A luz fria e intensa do hospital iluminava o quarto onde minha mãe estava internada. O cheiro de desinfetante e a batida distante de equipamentos médicos criavam uma atmosfera pesada. Eu me aproximei da cama, e um nó se formou na minha garganta ao vê-la deitada ali, tão vulnerável. As cobertas brancas contrastavam com sua pele pálida, quase translúcida. Um ventilador girava lentamente no canto, mas sua presença não trazia alívio ao calor que queimava dentro de mim.
— Oi, minha linda, — ela disse com um sorriso cansado, mas cheio de amor. Era um sorriso que sempre me fez sentir que tudo ficaria bem, mesmo em meio a tempestades.
— Oi, mamãe. — Sentei-me na beira da cama, segurando sua mão. Ela estava tão leve, como se a vida estivesse lentamente esvaindo-se dela. O toque de sua pele ressecada e quente era um lembrete cruel da fragilidade que agora dominava nossa realidade.
— Como você está se sentindo hoje? — perguntei, tentando esconder a preocupação em minha voz.
— Ah, você sabe, um dia de cada vez. — Sua voz era suave, como se quisesse me proteger das preocupações que a rodeavam. — Mas não se preocupe comigo. Eu só quero que você pense em seu futuro, Isabella. Não se sacrifique tanto por minha causa.
As palavras dela ecoaram em minha mente, e imediatamente um flashback tomou conta dos meus pensamentos. Eu era uma criança, correndo ao redor do quintal em um dia ensolarado. A brisa leve balançava meu cabelo, e o sol aquecia meu rosto. Minha mãe estava lá, de pé, com os braços abertos, pronta para me receber em um abraço caloroso.
Sempre foi ela quem me deu apoio, quem me ensinou a ser forte. A lembrança da sua risada, clara e vibrante, era um bálsamo para minha alma.
— Mamãe, você sempre foi meu pilar. Eu não consigo imaginar minha vida sem você. — A emoção transbordou, e minhas palavras saíram quase em um sussurro.
Ela apertou minha mão, seus olhos brilhando com lágrimas contidas.
— Você é mais forte do que imagina. Tem um futuro incrível pela frente, e não quero que você coloque sua vida em espera por mim. — Ela estava tentando ser forte, mesmo quando a fraqueza a dominava. Mas a força dela me fazia sentir ainda mais impotente. Como eu poderia deixar de lutar por ela?
Eu olhei para os monitores que apitavam ritmadamente, cada bip uma lembrança de que o tempo estava passando, e que eu não podia perder um único momento.
— Eu não sei como fazer isso, mamãe. — Minha voz tremeu. — Você é tudo o que eu tenho.
A porta se abriu e o médico entrou, trazendo uma gravidade que fez meu coração afundar. Ele olhou para nós com uma expressão que não prometia boas notícias.
— Isabella, precisamos conversar. O estado da sua mãe está se deteriorando. O tratamento que estamos recomendando é eficaz, mas é caro.
As palavras dele ecoaram em minha cabeça como um sino alarmante. Eu sabia que, além da dor emocional, havia uma pressão financeira esmagadora pairando sobre mim.
— Quanto custa? — Perguntei, tentando manter a voz firme, mas uma onda de desespero estava se formando dentro de mim.
— Cerca de... — Ele hesitou, olhando para a tela do computador, como se estivesse pesando suas palavras. — Cerca de trezentos mil reais.
A realidade da situação me atingiu com a força de um soco no estômago. Eu não tinha esse dinheiro. O que eu poderia fazer? O que eu estava disposta a fazer? Uma mistura de raiva e impotência tomou conta de mim.
— Eu farei o que for preciso, — murmurei, mais para mim do que para ele. O olhar de minha mãe, suave e amoroso, se manteve firme em mim, como se ela pudesse sentir a tempestade que se formava em meu coração.
— Você não precisa fazer isso sozinha, — ela disse, sua voz agora uma mistura de preocupação e amor. — Eu sempre estarei aqui, Isabella. Você não precisa carregar o mundo nos ombros.
Mas eu já sentia que estava fazendo isso.
— Eu... — As palavras falharam. Como eu poderia explicar que sua vida significava mais para mim do que qualquer outra coisa? Que eu estava disposta a sacrificar tudo, até mesmo meus sonhos, para mantê-la viva?
A pressão se acumulava em meu peito, e eu me levantei abruptamente, dando um passo para trás, sentindo a necessidade de respirar fundo. O médico continuou a explicar os detalhes do tratamento, mas sua voz soava distante. Era como se eu estivesse assistindo a um filme, incapaz de processar a realidade que se desenrolava diante de mim.
— Isabella, — ele disse, sua expressão séria, — preciso que você pense bem sobre isso. O tratamento pode trazer resultados, mas a situação é crítica. O tempo é um fator muito importante aqui.
— Eu entendi, — respondi, embora, no fundo, eu não tivesse certeza de nada. Como eu poderia decidir entre a vida da minha mãe e a minha própria sanidade? O que eu deveria fazer?
Eu olhei para minha mãe, e ela me ofereceu um sorriso encorajador, mas sua fraqueza era palpável. A luta dela para manter-se forte era visível em cada linha de seu rosto. O amor que eu sentia por ela era tão profundo que parecia atravessar a sala, preenchendo o espaço entre nós.
— Mamãe, você sabe que eu farei qualquer coisa. — Eu precisava que ela soubesse, que ela não se sentisse sozinha nessa batalha. — Eu não posso perder você.
Ela fechou os olhos por um momento, como se estivesse absorvendo o peso da minha declaração.
— Eu quero que você viva, Isabella. Prometa-me que você não vai deixar que isso a consuma. — Sua voz estava trêmula, e eu podia ver a luta interna dela. Era como se ela estivesse tentando não apenas lutar por si mesma, mas também por mim.
As palavras dela reverberaram em meu coração, criando uma tempestade de emoções. Como poderia eu pensar em mim mesma quando o futuro dela estava em jogo? Como poderia ser egoísta em um momento como esse?
— Eu não consigo prometer isso, — respondi, as lágrimas escorrendo pelo meu rosto. — Eu só quero que você fique comigo.
O médico interrompeu nosso momento, observando o peso da situação. Ele provavelmente estava acostumado a esses dramas emocionais, mas para mim, cada segundo contava como uma eternidade.
— Preciso que você considere o financiamento, Isabella. Existem opções, mas elas exigirão que você aja rápido. — Ele me entregou um folheto com informações sobre doações e fundos que poderiam ajudar.
— Obrigada, doutor, — eu disse, mas a gratidão parecia inadequada diante da gravidade da situação. Ele saiu do quarto, e o silêncio tomou conta de nós novamente.
— Eu não sei o que fazer, mamãe. — O desespero em minha voz era evidente.
— Vamos enfrentar isso juntas. — A determinação dela iluminou o quarto, e eu sentia que, mesmo em sua fragilidade, ela ainda era minha força.
— O que você quer que eu faça? — perguntei, desejando que houvesse um caminho claro à frente.
— Apenas viva, meu amor. Prometa-me que você não deixará que isso a destrua. Você tem tanto potencial. — Suas palavras eram como uma lâmina afiada, cortando a névoa de medo que me cercava.
— Eu prometo. — Essa promessa era mais do que uma palavra vazia; era um compromisso que eu faria com todas as minhas forças.
E assim, naquele quarto gelado do hospital, a conexão entre nós se fortaleceu. Mesmo em meio ao medo e à incerteza, eu sabia que não estava sozinha. Minha mãe era a luz que ainda brilhava em meio à escuridão, e eu estava disposta a lutar por ela, não importa o custo.
Points Of View Leonardo FerrazObservei a cidade do alto do meu escritório, cercada por vidros e concreto. O sol poente refletia em meus olhos frios enquanto meus advogados se revezavam para explicar os termos do testamento de meu pai. Cada palavra parecia uma marretada em minha mente, e eu não estava preparado para isso.— Então é isso? Eu tenho que me casar para manter o controle da empresa? — perguntei, com uma pitada de cinismo. O advogado à minha frente, o velho Sr. Braga, ajeitou os óculos enquanto mexia nos papéis à sua frente.— Exatamente, senhor Leonardo. A cláusula no testamento de seu pai é bem clara. Caso não contraia matrimônio dentro de seis meses, o controle acionário da empresa passará para o seu meio-irmão Ricardo — ele explicou calmamente, como se estivesse falando de algo trivial, quando na verdade estava colocando meu futuro em xeque.Ricardo. Só de ouvir o nome dele meu estômago se revirava. O oportunista, sempre à espreita, esperando que eu cometesse um deslize.
Points Of View Isabella RossiO som dos monitores e o cheiro de desinfetante hospitalar pareciam impregnados na minha pele. Minha rotina tinha se tornado uma série de idas e vindas ao hospital, somada às preocupações financeiras que só aumentavam. Minha mãe, sempre otimista e cheia de vida, agora se recuperava lentamente em um leito hospitalar, e, a cada dia, eu sentia que estava perdendo um pouco mais dela.Olhei para o relógio: meu turno começaria em uma hora. As contas não paravam de chegar, e o tratamento dela era caro demais para o meu salário cobrir. Eu já tinha vendido praticamente tudo que possuía e não sabia mais a quem recorrer. Meu trabalho atual, embora importante, pagava pouco, e as oportunidades pareciam sempre fora do meu alcance.Meu emprego na Meridiana Consultoria já estava por um fio, assim como a própria empresa. Sabíamos que os dias estavam contados; os atrasos nos pagamentos e a falta de novos projetos eram sinais claros de que a situação era grave. A equipe já e
Ao abrir a porta do meu apartamento, o cheiro familiar da madeira e do ar condicionado se misturou com a realidade sombria que havia me acompanhado desde a reunião com Leonardo Ferraz. O apartamento, embora modesto, era um refúgio. No entanto, aquela noite não seria suficiente para me afastar da tempestade emocional que se abatia sobre mim.O som do meu celular vibrando na mesa da cozinha interrompeu meu turbilhão de pensamentos. Pedro, meu amigo e colega de trabalho, estava ligando. Sempre alguém em quem eu podia confiar, sua presença era uma âncora em tempos de incerteza.— Oi, Pedro. — Minha voz soou mais trêmula do que eu esperava. Eu tentei disfarçar a apreensão que estava crescendo dentro de mim.— Isabella! O que aconteceu? Você parece preocupada — ele respondeu, a preocupação evidente em seu tom.Respirei fundo, tentando organizar as ideias antes de explicar a proposta absurda que me foi apresentada. A dor que senti ao reviver aquele momento era quase palpável, mas eu sabia qu
Enquanto observava minha mãe deitada na cama do hospital, as máquinas ao redor dela monitorando cada respiração, uma série de pensamentos começaram a se formar na minha mente. As luzes fluorescentes do quarto criavam um ambiente opressivo, e cada batida do meu coração parecia ecoar a realidade sombria que enfrentávamos. Eu não conseguia me afastar da proposta que Leonardo Ferraz havia me feito. A ideia de aceitar um casamento sem amor me deixava enjoada, mas a necessidade de segurança financeira me deixava dividida.Pensei em minha mãe. Ela sempre foi o pilar da minha vida, a mulher que me ensinou a valorizar a dignidade acima de tudo. Lembro-me das longas conversas que tivemos, quando ela me dizia que amor e respeito deveriam ser os alicerces de qualquer relacionamento. Como eu poderia olhar para ela nos olhos e dizer que estava considerando uma transação tão fria e sem alma? Mas, por outro lado, como eu poderia ignorar a gravidade da situação que estávamos vivendo?O tratamento dela
A luz da tarde entrava pela janela do meu pequeno apartamento, filtrada por cortinas desbotadas que há tempos não eram trocadas. O silêncio era quase ensurdecedor, uma constante lembrança da falta de movimento na minha vida. Ouvia apenas o som do meu próprio coração acelerado, batendo forte contra o peito, enquanto tentava processar a proposta de Leonardo Ferraz e o que isso significava para mim.A pressão emocional começou a se acumular, como se estivesse carregando o peso do mundo sobre meus ombros. A imagem da minha mãe no hospital se sobrepunha a tudo. Seu sorriso, uma luz que sempre me guiou, agora estava apagado, e a preocupação em seu olhar me atormentava. Lembrei-me de nossas conversas, de como ela sempre dizia para eu pensar no futuro, para não deixar que os problemas do presente me dominassem. Mas como eu poderia fazer isso agora? A saúde dela estava em jogo, e as minhas finanças estavam em ruínas.Pensei na proposta de Leonardo, naquele "casamento" que não passava de uma tr
Na manhã seguinte, levantei-me mais cedo do que o habitual. O sono me escapara completamente, mas minha decisão estava firme. Eu não podia mais perder tempo; a vida da minha mãe dependia de uma escolha que eu jamais imaginei ter que fazer. Olhei para o telefone em minha mão, os dedos levemente trêmulos, e decidi que Pedro precisava saber.Atravessar essa situação sozinha parecia impossível, e Pedro, com toda sua honestidade e amizade, poderia me ajudar a ter certeza de que eu estava tomando a decisão certa — ou, ao menos, me ajudar a suportá-la.Respirei fundo e disquei o número. Ele atendeu no segundo toque, como se estivesse esperando por isso.— Isa? Tudo bem? — A preocupação estava clara na voz dele, e eu podia imaginar seu rosto franzido.— Pedro, eu decidi... — minha voz saiu baixa, quase um sussurro. Respirei fundo e repeti, agora com mais firmeza. — Eu vou aceitar.Houve uma pausa do outro lado da linha, um silêncio carregado de incredulidade e desapontamento.— Isabella... vo
A caneta parecia pesar uma tonelada entre meus dedos, mesmo com minha mão já sobre o papel. Assinar aquele contrato representava muito mais do que uma simples formalidade; era um ponto de ruptura na minha vida. Eu me vi suspirando fundo e, então, numa última tentativa de bloquear toda a frustração e a revolta que surgiam em meu peito, coloquei meu nome, traçando a assinatura com uma mistura de raiva e resignação.Leonardo, por sua vez, me olhava com um controle glacial, como se estivéssemos apenas finalizando uma compra qualquer. Sua indiferença era um lembrete constante de que, para ele, eu era apenas uma peça em seu jogo. Para ele, um casamento não passava de um acordo de negócios e, se não fosse pelo último desejo do pai, ele jamais se sujeitaria a algo assim. Quando o advogado finalmente pegou o contrato, senti um misto de alívio e um peso sufocante.— Agora está feito, — disse ele, com um leve sorriso de satisfação. — A partir de amanhã, você se mudará para a cobertura que provid
Points Of View IsabellaO relógio da parede parecia zombar de mim, os ponteiros arrastando-se como se soubessem que eu não tinha pressa de encarar o que vinha depois do expediente. As horas naquele escritório pareciam mais longas do que nunca. A cada clique do mouse, cada e-mail enviado, mais um pedaço da minha alma se desgastava. Trabalhar naquela empresa há tanto tempo me dava a sensação de estar presa em uma teia, incapaz de escapar e sem saber para onde ir. O trabalho em si nunca foi o problema, mas a falta de reconhecimento, de propósito... era sufocante. Eu me esforçava, fazia tudo certo, mas no final do dia, parecia que nada importava.Suspirei profundamente, afastando o olhar da tela do computador. Meus olhos ardiam de cansaço, mas não era apenas isso. Era um cansaço que ia além do físico, era emocional, mental. A empresa estava em colapso, e eu, por mais dedicada que fosse, não conseguiria salvar um navio que já estava afundando. Sabia que os dias estavam contados, tanto para