— Ofélia, eu quero perguntar mais uma vez, e quero que tu sejas sincera. — Minha mãe me encarou, e sua expressão era quase impassível, mas seu olhar não mentia. Era evidente que ela estava controlando um furor interno. — Você realmente sabia onde a Olivia estava?Eu respirei fundo, tentando controlar a raiva que começava a se formar dentro de mim. Como ela podia ser tão cega? Como podia me fazer sentir a vilã, quando tudo que fiz, fiz para atender às expectativas dela?— Sério que tu vais perder o teu tempo a questionar-me isso? — Revirei os olhos, já sentindo a paciência esgotar. — Sim, eu sabia onde ela estava. Satisfeita?Minha mãe estremeceu, mas manteve o olhar fixo em mim, como se estivesse esperando uma explicação, uma desculpa. Eu podia sentir a tensão no ar, o peso das palavras não ditas, a dor de um relacionamento quebrado entre nós duas.— Como tu podes ser tão maldosa assim? Ela é tua irmã! Tu poderias ter… — A voz dela tremia, mas havia mais culpa nela do que raiva. Eu sa
Não sei por quanto tempo fiquei sentada no carro, as mãos no volante, os olhos fixos no prédio do escritório de advocacia. O céu começava a nublar, e as pessoas passavam apressadas pela calçada, mas tudo parecia estático para mim. O peso de tudo que estava acontecendo na minha vida parecia ter me paralisado.Fechei os olhos e respirei fundo. Eu precisava me recompor. Precisava ser corajosa. Peguei as marmitas que preparei no restaurante e saí do veículo. Meus saltos ecoavam pelo piso brilhante do edifício enquanto funcionários conhecidos me cumprimentavam calorosamente, mas eu só conseguia murmurar respostas automáticas.No andar de cima, notei que a secretária do meu pai não estava em sua mesa. O silêncio no corredor parecia mais pesado do que o normal, mas continuei andando. Decidi que era melhor não esperar. Girei a maçaneta e entrei na sala.O que vi me fez congelar.Meu pai estava de pé, com uma mulher nos braços. Seus rostos estavam próximos, íntimos, e o beijo que eles comparti
Assim que Olivia me enviou uma mensagem dizendo que estava voltando para casa, senti um alívio imediato. Tentei me concentrar no trabalho, mas fui interrompido por uma ligação do segurança da casa. Atendi, e o que ouvi me fez perder completamente o controle. — Não deixem ela entrar. Tirem-na daí antes que minha esposa veja — ordenei com firmeza. Eu havia sido claro: ninguém deveria perturbar Olivia. Mesmo tentando focar no trabalho, uma inquietação crescia em mim, tornando impossível permanecer no escritório. Decidi sair mais cedo, ainda que houvesse muito a ser feito. Olivia era minha prioridade. — Parks, envie o restante do trabalho para mim. — Avisei, já me dirigindo à saída. Entrei no carro e dirigi o mais rápido que pude até a casa. Assim que cheguei, o silêncio absoluto me envolveu. Subi as escadas até o nosso quarto e a encontrei sentada no chão. Olivia usava uma camisola branca longa, o cabelo solto caía sobre os ombros, e seu olhar estava perdido no vazio. Um cheiro sutil
Eu segui Ofélia até a biblioteca em completo silêncio. Meu coração estava inquieto, mas minha mente estava ainda pior, completamente tomada por pensamentos desconexos. O que eu poderia dizer a ela? Como começar uma conversa que parecia impossível de se ter? A verdade era que aquela era a primeira vez, em anos, que tínhamos um momento de interação sem gritos, acusações ou olhares carregados de desprezo. A biblioteca era um ambiente silencioso e acolhedor, mas naquele momento o ar parecia pesado. As altas estantes repletas de livros formavam corredores intermináveis, e o cheiro de papel antigo se misturava ao perfume sutil que Ofélia usava. Assim que entramos, ela se dirigiu a uma cadeira próxima à janela, sentando-se de forma casual, como se tentasse não demonstrar a tensão que claramente sentia. Eu, por outro lado, me sentei na cadeira em frente a ela, ajustando a barra do meu vestido com dedos trêmulos. Sua expressão era difícil de ler. Os olhos dela, tão semelhantes aos meus, pare
A casa dos sonhos de Olivia e Damien era tudo o que um dia imaginaram, e talvez até mais. Situada em uma região tranquila, cercada por árvores frondosas e um extenso jardim colorido, o lar que construíram era cheio de vida e significado. Cada canto parecia contar uma história, cada detalhe carregava um pedaço do amor e da luta que os uniu. No jardim, os gêmeos Ian e Matteo corriam descalços, rindo alto enquanto perseguiam um ao outro. Ian, o mais destemido dos dois, liderava a brincadeira, fingindo ser um aventureiro em busca de um tesouro. Matteo, por outro lado, preferia observar antes de agir, mas nunca ficava muito atrás do irmão. — Matteo, rápido! O dragão vai pegar você! — gritou Ian, segurando um pedaço de graveto que imaginava ser uma espada. — Não! Eu sou o dragão, e você tem que correr! — Matteo respondeu, com as bochechas coradas de tanto rir. Enquanto os dois disputavam quem era o herói e quem era o vilão da brincadeira, Damien estava sentado em uma espreguiçadeira na
Carl Sagan disse uma vez que, se quisermos fazer uma simples torta de maçã, precisamos inventar o universo. Sim, uma simples torta requer esse processo todo. Quando ele fala sobre inventar o universo, refere-se ao início de tudo. Todas as coisas que conhecemos na vida partem de um início. Mas, para que existam começos, é preciso que fins sejam declarados. O que fazemos, então, quando nos encontramos presos em um ciclo vicioso? Como quebramos esse ciclo de uma vez por todas?Essa pergunta ecoa em minha mente sempre que estou diante de uma situação que exige uma resposta. Sinto que minha vida está presa nesse ciclo repetitivo: reclamar sobre o quanto sou controlada pelos meus pais e, no fim, ceder às suas imposições. Parece simples, mas há algo mais sombrio quando o que enfrentamos é uma relação de poder. Quando estamos à mercê de regras que não fomos nós que criamos, e cada tentativa de fuga é rapidamente sufocada.Eu costumava me refugiar no hipismo, a única coisa que me traz paz. Car
Assim que saio da sala de reuniões com as minhas tias, finjo que estou indo para outro cômodo, mas, ao ver o corredor vazio, corro silenciosamente até a porta para escutar a conversa entre minha irmã e mãe. O tapete felpudo do corredor abafa meus passos, e me posiciono atrás da porta de madeira maciça, sentindo o frio que emanava dela.As palavras de minha mãe ecoam pelo ambiente, como uma música já ensaiada várias vezes: criticar Olívia, apontar suas falhas, e exaltá-la à força para corresponder às expectativas de ser uma Montenegro. A minha mãe não cansa de usá-la como bode expiatório e, como sempre, sou eu quem sirvo de exemplo. A filha perfeita. Meu nome é invocado, como sempre. Eu, o espelho da perfeição. E Olívia... bem, ela nunca entenderá isso. Se ela não fosse minha irmã gêmea, eu diria que foi adotada, tamanha é a diferença entre nós.Um sorriso divertido brota em meus lábios quando ouço minha mãe mencionar como ela precisaria abandonar essa ideia tola de se esconder atrás
Meu olhar segue os passos de Ofélia enquanto ela sai do quarto, com os lábios apertados de frustração. Os empregados, que haviam assistido a situação à distância, parecem aliviados quando percebem que o clima tenso havia finalmente se dissipado. Um a um, eles saem em silêncio, fechando a porta do quarto da Olívia atrás de si. Solto um suspiro pesado, sentindo meus ombros relaxarem um pouco. Quando me viro para Olívia, encontro-a sentada no chão, seus olhos vidrados, perdidos em um ponto qualquer do chão de madeira. Seus dedos finos arranham a própria pele com uma leveza quase automática, um reflexo da angústia silenciosa que eu conhecia bem.Sinto um aperto no peito ao vê-la assim, tão fragilizada e tão distante. O silêncio entre nós é denso, mas eu sabia que ela precisava desse tempo. Aproximo-me devagar, quase sem fazer barulho. Tiro o paletó e o jogo sobre a cama, me sentando ao lado dela no chão, o mais próximo possível. Sem pedir permissão, envolvo seus ombros com um braço, puxan