POV ALICE.
Toquei seu focinho frio e observei atentamente. Seus olhos continuavam fechados, sem qualquer sinal de movimento. A respiração, antes pesada, agora era quase imperceptível. Entrei em pânico.
— Não, não, por favor, aguente firme! — implorei em voz baixa, tentando manter a calma. Mas o medo crescia dentro de mim. Então, percebi.
— Droga, acho que ele entrou em coma… — minha voz falhou, uma mistura de desespero e impotência tomou conta de mim.
Olhei para o lobo, sentindo meu coração apertar. O que eu faria agora? Ele estava à beira da morte, e eu não tinha tempo a perder. Precisava agir, mas não sabia se conseguiria salvá-lo. Apenas uma coisa era certa: eu não poderia desistir dele agora.
O lobo continuava imóvel, seu peito mal se movendo. Eu podia sentir o peso da urgência esmagando meu peito. Precisava fazer algo. Mas o quê? Sou apenas uma ajudante de veterinário.
Olhei em volta, tentando pensar em uma solução.
O único som era minha própria respiração acelerada. Peguei o estetoscópio improvisado que mantinha no celeiro para examinar os animais feridos. Coloquei-o contra o corpo do lobo e tentei ouvir seus batimentos. Fracos, quase imperceptíveis. O pânico me dominou novamente.
— Não desista agora… lute, você consegue — falei, incentivando-o. Não podia perdê-lo.
Fui até o armário de primeiros socorros e procurei desesperadamente algo que pudesse ajudar. Soro fisiológico? Não, não tinha como administrá-lo. Bandagens? Não adiantariam. Um desfibrilador… claro, eu não tinha um. Senti o desespero crescer como um monstro faminto.
Preciso pensar, me obriguei, enquanto a adrenalina corria pelas minhas veias. Sabia que lobos são criaturas resilientes, mas o estado dele era grave demais para esperar que a natureza fizesse seu trabalho. Eu já havia tratado suas feridas e administrado antibiótico e anti-inflamatório. Talvez fosse suficiente.
Minhas mãos tremiam enquanto esfregava o rosto, tentando clarear a mente. Foi quando me ocorreu algo. Havia ouvido histórias de lobos que conseguiam curar-se mais rápido. Talvez, se eu o mantivesse aquecido, seu corpo pudesse reagir.
Com isso em mente, corri até o canto do celeiro, onde guardava alguns cobertores. Puxei dois, os mais grossos que consegui encontrar, e voltei correndo. Com cuidado, cobri o corpo enorme do lobo, na esperança de estabilizar sua temperatura.
— Você vai ficar bem… prometo — sussurrei, quase tentando me convencer.
Segurei sua enorme pata, sentindo seus pelos sob meus dedos. Ele parecia tão forte, tão imponente… e, ainda assim, ali estava, vulnerável e à beira da morte. A ideia de perder aquela criatura… doía.
Os minutos pareceram se arrastar como dias enquanto eu o vigiava. Não havia muito que eu pudesse fazer, a não ser esperar. O tempo parecia congelar, e a incerteza era sufocante. Minha mente continuava a pensar em todas as formas de ajudá-lo, mas eu me sentia impotente. Talvez fosse hora de aceitar que nem todos os animais que resgatava poderiam ser salvos.
No entanto, algo dentro de mim se recusava a desistir. Talvez fosse minha teimosia. O silêncio foi quebrado por um leve som, quase imperceptível. Meu coração saltou. A respiração dele… havia mudado.
Inclinei-me mais perto, esperando, com o coração quase na garganta. E então, de repente, um som rouco e profundo escapou de sua boca. Um gemido baixo, mas audível. Ele estava lutando. Meu corpo inteiro se arrepiou.
— Isso, garoto, você está lutando! — falei, com uma mistura de esperança e apreensão. Apertei sua pata levemente. Mas o alívio foi breve. Sua respiração voltou a ficar irregular. Senti meu coração afundar.
— Não agora… não agora… — sussurrei, desesperada. Levantei-me rapidamente e comecei a massagear seu peito, sem ter certeza se isso ajudaria, mas sem alternativa.
Meus movimentos eram frenéticos, meu coração martelando no peito. Eu não sabia o que estava fazendo, mas não podia ficar parada. Sentia o calor irradiando dele, mas o batimento continuava fraco. Foi então que ouvi o som distante de passos rápidos se aproximando. O rangido das tábuas velhas do celeiro denunciou a chegada de alguém. Meu coração disparou ao perceber quem era.
A porta se abriu com um estrondo, revelando a figura de minha mãe, Antônia, visivelmente preocupada. Seus olhos varreram o ambiente até pousarem sobre mim. Seu rosto refletia a preocupação pela minha demora.
— Alice? — exclamou, aflita. — O que… o que você está fazendo aqui? Por que demorou tanto para voltar para casa? Vi a luz acesa… — Ela parou ao ver o lobo ao meu lado e arregalou os olhos. Eu podia ver sua incredulidade se transformando em horror.
— O que é isso? — questionou, sua voz saindo em um sussurro tenso, como se mal acreditasse no que via. — Um lobo? Você trouxe um lobo para casa? — perguntou, incrédula.
— Mãe, calma, por favor! — Levantei-me rapidamente, as palavras saindo com urgência. — Ele está ferido, eu não podia deixá-lo lá fora. Ele precisa de ajuda! — expliquei.
Minha mãe deu um passo para trás, colocando a mão no peito, como se precisasse de apoio para processar o que estava vendo. O lobo, tão grande e imponente, estava agora vulnerável, mas para minha mãe, era uma criatura selvagem e perigosa.
— Alice, você está louca? — A voz dela estava carregada de pânico. — Isso é um animal selvagem! E se ele acordar? Se ele te atacar? Ele vai nos matar! Você perdeu o juízo! — falou, irritada.
— Ele não vai, mãe! — argumentei, minha voz embargada de emoção. — Ele está morrendo! Eu não podia deixá-lo… Por favor, me escute! Ele não sobreviverá se eu não fizer nada. — Comentei, aflita. Mamãe olhou de volta para o lobo, o corpo dele agora tremendo levemente sob os cobertores. Ela balançou a cabeça, ainda em choque, os olhos cheios de temor.
— Isso é perigoso, e muito irresponsável. Não sabemos de onde ele veio, o que pode acontecer se ele acordar. — Disse, preocupada.
— Mãe, eu não podia virar as costas para ele. — Mencionei.
Minha mãe me encarou por um longo momento, dividida entre o medo e o instinto protetor. Era como se ela não soubesse se deveria me puxar para longe ou me auxiliar a salvá-lo. Finalmente, ela respirou fundo, os ombros tensos.
— Isso vai acabar mal… — murmurou minha mãe, com voz de preocupação. Ela ainda falava, quando ouvimos um rosnado feroz e alto atrás de nós. Meu sangue chegou a gelar nas veias.
POV ALICE.Eu e mamãe corremos desesperadas em direção à porta do celeiro. Saímos às pressas, ofegantes e tomadas pelo pavor do rosnado que ouvimos.— Eu te disse que esse lobo ia acordar e nos atacar! O que faremos agora com um lobo selvagem dentro do nosso celeiro? — disparou minha mãe, nervosa, a voz trêmula de medo.— Calma, mamãe, eu vou resolver — falei, tentando manter a compostura, enquanto espiava pela fresta de madeira. O celeiro estava quieto, silencioso. Lá dentro, o lobo permanecia deitado, imóvel, no mesmo lugar. Senti um alívio imediato.— Ele continua parado. Acho que rosnou enquanto dormia. Vou entrar para verificar — falei, tentando soar confiante. Minha mãe agarrou meu braço, a preocupação nítida em seus olhos.— Você está louca? E se ele estiver acordado e te atacar? — murmurou, a voz baixa, temendo até mesmo o som de suas palavras.— Vou ter cuidado, prometo — comentei, acariciando a mão dela antes de entrar no celeiro. Aproximando-me do lobo, peguei um pedaço de
POV DARIUS.Eu estava me perdendo, sentindo meu corpo afundar num vazio profundo. Baltazar estava em silêncio, eu estava sozinho, desprotegido. Era como se uma sombra densa me envolvesse, me puxando para o abismo. Minha mente gritava por força, mas meu corpo estava exausto demais para continuar lutando. A dor era sufocante. Eu já havia aceitado o fim, até que… ouvi uma voz.Ela era doce, quase como um sussurro, mas cheia de medo, implorando para que eu não a deixasse. Essa voz… trazia algo mais, uma força que eu já não sabia que possuía. “Lute”, dizia ela, e por mais que parecesse impossível, algo dentro de mim reagiu. Ela me dava ânimo, esperança e, com o pouco que me restava, agarrei-me àquele som angelical e comecei a lutar.Senti, de repente, um toque suave, como o calor de um raio de sol após dias de tempestade. Era acolhedor, reconfortante. Lentamente, algo dentro de mim se reacendia. A dor ainda estava presente, mas agora eu tinha uma centelha de força. Lutei contra o peso nas
POV DARIUS.Olhei na direção da porta e uma senhora de feições gentis me encarava. Seus olhos brilhavam com uma mistura de medo e indignação ao ver essa humana tão próxima de mim, tocando-me como se eu fosse um simples animal inofensivo. Ela tinha um ar de determinação e desagrado que ficou claro. Então essa insolente se chama Alice?A idosa me olhava como se eu fosse uma ameaça iminente, pronta para atacar. Se soubesse quem eu realmente era, teria fugido apavorada. Alice, por outro lado, permaneceu imóvel. Seus olhos voltaram-se para mim antes de responder com tranquilidade:— Mãe, está tudo bem. Ele não vai me machucar — disse Alice, olhando com firmeza para a idosa. Sua voz era suave, mas segura. Então ela é mãe dessa insolente. Observei atentamente, tentando entender de onde vinha essa confiança. Eu poderia dilacerá-la em segundos, mas ela parecia não ter medo.— Não vai te machucar? — A mãe de Alice deu um passo à frente, os olhos cheios de preocupação. — Ele é uma fera selvagem,
POV ALICE.O primeiro raio de sol invadiu meu quarto através das cortinas entreabertas, aquecendo levemente meu rosto. Abri os olhos devagar, sentindo o conforto da minha cama macia. Meu quarto, embora simples, tinha tudo o que eu precisava. As paredes eram de um tom creme suave, decoradas com fotos antigas da família e quadros pintados à mão. A mobília era antiga, mas muito bem conservada, cheia de memórias. Havia uma prateleira de madeira no canto, abarrotada de livros de veterinária e algumas plantas que minha mãe insistia em cuidar para mim.Me sentei na cama e olhei em volta. Aquele lugar era mais do que um simples cômodo; era um refúgio de tranquilidade. Meu quarto refletia a simplicidade da nossa casa: aconchegante, cheio de amor, um lugar onde o tempo parecia passar mais devagar. Estiquei os braços, sentindo a leve dor nos músculos de tantas noites mal dormidas. Eu precisava descansar mais, mas não podia deixar aquele lobo sozinho.Com um suspiro, levantei e me arrumei rapidam
POV DARIUS.A voz de Baltazar era uma brisa de alívio. Meu lobo estava de volta, e o vazio que ele deixou, parecia, finalmente, preenchido. Mas algo havia mudado profundamente dentro de mim. Uma angústia diferente me apertava o peito, uma mistura de medo e alívio. Como seria agora, depois de tudo?— Baltazar… você finalmente voltou — falei, tentando controlar a felicidade que me transbordava. Eu, sem meu lobo, sou apenas uma casca, um humano inútil, perdido e incompleto. Senti uma onda de gratidão me percorrer, e parecia que Baltazar sentia o mesmo.— Parece que você sentiu minha falta — ele respondeu com sua risada familiar, vibrando dentro da minha mente como uma melodia que eu jamais queria esquecer.— Você não faz ideia do inferno que tenho passado sem você. Viver como humano é uma merda — contei, deixando minha voz trêmula revelar o que realmente sentia.— Sei o que você passou, Darius. Nós não podíamos nos comunicar, e você não podia me sentir, mas vi, ouvi e senti tudo o que vo
POV DARIUS.— Não acredito… temos uma companheira de segunda chance. — A voz de Baltazar ressoou em minha mente, cheia de um misto de admiração e empolgação.Eu não conseguia desviar o olhar. Ali estava ela, minha companheira, movendo-se com uma graça que prendia minha atenção em cada pequeno gesto, cada sorriso. Quando Alice me deu bom dia, com aquele brilho no olhar e um sorriso despreocupado, senti uma onda de felicidade que há muito não sentia. Era uma sensação estranha, mas agora eu entendia. Aquele turbilhão de emoções confusas que vinha me atormentando ultimamente… tudo fazia sentido. Minha alma reconhecia Alice como minha.— Acha que ela sente algo? — perguntei a Baltazar, não em dúvida, mas buscando entender o que ele via.— É claro que sim, — respondeu Baltazar, com uma certeza fria e orgulhosa, quase arrogante. — Ela pertence a nós. Mesmo sem saber, o corpo dela responderá… ao nosso toque, ao nosso olhar. — Disse.Alice se aproximou e seus dedos delicados começaram a desliz
POV DARIUS.Alice ainda estava deitada no chão, respirando fundo para se recuperar da queda. Seu rosto mostrava sinais de cansaço, mas os olhos mantinham um brilho determinado e um leve sorriso, como se quisesse esconder qualquer fraqueza. Eu permanecia ao seu lado, atento a cada movimento dela, e mesmo em um momento de vulnerabilidade, Alice parecia determinada a se mostrar forte.No entanto, nossa aproximação foi bruscamente interrompida pela chegada de sua mãe, escandalosa e de olhos arregalados de pavor. Ao me ver ao lado da filha, o pânico dela se transformou em uma fúria descontrolada. A voz, embargada pelo desespero, pegou um pedaço de madeira, que estava encostado na parede, empunhando-o como uma arma e me ameaçando sem hesitar. Senti um rosnado profundo formar-se em meu peito; uma resposta automática à ameaça que ela representava. Baltazar revoltou-se imediatamente.— O que ela pensa que vai fazer com aquele pedacinho de madeira? Essa humana ousa nos desafiar! Precisa aprende
POV ALICE.Minha mãe se aproximou e me ajudou a levantar. Seu olhar permanecia determinado. Senti o lobo encostar em mim. Acariciei seu pelo, ele estava ao meu lado. Eu sentia a tensão em cada fibra de meu corpo. Eu sabia que sua presença aqui incomodava minha mãe, mas eu não queria que ele fosse embora.— Mãe, por favor, me escute — falei, minha voz carregada de urgência. — Ele ainda não está totalmente curado. Se o mandarmos embora agora, ele não sobreviverá lá fora. Está machucado demais para se defender de qualquer perigo. — Falei exagerando, eu sabia que ele estava bem, mas não o queria longe de mim.Minha mãe cruzou seus braços, o rosto inexpressivo, embora eu pudesse ver a preocupação escondida em seus olhos. Ela suspirou, impaciente, e olhou para o lobo com uma expressão de desconfiança.— Alice, você não entende. Esse é um lobo, um animal selvagem. Não é como os outros bichos que resgatou e depois acolheu. Ele já está aqui há tempo demais, e quanto mais tempo ele fica, mais e