POV DARIUS.
— O que tinha no chá, sua m*****a? — perguntei com raiva.
— Não se preocupe, querido, agora você é meu. — Disse Agnes, sorrindo vitoriosa.
Senti uma leve tontura e percebi o cheiro de lobos se aproximando. Rosnei de raiva e Agnes se assustou. Levantei-me, pronto para matar a todos. Agnes me olhou, com os seus olhos arregalados, e saiu correndo pela porta da cabana. Eu me levantei, ainda um pouco tonto, e saí da cabana logo atrás da bruxa, pronto para acabar com sua vida. Mas, quando cheguei na porta, só pude ver ela desaparecendo em meio à fumaça roxa e densa. Com dificuldade, fui me transformando em um lobo negro de olhos azuis, mas era tarde demais. Minha visão estava turva, e meus reflexos, lentos.
Havia algo naquele chá que me impedia de lutar com toda a minha força. M*****a hora em que confiei naquela bruxa e suas promessas. Pensei, enquanto minhas mandíbulas se fechavam em torno do pescoço de um lobo marrom, quebrando-o com um estalo surdo. O gosto metálico do sangue preencheu minha boca, mas não trouxe satisfação. Fui emboscado na floresta por dez lobos da alcateia Lua de Sangue, uma alcateia que me perseguia há tempos e queria meu trono.
Um rosnado profundo escapou de mim quando dentes afiados penetraram minha pata traseira direita. Outra garra rasgou minhas costas, e a dor aguda me fez vacilar. Contudo, não sou chamado de besta infernal à toa. Reunindo o que restava de minhas forças, girei o corpo, dilacerando o lobo que mordia minha pata, e avancei com ferocidade contra o que havia me ferido, arrancando-lhe a cabeça com um único golpe.
Antes que pudesse respirar, mais dois lobos saltaram de lados opostos, tentando me cercar. Um deles abocanhou meu ombro, enquanto o outro tentava morder minha perna traseira novamente. A dor explodiu, mas não havia espaço para fraqueza. Com um impulso poderoso, empurrei o que mordia meu ombro para longe, lançando-o contra uma árvore com tal força que o som de ossos quebrando ecoou pelo ar. No mesmo movimento, cravei minhas garras no que mordia minha perna, rasgando-lhe o flanco até ver suas entranhas escorrerem pelo chão.
O último lobo tentou fugir, percebendo que a derrota era certa. Mas não havia escapatória. Em um salto, alcancei-o, derrubando-o ao chão. Seus olhos arregalaram-se em desespero, mas eu não hesitei. Minhas mandíbulas fecharam-se em torno de sua cabeça, esmagando seu crânio com um estalo seco.
Olhei ao redor. Os corpos dos lobos da alcateia Lua de Sangue, estavam espalhados, todos mortos. Eu havia triunfado, mas não sem pagar o preço. O sangue escorria de várias feridas, e minha respiração estava pesada. Minhas patas tremiam.
— Baltazar? — chamei mentalmente, desesperado. Mas o silêncio foi ensurdecedor.
— Baltazar! — insisti, o pânico crescendo dentro de mim. Nada. O vazio que se seguiu me gelou a alma. Não havia resposta, nem o familiar rosnado de raiva, nem sua presença avassaladora. Apenas… silêncio. Tentei me concentrar, senti-lo, alcançá-lo em minha mente, mas algo estava errado. Ele havia sumido.
Cambaleando, sangrando e enfraquecido, me afastei da cena da batalha. Meu corpo estava cheio de ferimentos, meus músculos latejavam de dor. Eu precisava de um refúgio, de um lugar para me curar e pensar em como me vingar de Agnes. Mas, antes que pudesse ir longe, minhas forças se esgotaram. Perdi o equilíbrio e caí à beira do rio, minhas patas mergulhando na água fria. Senti as correntes violentas me arrastarem, enquanto a consciência lentamente se esvaía de mim.
O rio me carregava com uma força implacável, levando-me para longe. A dor excruciante dos ferimentos misturava-se ao frio penetrante das águas escuras, e minha mente oscilava entre delírios e momentos de semiconsciência. Por fim, após horas à deriva, fui jogado contra uma margem desconhecida. Meus ferimentos eram graves demais, e, antes que pudesse tentar me levantar, minha visão escureceu de vez.
POV ALICE.
Após passar o período da tarde trabalhando como ajudante na clínica veterinária da cidade, estou voltando para casa caminhando. Meu sonho é me tornar uma veterinária um dia, e estou juntando dinheiro para pagar a faculdade. Como sempre, decidi cortar caminho pela floresta para chegar mais rápido antes do anoitecer.
Cresci em um pequeno sítio com minha mãe, Antônia, uma mulher simples, mas de um coração imenso. Ela me encontrou quando eu tinha dez anos, sozinha, nua e sem memória, em um beco sujo da cidade. Ela me acolheu como filha, me deu um nome e um lar. Agora, sou Alice Miller, tenho trinta e três anos, vivo em Salem, Oregon. Nosso pequeno sítio fica na fronteira do parque estadual Silver Falls.
Mas o mistério sobre quem eu era antes daquele dia continua a me assombrar. Às vezes, acordo no meio da noite, tentando desesperadamente me lembrar de algo, qualquer coisa sobre meu passado. Já estava quase em casa e havia chegado ao rio que fica nos fundos da minha propriedade, mas algo chamou minha atenção. Entre a vegetação próxima ao rio, um vulto. Pelos escuros se misturavam com as sombras. Parei, franzindo o cenho. Como sou muito curiosa e não posso ver um animal ferido sem querer ajudar, pensei em me aproximar.
— O que será aquilo? — pensei, a curiosidade me dominando. Sabia que deveria seguir em frente, mas algo dentro de mim me forçava a investigar, aproximando-me devagar. Quando finalmente vi o que estava à minha frente, meu coração acelerou.
Era um lobo. Um lobo negro, gigante. Ele estava caído, imóvel. Nunca havia visto um animal tão grande, tão assustador. Seu corpo estendido, cheio de cicatrizes e marcas de sangue, contrastava com seus pelos negros brilhantes. Ele devia ter quase dois metros de comprimento.
— Será que está morto? — sussurrei para mim mesma, minhas mãos tremendo.
POV ALICE.Meu primeiro instinto foi correr. O lobo era gigantesco, mais do que eu já tinha visto em qualquer documentário ou livro. Nunca havia ouvido falar de lobos nesta região, e sabia serem perigosos. Mas… algo em mim não permitiu que eu fugisse. Talvez fosse a minha paixão por animais. Ser veterinária sempre foi o meu sonho, e ali estava, diante de mim, uma oportunidade de ajudar. Mesmo que fosse imprudente.Aproximei-me devagar. Peguei um galho ao meu lado, hesitante, e cutuquei o corpo inerte. Nenhuma reação. Ele não se mexeu. Meu coração acelerou, mas a tensão que sentia diminuiu um pouco. Me ajoelhei perto dele, sentindo o cheiro de terra e pinho preenchendo o ar ao meu redor.— Você é enorme… — murmurei, enquanto minha mão tremia ao tocar de leve seu pelo. O calor de seu corpo me chocou. Ele estava vivo, mas tão machucado que eu mal conseguia entender como ainda respirava. Uma onda de pânico me percorreu.— Você está vivo… — sussurrei, me afastando rapidamente, o coração di
POV ALICE.Toquei seu focinho frio e observei atentamente. Seus olhos continuavam fechados, sem qualquer sinal de movimento. A respiração, antes pesada, agora era quase imperceptível. Entrei em pânico.— Não, não, por favor, aguente firme! — implorei em voz baixa, tentando manter a calma. Mas o medo crescia dentro de mim. Então, percebi.— Droga, acho que ele entrou em coma… — minha voz falhou, uma mistura de desespero e impotência tomou conta de mim.Olhei para o lobo, sentindo meu coração apertar. O que eu faria agora? Ele estava à beira da morte, e eu não tinha tempo a perder. Precisava agir, mas não sabia se conseguiria salvá-lo. Apenas uma coisa era certa: eu não poderia desistir dele agora.O lobo continuava imóvel, seu peito mal se movendo. Eu podia sentir o peso da urgência esmagando meu peito. Precisava fazer algo. Mas o quê? Sou apenas uma ajudante de veterinário.Olhei em volta, tentando pensar em uma solução.O único som era minha própria respiração acelerada. Peguei o est
POV ALICE.Eu e mamãe corremos desesperadas em direção à porta do celeiro. Saímos às pressas, ofegantes e tomadas pelo pavor do rosnado que ouvimos.— Eu te disse que esse lobo ia acordar e nos atacar! O que faremos agora com um lobo selvagem dentro do nosso celeiro? — disparou minha mãe, nervosa, a voz trêmula de medo.— Calma, mamãe, eu vou resolver — falei, tentando manter a compostura, enquanto espiava pela fresta de madeira. O celeiro estava quieto, silencioso. Lá dentro, o lobo permanecia deitado, imóvel, no mesmo lugar. Senti um alívio imediato.— Ele continua parado. Acho que rosnou enquanto dormia. Vou entrar para verificar — falei, tentando soar confiante. Minha mãe agarrou meu braço, a preocupação nítida em seus olhos.— Você está louca? E se ele estiver acordado e te atacar? — murmurou, a voz baixa, temendo até mesmo o som de suas palavras.— Vou ter cuidado, prometo — comentei, acariciando a mão dela antes de entrar no celeiro. Aproximando-me do lobo, peguei um pedaço de
POV DARIUS.Eu estava me perdendo, sentindo meu corpo afundar num vazio profundo. Baltazar estava em silêncio, eu estava sozinho, desprotegido. Era como se uma sombra densa me envolvesse, me puxando para o abismo. Minha mente gritava por força, mas meu corpo estava exausto demais para continuar lutando. A dor era sufocante. Eu já havia aceitado o fim, até que… ouvi uma voz.Ela era doce, quase como um sussurro, mas cheia de medo, implorando para que eu não a deixasse. Essa voz… trazia algo mais, uma força que eu já não sabia que possuía. “Lute”, dizia ela, e por mais que parecesse impossível, algo dentro de mim reagiu. Ela me dava ânimo, esperança e, com o pouco que me restava, agarrei-me àquele som angelical e comecei a lutar.Senti, de repente, um toque suave, como o calor de um raio de sol após dias de tempestade. Era acolhedor, reconfortante. Lentamente, algo dentro de mim se reacendia. A dor ainda estava presente, mas agora eu tinha uma centelha de força. Lutei contra o peso nas
POV DARIUS.Olhei na direção da porta e uma senhora de feições gentis me encarava. Seus olhos brilhavam com uma mistura de medo e indignação ao ver essa humana tão próxima de mim, tocando-me como se eu fosse um simples animal inofensivo. Ela tinha um ar de determinação e desagrado que ficou claro. Então essa insolente se chama Alice?A idosa me olhava como se eu fosse uma ameaça iminente, pronta para atacar. Se soubesse quem eu realmente era, teria fugido apavorada. Alice, por outro lado, permaneceu imóvel. Seus olhos voltaram-se para mim antes de responder com tranquilidade:— Mãe, está tudo bem. Ele não vai me machucar — disse Alice, olhando com firmeza para a idosa. Sua voz era suave, mas segura. Então ela é mãe dessa insolente. Observei atentamente, tentando entender de onde vinha essa confiança. Eu poderia dilacerá-la em segundos, mas ela parecia não ter medo.— Não vai te machucar? — A mãe de Alice deu um passo à frente, os olhos cheios de preocupação. — Ele é uma fera selvagem,
POV ALICE.O primeiro raio de sol invadiu meu quarto através das cortinas entreabertas, aquecendo levemente meu rosto. Abri os olhos devagar, sentindo o conforto da minha cama macia. Meu quarto, embora simples, tinha tudo o que eu precisava. As paredes eram de um tom creme suave, decoradas com fotos antigas da família e quadros pintados à mão. A mobília era antiga, mas muito bem conservada, cheia de memórias. Havia uma prateleira de madeira no canto, abarrotada de livros de veterinária e algumas plantas que minha mãe insistia em cuidar para mim.Me sentei na cama e olhei em volta. Aquele lugar era mais do que um simples cômodo; era um refúgio de tranquilidade. Meu quarto refletia a simplicidade da nossa casa: aconchegante, cheio de amor, um lugar onde o tempo parecia passar mais devagar. Estiquei os braços, sentindo a leve dor nos músculos de tantas noites mal dormidas. Eu precisava descansar mais, mas não podia deixar aquele lobo sozinho.Com um suspiro, levantei e me arrumei rapidam
POV DARIUS.A voz de Baltazar era uma brisa de alívio. Meu lobo estava de volta, e o vazio que ele deixou, parecia, finalmente, preenchido. Mas algo havia mudado profundamente dentro de mim. Uma angústia diferente me apertava o peito, uma mistura de medo e alívio. Como seria agora, depois de tudo?— Baltazar… você finalmente voltou — falei, tentando controlar a felicidade que me transbordava. Eu, sem meu lobo, sou apenas uma casca, um humano inútil, perdido e incompleto. Senti uma onda de gratidão me percorrer, e parecia que Baltazar sentia o mesmo.— Parece que você sentiu minha falta — ele respondeu com sua risada familiar, vibrando dentro da minha mente como uma melodia que eu jamais queria esquecer.— Você não faz ideia do inferno que tenho passado sem você. Viver como humano é uma merda — contei, deixando minha voz trêmula revelar o que realmente sentia.— Sei o que você passou, Darius. Nós não podíamos nos comunicar, e você não podia me sentir, mas vi, ouvi e senti tudo o que vo
POV DARIUS.— Não acredito… temos uma companheira de segunda chance. — A voz de Baltazar ressoou em minha mente, cheia de um misto de admiração e empolgação.Eu não conseguia desviar o olhar. Ali estava ela, minha companheira, movendo-se com uma graça que prendia minha atenção em cada pequeno gesto, cada sorriso. Quando Alice me deu bom dia, com aquele brilho no olhar e um sorriso despreocupado, senti uma onda de felicidade que há muito não sentia. Era uma sensação estranha, mas agora eu entendia. Aquele turbilhão de emoções confusas que vinha me atormentando ultimamente… tudo fazia sentido. Minha alma reconhecia Alice como minha.— Acha que ela sente algo? — perguntei a Baltazar, não em dúvida, mas buscando entender o que ele via.— É claro que sim, — respondeu Baltazar, com uma certeza fria e orgulhosa, quase arrogante. — Ela pertence a nós. Mesmo sem saber, o corpo dela responderá… ao nosso toque, ao nosso olhar. — Disse.Alice se aproximou e seus dedos delicados começaram a desliz