Capítulo 4

Points Of View Isabella Rossi

O som dos monitores e o cheiro de desinfetante hospitalar pareciam impregnados na minha pele. Minha rotina tinha se tornado uma série de idas e vindas ao hospital, somada às preocupações financeiras que só aumentavam. Minha mãe, sempre otimista e cheia de vida, agora se recuperava lentamente em um leito hospitalar, e, a cada dia, eu sentia que estava perdendo um pouco mais dela.

Olhei para o relógio: meu turno começaria em uma hora. As contas não paravam de chegar, e o tratamento dela era caro demais para o meu salário cobrir. Eu já tinha vendido praticamente tudo que possuía e não sabia mais a quem recorrer. Meu trabalho atual, embora importante, pagava pouco, e as oportunidades pareciam sempre fora do meu alcance.

Meu emprego na Meridiana Consultoria já estava por um fio, assim como a própria empresa. Sabíamos que os dias estavam contados; os atrasos nos pagamentos e a falta de novos projetos eram sinais claros de que a situação era grave. A equipe já estava reduzida ao mínimo, e muitos colegas haviam partido, deixando um clima de incerteza e tensão no escritório. O que me mantinha lá eram as contas intermináveis e, principalmente, a esperança de garantir o tratamento da minha mãe.

Sentada no ônibus, peguei meu celular para conferir e-mails, esperando receber alguma resposta positiva das diversas vagas para as quais havia me candidatado. Era algo que eu fazia com frequência: enviar currículos e esperar que alguma empresa pudesse me dar uma chance. Minha mente estava em um turbilhão quando vi uma nova mensagem na minha caixa de entrada, vinda de uma empresa desconhecida.

"Srta. Isabella,

Recebemos seu perfil por meio de nossa equipe de contatos e gostaríamos de discutir uma proposta profissional que acreditamos ser vantajosa para ambos. Nossa reunião será no Hotel Firenze, às 14h, com o Sr. Leonardo Ferraz.

Atenciosamente,

Equipe de Recrutamento.”

Leonardo Ferraz. O nome era familiar: o poderoso empresário e CEO de um dos maiores conglomerados do país. Por mais vaga que fosse a proposta, parecia uma oportunidade de ouro. Se ele me achava qualificada para uma posição, mesmo com a situação caótica da minha empresa, eu precisava considerar. Às 14h em ponto, eu estava no hotel.

Dois dias depois do convite, lá estava eu, parada na frente de um dos hotéis mais sofisticados do centro da cidade. Olhei para os detalhes luxuosos da fachada, tentando controlar a respiração. Esse não era o tipo de lugar onde eu costumava estar. O convite misterioso mencionava uma oportunidade de trabalho e incluía o nome de um homem importante: Leonardo Ferraz. Talvez essa fosse a chance que eu tanto precisava.

Entrei no saguão e me deparei com uma decoração que parecia digna de um palácio. Tudo ali exalava luxo, desde as colunas de mármore até os lustres de cristal. Escolhi uma poltrona próxima à janela e esperei. Minhas mãos estavam úmidas de nervosismo, e meu coração batia acelerado. Sentia que todos os olhares se voltavam para mim, mas provavelmente era só a ansiedade tomando conta.

Enquanto esperava, meus pensamentos se voltavam ao motivo que me trouxe até ali. Com minha mãe internada e a empresa onde eu trabalhava à beira da falência, qualquer oportunidade de trabalho seria um alívio bem-vindo. Mas, quanto mais eu olhava ao redor e via o luxo quase intimidante, mais me perguntava o que um empresário tão poderoso como Leonardo Ferraz poderia querer com alguém como eu.

Um movimento do outro lado do saguão me tirou dos pensamentos. Quando levantei a cabeça, vi um homem elegante e confiante se aproximando, e percebi imediatamente quem ele era. Leonardo Ferraz. Ele tinha uma presença impressionante, quase magnética, e parecia atravessar o ambiente como se todos os outros fossem apenas coadjuvantes. Quando chegou até mim, parou e me olhou com um ar avaliador.

— Isabella Rossi? — disse ele, com a voz firme e decidida. — Sou Leonardo Ferraz, muito prazer.

Levantei-me apressada, tentando parecer confiante, embora minha ansiedade estivesse visível em cada gesto. Apertei a mão dele, que estava fria e firme, enquanto meu coração disparava.

— É um prazer conhecê-lo, senhor Ferraz. Agradeço por me receber — respondi, forçando um sorriso educado.

Ele me observou por um momento, um olhar calculista e distante, antes de fazer um sinal para que eu o seguisse. Caminhamos até uma sala mais reservada, longe do movimento do saguão. Minha mente tentava adivinhar o motivo de um empresário como ele dedicar seu tempo a uma reunião comigo.

Ao entrarmos na sala de reuniões, ele me gesticulou para que me sentasse. O silêncio entre nós era intenso, enquanto ele me observava com a mesma calma de quem avalia uma peça de xadrez. Após alguns instantes, ele foi direto ao ponto.

— Imagino que esteja se perguntando o motivo de eu ter vindo pessoalmente ao nosso encontro — começou, sem rodeios.

— Sim, confesso que fiquei surpresa com a sua presença — respondi, sorrindo educadamente, tentando parecer mais confiante do que realmente estava.

Leonardo me estudou por um momento antes de inclinar-se ligeiramente para frente.

— Preciso ser honesto com você, Isabella. Essa proposta de trabalho é um pouco diferente do que você pode imaginar. — Ele pausou, me observando de novo. — Na verdade, não estou aqui para oferecer um emprego convencional.

A tensão no ar ficou ainda mais palpável. Minhas mãos começaram a suar e, sem entender o que ele queria dizer, franzi a testa, confusa.

— Diferente em que sentido? — perguntei, com a curiosidade e o desconforto crescendo.

— Preciso de uma esposa. — Ele disse isso de forma direta, sem qualquer hesitação ou tentativa de suavizar a surpresa da proposta.

O choque percorreu meu corpo como uma corrente elétrica. Abri e fechei a boca, tentando encontrar alguma reação adequada.

— Desculpe, eu... você disse... esposa? — A incredulidade estava estampada no meu rosto.

Ele assentiu, sua expressão tão imperturbável quanto antes.

— Exato. Meu pai deixou uma cláusula no testamento que exige que eu me case para garantir o controle da empresa. Sem isso, tudo será transferido para meu meio-irmão. Preciso de uma parceira que compreenda os termos do acordo e esteja disposta a manter um relacionamento puramente profissional. Em troca, você será recompensada financeiramente.

A cada palavra que ele proferia, eu sentia minha indignação crescer. Ele falava sobre casamento como se fosse uma mera transação, algo sem qualquer valor emocional.

— Então... você está dizendo que precisa de uma esposa de fachada? Alguém para servir de “decoração” na sua vida para que possa garantir a empresa? — Minha voz saiu embargada, entre surpresa e revolta.

Ele manteve o olhar fixo em mim, como se analisasse cada reação.

— Em termos simples, sim. Esse é o acordo. — Ele continuou, ignorando completamente a minha expressão de indignação. — Sei que está em uma situação complicada e, ao que tudo indica, o tratamento de sua mãe não está barato. Posso lhe oferecer estabilidade financeira e um contrato claro. Seria um benefício para ambos.

Enquanto eu tentava processar a proposta absurda de Leonardo, uma pergunta inquietante surgiu na minha mente. Olhei diretamente em seus olhos, desafiando-o.

— Espera um pouco. Como você conseguiu essas informações sobre mim? Onde encontrou dados tão pessoais? — indaguei, a desconfiança pesando na minha voz.

Leonardo cruzou os braços, um leve sorriso se formando em seus lábios, como se minha reação fosse previsível.

— Tenho meus meios de descobrir sobre pessoas que considero interessantes para meus planos. Não é algo tão difícil quando você está no meu nível — respondeu ele, a frieza em suas palavras evidente.

— Interessante? Você quer me usar como uma peça de xadrez e ainda tem a audácia de dizer que isso é interessante? — retruquei, meu tom repleto de incredulidade. — Eu não sou um projeto para ser avaliado!

Ele apenas levantou uma sobrancelha, mantendo a postura confiante, enquanto eu me sentia cada vez mais invadida por essa invasão de privacidade.

Eu me recostei na cadeira, ainda tentando absorver o que estava acontecendo. Ele usou o sofrimento da minha mãe como justificativa, como uma maneira de me prender nessa proposta absurda. E eu, vulnerável e desesperada, fui pega de surpresa por essa armadilha.

— Isso é completamente... absurdo. Você acha que pode comprar qualquer coisa? Até um casamento? — rebati, a indignação transbordando. — Eu não sou uma peça de xadrez para ser usada nos seus planos, Sr. Ferraz.

Ele se manteve impassível, apenas esperando que eu concluísse.

— Isabella — ele disse, em um tom mais frio e calculista — não preciso da sua aprovação para continuar com minha vida. Apenas pensei que uma proposta financeira sólida e que atendesse às suas necessidades poderia ser mutuamente vantajosa. Pense nos benefícios. Um casamento de fachada é uma conveniência para ambos. Nenhum envolvimento emocional, apenas um acordo que nos atende.

Eu não podia acreditar na frieza dele. Ele realmente enxergava isso como uma transação simples, sem qualquer consideração pelos sentimentos ou pela dignidade envolvidos.

— Você pode manter seu dinheiro, Leonardo. Eu não vou me submeter a algo assim — afirmei, levantando-me da cadeira com a voz trêmula de raiva. — A última coisa que farei é sacrificar minha integridade por um contrato sem alma. Minhas dificuldades não são uma desculpa para que você se aproveite.

Ele continuou sentado, sua expressão tão impenetrável quanto antes. Eu já tinha visto o suficiente para saber que Leonardo Ferraz era incapaz de compreender o absurdo de sua proposta.

— Se mudar de ideia, sabe onde me encontrar — ele disse com indiferença, ajeitando os punhos do terno como se nada de importante tivesse acontecido.

Sem responder, me virei e saí da sala, deixando-o para trás. Meus passos ecoavam no corredor enquanto meu coração pulsava com força. A cada passo, reafirmei para mim mesma que eu jamais me sujeitaria a algo tão degradante. Leonardo Ferraz não podia comprar tudo, e eu não seria apenas mais um peão em seu jogo.

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