Capítulo 7

Mergulhei para fora do elevador como um raio. Na recepção, a enfermeira, Shirly, abriu um sorriso largo assim que me viu e deu a volta no balcão de informações.

— Ei, Nora, ele está no quarto, — ela anunciou vindo na minha direção— antes, Dr Brown quer falar com você. Venha, vou levá-la até lá.

— Há algum problema?

Ela abriu uma porta e indicou com a mão para eu passar.

— Não, nada. São apenas as orientações de cuidado.

Cuidados?

Dra Brown estendeu a mão para a cadeira e disse:

— Sente-se, não vou tomar muito seu tempo. Só quero deixar algumas orientações.

Quando eu continuei em silêncio ele disse:

— Os curativos devem ser trocados diariamente e feito a limpeza do ferimento. Vou prescrever uma pomada para acelerar a cicatrização.

— E... quanto à medicação?

Eles imprimiu um papel.

— São analgésicos e um antibiótico. Aqui estão doses específicas, e ele não pode esquecer de tomá-los nos horários certos, ok?

— E se ele esquecer? — questionei nervosa

Ele se inclinou sobre a mesa, juntou as mãos e me encarou.

— Você esteve aqui todos os dias, ligou várias vezes para saber notícias, eu tenho certeza que lembrá-lo de tomar os remédios não será difícil.

Eu já tinha me conformado com isso.

— Tudo bem, dr. Mais alguma coisa que eu precise saber?

— Isto é só. — ele disse mais cauteloso — Nora, tenha paciência quanto à volta da memória. Eu vejo que há algo entre vocês, então tenha paciência.

Sai da sala com os papéis na mão. Algo entre nós? É, realmente há algo. Uma relação perfeitamente destrutiva entre uma ovelha e um lobo. Que absurdo. Levantei o olhar dos papéis e o vi. Ele está sentado, com os olhos estreitos e irritados olhando diretamente para mim. Vestia um moletom preto que dava ainda mais volume ao corpo esculpido em músculos.

Fui até ele e ao mesmo tempo ele levantou. Nossa, ele é alto. Fazia meus um e sessenta reduziram a nada. Me senti intimidada naquele breve momento de frente pra ele.

— Sou Nora…você se lembra?

Ele me encarou de um jeito tão atordoante que eu mesma pude ver meu rosto em seus olhos. Olhos serrados e nebulosos como um espelho negro.

— Devia lembrar?

Baixei os ombros e pensei brevemente numa resposta, mas foi Shirly quem falou.

— Está é Nora, ela esteve aqui desde o acidente. Você e ela são…

— Tudo bem, — eu disse interrompendo — nós precisamos ir.

Respirei aliviada. Graças a deus ela não terminou o que dizia. Eu mesma quero dizer sobre o acidente. Em algum momento eu criarei coragem para confessar que eu o atropelei, que eu sou a culpada em deixá-lo sem memória nenhuma.

Ela me entregou documentos da alta e fomos para o elevador. Havia uma tensão entre nós, era palpável, eu não estava confortável em estar sozinha ao lado dele dentro do elevador apertado. Ele parecia ocupar cada centímetros do espaço a ponto de eu sentir sua respiração no meu cabelo. Não pense, Nora.

Quando o uber parou em frente ao hospital ele prontamente entrou. Apesar da cara fechada eu percebi que o ferimento na perna doía quando andava. Entrei do outro lado sentindo-me quase claustrofóbica no carro. O que vou fazer com ele na minha casa? Preciso encontrar um jeito de encontrar alguém que o conheça, alguém da família. Merda, no que eu fui me meter?

Ele quebrou o silêncio

— Quem é você pra mim, Nora?

Engoli em seco, evitando seu olhar.

— Eu...sou uma pessoa próxima. Uma amiga.

— Amiga não é? Porque diabos estamos juntos nesse carro? Me ilumine, Nora.

Ele deu uma risada seca, esbanjando sarcástico. Minhas primeiras impressões dele eram exatamente o que esperava vendo sua imponência. Era rude, grosso e sem a menor ideia do que é gratidão. Mesmo que, no fim, eu tenha batido nele com o carro, eu merecia um, obrigado Nora.

Mantenha a calma. Nora.

— É uma longa história...

— Estou ouvindo.

Droga! Eu detesto mentira, mas assim será. Dessa vez eu o olhei de frente e disse:

— Você estava num bar, bêbado, levando um pé na bunda da sua namorada e…

Seus lábios inclinou-se para o lado num sorriso incrédulo.

— Sério? Mesmo com a minha memória toda fudida, Nora, custa acreditar que fui chutado.

Quão metido e cheio de ego esse cara podia ser? O sarcasmo começou a me deixar irritada, e eu só pensava em como eu conseguiria conviver com alguém assim.

O motorista olhou brevemente para mim pelo retrovisor. Notei que ele era jovem, com cabelos tingidos de loiro, quase raspado. Não combinava com seu trabalho.

— Porque, então eu estaria agora sequestrando um cara tão encantador como você? Me parece que a pancada na sua cabeça afetou seu senso de humor.

Ele virou a cabeça lentamente para encarar meus olhos como um imã que atrai para si.

— Encantador? Você sempre fala bonito assim?

Respirei fundo e olhei para frente. Mas porque estava demorando tanto para chegar no meu apartamento? Estamos andando em círculos, é isso?

— Você lembra seu nome, não lembra?

— Dean.

Imediatamente eu o olhei. Não pode ser. Era o que me faltava. Outro Dean na minha vida, não. Enquanto eu mergulhava em pensamentos o silêncio cai entre nós, carregado de tensão.

Nora, sua idiota! Porque decidiu levar esse homem pra casa. Eu sei a resposta na minha pergunta, era culpa. Apenas isso.

O motorista finalmente parou o carro em frente ao prédio. Paguei ao homem e saí do carro rapidamente, mas Dean levou mais tempo para sair, ainda com aquele olhar desconfiado.

— É ali, — disse apontando para o prédio à nossa frente — Eu moro no terceiro andar. Dá pra ver a varanda daqui.

Dean levantou os olhos sobre os cabelos negros seguindo a direção do meu dedo. Pela cara que ele fez, estava pensando o mesmo que eu. Como ele subiria ali?

Mordi o lábio inferior, encarando os degraus que teríamos que subir. Três lances de escada. Três malditos lances com ele desse jeito, mancando e claramente sem paciência. Comecei a andar de um lado para o outro, tentando bolar um plano. Talvez eu pudesse chamar alguém... Não, isso não daria certo. E se...? Não. Nada parecia uma boa ideia. Parei de andar e o encarei.

— Acho que a única opção é você se apoiar em mim.

Dean soltou uma risada baixa, e segurou o corrimão. Ele me lançou um olhar que fez o meu estômago revirar, talvez fosse irritação, sei lá.

— Você? Vai acabar nós dois no chão.

Fuzilei ele. Tudo bem que eu estou magra, e talvez tenha perdido mais algum peso nos últimos dias, mas dizer que não consigo? Quem ele pensa que é?

— Eu consigo!

Ele arqueou uma sobrancelha, o canto da boca puxado num sorriso cínico.

– Claro.

A raiva me fez agir antes que a lógica pudesse me impedir. Sem pensar muito, dei um passo até ele e passei seu braço sobre os meus ombros, segurando-o pela cintura para apoiá-lo. Sua envergadura quase me cobriu por inteiro.

Merda, ele é mesmo pesado.

No último lance minha mão estava escorregadia, tentei ajustar minha posição e, de repente, minha mão soltou o tecido do agasalho indo de encontro a pele quente e firme do seu abdômen. Estremeci.

Puxei a mão tão rápido que parecia que eu tinha tomado uma descarga elétrica.

— Desculpe.

Sacudi a cabeça, tentando me recompor, e continuei a ajudá-lo escada acima. Cada passo que eu dava parecia um teste de resistência, nem nos meus piores dias no pilates eu fui tão massacrada. Quando finalmente chegamos ao último degrau, eu estava ofegante e exausta.

Dean se sentou no pequeno banco da varanda, analisando o lugar com calma, mas eu sabia que ele estava sentindo dor. Só que ele não diria isso, nitidamente ele não é o tipo de homem que admitiria fraqueza. Isso tinha ficado claro.

Procurei as chaves na bolsa tentando recuperar o fôlego enquanto procurava.

— Eu tinha razão sobre você não aguentar.

Bufei, sei lhe dar atenção. Girei as chaves na fechadura, respirei fundo. A partir de agora, se você deixar esse homem sombrio entrar, não terá mais volta, Nora.

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