aliviar a carga que pesava sobre meus ombros.Quando vi o homem mexendo no motor do caminhão, decidi voltar. Talvez ele pudesse me ajudar de algum jeito. Não custa tentar, pensei, tentando afastar a vergonha e o medo de ser rejeitada.Sem esperar por mais nada, segurei Megan pela mão e conduzi meus filhos até a calçada. Ao atravessar a rua, notei um homem mexendo no motor de um caminhão. Um frio percorreu minha espinh
Não conseguiria dormir. Levantei-me devagar, com cuidado para não fazer barulho e não acordar Megan, que dormia tranquila do outro lado da cama. Fui ao banheiro e, em seguida, parei ao lado do beliche onde meus meninos dormiam. Fiquei ali, parada, por alguns minutos, apenas observando-os. Eles estavam tão serenos e tão vulneráveis. Aquilo me cortou o coração. Sentia-me tão pequena diante do peso que carregava todos os dias, a luta para dar a eles um futuro melhor. Com os olhos cheios de lágrimas, fechei a porta sem fazer barulho e me dirigi à cozinha. Eu sabia que eles mereciam muito mais do que eu poderia dar. Esse pensamento me angustiava. Sentei-me em uma cadeira, apoiei o rosto nas mãos e deixei as lágrimas caírem. Chorei por eles, pelo meu casamento infeliz, pela ausência de minha avó, que tanto significava para mim, mas, acima de tudo, chorei pelo vazio que parecia se expandir diante de mim sem que eu soubesse como preenchê-lo. Olhei para a velha máquina de costura que esta