O frio da madrugada cortava como lâminas, e Kael sentia cada rajada de vento atravessar suas roupas. Ele andava rápido, mas atento, guiando o médico pelo caminho irregular da floresta. O céu escuro parecia pesar sobre eles, e a neblina rasteira fazia o chão desaparecer aos poucos.— Faz tempo que não vejo alguém tão jovem carregar tanto peso nos ombros. — O médico quebrou o silêncio.Kael apenas lançou um olhar de esguelha. Talvez, em outro momento, ele tivesse respondido, mas agora não tinha paciência para conversa. Não estava ali para filosofar sobre fardos.— É por aqui. Cuidado onde pisa.— Não se preocupe, eu moro aqui. Sei onde pisar. — O médico passou à frente de Kael, que o olhou de cima a baixo.— Exibido.Eles não demoraram a chegar, mas, quando o fizeram, encontraram Ágata deitada na cama de Kaito. Estava gelada, pálida demais, com a testa coberta de suor. Seu peito subia e descia devagar, como se seu corpo lutasse para continuar funcionando.O médico ajoelhou-se ao
A manhã seguiu seu curso, trazendo consigo um ar de alívio e renovação. Kaito, ainda pálido e visivelmente cansado, havia acordado. Seus olhos claros e brilhantes encontraram os de Ágata, e um sorriso fraco, mas reconfortante, surgiu em seu rosto. Ele não precisava dizer nada; a gratidão e o afeto estavam estampados em seu olhar. Ágata, por sua vez, sentiu um peso sair de seus ombros. Ele estava bem. Isso era o que importava. Mas a inquietação ainda habitava seu peito. Boldar e Yoran não saíam de seus pensamentos. Ela sabia que precisava descansar, que seu corpo ainda estava se recuperando, mas a preocupação falou mais alto. Enquanto Kaito descansava, Ágata decidiu sair escondida. Não queria que Kael percebesse, sabendo que ele tentaria impedi-la. Ela não tinha energia para discutir. Caminhou silenciosamente pelos corredores, até que, de longe, ouviu os gritos de Yoran. O som a deixou apreensiva, acelerando seus passos. Ao chegar mais perto, viu Yoran amarrado a uma cadeira, se deba
sol já se escondia no horizonte, pintando o céu com tons de laranja e roxo. O grupo seguia determinado a encontrar Leon, o Pecado do Orgulho, já que não. sabiam nada sobre Ordan ainda, ele era o próximo.— Tá, mas se o Ordinário não vai, e a espadachim muito menos... então não estão faltando só três? — questionou Kael, semicerrando os olhos.— Bem… é… — começou Yoran.— ACORDA, PORRA! — berrou ele de repente, jogando o que sobrou do pão na cara de Kael.Kael desviou a tempo, mas o pão voou direto na parede e deslizou dramaticamente para o chão.— Joga comida fora não, demônio — repreendeu Kaito, balançando a cabeça.— Ei, isso foi um insulto? — protestou Kael, cruzando os braços.— Não leva pro coração, capitão — Yoran piscou.Ambos riram, mas Kaito olhava para o pão no chão como se fosse cometer um crime. No canto da cozinha, Ágata e Alinna observavam o diálogo sem se meter.— Então… — começou Ágata, cruzando os braços.— Não, mel, não me lembro. Não quero ter essa conversa agora. —
Horas depois, ambos saíram do quarto para beber água. Caminhavam pelo corredor, os corpos ainda sensíveis, quando viram Alinna sentada no meio da cozinha.Ela estava imóvel, os olhos abertos, mas marejados, com lágrimas escorrendo silenciosas pelo rosto.— Alinna? — Yoran chamou, franzindo a testa.Ela não respondeu.— O que diabos…? — Yoran se aproximou, mas hesitou ao ver que ela nem sequer piscava.Eles trocaram um olhar, e, sem perder tempo, Boldar foi chamar Ágata.Quando ela chegou, olhou para Alinna e suspirou.— Ela está dormindo — disse simplesmente.— Isso parece qualquer coisa, menos sono — resmungou Yoran.— Confia em mim.Ágata se ajoelhou ao lado da fada e murmurou:— Adductus somno.Poucos segundos depois, Alinna desabou no chão, agora dormindo de verdade.Yoran passou a mão pelo rosto, exausto.— Se isso é o que nos espera no futuro, eu prefiro me aposentar.— Vai sonhando — retrucou Boldar.Na manhã seguinte, Alinna ainda dormia. Seu rosto estava pálido, e seu corpo s
Kael foi o primeiro a voltar para casa. Ordam carregava Alinna nos braços com tanto cuidado que, às vezes, parecia que ela ia se quebrar. O silêncio acabou quando ele a colocou na cama da varanda. — E aí? Vai contar por que mentiu? — disse Kaito, escorado no batente da porta. — Eu não menti. Meu nome é Ordam de Mortraz. — Eles se entreolharam sérios. — Então, a fada é sua amiga? — Ordam olhou para Alinna, deitada na cama, com um semblante alegre. — Pra mim, ela é muito mais que isso. A porta bateu, e Ágata entrou junto com Boldar e Yoran, trazendo suprimentos. — Vai ter que explicar mesmo por que fez a minha Nina chorar. — O rosto de Ágata estava carregado de crítica e dúvida. — Pensei que fossem demorar — disse Kael, olhando para os três. — Ah, a gente ia, mas o Yoran usou a super velocidade pra terminar logo e ouvir a fofoca. — Todos riram da naturalidade com que Boldar falava. — Uau, sua cara, né, Yoran? — disse Kael, com os olhos semi-serrados. — É...
— Nakim? Esse é seu nome? — Sim, mas já me acostumei a ser chamado de Boldar. Prefiro que continue assim — respondeu Boldar, sentando-se confortavelmente no criado-mudo enquanto Yoran beijava seu pescoço sensualmente. — Aram, aram — Kael interrompeu. — Não quero atrapalhar, mas Ágata pediu para chamá-los. — Capitão, o quarto tem porta — respondeu Yoran, assustado. — Sim, eu vi. Da próxima vez, certifique-se de usá-la. — Boldar riu baixinho. Ele sabia que Yoran odiava ser visto assim. — Está com vergonha de mim? — perguntou Boldar, com a sobrancelha erguida. — Se você mandasse, eu usaria uma coleira com meu nome, meu amor — disse Yoran, dando um beijinho no nariz de Boldar e saindo logo em seguida. — "Amor"? — repetiu Boldar, surpreso descendo as escadas. — Bem, já que estamos todos aqui, tenho que falar sobre o próximo Pecado. De acordo com a princesa Temeria, ele já é um soldado do reino, mas está com problemas agora. — Que tipo de problemas? — perguntou Kai
Vinte e três longos dias se passaram até que chegaram a Moltrap, a aldeia onde os vampiros tinham sua “fábrica”.— E aí, capitão, o que vamos fazer? — perguntou Kaito, girando uma adaga entre os dedos.— Amigos, não sei vocês, mas eu quero tomar uma cerveja — disse Yoran.— Eu também — completou Kaito.— Segura a onda aí, senão você não vai pra lugar nenhum — resmungou Boldar por cima do ombro.— Ih, capitão, tu vai sozinho, então — Yoran sacudiu a cabeça, em negação.— Pau-mandado — sussurraram Kael, Kaito e Ordan em uníssono.— Em minha defesa, não estou indo me embebedar. Vou buscar informações. Embebedar é só um brinde — retrucou o capitão, com um sorriso.— Bem, ele está certo — disse Ágata, entrando na cozinha e se jogando na cadeira. — Vocês três vão ao bordel. Precisamos de informações.— Nós três? Eu não posso, Agui… — Yoran olhou para Boldar.— Pode sim. Boldar também vai. Tenho um trabalho a mais pra ele.— Ah, qual é? Tudo de ruim sobra pra mim!— Não, gatinho
Houve um tempo em que os gigantes esculpiam montanhas com as mãos nuas, as fadas dançavam em florestas de cristal, e os demônios brindavam com vinho sob a luz de duas luas. A Terra era uma tapeçaria de raças, tecida com magia e sangue. Mas o equilíbrio é frágil, e a ganância dos deuses, ainda mais.Nas ruínas de um mundo outrora grandioso, Andrômeda observava o céu, o olhar perdido entre as estrelas. O eco da voz de Kael era longínquo, mas presente. Ela sentia o sangue escorrer entre os dedos que freneticamente pressionavam o ferimento profundo em seu ventre.— Não, não, não… mil vezes eu, mas minha Deusa, não. — A voz de Kael era um lamento desesperado. O peso da culpa apertava seu peito enquanto ele segurava Andrômeda contra si, tentando aquecer o corpo que esmorecia.— Abre os olhos, por favor… fica comigo. Não me deixa. Eu não quero… eu não consigo ficar aqui sem você.O pranto dele se misturava ao cheiro de ferro no ar.— Ela está morta, demônio. Você já destruiu a vida dela