Outro impacto sacudiu a casa, desta vez mais forte. Mas aquela não era uma simples construção de madeira e pedra. Era um refúgio encantado, forjado para resistir a ataques de alto escalão. Se estavam sentindo os tremores, então quem quer que estivesse lá fora era poderoso o bastante para desafiar essa proteção. — Se for outra maldita tempestade, eu juro que vou… — Yoran começou, mas sua voz morreu assim que abriu a porta. Kael estava recostado na mureta da varanda, os olhos semicerrados e uma expressão azeda de quem fora arrancado de um sonho bom. Suspirou, exausto. — Eu estava sonhando… — murmurou, esfregando o rosto. — Mas, claro, alguém decidiu me arrancar do único lugar onde a vida ainda faz sentido. Kaito estava ao lado dele, um copo de vinho ainda na mão, como se não tivesse tido tempo para processar nada. Mais afastada, Ágata subia as escadas do porão, segurando um tomo pesado, claramente irritada pela interrupção. Todos estavam ali. E todos olhavam na mesma direção.
Fechando os olhos novamente, ele se concentrou. Seu poder demoníaco se espalhou pelo ambiente, captando resquícios de energia mágica ao redor. Precisavam de cura, e qualquer vestígio de magia restauradora poderia ser sua única esperança. — Há um traço… — Kael franziu a testa. — Não é forte, mas é recente. E está… na montanha. — Claro, porque as coisas nunca podem ser fáceis. — Yoran bufou, ajustando Boldar em seus braços. O guerreiro estava desacordado, mas sua respiração ainda era firme. — Se você morrer, eu mato você. — Boldar murmurou com um sorriso fraco. — E a Águi? Ela ainda está inconsciente. Se a movermos, podemos piorar a situação. — Então eu fico com ela. — Eu não esperava menos. Trocaram um olhar breve antes de se separarem. — Vamos. Kael e Yoran começaram a subir a montanha, os passos apressados pela urgência da situação. Mas, antes que pudessem alcançar o topo, um movimento na vegetação os fez parar. Folhas se agitaram, gravetos estalaram, e, de
Quando abriu os olhos, Kaito já não estava mais no quarto. O cheiro doce de jasmim chegou primeiro. O brilho dourado da cozinha realçava as flores sobre a mesa. Risadas infantis ecoavam Ele seguiu o som. Na cozinha, uma garotinha brincava ao lado de uma mulher de beleza exuberante. O sorriso dela era tão iluminado que chegava a incomodar. Próximo a elas, um homem as observava com uma felicidade genuína. Kaito franziu o cenho. Por um instante, pensou que a mulher fosse Ágata… Mas não era. Era a mãe dela. Kaito franziu o cenho. Algo estava errado. Um segundo atrás, a cozinha era um refúgio tranquilo; agora, o cheiro doce de jasmim se dissipava. O ar esquentava, e uma fina névoa subia do chão. Então veio o cheiro de fumaça. Gritos ecoaram. O mundo ao redor desmoronava." Kaito ouviu os gritos. A cena desmoronou, rápida e brutal, como se o próprio mundo tentasse engoli-lo. Agora, ele estava em um lugar escuro. No centro, uma garota de 13 ou 14 anos estava presa a
Mas sua inquietação persistia. Boldar e Yoran não saíam de seus pensamentos. Ela sabia que precisava descansar, que seu corpo ainda se recuperava, mas a preocupação falava mais alto. Esperou Kaito voltar a dormir e decidiu sair em silêncio. Se Kael percebesse, tentaria impedi-la, e ela não tinha energia para discutir. Os corredores estavam vazios, iluminados apenas pela luz suave da manhã. No entanto, a tranquilidade foi quebrada por gritos aflitos. — Agui, me solta! Ela vai machucá-lo! A demônio-tigre vai machucar o Boldar! — a voz desesperada de Yoran ecoou, e Ágata acelerou o passo. Ao empurrar a porta, encontrou Yoran amarrado a uma cadeira, debatendo-se furiosamente. Boldar jazia sobre a cama, um pano úmido sobre a testa, a respiração irregular. Perto dele, uma mulher alta e séria amassava folhas em um pilão. Ela ergueu os olhos para Ágata, mas não demonstrou surpresa com a entrada abrupta. — Ele está se curando. Demônios não podem ser costurados como humanos — explicou, s
Sem tempo para excitação, Kael seguiu o que Yoran disse: uma mente cheia não tem espaço para manipulação. Para sua sorte ou azar, na sua mente só havia Andrômeda, e eles nunca poderiam usá-la para manipulá-lo. Enquanto entrava no covil, Kael percebeu que o silêncio ecoava por todos os lados e sentiu algo estranho, como se algo estivesse errado. O cheiro de sangue impregnava o ar, misturando-se à umidade das paredes de pedra. Tochas fracas iluminavam o longo corredor, lançando sombras distorcidas que pareciam ganhar vida. Kael inspirou profundamente, o odor metálico e denso lhe trazendo uma sensação estranha. Ele caminhava à frente, seus passos ecoando no silêncio perturbador daquele covil imundo. Atrás dele, Yoran segurava a lâmina com força, seus olhos atentos. Boldar caminhava calmo e seguro de que nada aconteceria. Ordan protegia Alinna, que batia as asas devagar, como se elas acompanhassem os batimentos cardíacos dele. Kaito mantinha-se em silêncio, concentrado, os músculo
Kael esperou a chegada da guarda real e escoltou pessoalmente alguns dos escravos mais feridos até eles — talvez fugindo de si mesmo. — Capitão, devemos voltar agora. Não é seguro deixar Ágata e Boldar sozinhos, e Yoran precisa de cuidados — disse Ordan, observando a carruagem de escravos se afastar. — Sim, vamos — respondeu Kael, sem olhar para ele. Kael entrou sem pressa no quarto, que, por sinal, era o único lugar disponível para tratar a garota, já que Rarim estava mais ferida e precisava de atendimento urgente no laboratório. Yoran estava em seu próprio quarto, e Boldar e Leon só queriam dormir um pouco. Nada além. Se o rei ordenasse, ele mesmo se mataria, afinal, não via sentido em sua vida. Então, acomodou-se no que antes era seu quarto e agora voltara a ser a varanda. Kael olhou para Andrômeda com um misto de emoções: felicidade por tê-la perto, medo de que, ao acordar, ela não fosse a mesma, e desespero por vê-la ali, intocável. Seus olhos encheram-se de água. Ele
E agora, ela estava ali, diante dele, como se nada tivesse acontecido. — Bom dia — disse Alinna, sua voz suave, mas carregada de uma força que fez Ordan estremecer. — Procuro por Ágata, o Pecado da Gula. Pode me levar até ela? Aquela voz arrancou Ordan do turbilhão de lembranças, puxando-o de volta ao presente. Ele engoliu seco, tentando encontrar palavras, mas nada saiu. Apenas assentiu e indicou com um gesto para que ela o seguisse. Alinna entrou no quarto, seus passos quase inaudíveis. Seu olhar pousou sobre Boldar, deitado na cama, e a preocupação se refletiu em seus olhos. — Ele vai ficar bem? — perguntou ela, sem desviar os olhos de Ordan. — Vai sobreviver — respondeu ele, a voz rouca. — Demônios se curam de formas diferentes, mas ele é forte. Alinna assentiu em silêncio e seguiu Ordan até a sala onde Ágata estava, sentada à mesa, conversando com Kael e Yoran. Ao ver Alinna, o rosto de Ágata se iluminou. — Alinna! — exclamou, levantando-se para abraçar a fada
O sol já se escondia no horizonte, pintando o céu com tons de laranja e roxo. O grupo seguia determinado a encontrar Leon, o Pecado do Orgulho. Como ainda não tinham informações sobre Ordan, ele seria o próximo alvo. — Tá, mas se o Ordinário não vai e a espadachim muito menos... então não estão faltando só três? — questionou Kael, semicerrando os olhos. — Bem… é… — Yoran hesitou. — ACORDA, PORRA! — berrou de repente, jogando o que restava do pão na cara de Kael. Kael desviou a tempo, e o pão voou direto para a parede antes de deslizar dramaticamente até o chão. — Não j**a comida fora, demônio — repreendeu Kaito, balançando a cabeça. — Ei, isso foi um insulto? — protestou Kael, cruzando os braços. — Não leva pro coração, capitão — Yoran piscou. Ambos riram, mas Kaito olhava para o pão caído como se cogitasse um crime. No canto da cozinha, Ágata e Alinna observavam o diálogo sem se meter. — Então… — começou Ágata, cruzando os braços. — Não, mel, não me lembro. E não quero ter e