Meu olhar segue os passos de Ofélia enquanto ela sai do quarto, com os lábios apertados de frustração. Os empregados, que haviam assistido a situação à distância, parecem aliviados quando percebem que o clima tenso havia finalmente se dissipado. Um a um, eles saem em silêncio, fechando a porta do quarto da Olívia atrás de si. Solto um suspiro pesado, sentindo meus ombros relaxarem um pouco. Quando me viro para Olívia, encontro-a sentada no chão, seus olhos vidrados, perdidos em um ponto qualquer do chão de madeira. Seus dedos finos arranham a própria pele com uma leveza quase automática, um reflexo da angústia silenciosa que eu conhecia bem.
Sinto um aperto no peito ao vê-la assim, tão fragilizada e tão distante. O silêncio entre nós é denso, mas eu sabia que ela precisava desse tempo. Aproximo-me devagar, quase sem fazer barulho. Tiro o paletó e o jogo sobre a cama, me sentando ao lado dela no chão, o mais próximo possível. Sem pedir permissão, envolvo seus ombros com um braço, puxando-a delicadamente para junto de mim. Aquele gesto era o único consolo que eu podia oferecer naquele momento. Ela não esboça resistência, mas também não retribui o abraço. Sua cabeça encosta no meu ombro, e nós permanecemos assim, em um silêncio pesado, mas familiar. Fico pensando nas palavras certas para dizer, escolhendo cuidadosamente como abordar o que eu precisava falar sem pressioná-la demais. Finalmente, rompo o silêncio, a voz saindo suave: — Liv... — Começo, hesitante. — Tu sabes que não vou prolongar essa discussão, certo? Ela ergue lentamente o olhar para mim, seus olhos castanhos cheios de cansaço, como se já soubesse o que eu estava prestes a dizer. Ela não fala nada, mas aquele olhar bastava. Estávamos acostumados a nos comunicar assim, com um simples olhar, quando as palavras não pareciam suficientes ou eram difíceis demais de serem ditas. — Precisamos encerrar ciclos, Liv. — Continuo, com cautela. — Não podemos continuar assim. Já passou da hora de deixarmos isso para trás. Recomeçar em um lugar onde as coisas sejam melhores para nós. Fico em silêncio por um instante, observando suas reações, antes de soltar, quase num sussurro: — Minha proposta de morarmos juntos ainda está de pé. Ela desvia o olhar, mordendo levemente o lábio inferior, em dúvida. O silêncio se alonga, e eu espero pacientemente por sua resposta. Quando ela finalmente fala, sua voz sai baixa, quase um sussurro. — Eu não quero incomodar-te, Alex. — Diz ela, a hesitação clara em cada palavra. — O teu apartamento... o seu espaço. Eu não quero ser um peso. — Tu nunca serias um peso, Liv. — Respondo, imediatamente. — Muito pelo contrário. Eu adoraria ter tua companhia. O apartamento é grande, vazio e... sinceramente, é bem solitário sem ti por lá. Ela sorri de leve, um sorriso tímido, mas que ilumina o seu rosto. Esse era o sorriso que eu queria ver mais vezes, um lampejo da Olívia de antes, daquela que sempre encontrava um motivo para sorrir, mesmo nas situações mais difíceis. — Tu vais dormir aqui hoje? — Ela pergunta, a voz um pouco mais animada. — Sim. — Respondo, relaxando um pouco — Tenho que aproveitar que amanhã temos o leilão. Então, o que me dizes? Aceitas a minha proposta? Ela hesita novamente, brincando com os dedos, mas seu semblante revela que estava pensando seriamente sobre isso. — Eu preciso pensar um pouco mais. — Responde, com sinceridade. — É tentador, mas... ainda não sei se estou pronta para sair daqui. — Não há pressa. — Digo, suavemente. — Leve o tempo que precisar. Só quero que tu te sintas bem e segura, seja onde for. Acaricio seus cabelos antes de inclinar a cabeça e depositar um beijo suave na sua testa. Fico de pé e aliso as roupas, tentando afastar a sensação de peso que pairava sobre nós. — Vou te deixar descansar agora. — Falo, com um sorriso gentil. — O pai me pediu para resolver umas coisas, mas mais tarde podemos ver um filme, se quiser. O que achas? — Que tal os filmes do Tim Burton? — Ela sugere, com um brilho no olhar que não via há algum tempo. — Faz tempo que não assistimos. — Ótima escolha. — Digo, sorrindo. — Então, até mais tarde. Saio do quarto com um último olhar para Olívia, ainda sentada no chão, agora com uma expressão um pouco mais leve. Fecho a porta atrás de mim e dou alguns passos no corredor, mas paro abruptamente ao ver minha mãe vindo na minha direção. Seu andar é apressado, e a expressão dura em seu rosto deixa claro que não estava nada satisfeita. — A Olívia está aí? — Ela pergunta, sem rodeios. Faço que sim com a cabeça. — Ótimo. — Ela diz, ainda mais séria. — Ela precisa ouvir umas boas verdades. Estou farta dessas atitudes, Alex. Sabe o que aconteceu? Ela atacou a Ofélia! Sem motivo algum! Minha mãe tenta passar por mim, mas rapidamente bloqueio a porta, impedindo sua passagem. — Alex, me deixe passar. — Ela diz, a voz carregada de autoridade. — Eu sou sua mãe. — E eu sou o irmão dela. — Respondo, mantendo minha postura firme. — Ser minha mãe não te dá o direito de vir aqui e julgar a Olívia sem ouvir o lado dela. Sabemos como Ofélia pode ser provocativa, mãe. Ela me encara, chocada com minha resposta, como se não acreditasse no que eu estava dizendo. — Alex, isso não justifica. Ela a atacou! Violência não se resolve assim. — E eu concordo, mas também não podemos ignorar que Ofélia provocou. E se vamos resolver isso, tem que ser de forma justa, com as duas presentes. Você sabe que isso nunca acontece. — Insisto, minha voz mais firme do que antes. — Não podemos continuar com esse favoritismo. Se você quer justiça, tem que ouvir ambos os lados. Minha mãe cruza os braços, balançando a cabeça. — Ofélia é sensível, Alex. Ela não aguenta essas situações. Quero resolver isso sozinha. — Sensível? — Rio sem humor. — Mãe, Ofélia não é mais uma criança. Você a trata como se fosse frágil, mas ela sabe muito bem o que está fazendo. E lembre-se de uma coisa: Olívia também é sua filha. O silêncio entre nós se alonga enquanto ela me encara, os olhos escurecendo de frustração. Mas, no fim, ela não diz mais nada. Dá meia-volta e sai. Solto um suspiro pesado e encaro meu celular ao sentir a vibração de uma notificação. Uma mensagem de Olívia aparece na tela: "Obrigada, Alex." Passo a mão pelo rosto, exausto. Sabia que os próximos dias seriam desafiadores.Orion Global Enterprises é uma empresa multinacional que opera em diversos setores estratégicos, sendo referência em Tecnologia e Inovação; Energia e Recursos Naturais; Imobiliário e Construção; Finanças & Investimentos; Saúde & Farmacêutica e Agro-indústria. Com forte presença nos principais mercados globais, como China e Japão, a Orion Global Enterprises se destaca pela capacidade de inovar, expandir e integrar soluções de impacto, promovendo o desenvolvimento sustentável e a transformação de indústrias ao redor do mundo.Combinando expertise local com uma visão global, a empresa oferece produtos e serviços de alta qualidade, sempre buscando o equilíbrio entre inovação tecnológica e responsabilidade social. Agora, assim como meu pai fez comigo, é chegada a hora de passar essa responsabilidade de liderar para um dos meus filhos.Se eu pudesse escolher, seria Damien. Ele é focado, dinâmico e totalmente comprometido aos negócios, me lembrando dos meus anos de juventude. No entanto, ao
— Você vai participar dessa competição? Pergunto a Damien assim que saímos da sala de reuniões na nossa empresa.Ele para no corredor, ainda com os olhos presos aos documentos que segurava, mas logo ergue o olhar para mim. Seus olhos frios parecem me analisar, como se estivesse pesando cada palavra antes de falar. Esse é o estilo dele — sempre calculado, sempre um passo à frente, ou pelo menos ele acha que está.— Isso não é uma competição, Ethan — Ele responde, com o tom casual de quem faz uma constatação óbvia. — Para que fosse uma competição, seria necessário um adversário à altura. E você, definitivamente, não é um.O desprezo escorre nas palavras como veneno, e a tensão no ar é palpável. É um padrão em nossas interações: Damien sempre tenta me diminuir. Mas, desta vez, sinto uma neutralidade tomar conta de mim. Nossas relações nunca foram boas, e eu já deixei de me importar em tentar entender onde foi que as coisas começaram a se romper entre nós.— Se eu não fosse um adversári
Enquanto analisava os documentos da Elysium Holdings, tentando traçar uma estratégia para o acordo de distribuição, ouvi batidas leves na porta. Soltei um suspiro e coloquei a esferográfica de lado. Sem tirar os olhos dos papéis, respondi com uma voz baixa, mas firme:— Entre.Os passos elegantes que seguiam em minha direção eram familiares. Minha mãe entrou no escritório como quem já sabe que está no comando, com a postura impecável e um brilho característico nos olhos. Era aquele olhar que sempre significava problemas — ou, como ela preferia, “soluções”.— Pela sua cara, parece que não está feliz em me ver — Começou, balançando a cabeça levemente, como se minha expressão contrariada fosse um exagero.Me esforcei para manter a calma. Quando Celine Carter vinha até mim assim, cheia de confiança, significava que eu estava prestes a ser envolvido em mais uma de suas tramas. Respirei fundo e tentei manter a paciência.— Mãe, estou no meio de algo importante. Vá direto ao ponto, por favor
A noite passou em um breve estalo, e por um momento, quase esqueci o quão caótico havia sido o dia anterior. Meu pescoço dói, resultado de ter dormido numa posição desconfortável na cama. Abro os olhos lentamente e a primeira visão que tenho é de Alex, ainda adormecido ao meu lado. A televisão está ligada, o som baixo, e o filme parece estar no início, como se estivéssemos revivendo o mesmo ciclo de repetições. Não lembro ao certo quanto tempo ficamos acordados, mas certamente não foi muito.Levanto-me devagar para não acordá-lo e pego um cobertor para cobri-lo. Antes que eu possa fazer mais alguma coisa, a porta do quarto se abre bruscamente, revelando Constance, a governanta da casa.— A senhora Montenegro exige a sua presença no café da manhã. — Ela faz uma breve pausa, como se ponderasse se deveria dizer mais. — Imediatamente.Com a mesma rapidez com que entrou, Constance desaparece. Solto um longo suspiro, passando a mão pelos cabelos, ainda confusa com o dia que se inicia. Camin
Assim que acordo, sinto uma dor de cabeça latente, como se tivesse estado horas sob uma sensação de tortura. Faço uma careta ao tentar levantar da cama; ainda estou com as roupas da noite anterior. Ergo o pulso e vejo que são 4:30 PM de sábado. Sinto-me aliviado, porque hoje não tenho nenhum trabalho. Detesto ter que faltar com as minhas obrigações. Pego o celular e vejo várias chamadas perdidas da minha mãe. Suspiro fundo, já sabendo que, provavelmente, ela queria saber como foi o jantar com a filha da amiga dela. Aperto a tecla e deixo que seu número chame. Quando ela atende, não ouço seus gritos histéricos sobre as atualizações, apenas um:“Não se esqueça do leilão dos Montenegro, será dentro de horas.”Por um momento, eu tinha esquecido que hoje seria o leilão dos Montenegro. Olhei para as minhas vestimentas e lembrei que não tinha vindo de carro. Recolho meus pertences e faço o check-out antes de pegar o primeiro táxi para casa.Ao entrar, sou recebido pelos olhares julgadores da
Embora eu estivesse confiante de que me sairia bem durante o evento, o medo começou a tomar conta de mim assim que entrei no salão e vi a quantidade de pessoas no leilão. Meu coração disparou, as mãos tremiam levemente, e os meus pés pareciam querer vacilar a cada passo. Os olhares curiosos, os sussurros discretos, o som suave de música clássica ao fundo... tudo aquilo começou a se misturar numa cacofonia desconfortável, como se o mundo ao meu redor estivesse comprimido e me observando de perto. Era como se, de algum modo, eu estivesse fazendo algo de errado. Respirei fundo, tentando afastar o nó que começava a se formar no meu estômago, e continuei andando.Ao longe, meus olhos encontraram o olhar firme e crítico da minha mãe. Mesmo à distância, pude perceber que ela não estava nada satisfeita com o meu visual. Seu pedido havia sido simples: que eu deixasse o cabelo todo natural, sem as mechas loiras que eu insistia em manter. Provavelmente, aquilo a deixara furiosa. Para evitar que
— Mãe, você realmente vai deixar a Olívia participar do leilão? — pergunto, a indignação transparecendo na minha voz assim que ela fica sozinha após uma conversa com uma das convidadas. O sorriso dela é o mesmo de sempre, aquele que tenta me acalmar, mas que só serve para aumentar minha frustração.— Não tenho muito o que fazer, Ofélia. As nossas atrações tiveram um imprevisto e precisamos de uma substituição — responde, seu tom firme, mas não sem um toque de exaustão. Esse tipo de situação parece estar se tornando comum, e isso só me irrita ainda mais.Eu não posso acreditar que ela realmente acha que isso é aceitável. Olívia não merece esse tipo de chance. — Ela vai estragar tudo. — A minha voz se eleva.— Imagine se ela não for escolhida e atacar-me por inveja? Mãe, a Olívia me odeia porque você gosta de mim.A expressão de minha mãe muda ligeiramente, como se um feixe de preocupação cruzasse seu rosto. Mas logo, essa preocupação é substituída por uma frieza que não consigo entende
Minha curiosidade sobre o homem que conheci no jardim crescia a cada vez mais. Ele parecia conhecer pedaços de mim que eu mesma desconhecia, como se enxergasse através de uma cortina que bloqueava minhas memórias. Seus olhares, suas palavras, carregavam uma familiaridade que eu não conseguia ignorar, mas também não conseguia decifrar. A psicóloga dizia que a perda de memória era um mecanismo de defesa da mente após eventos traumáticos. Um jeito de lidar com algo que a consciência se recusava a aceitar. Mas isso nunca pareceu uma explicação completa. Era como se houvesse buracos na minha história, peças faltando em um quebra-cabeça que, mesmo incompleto, ainda me atormentava. Quando eu tentava lembrar, sentia como se minha mente estivesse presa em um labirinto, incapaz de encontrar a saída.No entanto, havia algo que eu sabia com certeza: aquele leilão era o último lugar onde eu queria estar. Detestava ser o centro das atenções, ser exibida como um prêmio, mas minha mãe insistiu para q