— Você é um canalha!
Todo o meu alto controle escorreu ralo abaixo assim que entrei no carro. Meu mundo estava dismoronando. Girei as chaves na ignição e dei partida. O mais rápido que eu podia para sair dali. Pra esquecer aquele desgraçado. Pisei no acelerador com força, meu carro disparou pela rua, a borracha dos pneus gritando com o atrito no asfalto. A dor me consumia a cada segundo, e era tanta que até mesmo as lágrimas que turvavam meus olhos doíam. Soquei o volante com ódio. — Maldito! — gritei — Como pôde? Como pôde fazer isso comigo? Seis longos anos juntos, jogados fora! A gente ia casar em dois meses, droga. Mordi o lábio entando conter meu desespero. Eu estava morando na sua casa! Como eu não percebi isso, como? Meu coração se partia cada vez que eu lembrava da cena dos dois aos beijos. Do sorriso que deveria ser pra mim. A rua era um borrão de luzes e sombras enquanto eu dirigia, completamente destruída. Nada mais importava. Tudo que tínhamos planejado pro futuro, tudo virou cinzas. E a viajem para Cancun? A casa planejada? Os filhos? Desgraçado! Cada lágrima que escorria dos meus olhos era como um lembrete da cena que se repetia em câmera lenta. Dean, inclinado para beijar outra mulher. As mãos dele na cintura dela, o mesmo Dean que me beijou e disse que me amava hoje pela manhã em sua cama. Ele me tocava e me beijava daquele meamo jeito, como ele pode? Passei a mão na boca, sentindo o nojo dele. Eu queria lavar minha boca o quanto antea. Mas minha mente queria me punir e me trazia outras lembranças e outras após outra. Pisei ainda mais fundo no acelerador, o carro avançando em uma fuga pelas ruas. — Eu odeio vo… O barulho ralhou como um trovão ao mesmo tempo que algo colidiu contra a lateral do sedã. Meu corpo foi violentamente lançado para o lado contra a porta do motorista. Minha cabeça acertando o vidro com força. Meu grito de pânico estrangulado ecoou com o impacto. Não sei como, mas tive a reação de enfiar o pé no freio e o carro parou com um solavanco. Fiquei imóvel, uma mão na cabeça e a outra agarrando o volante com força. Meu coração batia como um tambor furioso no peito e meu corpo trêmulo ainda não me obedecia. Então tirei o sinto e eu abri a porta. Saí, tropeçando nos meus próprios pés completamente confusa. Olhei para além do parabrisa quebrado. Meu Deus… o que eu fiz? A cena era aterrorizante. O homem deitado no chão, a moto caída a poucos metros dele completamente distorcida, os farois ainda acesos. Corri e ajoelhei ao lado do homem. Ele estava de bruços, o rosto virado para o lado ainda com o capacete. — Não… não, não, não! Meus olhos pararam no ferimento que sangrava na perna. Com o impacto, o asfalto rasgou a calça preta e chegou até a pele. Senti meu corpo amolecer com aquela visão. Toquei seu pulso. — Acorde... Por favor! Sem resposta. Ele não se mexia. — Ligue para a emergência. — alguém ordenou Emergência! Ligue! Foi aí que meu sentidos voltaram a funcionar. Tirei meu celular do bolso do casaco com as mãos tremulas. Disquei o número. Cada toque parecia ecoar como um grito dentro da minha mente, enquanto eu praguejava desesperadamente para que alguém atendesse do outro lado da linha. Atenda isso, droga! Finalmente, após alguns segundos que pareceram durar uma eternidade, uma voz respondeu do outro lado. — Alô, emergência. Qual é a situação? Minha voz falhou por um momento, mas forcei as palavras para fora. — Houve um acidente. Eu... eu atropelei alguém — sussurrei, com os olhos cheios de lágrimas — acho que eu o matei. … Minutos depois o barulho das sirenes ecoavam junto com a polícia, a distância. Além disso, muitas pessoas chegaram ao local. Algumas delas me olhavam como se eu fosse uma criminosa, e a essa altura eu não sabia se elas estavam erradas. Não o abandonei nem por um segundo. A pancada na minha cabeça doía, meu corpo tremia, meus joelhos falhavam, e para completar sentia uma pressão crescente no peito, como se não pudesse respirar direito. Estou em pânico. Meu Deus, salve-o. — Você é uma irresponsável! — rugiu um homem apontando pra mim com raiva. — Avançou o sinal em alta velocidade, podia ter matado alguém! Eu olhei para ele, com os olhos cheios de lágrimas, tentando me defender, mas as palavras não vinham. Minha mente estava paralisada. Que droga aconteceu? — Eu... eu não vi! Mas a cada palavra que eu dizia, o peso da minha culpa aumentava. Como eu fui tão burra? Como pude ser tão irresponsável, tão... distraída? Por que não percebi o que estava acontecendo? Tudo isso era culpa do maldito, Dean! Eu sabia, no fundo, que precisava culpar alguém, mas ainda assim eu não conseguia acreditar no que estava acontecendo. Assim que a ambulância chegou eu levantei vacilante do asfalto, e notei o sorriso no rosto de uma mulher. Segui o olhar dela e ali estava, duas viaturas de polícia. O que mais faltava acontecer? — Está vendo o que você fez? Agora a polícia vai levar você presa! Você vai pagar pelo que fez! — outra voz gritou, e meu corpo gelou. O som das sirenes pararam. E meus olhos moviam dos paramédicos que levavam o homem para a ambulância, para o dois policiais que vinham em minha direção. — Precisamos que a senhora nos acompanhe à delegacia. — O quê? O outro policial, mais jovem, me olhou com desdém e mostrou às algemas: — A senhora é suspeita de avançar o sinal, causar um acidente grave que pode levar uma pessoa a óbito. Você precisa vir conosco. Olhei para o sangue no chão depois para as algumas em meus pulsos, e não contive as lágrimas. Eu tinha mesmo destruído minha vida em poucas horas. E agora eu tenho uma certeza, pela primeira vez em toda minha vida eu conheci o fundo do poço. Ele é frio e solitário.Hoje cedo, dei um beijo no meu noivo ao sair para trabalhar no meu sedã branco, encontrei Rachel para o almoço no salão de festas que contratei para a festa de casamento. Até aquele momento eu não podia imaginar que uma sequência de acontecimentos iam me trazer onde estou pondo os pés agora. Devia ter anoitecido em algum momento no trajeto até a delegacia, mas eu nem mesmo pude perceber, estava apenas sendo levada pela maré direto para o fundo. A ante sala da delegacia estava bem iluminada por um excesso de lâmpadas fluorescentes que pareciam refletores virados para mim. Ofuscando minha visão ao olhar para o policial que me algemou. Ele disse que eu teria que falar com o delegado de plantão e depois poderia ligar para alguém. Fui levada até o delegado, um homem robusto de meia idade com olhos cansados.Ele estava atrás de uma mesa bagunçada falando estridente com alguém no telefone. Assim que me viu ao lado do policial parado na porta, interrompeu a ligação.— Ótimo, encerrando o c
Abri os olhos, da pequena janela do quarto, o céu apareceu alaranjado ao nascer do sol. Estiquei-me sobre o colchão. Que noite horrível, meu corpo estava moído, eu precisava comprar uma cama urgentemente. Me sentei devagar, esfregando os olhos que deviam estar cheios de olheiras roxas em volta. Eram as consequências dos últimos acontecimentos. Levantei e tomei ar. — Chega, tenho coisas mais importantes para me preocupar. O apartamento estava um grande caos, caixas e alguns móveis que deviam ter ido pro lixo estavam pelos cantos. Olhei pela mesma janela mais uma vez, dava pra ver parte do rio. A rua tranquila e a vizinha antiga foi o que me cativou. Lembrei do dia que encontrei este apartamento, eu tinha acabado a faculdade e pouco dinheiro, e foi aí que o micro apartamento apareceu pra mim. Não podia ser mais perfeito que isso. Até hoje ainda era perfeito. Um pouco vazio e bagunçado, mas perfeito. Abri as portas do armário e encontrei algumas roupas que deveria ter doado. — Graç
O efeito da sedação deve passar em breve — explicou a enfermeira, empurrando a porta de vidro com um movimento suave. — Pode ficar por alguns minutos, só não o toque. Eu não prestei muita atenção no que ela dizia, a única coisa que tomava meus sentidos era a imagem do homem. Seus ombros largos e braços fortes imóveis na cama de hospital. Mesmo assim ele ainda tinha uma figura imponente, que, pra falar a verdade, não combinava em nada com o lugar. Mal podia acreditar que logo ele acordaria e descobriria que não vai lembrar da própria vida. Ele vai me odiar, me processar ou até tentar me matar. Ou tudo isso ao mesmo tempo. Droga! Senti o peso do meu corpo mudar de um pé para o outro e percebi que passei um longo momento ali, parada. Realmente, me mantive paralisada ao lado da cama que claramente não suportava o tamanho dele, mas não era isso que me mantinha concentrada. E sim a forma perfeitamente esculpida de um um homem de verdade, que fora capaz de hipnotizar até mesmo à mim —u
Mergulhei para fora do elevador como um raio. Na recepção, a enfermeira, Shirly, abriu um sorriso largo assim que me viu e deu a volta no balcão de informações. — Ei, Nora, ele está no quarto, — ela anunciou vindo na minha direção— antes, Dr Brown quer falar com você. Venha, vou levá-la até lá. — Há algum problema? Ela abriu uma porta e indicou com a mão para eu passar. — Não, nada. São apenas as orientações de cuidado. Cuidados? Dra Brown estendeu a mão para a cadeira e disse: — Sente-se, não vou tomar muito seu tempo. Só quero deixar algumas orientações. Quando eu continuei em silêncio ele disse: — Os curativos devem ser trocados diariamente e feito a limpeza do ferimento. Vou prescrever uma pomada para acelerar a cicatrização. — E... quanto à medicação? Eles imprimiu um papel. — São analgésicos e um antibiótico. Aqui estão doses específicas, e ele não pode esquecer de tomá-los nos horários certos, ok? — E se ele esquecer? — questionei nervosa Ele se inclinou
— Como alguém pode viver nisso? Revirei os olhos, ofegante. Escancarei ainda mais a porta para, Dean, o estranho desmemoriado entrar. Aparentemente o lugar não foi feito para alguém do tamanho dele, porque agora, o apartamento foi reduzido a um cubículo. Na sala havia um sofá novo, uma TV, uma mesa de escritório com uma pilha de livros que servia de mesa para o telefone no canto, e o básico na cozinha. Era o que me restava da minha vida antes de ter ido morar com Dean Carter. A minúscula janela na sala estava emperrada desde que voltei e o aquecedor estava quebrado, eram coisas que eu tinha que dar um jeito. E rápido. Me apressei, tirei uma caixa de tralhas de cima da mesa. Eu não tinha organizado todas coisas que Chayse trouxe, ainda tava uma bagunça. — Desculpe pela bagunça,— disse enquanto olhava em volta, sentindo-me um pouco envergonhada com a desordem que dominava o apartamento— Eu não tive tempo para nada. Dean me olhou de cima. Seu rosto angular e os olhos negros
Eu ainda estava parada desfazendo as sacolas quando ele voltou para o quarto. Sei que não tenho escolha. Dei minha palavra ao dr Brown. Isso significava que, mesmo contra minha vontade, eu teria que lidar com ele. Senti um calafrio na nuca quando a imagem dele apareceu na minha mente. É apenas um curativo, nada de mais. Me convenci. Peguei a sacola com os remédios, bandagem, pomadas e tudo que era preciso para o curativo e fui para o quarto. — Vou tirar a calça Virei-me imediatamente, quase engasgando com o ar.— O quê? — Você pretende fazer o curativo por cima da roupa? Minha boca se abriu para protestar, mas não soube o que dizer. Ele tinha que ter uma resposta para tudo? Sem esperar por mim, ele simplesmente começou a puxar a calça de moletom. Eu imediatamente me virei. — Vires-se, Nora. Ao mesmo tempo que ele falava a cama rangeu sob seu peso. Quando me virei, Dean estava sentado com o travesseiro estrategicamente posicionado para cobrir a cueca.Meu corpo reagiu estranhame
Pisquei algumas vezes, e vi a figura obscura de Dean, sentado numa cadeira na minha frente. Ele levou a xicara à boca.— Você está atrasada, Nora. — Ah, droga! Dei um pulo desajeitada, enroscando a perna nas cobertas e indo de cara no chão. Dean apenas arqueou a sobrancelha, sem mover um músculo para me ajudar.— Porquê não me acordou? — Resmunguei alto, mas não tinha tempo para orgulho ou reclamações. Disparei para o banheiro, me enfiei no chuveiro e tomei o banho mais rápido da minha vida. Vesti a primeira roupa que encontrei — uma camisa preta amassada e uma calça que talvez nem combinasse. Corri de volta para a sala enquanto tentava enfiar os pés nos meus sapatos, ao mesmo tempo em que lutava para dar um jeito no meu cabelo ondulado, que mais parecia um ninho de pássaros.— Não volto antes das dezoito então, se vira, ok? Dean me lançou um olhar que me fez ranger os dentes, ele estava mesmo gosando da minha cara? Era possível. — Meu número está na mesinha. — cuspi pegando minh
Depois que Rachel saiu, fui atingida pela minha própria culpa. Isso não tinha nada haver com nossa ida naquela sessão, e ela tinha toda razão quando dizia isso. Onde eu estava com a cabeça? Afastei os pensamentos que doíam cada vez mais toda vez que eu pensava e terminei meu trabalho. Intercalando entre pensar no estranho incrivelmente atraente na minha casa e Carter, viajando sabe-se lá com quem. Talvez esse fosse o motivo de ter se mantido afastado, Dean Carter, sempre colocaria o trabalho em primeiro lugar. Isso me dava tempo para reunir coragem para dizer tudo que quero quando nos encontrarmos. As luzes do lado de fora da galeria acenderam, meu turno acabou. Recolhi minhas coisas. Mas assim que peguei meu celular algo dentro da minha cabeça dizia para ligar para meus pais, eu evitava esse momento a todo custo a dias, mas não podia mais. Quanto mais rápido fizer, menos eu tenho que me preocupar. Rolei em minha lista e cliquei. Esperei enquanto o barulho se estendia até cair na c