Doze dias se passaram até que kael abrisse os olhos novamente, seu corpo ainda estava pesado e seus olhos demoravam a se acostumar com a luz que passava pela janela. “Se sente melhor ?" Disse Ágata colocando uma bandeja com frascos e remédios em cima do criado mudo. Kael se assustou mas não demonstrou. "Quem é você " "Tenho várias respostas, mas nenhuma delas convincentes o suficiente pra eu não parecer uma ameaça" ela sorriu, tentando tocar na faixa que protegia o ferimento dele "Não se preocupe, quando eu cheguei até você,você já estava morto capitão, se eu quisesse você morto eu só precisava deixar você lá" ele se recostou no travesseiro deixando que ela tocasse nele "Qual o seu nome?" "Me chamam de Agatha" "Agatha, por que fez isso? " " isso ?" "Por que me tirou de lá?" "Podia dizer que foi por empatia, mas nunca provei esse sabor de cerveja" "Cerveja ?" "É brincadeira" "É uma história bem longa,mas..." "Andrômeda..." interrompeu kael segurando o pulso dela "Antes que me conte sobre ela e etc, vamos diminuir a conversa tá, eu enterrei o corpo dela na margem do rio, posso levá-lo lá quando se curar, agora fique quieto capitão eu sou maga não médica". "Obrigado" "Por salvar a sua vida?" "Por cuidar dela " "Ela era bem bonita, o que deu na cabeça dela pra namorar alguém feio como você?" Kael sorriu pela piada, mas seu coração cheio de tristeza lembrou-se que sabia exatamente o por que de se apaixonar por ela mas não sabia por que ela havia se apaixonado por ele "Eu não sei, devia ter perguntado isso a ela" ele olhou para o nada enquanto respondia. "Bem, coloquei a bandagem no lugar, mais alguns dias e seguiremos viajem " ela respondeu tentando quebrar o clima tenso no ar. "Viajem ?" "Sim" "No jantar, conversaremos melhor, descanse".
Kael não teve tempo de responder. Agatha já havia se levantado, caminhando até a porta com sua típica calma calculada. Ele a observou por um momento, tentando decifrá-la. Não confiava nela, mas também não via razão para que ela o tivesse salvo. Quando a porta se fechou atrás dela, ele soltou um longo suspiro, sentindo o peso do próprio corpo. Havia algo estranho dentro dele. Um vazio. Como se um pedaço de sua existência tivesse sido arrancado à força. Seus olhos vagaram pelo quarto. As paredes de pedra escura, a lareira acesa num canto, a bandeja com os frascos deixada por Agatha. O cheiro de ervas amargas pairava no ar, misturado ao leve aroma de cera queimada. Tudo era estranho e familiar ao mesmo tempo, mas o desconforto vinha de dentro, não do ambiente. Ele fechou os olhos e tentou se lembrar da última coisa antes de apagar. O sangue, a dor, Azrael caindo morto a seus pés. A fúria crescendo como uma tempestade sem fim. E então… o toque frio de Agatha puxando algo dele. A alma. Kael abriu os olhos de repente. Metade de sua alma. Era isso que faltava. Um rugido silencioso cresceu dentro dele, mas foi interrompido pelo próprio corpo, que ainda estava fraco. Ele cerrou os punhos, frustrado. Precisava se recuperar, precisava entender o que Agatha havia feito. Ele se deitou novamente, fechando os olhos com força. O sono não veio de imediato, mas, quando finalmente cedeu, não houve sonhos. Apenas o vazio. Horas depois, o cheiro de carne assada e especiarias o despertou. O quarto estava escuro, exceto pela lareira ainda acesa. Kael se levantou devagar, sentindo as dores do corpo protestarem. Vestiu uma camisa negra que estava dobrada ao lado da cama e seguiu pelo corredor estreito de pedra, guiado pelo cheiro da comida. A sala de jantar era menor do que esperava. Uma mesa de madeira robusta ocupava o centro, iluminada por velas suspensas por correntes no teto. Agatha estava sentada, servindo-se de um prato generoso. “Você demorou, Capitão. Pensei que ia desmaiar de novo.” Ela sorriu, tomando um gole de vinho. Kael puxou a cadeira e sentou-se, sem responder de imediato. Pegou um pedaço de pão e levou à boca, mastigando lentamente. “Agora me diga. O que realmente quer de mim?” Agatha ergueu uma sobrancelha. “Direto ao ponto. Gosto disso.” Ela girou a taça de vinho entre os dedos. “Eu quero que você viva, Kael.” Ele riu, seco. “Você roubou metade da minha alma. Isso não parece exatamente um desejo de me ver vivendo.” Ela apoiou o queixo na mão e o observou com aqueles olhos que pareciam ver além da carne. “Se eu não tivesse feito isso, você teria destruído o mundo. E então morrido em seguida.” Ele ficou em silêncio. “Mas não é só isso, claro.” Ela se inclinou um pouco mais para perto, um brilho enigmático nos olhos. “Há algo muito maior acontecendo, e você faz parte disso. A questão é… você quer descobrir ou prefere passar o resto da eternidade se lamentando?” Kael apertou os dentes, sentindo a raiva subir novamente. Mas, dessa vez, não havia poder para transbordar. Ele estava quebrado. E odiava admitir que precisava de respostas. “Fale.” Agatha sorriu. “Sirva seu jantar, Capitão. Você vai precisar de forças para o que vem a seguir O jantar continuou em silêncio até que Kael comesse o último pedaço do porco assado em seu prato. Ele ergueu a taça de vinho e bateu-a levemente na mesa, olhando para Agatha. — Fale, sem rodeios. O que você quer? — disse, limpando a boca com o antebraço, deixando claro que estava satisfeito. — É algo pessoal, mas há algum tempo vossa majestade me convocou. Sua filha mais nova, Temeria, é vidente. Há algumas luas, ela teve um sonho vívido no qual via sete pecadores lutando contra vários demônios. Pensando não ser uma visão certeira, ela me pediu que trouxesse uma erva rara para ajudá-la a ter clareza mental. Porém, durante sua meditação, algo a atacou. _O rosto de Kael escureceu. — Foi…? — Sim, Arquibar. Um demônio perturbador do sexto nível do inferno. A intenção dele era clara: evitar que Temeria visse de fato o que o sonho queria mostrar. — Entendi… Quer que eu descubra o que o demônio quer? — Não — Agatha respondeu em um tom desinteressado. — Temeria dormiu por vinte dias depois do atentado, mas está bem. Quando acordou, o primeiro nome que disse foi Kael. Ele olhou assustado. Mesmo sendo o futuro rei do inferno, nunca teve contato com essa princesa humana, nem em sonho. — Sete pecadores salvariam o mundo... — murmurou. — Pecadores? — Ele a interrompeu. — Espera, não quero ser egoísta, e até agradeço por ter me salvado, mas eu quero que o mundo se dane! Já viu como tudo está? Eles têm a opção de fazer melhor, e a única coisa que fazem é piorar. Kael levantou-se da mesa. — Obrigado pela comida e pelos cuidados. Retribuirei um dia, se puder, eu garanto. Mas agora, tenho que ir. — Fez uma promessa a ela, lembra-se? Kael parou, travado como uma estátua. Ele a olhou por cima do ombro e disse, determinado: — Quem são os outros? — Vamos buscá-los. Enquanto isso, capitão, aceita mais vinho? Apesar da recente perda, Kael se lembrou da promessa que fez à sua amada: jamais, independente da dor, deixaria o rancor parar sua vontade de viver em um mundo melhor e de fazer a paz reinar em todos os clãs, independente da raça. Ele nunca quebraria uma promessa feita a ela, mesmo que ela não estivesse mais ali. — Capitão? — Agatha o arrancou de seus pensamentos. — Mais vinho? — Sim, claro — ele disse em um tom condescendente. Agatha sorriu, servindo mais vinho na taça de Kael. O líquido escuro escorreu suavemente, refletindo a luz bruxuleante das velas. Kael pegou a taça, mas não bebeu de imediato. Seus pensamentos estavam distantes, girando em torno das palavras de Agatha e da promessa que ele nunca poderia esquecer. “Sete pecadores.” O destino parecia brincar com ele, como sempre fazia. Ele, um príncipe exilado do inferno, fadado a viver sozinho, agora era chamado para salvar um mundo que tirou dele a única coisa que amava. Agatha tomou um gole do próprio vinho antes de continuar: — Temeria viu sete pecadores enfrentando demônios… mas sua visão não foi completamente clara. Não sabemos quem são os outros, nem onde estão. Kael apoiou os cotovelos na mesa, esfregando o rosto com as mãos. — E você espera que eu os encontre? — Eu espero que nós os encontremos, Capitão. Você não vai fazer isso sozinho. Ele soltou uma risada baixa e amarga. — E o que te faz pensar que eu vou aceitar essa missão? — Porque você já aceitou. Kael estreitou os olhos. — O que quer dizer? Agatha girou a taça entre os dedos, um brilho enigmático nos olhos. — A partir do momento em que perguntou quem são os outros, você aceitou, Kael. Ele ficou em silêncio, digerindo as palavras dela. No fundo, sabia que Agatha estava certa. Ele poderia fingir que não se importava, poderia insistir que o mundo não valia o esforço… mas Andrômeda acreditava em algo maior. E ele nunca quebraria uma promessa feita a ela. Finalmente, ele levou a taça aos lábios e bebeu um longo gole. Quando abaixou a taça, seu olhar estava decidido. — Por onde começamos? Agatha sorriu, satisfeita. — A primeira pista nos leva a uma prisão esquecida no norte. Se minha intuição estiver certa, o primeiro pecador está acorrentado lá. Kael se recostou na cadeira, sentindo a adrenalina correr pelas veias. Ele poderia não acreditar que o mundo merecia ser salvo, mas algo dentro dele ansiava por lutar novamente. A caça aos sete pecadores havia começado.Kael cambaleou até o quarto, sentindo o mundo girar ao seu redor. Ele estava bêbado, muito mais do que deveria estar, e o mais estranho era que Agatha, que havia bebido ainda mais que ele, parecia perfeitamente sóbria. Algo nisso o incomodava, mas seus pensamentos estavam turvos demais para se aprofundar nisso agora. Tudo o que queria era dormir. Fechar os olhos e esquecer. Quem sabe, se tivesse sorte, sonharia com Andrômeda. Mas mesmo a embriaguez não foi capaz de enganá-lo. A realidade era cruel e implacável. Andrômeda estava morta. A dor veio como uma lâmina cravada no peito, roubando seu ar. Seu corpo ficou pesado, os músculos recusando-se a obedecer, e ele desabou na porta do quarto. O chão frio contra seu rosto não trouxe nenhum alívio. Com esforço, ele se arrastou até a fechadura, forçando a porta a se abrir. O cheiro que o atingiu fez seu coração falhar uma batida. O perfume delicado flutuava pelo quarto, preenchendo cada canto. Andrômeda amava lírios. Sempre dizia q
Kael desceu do sótão, ainda com a mente ocupada pelo encontro inesperado com o tal Boldar. Ele caminhava pelo corredor em direção ao quarto quando algo fora da casa chamou sua atenção.Ao passar por uma das janelas, parou de súbito. Lá fora, uma das árvores se moveu. Não foi um balanço de vento ou o farfalhar comum das folhas. Ela realmente se moveu, deslizando pelo solo como se estivesse viva.Franziu o cenho, inclinando-se um pouco mais para observar melhor. Outra árvore repetiu o movimento, depois outra, e mais outra, como se a floresta estivesse… caminhando.Foi então que a lembrança das palavras de Agatha lhe atingiu."A casa anda em reforma."Ele piscou. Aquilo não havia sido uma metáfora. A casa realmente andava.Kael recuou um passo, dessa vez observando melhor a estrutura ao seu redor. Por fora, a casa parecia pequena, quase insignificante, mas ali dentro… ela era imensa, confortável, aconchegante de um jeito estranho. Isso exigia um nível de magia altíssimo.Ele soltou um ri
Depois de algumas horas de viagem, a quietude se tornou inevitável, e o silêncio da estrada incomodava Kael. Os galhos das árvores balançavam sob o vento, criando sombras esguias pelo caminho de terra. EraO tipo de silêncio que antecedia um problema.Kael levou a mão ao cabo da espada.— Você sente isso? — ele perguntou.— Você sente coisas demais — Ágata retrucou. — Mas sim, eu sinto.Antes que Kael pudesse responder, um estalo veio da floresta.— Emboscada — ele murmurou.O ataque veio rápido. Seis figuras encapuzadas emergiram das sombras, lâminas brilhando à luz do entardecer.— Sejam bonzinhos e deixem as bolsas, e ninguém sai ferido — um dos ladrões disse.Kael sorriu.— Eu tenho uma proposta melhor: vocês correm, e eu não quebro seus dentes.O líder riu.— Engraçadinho. Pena que sua sorte acaba aqui...O soco de Kael o atingiu antes que ele terminasse a frase. O homem caiu como um saco de batatas. O caos se instaurou.Kael se movia como um trovão, desviando de golpes e revidan
O cheiro forte e envolvente do café recém passado dominava o ambiente, despertando lentamente os sentidos de quem ainda repousava. O sol da manhã filtrava-se pelas janelas da cozinha, projetando sombras suaves sobre a madeira envelhecida da casa. As paredes de pedra e a mesa rústica de carvalho compunham o cenário onde Boldar estava, encostado no batente da porta, a xícara de barro repousando entre os dedos longos. Seus olhos vermelhos eram uma lâmina contra a penumbra—um brilho inquietante, quase melancólico. O cabelo negro escorria sobre os ombros, com uma única mecha branca destoando no topo da cabeça. Ele parecia uma obra-prima inacabada—força crua e beleza trágica em uma só figura.Kael estava sentado à mesa, o corpo inclinado para trás na cadeira, como se não tivesse um único peso no mundo. Seus olhos Âmbar eram tão cortantes quanto o fio de uma lâmina, e os músculos sob a pele marcada por cicatrizes contavam histórias que ele nunca se daria ao trabalho de narrar. Seu cabelo ca
O cheiro de terra molhada ainda impregnava o ar quando Kael, Yoran e Ágata saíram da taverna. A chuva havia transformado a estrada em um lamaçal infernal, mas quem ali tinha tempo para reclamar? Eles tinham um objetivo: chegar a Merlin e tirar Kaito da prisão antes do almoço. Poderiam enfrentar qualquer coisa, menos a fome de Ágata ao meio-dia.O caminho era longo, mas nada que os três já não estivessem acostumados. Kael seguia na frente, focado, calado como sempre. Yoran caminhava ao lado de Ágata, que ajeitava a capa, tentando ignorar o frio que insistia em se infiltrar em suas roupas.— Então… Kaito, hein? — Yoran quebrou o silêncio, lançando um olhar de canto para Ágata.Ela bufou.— O quê? Vamos ficar calados até Merlin?Ágata ergueu a sobrancelha.— Sim, me agradaria, de fato, ser agraciada pelo som inebriante do seu absoluto silêncio.Kael soltou um riso abafado, sem tirar os olhos do caminho.— Eu, hein? Que mau humor. — Disse Yoran entre dentes, ajeitando a capa.Dep
A noite já caía quando chegaram. O céu estava pintado de tons de púrpura e azul, e a brisa trazia o cheiro fresco da terra molhada. O silêncio da estrada contrastava com a bagunça que encontraram ao entrar.Kael foi o primeiro a falar:— Precisamos de quartos para todo mundo.Ágata olhou para Kaito, avaliando-o.— Você vai dividir com quem?Kaito sorriu de canto.— Se for com você, não me importo.Kael bufou.— Escolhe outro.— Ora, ora, que defensivo. — Kaito apoiou o queixo sobre a mão, olhando para os outros com curiosidade. — Então... opções?Yoran estalou a língua.— Posso dividir com outro, mas com você não.— Também não quero dividir com você — retrucou Kael.— Eu não me importo — disse Boldar, chegando com um prato de frutas nas mãos.Todos olharam para ele.— O quê? Ele me ajuda na cozinha, diferente de vocês, preguiçosos.Yoran sorriu.— E eu sou um ótimo colega de quarto.Kael cruzou os braços.— Fechado, então. Fique com meu quarto, é o segundo à esquerd
Outro impacto sacudiu a casa, dessa vez mais forte. Mas a casa não se partiria. Não era apenas uma construção de madeira e pedra, mas um refúgio mágico, resistente a qualquer ataque. Então, se estavam sentindo o impacto… quem quer que estivesse do lado de fora era forte. Forte o bastante para querer derrubar uma casa feita para suportar magias de alto escalão.— Se for uma maldita tempestade de novo, eu juro que vou… — Yoran começou, mas parou assim que abriu a porta e viu o caos do lado de fora.Kael estava encostado na mureta da varanda, olhos semicerrados, a expressão azeda de quem foi despertado à força. Ele suspirou, exausto.— Eu estava sonhando… — murmurou, esfregando o rosto. — Mas claro, alguém decide me arrancar do único lugar onde a vida ainda faz sentido.Kaito estava parado ao lado dele, com um copo de vinho ainda na mão, como se tivesse acabado de se levantar da cama sem tempo para processar nada. Mais afastada, Ágata subia as escadas do porão, segurando um livro pes
O frio da madrugada cortava como lâminas, e Kael sentia cada rajada de vento atravessar suas roupas. Ele andava rápido, mas atento, guiando o médico pelo caminho irregular da floresta. O céu escuro parecia pesar sobre eles, e a neblina rasteira fazia o chão desaparecer aos poucos.— Faz tempo que não vejo alguém tão jovem carregar tanto peso nos ombros. — O médico quebrou o silêncio.Kael apenas lançou um olhar de esguelha. Talvez, em outro momento, ele tivesse respondido, mas agora não tinha paciência para conversa. Não estava ali para filosofar sobre fardos.— É por aqui. Cuidado onde pisa.— Não se preocupe, eu moro aqui. Sei onde pisar. — O médico passou à frente de Kael, que o olhou de cima a baixo.— Exibido.Eles não demoraram a chegar, mas, quando o fizeram, encontraram Ágata deitada na cama de Kaito. Estava gelada, pálida demais, com a testa coberta de suor. Seu peito subia e descia devagar, como se seu corpo lutasse para continuar funcionando.O médico ajoelhou-se ao