Eu estava sentada à mesa da cozinha, tentando desesperadamente equilibrar as contas. O caminhão vendido, os impostos pagos, e ainda assim, o dinheiro parecia evaporar antes de eu conseguir respirar aliviada. Era como se a vida jogasse contra mim. O pagamento pelo serviço na escola ainda estava distante, e o pouco que ganhara ajudando a limpar as salas mal cobria a babá. Minha cabeça latejava, mas eu precisava me concentrar.
— Mamãe, eu preciso falar com você. — A voz de Ryan cortou minha concentração. — Só um minuto, Ryan. Deixe-me terminar estas contas. — Respondi sem tirar os olhos da coluna de números. Mas ele insistiu, e algo na sua voz me fez largar a caneta. — O que foi, Ryan? Não vê que estou ocupada? — Eu e Trev tivemos uma espécie de acidente. — Ele parecia ansioso, pálido até. Meu coração apertou. — Acidente? Trev está machucado? — Não, ele está bem. Foi um tipo diferente de acidente. — O que aconteceu desta vez? — Perguntei, já prevendo algum estrago. Então, Ryan confessou tudo de uma vez, sem respirar. Minha cabeça girou. O’Neil Veículos. Grady O’Neil. Ótimo, o homem mais carrancudo da cidade. Eu já conseguia imaginar o olhar gélido dele quando soubesse que os causadores da confusão eram meus filhos. — Onde está seu irmão? — Perguntei com a calma que me restava. — Sentado na varanda, querendo morrer. Revirei os olhos, mas um sorriso escapou. Apesar de tudo, eles sabiam quando tinham ultrapassado o limite. Caminhei até a varanda, onde encontrei Trevor sentado no degrau mais baixo, com o rosto enterrado nas mãos e os ombros sacudindo de tanto chorar. Meu coração apertou. Ele estava com medo, e, por mais que tivesse causado o problema, ainda era apenas uma criança. Sentei-me ao lado dele, pousando uma mão suave em suas costas. — Ei, Trev... Olhe para mim. Ele levantou o rosto, as bochechas úmidas e os olhos arregalados de pavor. — Mamãe, eu juro que foi sem querer! Eu não queria quebrar nada! — Eu sei, querido. E vai ficar tudo bem, ok? — Acariciei seu cabelo, tentando transmitir alguma calma. — E se... e se ele chamar a polícia? — Trevor fungou, apertando os olhos como se tentasse conter mais lágrimas. — Eu não quero ir preso, mamãe! Segurei seu rosto com as duas mãos, forçando-o a me encarar. — Você não vai ser preso, Trev. Ouça o que eu estou dizendo: você é apenas uma criança. Quebrou uma janela, e isso pode ser resolvido. Agora, respire fundo. — Esperei ele obedecer antes de continuar. — Nós vamos até a oficina, vamos falar com o Sr. O’Neil, pedir desculpas e tentar resolver isso da melhor forma possível. Ele balançou a cabeça, relutante. — E se ele ficar bravo? — Talvez fique, sim. — Admiti, mantendo meu tom sereno. — Mas, mesmo que ele fique bravo, o que importa é que estamos assumindo a responsabilidade. E você não estará sozinho, ok? Eu vou segurar sua mão o tempo todo. Trevor olhou para mim, hesitando, e depois desviou o olhar para a rua onde ficava a oficina. Finalmente, ele deu um leve aceno de cabeça. — Certo, mamãe. Segurei sua mão com firmeza e me levantei, puxando-o gentilmente para que ele fizesse o mesmo. Ryan apareceu na porta, observando de longe. — Ryan, venha cá. — Chamei, e ele se aproximou. — Nós vamos até a oficina juntos. O que aconteceu foi um erro, mas vocês dois vão mostrar ao Sr. O’Neil que têm coragem de admitir isso e consertar o que puderem. Ryan concordou, mais confiante que Trevor, mas ainda preocupado. Juntos, atravessamos a rua, Megan caminhando atrás de nós, segurando um dos meus dedos. Enquanto seguíamos para a oficina, continuei conversando com eles, encorajando cada passo: — O importante é que vocês aprendam com isso. Vocês dois são meninos bons, e bons meninos assumem seus erros. Quando paramos diante da porta da O’Neil Veículos, olhei para eles mais uma vez, apertando suas mãos levemente. — Vai dar tudo certo. — Sorri, apesar do aperto no peito. — Agora, vamos lá. Ao entrar no estabelecimento, meu coração disparava como se fosse eu a culpada. Quando Grady finalmente apareceu, segurando aquele manual enorme, senti que o ar ficou mais pesado. Ele me olhou com aquele jeito frio e impessoal que parecia ser sua marca registrada. Engoli em seco, mas não podia recuar. A presença imponente do Senhor Grady O’Neill surgiu na porta do estabelecimento, fiquei um pouco receosa, mais criei coragem e comecei a falar: — Bom dia Sr. O’Neill, meus filhos estavam brincando com pedras e acabaram quebrando o vidro de sua porta. Eu vim lhe pedir desculpas e dizer que pretendo pagar pelo conserto. Ele não reagiu. Fiquei ali, plantada, me sentindo minúscula, até que Trevor tomou a frente, com coragem inesperada. — Eu devo pagar, Sr. O’Neil. A culpa foi minha. Ryan logo seguiu o exemplo do irmão. — Foi culpa minha também. Trevor só começou porque eu comecei. Por um instante, achei que o vi esboçar um sorriso, mas ele voltou a encará-los com firmeza. — Se foram os responsáveis pelo estrago, não acham que a obrigação de arcar com o conserto é de vocês, e não de sua mãe? Eu fiquei sem palavras. Antes que pudesse intervir, Trevor, cabisbaixo, respondeu: — Claro, mas não temos dinheiro. Meu coração apertou. Aqueles meninos, com tão pouco, já sabiam o que significava responsabilidade. Então, Sr. Grady falou, surpreendendo a todos. — Se vocês pensam assim, talvez possamos fazer um trato. Preciso de alguém para recolher o lixo e limpar o pátio. Se fizerem isso para mim, considerarei o vidro pago. O alívio tomou conta de mim, misturado a um orgulho imenso. Trevor e Ryan aceitaram imediatamente, a confiança voltando aos olhos deles. Eles concordaram e pra finalizar o acordo cada um deram um aperto de mão no Sr. O’Naill. Enquanto saíamos dali, senti que, apesar de todos os desafios, talvez estivéssemos indo na direção certa. Grady não era tão carrancudo quanto parecia, afinal.Mulher Irresistível Por Grady O’neill Eu saí da oficina naquele dia com a intenção de dar um tempo para a mente. Tinha passado a manhã inteira resolvendo problemas de clientes, negociando preços e lidando com mais papelada do que eu gostaria. Tudo o que eu queria era um café forte e uns minutos de silêncio. Mike e os outros já estavam do lado de fora do café quando cheguei. Eles conversavam animadamente sobre qualquer coisa que homens discutem para matar o tempo. Eu mal prestei atenção até que notei algo na rua. Um caminhão. Não, mais que isso... uma mulher saindo dele com um ar visivelmente tenso. — Ei, moça, você sabia que está com um pneu furado? — Mike apontou, sempre o primeiro a notar tudo e a se intrometer. Assim que os olhos dela se levantaram, fui atingido por um instante de algo que não acontecia há anos: curiosidade. A mulher tinha um jeito que mesclava fragilidade e força, como alguém que já carregou mais do que deveria, mas ainda assim se mantém em pé. Eu
Enquanto atravessávamos a rua, percebi que meu coração estava mais leve. Grady O’Neil não era apenas o carrancudo que aparentava ser. Ele havia demonstrado bondade e compreensão. Isso me fez refletir: Se ele foi capaz de ajudar os meninos com esse trabalho, talvez pudesse ter algo para mim também.Nos últimos meses, a situação financeira tinha se tornado insustentável. Era como se cada dia trouxesse mais contas, mais dificuldades e menos soluções. Eu estava disposta a aceitar qualquer trabalho: faxina, lavagem de carros, organização do pátio... qualquer coisa que pudesse aliviar a carga que pesava sobre meus ombros.Quando vi o homem mexendo no motor do caminhão, decidi voltar. Talvez ele pudesse me ajudar de algum jeito. Não custa tentar, pensei, tentando afastar a vergonha e o medo de ser rejeitada.Sem esperar por mais nada, segurei Megan pela mão e conduzi meus filhos até a calçada. Ao atravessar a rua, notei um homem mexendo no motor de um caminhão. Um frio percorreu minha espinh
Não conseguiria dormir. Levantei-me devagar, com cuidado para não fazer barulho e não acordar Megan, que dormia tranquila do outro lado da cama. Fui ao banheiro e, em seguida, parei ao lado do beliche onde meus meninos dormiam. Fiquei ali, parada, por alguns minutos, apenas observando-os. Eles estavam tão serenos e tão vulneráveis. Aquilo me cortou o coração. Sentia-me tão pequena diante do peso que carregava todos os dias, a luta para dar a eles um futuro melhor. Com os olhos cheios de lágrimas, fechei a porta sem fazer barulho e me dirigi à cozinha. Eu sabia que eles mereciam muito mais do que eu poderia dar. Esse pensamento me angustiava. Sentei-me em uma cadeira, apoiei o rosto nas mãos e deixei as lágrimas caírem. Chorei por eles, pelo meu casamento infeliz, pela ausência de minha avó, que tanto significava para mim, mas, acima de tudo, chorei pelo vazio que parecia se expandir diante de mim sem que eu soubesse como preenchê-lo. Olhei para a velha máquina de costura que esta
Para a Sra. Potter, derrubar a cerca já seria um grande problema; estragar algumas de suas preciosas plantas atingia o nível de catástrofe.— Se acontecer alguma coisa, tomem cuidado para não rir.— Está bem. — Ele virou-se e caminhou para a porta. — Pelo menos não na frente dela.— Trevor! — avisei.— Pode ficar sossegada, mamãe. Nós não vamos incomodar. O que acha que ela vai fazer se o caminhão passar por cima das rosas? — ele indagou, com um sorriso travesso.— Nem pense nisso! -- Falei, eu queria sorrir, mais precisava passar autoridade para ele.Ele riu e abriu a porta, mas antes de sair olhou para mim com uma firmeza que não condizia com sua pouca idade.— Não fique triste por causa do cinema, mamãe. Logo eu e Ryan vamos crescer e poderemos trabalhar. Aí você não precisará se preocupar tanto. — Ele levantou os ombros num gesto tímido e saiu da cozinha.Eu o observei através de uma nova cortina de lágrimas. Havia muitas coisas ruins na minha vida, mas as crianças certamente não
"Eu Te Esperarei"Eu te esperareiEla tentava se esquivar. Eu podia sentir. Toda vez que nossos olhares se cruzavam, Holly desviava os olhos rapidamente, como se temesse que eu enxergasse algo que ela escondia a sete chaves. Não era a primeira vez que percebia isso, mas naquela manhã, com a luz dourada atravessando a cozinha, pareceu mais evidente.Holly era um enigma. Eu a observava enquanto ela movia os braços no fogão, o rosto parcialmente voltado para longe de mim, e me perguntava o que a fazia se recolher para dentro de si daquele jeito. Sua vulnerabilidade estava visível, como uma corda tensa prestes a se romper.Quando seus olhos umedecidos brilharam antes que ela se virasse, algo dentro de mim se apertou. Eu sabia o que era ser forte por fora, enquanto por dentro tudo desmoronava. Reconhecia a forma como ela erguia as defesas e forçava um sorriso para os filhos, tentando esconder o peso que carregava.Mas o que me perturbava mais do que qualquer coisa era o modo como ela reag
Eu não vi os meninos pelo resto da tarde. Por volta das cinco horas, não consegui mais conter a minha curiosidade e fui espiar o que estava acontecendo. minha cerca ficou reduzida a uma pilha caprichada de madeira para fogo e a terra havia sido espalhada por igual sobre a horta da sra. Potter. Eu mal contive o riso quando dei a volta na garagem e vi Trevor, sério e suado, varrendo dedicadamente a calçada da vizinha enquanto Ryan vinha atrás com uma mangueira de água.Eu ia voltar para casa quando o caminhão da O’Neil Veículos estacionou no meio-fio e Grady desceu. Ele me cumprimentou com um aceno de cabeça e encaminhou-se para onde os meninos se encontravam. Colocou as mãos nos quadris, olhou em volta e falou alguma coisa com Trevor. O garoto pegou as pás e a vassoura e depositou-as na carroceria do caminhão. Ryan enrolou a mangueira e aproximou-se do irmão.Eu os observei por um momento, depois virei-me e voltei para casa. Ao passar pelos canteiros de flores, notei algum mato cresc
"Risadas e Frustrações" Enquanto cuidava do jardim, meus olhos inevitavelmente se voltaram para a varanda. As pilastras cederam sob o peso do peitoril de cimento, e a cena gritava por uma solução. A casa ficaria com uma aparência bem melhor se eu conseguisse consertá-la. Era uma ideia simples: com um macaco de automóvel grande o suficiente, poderia levantar o parapeito inclinado e colocar sob ele os blocos de cimento que vi na garagem. Não parecia algo tão difícil. Olhei na direção da oficina de Grady, onde Mike Tuttle acabava de estacionar seu caminhão. Hesitei por um momento antes de atravessar a rua e me aproximar. — Oi, Mike. Como vai? — cumprimentei, tentando parecer casual. — Ótimo. E você? — Estou bem, obrigada. Será que poderia me emprestar o macaco do seu caminhão? Quero tentar levantar o parapeito da varanda. — Pode pegar. Está na caixa de ferramentas. Quando terminar, é só colocá-lo de volta. Sinto muito por não poder ajudar, mas tenho uma entrega para fazer daqui a po
— É só apoiar direito que não acontecerá nada — garanti, confiante. — Será seguro se colocarmos uma escora aqui na frente. Vamos tentar?Ele respirou fundo, ainda desconfiado, mas cedeu.— Está certo, mas espere até eu deixar isso bem firme.E assim começamos de novo. Uma hora depois, com as mãos sujas de terra e o cabelo desalinhado, observei a varanda praticamente nivelada e senti um orgulho imenso.— Foi uma melhora e tanto! — comemorei, limpando a testa com as costas da mão.Mas Grady, com aquele jeito provocador de sempre, me analisou de cima a baixo antes de declarar:— É pena que eu não possa dizer o mesmo de você.Revirei os olhos, exasperada.— Muito obrigada!Ele riu, satisfeito.— De nada. Agora, vamos aos bolinhos de canela.Cruzei os braços e fiz minha melhor imitação de uma mãe exigente.— Diga, "por favor".Grady parou, sua expressão mudando de súbita leveza para algo mais intenso. Quando respondeu, sua voz estava repleta de algo que não consegui decifrar.— Não,