CLARA
Se teve uma coisa que aprendi nos últimos anos, era que a vida nem sempre seguia o roteiro que nós tínhamos escrito em nossas cabeças. E olha que eu me considerava boa em escrever roteiros — mas… isso foi realmente algo que ficou no passado. Afinal… aos 23 anos, minha vida era praticamente perfeita. Eu tinha um emprego decente, amigos incríveis, e um namorado com quem dividi três anos da minha vida. Tudo parecia estar no lugar, mas… ultimamente, eu comecei a sentir que… alguma coisa estava faltando.
Sabe aquela sensação de que você está esquecendo alguma coisa importante? Como quando você sai de casa, mas não tem certeza se trancou a porta? Bom… é esse sentimento irritante que fica martelando na minha mente o tempo inteiro, só que eu não faço ideia do que estou esquecendo.
E já está começando a me deixar louca!
Hoje de manhã, enquanto tomava meu café, essa sensação bateu ainda mais forte — o que quase me tirou completamente da órbita. A cozinha estava quieta, exceto pelo som do café sendo derramado na caneca. Olhei para as fotos de viagens que eu e Ana, minha melhor amiga e companheira de apartamento, tínhamos pendurado nas paredes. Paris, Barcelona, Rio de Janeiro... Lugares incríveis, momentos inesquecíveis, mas mesmo assim... algo estava errado.
— Clara! Você vai se atrasar, de novo! — A voz de Ana me tirou dos meus pensamentos.
— Tô indo! — gritei de volta, pegando minha bolsa e correndo para a porta.
— Céus… não me ouviu das primeiras vezes? — Ela acabou perguntando, antes de olhar para o meu rosto, que provavelmente ainda deixava claro que eu não estava totalmente presente. — Por acaso… estava no mundo da lua? — Ana perguntou enquanto descíamos as escadas.
Suspirei.
Falar ou não falar? Talvez eu estivesse só sendo dramática, ou algo do gênero, afinal… tudo estava — e continuaria — certo?
— Ah, sei lá, Ana. Sinto que tem algo faltando na minha vida, sabe? Tipo, tudo tá no lugar, mas parece que eu estou esperando por… alguma coisa, alguma coisa grande.
Ana me olhou como se tivesse visto um fantasma. Talvez porque ela já ouviu isso de mim antes — só que dessa vez… ela pareceu ter levado mais a sério.
— Quem sabe você só precisa de uma mudança, fazer algo novo, fora da rotina, sabe? — disse ela, com aquele sorriso de quem sabe mais do que está dizendo, o que me deixou ainda mais agoniada com aquela sensação constante que não me abandonava.
Eu tentei sorrir de volta, mas no fundo, essa inquietação não saía da minha cabeça. Era como se eu estivesse numa estação de trem, esperando o próximo, sem saber exatamente qual era o meu destino.
Enquanto íamos para o trabalho, eu tentava sacudir esse pensamento. Afinal, eu tinha uma vida ótima, certo? Um emprego que eu gostava, amigos que me amavam, e um namorado... bem, um namorado que... Ok, confesso, ultimamente o Lucas andava meio estranho, mas isso era assunto para depois.
Mas lá no fundo, eu sabia que alguma coisa estava prestes a mudar. E não era uma mudança qualquer. Era daquelas que vira a vida de cabeça para baixo. Só que, por enquanto, tudo que eu podia fazer era esperar e ver onde isso tudo ia dar.
Chegamos ao trabalho e tudo estava no modo automático. Liguei o computador, abri os e-mails e comecei a rotina de sempre — que no caso, se constituía a passar boa parte do meu tempo navegando entre campanhas de marketing e reuniões intermináveis, e bom… hoje não foi diferente. Eu estava prestes a entrar em uma dessas reuniões quando meu celular vibrou na mesa.
Era uma mensagem do Lucas.
[Amor ♥]: Podemos nos encontrar mais tarde? Precisamos conversar.
Se eu ganhasse um real para cada vez que alguém dissesse "precisamos conversar", eu já estaria rica, mesmo assim… eu consegui evitar de ter nó no estômago, quase que imediato. Quando alguém dizia isso, nunca era para falar de algo bom, e ultimamente… Lucas vinha agindo de forma estranha — mais distante, sempre com a cabeça em outro lugar, e agora isso...
[Clara]: Claro, mais tarde a gente se vê :).
Tentei não pensar muito nisso durante o resto do dia, mas é claro que… falhei miseravelmente. Tudo o que eu conseguia pensar era no que Lucas queria me dizer. Será que ele tinha alguma surpresa planejada? Ou será que... não, eu não queria pensar na possibilidade de ser algo ruim. Mas quanto mais eu tentava ignorar, mais meu cérebro insistia em voltar para essa possibilidade.
E quando o dia de trabalho finalmente acabou. Eu e Ana voltamos para casa, e tudo o que eu queria era um banho quente para tirar a tensão do corpo. Mas minha cabeça ainda estava a mil. Tomei um banho rápido e me vesti para encontrar Lucas. Algo casual, mas que não parecesse que eu estava me esforçando demais.
Mas quem eu queria enganar? Estava nervosa, sim!
Nos encontramos em um café perto do meu apartamento. Era o nosso lugar preferido, mas hoje parecia que até o ambiente estava diferente. Lucas já estava lá quando cheguei, e ele parecia tão tenso quanto eu.
— Oi — falei, tentando soar normal, até porque… eu não queria que o turbilhão que estava na minha cabeça, ficasse na cara.
— Oi — respondeu ele, levantando os olhos da xícara de café. Ele parecia cansado, como se tivesse carregando o peso do mundo nas costas.
Sentamos e por um momento ficamos em silêncio. Era estranho. Não deveria ser assim. Lucas e eu sempre tivemos facilidade para conversar, mas hoje... hoje foi diferente…
— Clara, eu... — ele começou, mas parou logo em seguida, como se não soubesse como continuar.
— Lucas… o que está acontecendo? — Eu queria que ele falasse de uma vez, sem rodeios.
Ele suspirou, olhando para a xícara de café como se aquilo fosse a coisa mais interessante do mundo.
— Eu acho que não estamos funcionando mais. Nós dois, quero dizer... Eu... eu não sei como dizer isso, mas... eu conheci alguém. E acho que preciso de um tempo para descobrir o que realmente quero.
Descobrir… o que realmente quer?
Naquele momento, meu mundo parou. Era como se o tempo tivesse congelado e a única coisa que eu conseguia ouvir era o som do meu coração batendo descompassado.
Lucas...
Lucas tinha me traído. E estava sentado ali, na minha frente, me dizendo que queria "descobrir o que realmente queria". Como se a nossa relação de três anos não significasse nada.
— Você está brincando, não é? — Foi a única coisa que consegui dizer.
Mas ele não estava. O olhar dele me dizia tudo o que eu precisava saber. Ele realmente estava sendo sincero. E, de repente, a ficha caiu. Todo aquele comportamento estranho, o distanciamento... fazia todo sentido agora.
— Quem é ela? — perguntei, sentindo minha voz tremer.
Lucas hesitou por um momento, mas então sussurrou um nome que fez tudo desabar de vez.
— Aline.
Minha amiga.
A Aline que eu conhecia desde a escola. Aline, que estava sempre ali para mim, em todos os momentos. A mesma Aline que agora estava saindo com o meu namorado.
Eu me levantei, sem conseguir dizer mais nada. Era como se o chão tivesse sumido debaixo dos meus pés. Como ele pôde fazer isso comigo? Como ela pôde fazer isso comigo? Saí do café sem olhar para trás. Lágrimas ardiam nos meus olhos, mas eu me recusei a deixar que caíssem.
Tudo o que eu sabia era que minha vida, aquela que parecia tão estável até algumas horas atrás, havia acabado de virar de cabeça para baixo.
LUCASTrair é uma palavra forte. Eu sei. Mas, às vezes, as coisas saem do controle antes que a gente perceba. Não estou tentando justificar o que fiz, mas, sério, a vida é complicada pra caramba.Quando eu comecei a namorar a Clara, tudo era perfeito. Ela era incrível, ainda é, mas com o tempo, algo mudou. Não sei dizer exatamente o quê. Só sei que a gente foi se afastando aos poucos, e eu comecei a me sentir preso, como se estivesse numa rotina sem saída. As coisas que antes eram legais começaram a parecer... entediantes. Eu sei que isso parece horrível, mas é a verdade. E a verdade, às vezes, dói.Eu nunca quis machucar a Clara. Isso eu digo de coração. Mas aí apareceu a Aline... Cara, a Aline é diferente. Ela me faz sentir vivo de novo, sabe? É como se todo aquele brilho que eu sentia no começo com a Clara tivesse voltado, só que dessa vez com a Aline. Tudo aconteceu de forma tão rápida que eu mal consegui perceber. Quando me dei conta, já estava completamente envolvido. E então pe
CLARAVoltar pra casa depois de uma noite como essa é como ser atropelada por um caminhão e ainda ter que levantar sozinha. Não que eu saiba como é ser atropelada, mas acho que essa é a melhor comparação que consigo fazer no momento.Eu saí correndo daquele café sem nem saber para onde estava indo. Tudo que eu queria era fugir. Fugir do Lucas, da Aline, de mim mesma. A única coisa que meu cérebro conseguia processar era o som das palavras dele ecoando na minha cabeça: “Eu conheci alguém… é a Aline.”A Aline. A minha melhor amiga, a pessoa que eu confiava de olhos fechados, que esteve ao meu lado em todos os momentos importantes da minha vida. E agora, ela estava ao lado do Lucas, do meu namorado. Não, ex-namorado. O que me restava era tentar juntar os cacos de mim mesma e descobrir o que fazer com essa bagunça toda.Quando finalmente cheguei em casa, Ana estava na sala, assistindo a uma série qualquer. Ela olhou pra mim e, no mesmo instante, soube que algo estava terrivelmente errado.
CLARALevantar da cama depois de tudo o que aconteceu parecia um daqueles desafios impossíveis, tipo escalar o Everest sem oxigênio. Eu não sou exatamente uma expert em escaladas, mas se fosse apostar, diria que, emocionalmente, estava bem perto disso. Mesmo assim, o mundo não para, e eu não podia ficar parada também.Ana, sempre ela, estava ali para me dar um empurrãozinho. Literalmente.— Levanta, Clara. Você vai se atrasar, de novo. — Ela disse, puxando as cobertas de cima de mim como se estivesse tentando tirar um Band-Aid de uma ferida aberta.— Eu não quero. — Minha voz saiu abafada pela almofada que eu tinha enfiado na cara, na tentativa de escapar da realidade.— O que você quer é irrelevante agora. O que você precisa é sair dessa cama e começar a viver sua vida.— Ana, minha vida desmoronou, lembra? — retruquei, sem fazer nenhum esforço para me mexer.— Sua vida não desmoronou. Você só perdeu um peso morto, que, por acaso, vinha em forma de namorado infiel. Agora, levanta e v
CLARANa manhã seguinte, acordei com o som irritante do alarme. E, por um momento, quase voltei a dormir. Mas então me lembrei da reunião importante que Ricardo mencionou ontem. Era como se meu cérebro estivesse dividindo minha vida em duas partes: a bagunça emocional que era meu coração e a tentativa desesperada de manter minha carreira intacta.Levantei da cama e fui direto para o banho, deixando a água quente escorrer pelo meu corpo, tentando lavar toda a tensão acumulada. Vesti a melhor roupa que encontrei no armário, algo que me fazia sentir confiante, mesmo que só por fora. Por dentro, eu ainda estava quebrada.Quando cheguei ao escritório, o clima estava um pouco diferente. Ricardo parecia mais animado que o normal, e isso não era algo fácil de acontecer. Ele era conhecido por ser exigente, então, quando estava de bom humor, algo grande estava para acontecer.— Clara, preciso de você na sala de reuniões em cinco minutos. Vamos discutir a apresentação com o cliente — disse ele,
CLARAAquela noite eu mal dormi. Não por causa do que aconteceu com Lucas ou da traição de Aline, mas por causa de Henrique. Eu sabia que era ridículo — mal conhecia o homem! —, mas, mesmo assim, algo nele mexeu comigo de uma forma que eu não conseguia entender.No dia seguinte, acordei com a sensação de que estava prestes a fazer algo importante, mas sem ter a mínima ideia do que era. E isso me deixava ainda mais nervosa. Tomei meu café da manhã em silêncio, enquanto Ana folheava uma revista na mesa ao lado. Ela percebeu meu nervosismo, mas sabiamente não comentou nada.Fui para o trabalho como se estivesse em piloto automático. Tudo parecia fora do lugar, como se o mundo ao meu redor estivesse em câmera lenta, enquanto minha mente corria a mil por hora. Quando cheguei ao escritório, a primeira coisa que fiz foi checar meus e-mails, torcendo para encontrar alguma mensagem importante que me distraísse dos pensamentos sobre Henrique.Para minha surpresa, havia uma mensagem dele na minh
CLARANa semana seguinte, me vi pensando em Henrique mais vezes do que gostaria de admitir. Cada vez que seu nome surgia em uma conversa no escritório, sentia uma pontada de ansiedade misturada com uma excitação que eu não conseguia entender. Era como se meu corpo estivesse reagindo a ele de uma forma que minha mente não conseguia controlar.Eu sabia que estava andando em território perigoso. Depois de tudo que aconteceu com Lucas, a última coisa que eu precisava era me envolver emocionalmente com alguém, especialmente alguém tão ligado ao meu trabalho. Mas, por mais que tentasse, não conseguia evitar a atração que sentia por Henrique. Era como se algo além de mim estivesse no controle, puxando-me para ele.Na terça-feira, recebi um e-mail dele, pedindo uma reunião para discutir os próximos passos da campanha. Eu sabia que era uma simples reunião de trabalho, mas a ideia de passar mais tempo com ele me deixou nervosa. Não nervosa de um jeito ruim, mas nervosa de um jeito que fazia meu
CLARAOs dias seguintes foram uma mistura confusa de trabalho e pensamentos constantes sobre Henrique. Era como se meu cérebro tivesse decidido que ele era o novo foco central da minha vida, e não importava o quanto eu tentasse me distrair, tudo sempre voltava para ele.No escritório, as coisas continuavam normais — ou pelo menos, eu tentava agir como se estivessem. Ninguém sabia sobre o turbilhão de emoções que eu estava sentindo, nem mesmo Ana. Eu sabia que, se contasse a ela, ela iria entender, mas parte de mim ainda queria manter esses sentimentos em segredo, talvez por medo do que eles realmente significavam.Na sexta-feira à tarde, recebi outro e-mail de Henrique. Era uma mensagem curta, convidando-me para um evento de lançamento que sua empresa estava organizando na semana seguinte. Disse que seria uma boa oportunidade para discutirmos mais sobre a campanha e, claro, para eu conhecer algumas pessoas importantes do setor.Ao ler o e-mail, senti um misto de nervosismo e empolgaçã
CLARANo dia seguinte ao evento, acordei com uma sensação estranha de expectativa, como se algo estivesse prestes a acontecer. A noite anterior ainda estava fresca na minha mente, e não conseguia parar de pensar em Henrique e em tudo o que ele disse. Era como se ele tivesse plantado uma semente de esperança dentro de mim, algo que eu não sentia há muito tempo.Mas, ao mesmo tempo, havia uma nuvem de preocupação pairando sobre mim. Eu sabia que estava começando a me apaixonar por Henrique, mas também sabia que havia muitas complicações nesse caminho. A mais óbvia era o fato de que ele era tio de Lucas, o homem que havia destruído meu coração. E, mesmo que eu não tivesse contado a Henrique sobre minha relação com Lucas, sabia que esse segredo não poderia ser mantido para sempre.Passei o dia tentando me concentrar no trabalho, mas minha mente continuava voltando para Henrique. As lembranças da noite anterior se misturavam com os pensamentos do que poderia acontecer a seguir. Eu sabia qu