Tempestade Perfeita

Tempestade PerfeitaPT

Ficção Científica
Marco Barbieri  Em andamento
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Resumo
Índice

Ao se ver ameaçada, Natasha foi obrigada a tomar uma decisão irrevogável. Lutar ou fugir? As consequências de sua escolha acabaram se provando letais para as pessoas mais importantes de sua vida. Isso fez com que ela se transformasse dramaticamente. Abandonou seu hábito de escrever; afastou-se de sua família; renunciou seus propósitos. Suas únicas companhias eram a culpa e as dúvidas: e se tivesse agido diferente? E se tivesse feito a escolha certa? Cinco anos se passam com o peso de décadas. Quando elementos do passado voltam à tona, as emoções sufocadas pelo tempo irrompem. Uma reviravolta implausível coloca Natasha numa inesperada situação: ela desperta num universo que não lhe pertence. Não demora muito para que perceba estar vivendo a vida de outra pessoa — da Natasha que ela mesma seria caso, cinco anos atrás, tivesse tomado a decisão certa em vez de a errada. Tudo está perturbadoramente diferente. Em busca de uma explicação, Natasha descobre que a versão alternativa de si própria guarda segredos obscuros. Por conta deles, ela se torna alvo fácil para os perigos presentes nessa realidade paralela. Agora ela precisa desvendar os mistérios que tiveram início na fatídica noite em que tomou sua decisão mais difícil... antes que seja tarde.

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Prólogo: Folie à Deux - I
Abril de 2011 O começo foi o que, mais tarde, eu chamaria de “princípio do fim”. Inícios são despretensiosos, como filmes de animação infantil que nos fazem chorar no final. Não avisam o que são. Se os notarmos, é porque talvez já tenhamos alcançado o meio da narrativa. Eles geralmente pertencem ao passado; e nós, ocupados com outras coisas, temos sorte quando conseguimos capturá-los pouco depois de terem chegado para modificar tudo.Era dia de semana. A voz do professor de filosofia lá na frente soava hipnótica:— Podemos concluir que, segundo Marx, mesmo o pior dos tecelões supera a melhor das aranhas, uma vez que a teia tecida por ela é feita sempre da mesma maneira, sem o recurso da reflexão, enquanto o homem tem a capacidade autônoma de ponderar sobre a realização d
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Prólogo: Folie à Deux - II
Naquela noite, Leon foi embora com o caderno carregado de anotações e a cabeça cheia de idealizações. Tínhamos razões para nos vermos outras vezes, e, sem que ao menos pensássemos nelas, assim fizemos.Em sua terceira visita à minha casa, no final de maio, trouxe com ele uma porção de materiais: cartolina, caixas de papelão, canetas hidrográficas, blocos de post-it, fita adesiva e alfinetes. Enquanto ia tirando tudo das duas mochilas que carregava, eu questionava se aquilo já não era exagero.— Ideias são só ideias até que eu possa tocar nelas — explicou.E, durante horas, criamos um trabalhoso outline. No início, tudo era uma bagunça, e eu só conseguia pensar no tempo que me custaria limpar os restos picotados de papelão que voavam para baixo dos móveis. Depois, comecei a v
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Prólogo: Folie à Deux - III
Alguns fatos: eu precisava de um banho; Ariel não convenceria ninguém de que não havia bebido. Não poderíamos voltar para casa nessas circunstâncias.A princípio, a ideia era nos enfiarmos cada um em seu respectivo quarto enquanto minha mãe ainda dormia, mas após esperar o ônibus por mais de uma hora, demo-nos conta de que talvez já fosse muito tarde para que esse plano desse certo. Minha mãe costumava se levantar cedo, mesmo nos fins de semana.Quando Leon sugeriu que fôssemos para a casa dele, de verdade dessa vez, não me pareceu má ideia — aliás, seria um alívio não ter que me despedir dele ainda, por mais cansada que eu estivesse.Eva, satisfeita com sua missão cumprida, tomou seu próprio rumo. Ariel e eu acompanhamos Leon no ônibus para o outro lado da cidade. Encostada na janela, eu podia ver o arvoredo passan
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Prólogo: Folie à Deux - IV
— Estou avisando. Espere lá fora — ordenou a enfermeira pela segunda vez desde que Leon e eu havíamos entrado na enfermaria da universidade. Ela não soava autoritária, apenas seguia o protocolo. Cruzei os braços, resistindo ao comando.Após os socos trocados, eu acompanhara um dos seguranças carregar Leon pelo braço até aquela ala da enfermaria. Agora o homem esperava do lado de fora, para garantir que a próxima parada de Leon fosse a sala da coordenadoria de ensino, para onde seria levado assim que a enfermeira terminasse de cuidar de seus ferimentos. Quanto a Gaspar, eu não sabia onde estava.A mulher havia estudado meu rosto esbofeteado, mas pedi que se focasse em Leon. Eu estava bem.A enfermaria era toda de um branco doentio. Tinha bem mais macas do que necessário e apenas uma funcionária, provavelmente estagiária do curso de Enfermagem, para recebe
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Prólogo: Folie à Deux - V
A semana seguinte veio sem que eu trocasse palavra com Eva, e assim ocorreu até início de junho. Eu me sentia uma idiota pensando que éramos tão próximas. Costumávamos fazer planos de terminar a faculdade e tentar emprego no jornal de Santa Alice, o Diário Catedral; seríamos companheiras de profissão e amigas de longa data. Pelo visto, se ela continuasse com aquela atitude, o futuro teria que ser diferente.Infelizmente, eu também não vinha passando muito tempo com Leon. Quando ele foi passar sua folga na minha casa, acabou dormindo pesadamente sem que tivéssemos a chance de conversar ou aproveitar um tempo juntos. Não tinha denunciado Gaspar, nem ao menos mencionava o ocorrido no banheiro; era como se nunca tivesse acontecido. Tudo o que fiquei sabendo era que a universidade tinha anotado o nome dos dois para que, caso houvesse outra ocorrência como aquela, ambos tivessem a matr&
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Prólogo: Folie à Deux - VI
A hora seguinte veio feito um tufão. Eu agia, não sabia como ou se fazia certo. Só agia.Quando parei o carro na frente do Hospital Memorial de Santa Alice, funcionários vieram com aparatos e macas. Não desci do carro, não abri a porta, não ousei olhar para o lado outra vez. Talvez tivéssemos tempo de salvá-lo, mas eu não queria checar. Se olhasse, poderia descobrir que era tarde demais.O auxílio chegou. Abriram as demais portas. O vidro danificado despencava, enquanto muitos pares de pés pisavam sobre ele. Eva chorava muito alto. Fechei os olhos e me agarrei ainda com mais força ao volante. Enquanto precisara dirigir até ali, sentira que havia algo que pudesse ser feito, mas, agora que tinha parado, tudo o que queria era negar a realidade. Pensei em voltar a acelerar, mas já não dava para continuar fugindo.Quando finalmente olhei para fora, vi dois
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Parte Um: Entre a Morte e o Louco - VII
Agosto de 2018 Olhei mais uma vez o relógio sobre a estante. Mais um minuto havia se passado. Um minuto desde que eu verificara as horas da última vez, e isso parecia ter acontecido cinco minutos atrás.— … mas, tirando isso, estou bem — falei, concluindo meu raciocínio.As séries de televisão por muito tempo me convenceram de que haveria um divã quando eu finalmente me consultasse com um profissional, mas não havia. Em vez disso, eu me sentava todas as quartas-feiras numa cadeira de alumínio fria, diante de uma mesa de escritório comum, e esperava os quarenta e cinco minutos passarem.A senhora do outro lado sorriu, e eu a imitei.— Posso ver pelo seu semblante que está mesmo.O consultório deveria ser acolhedor. Por vezes eu desejava que não entrasse tanta luz por entre as corti
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Parte Um: Entre a Morte e o Louco - VIII
Quando meu chefe apareceu, no dia seguinte, com uma prancheta na mão no meio do escritório, todos pararam suas atividades e voltaram sua atenção a ele. Conrado não era um homem de aparência imponente, era baixo e relativamente jovem, e a barba em seu rosto era rala como a de um adolescente. Nada disso o desencorajava; ele usava calças apertadas, sapatos de solas altas e cinto no estilo caubói do velho oeste. Havia um certo charme na junção de tudo aquilo.— Temos alguns clientes novos investindo conosco este mês. Aqueles de vocês que não estiverem tendo problemas com deadline podem manifestar sua preferência — anunciou ele.Cruzei os braços e relaxei na cadeira. Conrado costumava sair de seu escritório particular e vir divulgar em voz alta a relação dos nossos novos clientes; isso só acontecia quando um número gran
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Parte Um: Entre a Morte e o Louco - IX
De manhã, minha mãe insistiu que eu tomasse café consigo. Preparava torradas na cozinha enquanto eu me vestia. Quando me sentei à mesa para esperar, percebi que seu humor não estava muito bom. Geralmente ela cantarolava alguma música gospel ou assobiava; dessa vez, estava totalmente em silêncio.— Natasha, hoje estou de folga. Vou levar seu irmão para a fisioterapia e passar no mecânico à tarde. Depois vamos os dois à igreja. Gostaria de vir conosco?Esse era o tipo de pergunta que há muito tempo eu já não precisava responder.— Não, obrigada.Ela tirou as torradas da sanduicheira e colocou uma diante de mim.— Minha filha, você sabe o quanto é importante tratar da alma. — Era um conselho, mas seu tom autoritário fazia com que parecesse uma ameaça. — Você deve ir. Orar pelos seus pecad
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Parte Um: Entre a Morte e o Louco - X
Ao chegar em casa, tentei subir as escadas fazendo o mínimo de barulho possível, não queria ter que encarar minha família agora, pois pretendia esconder os últimos acontecimentos por algum tempo. Para meu azar, Ariel surgiu no topo da rampa, olhando-me com estranhamento.— O que está fazendo em casa a esta hora?Parei imediatamente. Pega no flagra, soltei uma expressão de susto.Eu havia pensado muito durante o trajeto de ônibus; pensara no que diria, se eu deveria passar algumas horas pelo centro de Santa Alice a fim de chegar em casa no horário de costume. No fim, escolhera me recolher no meu quarto, ponderar sobre o que estava por vir.Era tarde demais, de todo modo, para passar despercebida. Minha mãe veio da cozinha para a sala, secando as mãos num pano de prato.— Natasha?Seu olhar inquisitivo reproduzia o questionamento de Ariel. Eu poderia dizer
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