CAPÍTULO OITO: ENTRE O CUIDADO E A EXAUSTÃO.

POV ALICE.

O primeiro raio de sol invadiu meu quarto através das cortinas entreabertas, aquecendo levemente meu rosto. Abri os olhos devagar, sentindo o conforto da minha cama macia. Meu quarto, embora simples, tinha tudo o que eu precisava. As paredes eram de um tom creme suave, decoradas com fotos antigas da família e quadros pintados à mão. A mobília era antiga, mas muito bem conservada, cheia de memórias. Havia uma prateleira de madeira no canto, abarrotada de livros de veterinária e algumas plantas que minha mãe insistia em cuidar para mim.

Me sentei na cama e olhei em volta. Aquele lugar era mais do que um simples cômodo; era um refúgio de tranquilidade. Meu quarto refletia a simplicidade da nossa casa: aconchegante, cheio de amor, um lugar onde o tempo parecia passar mais devagar. Estiquei os braços, sentindo a leve dor nos músculos de tantas noites mal dormidas. Eu precisava descansar mais, mas não podia deixar aquele lobo sozinho.

Com um suspiro, levantei e me arrumei rapidamente. A luz da manhã iluminava os móveis de madeira envelhecida na casa, enquanto eu me dirigia para a cozinha. Assim que entrei, o cheiro familiar de café fresco encheu o ar.

— Já está de pé, Alice? — A voz de minha mãe ecoou antes mesmo que eu pudesse lhe dar bom dia.

Lá estava ela, como sempre, de pé diante do fogão, com um avental florido. Minha mãe, aos setenta e seis anos, ainda era uma força da natureza. Seus cabelos grisalhos estavam presos em um coque prático, e suas mãos ágeis mexiam a panela como se o tempo nunca tivesse tocado sua energia. Ela odiava ficar parada, era uma pessoa muito ativa. E nem aparentava ter setenta e seis anos.

— Bom dia, mamãe, sua benção — falei com um sorriso, enquanto me aproximava dela e lhe abraçava por trás e beijava sua bochecha. 

— Bom dia e Deus te abençoe — ela falou e bufou, virando-se para me olhar. — O que tem de bom em você ficar se esgotando desse jeito? Anda dormindo mal, levanta cedo para cuidar daquele lobo no celeiro, e ainda tem o trabalho na clínica. — Sua expressão era de preocupação, mas também de irritação. — Alice, você não é mais uma menina. Precisa descansar! — Disse mamãe. Enquanto eu andava até a mesa. Eu suspirei, sabendo que não conseguiria fugir da bronca matinal.

— Mãe, ele precisa de mim. Se eu não cuidar dele, quem vai? Ele está se recuperando rápido, mas ainda não consegue se mover direito e está fraco. Não posso deixá-lo abandonado lá. — Falei e sentei-me à mesa, pegando uma xícara de café que minha mãe havia colocado para mim. Mamãe parou por um momento, apoiando as mãos na cintura, e me olhou, com os olhos semicerrados.

— Você pode muito bem encontrar alguém para te ajudar, Alice. Ficar enfiada naquele celeiro, de manhã e de tarde, e ainda trabalhar na clínica, acabará com você! — Ela colocou a frigideira sobre o fogão e virou-se para mim, cruzando seus braços. — Não tem ninguém que possa cuidar desse bicho enquanto você descansa? Por que não entrega para o pessoal do parque estadual? Você está se matando lentamente, e eu não quero perder minha filha por um lobo!

— Mãe, por favor… — suspirei. — Não é só um lobo. Ele é diferente, especial. Sei que parece loucura, mas sinto que tenho que ajudá-lo. — Comentei.

— Loucura é o que é — disse minha mãe, sacudindo a cabeça. — Você mal tem tempo para você mesma. Quando não está trabalhando, está no celeiro. Mal cuida de si. Não quero que acabe doente! — Falou minha mãe. Eu sabia que ela estava certa, mas algo me puxava de volta para aquele celeiro todos os dias. Algo naquele lobo me fazia sentir que não podia abandoná-lo.

— Vou ficar bem, mãe. Só preciso terminar o que comecei. Ele está melhorando, e logo não precisarei mais passar tanto tempo com ele e poderá voltar para a natureza. — Falei. Mamãe bufou, pegando a frigideira e despejando os ovos mexidos no prato à minha frente.

— Espero que saiba o que está fazendo, Alice. Porque você está se desgastando demais — mamãe murmurou, mas deixou o assunto morrer ali. Sentamos juntas para o café da manhã, e eu me deixei envolver pela sensação de normalidade, mesmo com o cansaço pesando nos meus ombros.

Quando terminei, me despedi com um beijo no rosto dela e caminhei em direção ao celeiro, a leve brisa da manhã refrescando meu rosto cansado. Talvez mamãe tenha razão. Eu precisava descansar mais, mas hoje não. 

Assim que cheguei ao celeiro, o som dos meus passos ecoou pelo chão de madeira. Abri a porta e, para minha surpresa, encontrei o lobo acordado e sentado na cama de feno, os olhos fixos em mim, como se estivesse esperando.

— Bom dia, lobinho — eu disse, tentando soar animada, mas sentindo o peso do cansaço em cada palavra. Ele me observava atentamente, seu olhar intenso, mas agora menos ameaçador. Eu não tinha mais tanto medo dele, mas nunca abaixava completamente a guarda. Não podia esquecer que ele era um animal selvagem.

Caminhei até ele e comecei a examinar seus ferimentos. As feridas haviam cicatrizado, deixando apenas marcas leves na sua pele, agora coberta por pelos mais grossos. Murmurei algo para mim mesma: — Ah, quem diria… um lobinho tão imponente, mas com um olhar tão… suave. Enquanto eu o observava, percebi algo estranho: o lobo começou a abanar o rabo e lamber o focinho de maneira quase… brincalhona?

— Ora, o que foi isso? Está tentando me impressionar agora? — Eu brinquei, rindo suavemente. Ele continuou com o comportamento estranho, e isso me fez sorrir. Talvez estivesse se sentindo melhor.

Eu me abaixei para pegar o estetoscópio que caiu da minha mão, mas quando me levantei, uma tontura repentina me atingiu. O mundo girou e, antes que eu percebesse, perdi o equilíbrio. Meu corpo tombou para o lado e caí, sentindo o chão duro contra mim.

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