Capítulo 2
O carro freou bruscamente, parando a poucos metros das duas, mas o choque de quase ter sido atropelada deixou a garota paralisada nos braços de Giulia. Ela olhou para Giulia com os olhos arregalados e lágrimas prontas para cair. — Você está bem? — Giulia perguntou, ainda com a voz trêmula pela adrenalina. — Eu... eu acho que sim — respondeu a menina, assustada, enquanto se levantava lentamente. Algumas pessoas se aproximaram, e logo um homem surgiu, visivelmente desesperado e ofegante, mas com uma expressão fechada. — Vitória! Minha filha! — Ele correu até elas e, ao ver Giulia segurando a criança, afastou-a rapidamente da mulher estranha. — O que você pensa que está fazendo com a minha filha? Giulia ficou surpresa com a reação, ainda tentando processar o que havia acontecido. — Eu só... — começou ela, mas ele a interrompeu. — Só? Só colocou a vida dela em perigo, isso sim! — disparou o homem, o rosto vermelho de frustração. — Se você tivesse prestado mais atenção, isso nem teria acontecido! — Mas... eu salvei ela. O carro quase... — tentou explicar, mas se calou sem acreditar na agressividade dele. — Não venha me dizer o que quase aconteceu! — O homem, claramente irritado, lançou um olhar desconfiado. — Fique longe da minha filha! Giulia sentiu a injustiça das palavras dele e, por um momento, pensou em retrucar, mas mordeu os lábios. O homem, abraçando a filha, a levou para longe, sem sequer agradecer, lançando um último olhar de desdém. Giulia suspirou e, sem dizer mais nada, entrou no mercado, ainda processando a situação. Tentou se concentrar nas prateleiras à sua frente, pegando os itens de que precisava, mas o olhar cheio de desdém do cowboy ainda estava fresco em sua mente. Do lado de fora, Carlos ajudou a filha a entrar na caminhonete, fechando a porta com um estalo, ainda com os nervos à flor da pele. Ele olhou para a filha no banco de trás, tentando ver se ela estava realmente bem. — Você está bem, querida? — perguntou, suavizando a voz. — Sim, papai. Foi só um susto — respondeu Vitória, com a voz ainda um pouco trêmula. Carlos soltou um longo suspiro de alívio. Mas logo sua expressão se fechou novamente, a raiva e a confusão misturadas em sua mente. — Aquela mulher é uma louca! — ele exclamou, mais para si mesmo do que para a filha. — Não, papai! — Vitória o corrigiu rapidamente, o tom de voz um pouco mais firme. — Ela me salvou. Eu estava atravessando a rua e não vi o carro. Se ela não tivesse me puxado... Carlos ficou em silêncio por um momento, processando as palavras da filha. Ele tinha agido por impulso, tomado pela adrenalina e pelo medo de perder Vitória. Agora, ouvindo a verdade de sua própria filha, sentiu um arrependimento crescente se espalhar em seu peito. Olhou para o volante e suspirou forte, lembrando de sua grosseria. — Ela te salvou? — ele murmurou, como se tentasse se convencer daquilo. A culpa agora o corroía. — Eu... eu fui um idiota. Ele virou-se para a filha, decidido. — Venha, vamos encontrar aquela mulher. Carlos desceu da caminhonete rapidamente, puxando a filha pela mão. Ele olhou em volta, procurando pela mulher que, agora, ele sabia que devia um pedido de desculpas. Dentro do mercado, Giulia estava distraída, passando os itens para o carrinho, quando sentiu alguém se aproximar. Ela olhou para o lado e viu cowboy, acompanhado de Vitória, se aproximando de forma um pouco hesitante. Sua expressão não era mais de raiva, mas de culpa. — Com licença... — Carlos começou, a voz um tanto baixa. — Eu... preciso falar com você. Giulia o encarou, surpresa. Não esperava vê-lo novamente, muito menos tão rápido. A imagem dele a insultando ainda estava fresca em sua mente. — O que foi agora? — ela respondeu, tentando manter a calma. Carlos suspirou e olhou para a filha, que o incentivou com um pequeno sorriso. — Eu... eu fui um idiota lá fora — ele admitiu, a voz cheia de arrependimento. — Eu agi por impulso e não percebi o que realmente aconteceu. Vitória me contou que você... você salvou ela. Giulia ficou em silêncio, encarando-o com surpresa no olhar. — Eu só estava tentando ajudar — respondeu ela, com a voz baixa. — E eu fui grosso, mal-educado — Carlos continuou. — Eu só... eu pensei que você estivesse distraída, mas na verdade, você a salvou. Se não fosse por você... — Ele parou por um momento, respirando fundo, visivelmente desconfortável. — Não sei o que teria acontecido. Me desculpe. De verdade. Giulia relaxou um pouco ao ouvir as palavras dele, e sua expressão suavizou. Ela olhou para Vitória, que ainda segurava a mão do pai, e depois para o cowboy, que agora parecia um homem bem diferente daquele que havia gritado com ela momentos antes. — Está tudo bem — ela respondeu, finalmente. — Eu entendo. Só fiquei surpresa com a sua reação. Carlos assentiu, parecendo aliviado por ela não ter rejeitado seu pedido de desculpas. — Obrigado, de verdade. Eu... não sei como agradecer — disse ele, baixando o olhar por um momento, visivelmente arrependido. Vitória sorriu para Giulia, e a mulher retribuiu o gesto com um sorriso tímido. — Bom, pelo menos agora você sabe — Giulia disse, olhando para Carlos. — Não foi nada, só fiz o que qualquer um faria. Carlos balançou a cabeça, quase rindo de si mesmo. — Eu não sei se qualquer um teria agido tão rápido quanto você — ele disse, agora mais leve. — Se precisar de qualquer coisa... estou em dívida com você. Giulia sorriu de leve, sentindo o peso da tensão diminuir. — Eu estou bem, obrigada. — Ela hesitou por um momento, e depois continuou: — Só... Fique de olho nela, ok? Crianças são imprevisíveis, mesmo ela já sendo uma mocinha. Carlos riu, mais relaxado agora. — Pode deixar. Eu vou — ele disse, olhando para Giulia com mais atenção, notando algo que não havia percebido antes. Seus olhos recaíram sobre a mala ao lado do carrinho de compras e o sotaque leve em suas palavras. — Você é nova por aqui, não é? — perguntou, curioso. — E tem um sotaque diferente... Você é estrangeira? Giulia suspirou, sentindo uma pontada no peito ao lembrar o motivo que a levou àquela pequena cidade do interior. — Sim... — disse ela, após uma pausa. — Agora minha vida é aqui no Brasil, mas sou italiana. Vitória, que até então estava quieta, arregalou os olhos, empolgada. — Uau! Você é da Itália? — exclamou a menina, encantada. — Eu amo esse idioma! Sempre quis aprender italiano! Carlos sorriu ao ver a empolgação da filha, e isso o fez se sentir mais à vontade. — Bom, meu nome é Carlos Albuquerque. E você, como se chama? — Giulia Ricci — respondeu ela, oferecendo um leve sorriso enquanto apertava a mão dele. A impressão inicial, ainda que tensa, agora parecia mais amigável. Carlos refletiu por um momento, observando Giulia e a situação em que ela estava. Ele sabia que sua fazenda precisava de ajuda em várias áreas, especialmente com Vitória. Um pensamento surgiu em sua mente, e, sem hesitar, ele perguntou: — Você está procurando um emprego, Giulia? Ela olhou para ele, surpresa pela pergunta direta, mas a realidade é que sim, ela precisava de um trabalho para se estabelecer. — Sim, estou — admitiu, um pouco cautelosa. Carlos balançou a cabeça, como se estivesse tomando uma decisão. — Bem, eu estou precisando de alguém para cuidar da Vitória. Seria como uma babá, sabe? E já que você fala italiano, talvez até possa ensinar o idioma a ela. O que acha? Vitória saltou de alegria, puxando o braço do pai. — Por favor, Giulia! Eu adoraria aprender italiano com você! Giulia sorriu para a menina, tocada pela empolgação dela, mas ainda incerta. — Eu adoraria ensinar, de verdade — começou ela, com delicadeza. — Mas, Carlos... ela já está grande para ter uma babá, não acha? Carlos riu e coçou a nuca, parecendo um pouco constrangido. — É, talvez você tenha razão. Mas tem coisas, sabe, coisas de mulheres, que eu não sei como conversar com ela. Eu sou viúvo, e tem momentos que... eu só não sei lidar com certos assuntos. Giulia entendeu imediatamente. Não era apenas sobre cuidados práticos, mas também sobre a necessidade de alguém que pudesse guiar Vitória em momentos delicados, que fossem além das capacidades de Carlos. — Eu entendo. — Ela olhou para Vitória, que a observava ansiosa. — Se for assim, aceito ser a babá dela... e a professora de italiano, claro. Vitória comemorou, abraçando o pai. — Oba! Vai ser incrível! Carlos sorriu, aliviado com a decisão dela. — E mais uma coisa — disse ele, olhando de forma um pouco mais séria. — Se você vai trabalhar comigo, pode morar na fazenda Albuquerque. Temos espaço de sobra. O que me diz? Giulia ficou em silêncio por um instante, ponderando. O convite parecia uma boa oportunidade, e a fazenda seria um refúgio seguro, longe do caos que a fez fugir. Além disso, Vitória parecia uma garota doce e Carlos, apesar de seu comportamento inicial, agora mostrava um lado mais gentil e preocupado. Ela finalmente assentiu, com um pequeno sorriso no rosto. — Parece uma boa ideia. Eu aceito. Carlos estendeu a mão novamente, dessa vez com um olhar de agradecimento. — Bem-vinda, Giulia. Ela terminou de fazer as compras e saiu do estabelecimento com Carlos, que carregava sua mala e as sacolas até o carro. Enquanto ambos entravam e se preparavam para sair, quatro homens surgiram de trás das árvores da praça. Eles os observavam há algum tempo. — Vamos atrás deles!Capítulo 3Carlos estacionou a caminhonete em frente à imensa casa rústica. Giulia ficou imediatamente encantada com a beleza simples e acolhedora da casa rústica.- A casa é linda - disse Giulia, ainda admirada enquanto saía do carro.Carlos sorriu, notando a expressão no rosto dela, e levou a mala e sacolas para dentro. Giulia o seguiu, seus olhos ainda presos na paisagem ao redor, onde a vastidão dos campos verdes parecia se estender pelo horizonte.Enquanto Vitória corria para a área gourmet para ver o que os cozinheiros tinham preparado para o café da tarde, Carlos tirou o chapéu, passando a mão pelos cabelos castanhos antes de recolocá-lo de maneira prática e habitual.- Fique à vontade - disse ele com um aceno de cabeça, enquanto caminhava em direção ao escritório.Giulia o seguiu, curiosa. O escritório era aconchegante, com móveis de madeira escura e paredes decoradas com prateleiras cheias de livros e alguns troféus de montaria. Carlos abriu uma gaveta e, sem cerimônia, puxou
Capítulo 4Giulia mal teve tempo de se acomodar atrás dele antes que o carro fizesse uma curva brusca e começasse a persegui-los. O motor roncava ferozmente, e a poeira subia no ar. O coração de Giulia batia descontroladamente enquanto ela se agarrava à cintura de Carlos, sentindo a dureza dos músculos dele sob as mãos.Sem perder tempo, Carlos sacou um de seus revólveres com uma mão, enquanto segurava as rédeas da égua com a outra. Com uma precisão surpreendente, ele virou o corpo para o lado, ainda trotando, e mirou no carro que se aproximava rapidamente. Sem hesitar, ele disparou.O som do tiro ecoou. O tiro foi certeiro, mas o vidro do carro era blindado. O projétil ricocheteou, e ele rosnou de frustração.— Droga! — Carlos rosnou, enquanto puxava as rédeas de Floco de Neve, fazendo a égua acelerar. — Segure firme!Giulia se apertou mais contra ele, o medo crescendo a cada segundo que passava. O carro estava se aproximando rápido demais.— Malditos... — resmungou, tentando ajustar
Capítulo 5O som repentino de um tiro ecoou no ar. Ele se virou rapidamente e viu que o capanga que foi atingido no ombro estava tentando acerta-lo. Sem hesitar, Carlos sacou o revólver e, com um tiro certeiro, tirou a vida do homem, eliminando a ameaça de uma vez por todas.Ele respirou fundo, os olhos percorrendo a área ao redor. Ao longe, avistou Floco de Neve se aproximando. A égua, com seu instinto afiado, voltou para o local, pronta para ajudar. Carlos, sem perder tempo, levantou Giulia do chão, a colocou cuidadosamente sobre a égua e subiu logo em seguida, segurando-a firme enquanto cavalgavam de volta para casa.Quando chegaram à fazenda, Carlos desceu do cavalo e carregou Giulia para dentro. Ele a colocou gentilmente no sofá da sala. Vitória, que estava do lado de fora, viu seu pai chegando com Giulia nos braços e correu para dentro, preocupada.- Pai, o que aconteceu com ela? - perguntou Vitória, já ao lado de Giulia, visivelmente ansiosa.- Ela está bem, só tomou uma pancad
Capítulo 6Carlos, depois de verificar que tudo estava tranquilo, voltou para a área gourmet para pegar uma bandeja com chá e pães caseiros. Ao retornar para a sala, seus olhos estavam atentos, ainda preocupado com o ataque. Ele sabia que aquilo não havia sido por acaso, e a tensão crescia dentro dele.Ao entrar na sala, observou as duas, e seu coração apertou por um segundo ao ver Vitória cuidando de Giulia com tanto carinho. Giulia, por sua vez, já parecia mais consciente, embora ainda visivelmente abalada.— Como está se sentindo? — Carlos perguntou, pousando a bandeja na mesinha de centro.— Melhor… acho que um dia me acostumo a levar coronhadas — ela tentou brincar, mas a dor no lado da cabeça não permitiu que continuasse rindo.Carlos sorriu de leve, mas seus olhos não esconderam a preocupação. Ele se abaixou ao lado dela, seus dedos passando pela lateral do rosto de Giulia, verificando o machucado.— Nós vamos aumentar a segurança na fazenda. Não posso permitir que algo assim a
Capítulo 7O som do telefone batendo com força contra a mesa ecoou pela sala luxuosa. Giovanni Moretti, o marido de Giulia, estava frustrado, seus olhos faiscando de raiva enquanto esfregava o rosto com as mãos. Mais uma vez, seus informantes haviam falhado em localizá-la.— Como é possível que uma mulher desapareça assim? — ele grunhiu, a voz pesada com a frustração acumulada.Seu braço direito, Paolo, observava o chefe com cautela, medindo suas palavras antes de falar.— Ela não quer ser encontrada, senhor. Fugiu para um país vasto como o Brasil, e os contatos de lá estão tendo dificuldade de rastreá-la após o sumiço de alguns capangas.Giovanni apertou os punhos com força, os dedos quase cravando na madeira da mesa.— Não é possível que eles sejam tão incompetentes! Ela não pode ir tão longe! Quero todos os meus homens em cada cidade daquele país. Ela não vai escapar.Paolo assentiu, hesitante.— Vou redobrar os esforços, senhor. Mas talvez seja melhor considerarmos outra abordagem
Capítulo 8Giulia piscou, ligeiramente envergonhada, ao perceber o quanto havia revelado. Tentando mudar de assunto, disse:— Eu não vi a Vitória.Carlos sorriu, relaxando um pouco mais na cadeira.— Ela está na escola. Meio dia e meia ela estará de volta — explicou ele, enquanto tomava outro gole de café. — Preciso que vá até a rua asfaltada buscar ela. Fica um pouco longe da entrada da fazenda. Você sabe dirigir?Giulia assentiu, mostrando interesse.— Sei. É só me mostrar onde fica, eu decoro fácil o caminho. Tenho uma excelente memória.Carlos arqueou uma sobrancelha, surpreso com a segurança dela.— Ótimo. Eu te mostro no mapa da fazenda. Confesso que é um alívio saber que pode ajudar. Vitória vai gostar de te ver lá.Carlos levantou-se e foi até uma moldura na parede, onde havia um mapa da fazenda e da região ao redor. Com calma e precisão, ele ensinou Giulia o caminho, apontando os pontos de referência, mas o que mais chamou a atenção dela foi a maneira como ele se guiava pelo
Capítulo 9Benedito, sempre atento, observou o jeito acanhado de Giulia ao olhar para Carlos. Aquilo era mais do que simples gentileza. "Tem coisa aí", pensou, mas ficou em silêncio, apenas dando um sorriso discreto enquanto todos voltavam ao trabalho após o almoço.Vitória foi para o quarto fazer seu dever de casa, deixando Giulia com algum tempo livre. Ela decidiu voltar para a área gourmet, onde encontrou o cozinheiro ocupado, se desdobrando para adiantar o trabalho. Ele lavava panelas enquanto monitorava uma massa no fogão, visivelmente apressado.Giulia, ainda um pouco tímida, ficou observando por um momento antes de se aproximar.- Posso ajudar com algo? - perguntou, a voz suave, mas com um toque de determinação.O cozinheiro olhou para ela, surpreso e, de certa forma, aliviado.- A dona quer me ajudar? Não precisa, não, dona. Aqui é meu trabalho, mas... se quiser, não vou recusar. Só toma cuidado para não se sujar, hein?Ela sorriu, e logo o cozinheiro lhe indicou algumas taref
Capítulo 10No dia seguinte...Giulia caminhava pelo corredor da casa com o coração acelerado. Cada passo que dava parecia ecoar sua ansiedade, mas ela sabia que não podia mais adiar essa conversa. As lembranças do que aconteceu e a possibilidade de mais perigos se aproximando a atormentavam, especialmente o medo de algo atingir Vitória. Isso era inaceitável para ela. Já era hora de contar tudo a Carlos.Ao passar pela janela, viu Matteo e os outros homens instalando câmeras pela fazenda. Cada movimento deles parecia confirmar que a situação estava se tornando mais séria. Eles estavam se preparando para algo maior, e Giulia sabia que parte disso era culpa do seu passado. Respirou fundo, tentando reunir a coragem que precisaria para encarar Carlos.Quando chegou à porta do escritório, parou por um instante, sentindo uma onda de medo e dúvida. "Será que ele vai me entender? Será que vai me culpar?", pensou. Mas havia algo maior em jogo, e ela não podia se dar ao luxo de hesitar. Bateu n