Capítulo 1

Galopando com sua capa preta de capuz e um chapéu que tapava ainda mais o seu rosto, Dilan via os raios eletrizantes e seus clarões cortar o céu, que saia de um azul para ficar completamente cinzento, junto aos barulhos estridentes do trovão. A revolta de Dilan era quase palpável, havia avisado ao cozinheiro do Rei que aquele não seria um bom momento para buscar o gado e os porcos.

Desde criança já fazia esse trabalho com o pai. Ao longo dos anos, adquiriu experiência e mesmo com pouca idade, seus calos e joanetes lhe indicavam quando a tormenta cairia.

Em Arbória, só a realeza e o clero podem obter terras, poder e fortuna. Aqueles plebeus que querem usufruir de um pedaço de chão, além de cultiva-lo com algum suprimento para o reino, algum homem da família tem de trabalhar a serviço do rei.

Esse era o caso da família de Dilan, seu pai Cícero e sua mãe Bertha cultivam a maior plantação de verduras que abastece o reino. Cícero também era quem tocava o gado criado por outra família a serviço do reino para o consumo da nobreza. Entretanto após Cícero adoecer, Dilan a contragosto do pai tornou-se responsável.

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Ainda com raiva pelo cozinheiro presunçoso não ter lhe dado ouvidos, Dilan procurava um lugar aonde pudesse parar com quatro bois e dois leitões. Com a chuva que começava a cair, aqueles animais atolariam e de certo ainda iriam lhe pôr a culpa em cima.

Apeou da égua Raia, sabia que o animal sensitivo e inteligente logo encontraria um lugar seco, aonde todos pudessem se abrigar até a tormenta dissipar-se. E Raia não decepcionou, alguns nômades que por ali passaram fizeram um abrigo bem coberto feito de folhas longas das palmeiras. A égua de esperteza ímpar, encontrou o lugar e conduziu todos até o local.

Tirando a Raia que era obediente e sagaz, Dilan prendeu os animais aos troncos das árvores que os nômades usaram como apoio do abrigo. Agachou-se ao pé da árvore mais robusta e pensou que poderia até tirar uma pestana de final de tarde. O problema é que Raia ficou agitada, e de supetão saiu em disparada.

Dilan achou estranho a égua sair daquele jeito debaixo da tempestade, porém confiava em Raia e saberia que logo o animal estaria de volta.

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Raia não voltou. A sombra da preocupação começou a apontar na mente de Dilan. Levantou-se do chão, pôs o dedo mínimo no canto da boca e apitou um grande assovio. Só parou, quando mesmo de longe começou a ouvir trotes que pareciam multiplicados.

Se espantou ao ver Raia chegar com companhia um Mustang puro sangue. O pobre equino estava de barro até o pescoço. Contudo, mesmo debaixo daquela sujeira, Dilan tinha certeza que aquele animal de peito robusto e crina brilhante, se tratava de um cavalo da realeza.

"Ei Raia! Aonde arrumaste este amiguinho?"

A égua relinchou como se quisesse responder, mas na verdade o animal ainda estava impaciente. Abaixou a cabeça com o longo pescoço junto ao chão, indicando que Dilan deveria montar-lhe.

Conhecendo seu animal, Dilan obedeceu o apelo de Raia subindo rapidamente na égua, saindo a galope sendo seguidos pelo muntang. "Calma Raia!" Dilan pedia fazendo carinho no animal, que trotava rápido e agoniado "De vagar Raia! senão iremos atolar"

Raia levou Dilan até a cachoeira de cristais que ficava abaixo do pico mais alto de Arbória. "Para quê me trouxe aqui Raia? Não entendo!" Questiona apeando do animal. A égua relincha a beira da cachoeira e levanta as patas dianteiras, o mustang faz o mesmo, como se tivesse a imitando.

Sem entender bem o que Raia e o outro animal queriam, Dilan resolveu olhar bem o local. Foi aí que avistou um corpo deitado de bruços em uma das pedras. Era um homem e dava para ver que estava ferido.

A correnteza estava forte por conta da chuva. Caso fosse até lá poderia se afogar, e aquele homem talvez já estivesse morto. Por outro lado, pensava que se o deixasse ali e estivesse com vida, de certo morreria pelo ferimento que possuía, ou afogado pela cachoeira no qual as águas não paravam de subir.

Seu pai não perdoaria uma atitude egoísta e com total falta de cristianismo. Dilan tirou o chapéu, a capa de capuz preta, as galochas e se tacou nas águas de cristais.

Seu corpo pequeno e franzino, sentiu uma dificuldade em enfrentar a correnteza para chegar até o homem. Percebeu que fez a coisa certa quando viu que ele ainda tinha sinais vitais. O problema seria como chegar até a superfície com alguém com o dobro do seu tamanho.

O homem estava com o corpo de um lado ao o outro na pedra, tocando as mãos e os pés nas águas. Dilan reparou que ele segurava um enorme galho com as duas mãos, naquele momento passou por sua cabeça que aquele galho o ajudou a emergir.

"Amigo, vou apostar que você não soltará esse tronco. Essa é nossa única chance."

Dilan viu o homem abrir levemente os olhos por um breve momento. "Perdão senhor! Mas lhe jogarei na água, segure com força ao galho e tente voltar." Rezando que sua teoria estivesse certa, esforçou-se e atirou o homem nas águas frias. Soltou o ar preso dos pulmões, quando o viu voltar com o galho nas mãos. Aquele queria viver de verdade, sua missão na terra não havia acabado.

Puxando o galho, Dilan conseguiu chegar com o homem até a superfície da cachoeira. O pedaço de árvore serviu até para puxa-lo em terra firme. Tamanha era a vontade de viver que o ferido, não soltava o galho de jeito algum. Dilan teve que abrir dedo a dedo, era como se ele estivesse colado ao tronco.

Dilan vestia sobre a vestimenta encharcada sua capa preta, enquanto Raia e seu novo amigo, sorriam em meio aos relinchos pelo salvamento bem sucedido. A chuva já começara a diminuir, mas ainda faltava por o homem em cima do mustang.

Era um homem com mais de 1,80m de altura e de aproximadamente 90 kilos, enquanto Dilan tinha 1,60m e 55 kilos.

"Aí meu Deus! Aonde fui amarrar meu burro? Eu tinha que te dar ouvidos não é Raia!"

A égua que parece entender, levanta as patas dianteiras dando mais um de seus relinchos. Dilan tenta várias formas de levantar o homem, porém sem sucesso. Até que ele tem mais um momento de lucidez.

"Quem é você?" O ferido tem a voz em um fraco sussurro.

"Me chamo Dilan. Só quero lhe ajudar, me ajude a te levantar" Força era algo que naquele estado o homem não tinha, mas conseguiu ajudar Dilan a lhe pôr em cima da Raia, que esperta deitou ao chão para facilitar.

Dilan montou no mustang para fazer a entrega dos animais ao abatedouro real, enquanto Raia levou o ferido para casa de seus pais.

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A exaustão lhe dominava. Que dia havia sido este! Só queria chegar, usar uma tina com um bom sabão de coco e quem sabe umas pétalas de rosa para aromatizar, depois jantar a comidinha feita pela sua mãe, e ler um romance até o sono lhe consumir por completo.

Havia esquecido do estranho ferido que enviou pela Raia para casa. Mas a face emburrada de seus pais na porta lhe fez lembrar. Sabia que levaria uma carraspana de arder os tímpanos.

Seu pai ajuda apear do cavalo. "Graças a Deus!" Bertha mãe de Dilan exclama aliviada.

"Com sua bênção meus pais. O que houve mãe?"

"Você manda a Raia sozinha com um homem ferido por dois tiros, depois que a gente já estava morrendo de preocupação por conta da chuva, e pergunta o que houve!"

"A Raia não avisou que estou bem?"

Cícero olha para Dilan com as sobrancelhas eriçadas. "A Raia não fala."

"Fala sim pai, você e a mãe que não entendem ela." Dilan vai falando e tirando do corpo os apetrechos de trabalho " E o homem, está vivo?

"Está sim, Irlanda está cuidando dele. Você já avisou a família?" Dilan estava caminhando para o interior da choupana simples na qual morava, mas freou diante da pergunta de seu pai. Sua mãe continuou a entrar para lhe preparar um banho.

"Que família pai! Não sei quem é a família desse homem." Dilan põe a mão no queixo, enquanto seu pai também põe uma face estranha. "Você conhece esse homem pai?"

"Claro que conheço." Cícero responde com firmeza. " E pensei que você conhecesse também."

"Não conheço. Não faço ideia. Quem é ele pai"

"Salvador Francisco Arbória III. Filho do rei Conrado e vosso príncipe."

Oi gente!

APEAR descer do cavalo.

CARRASPANA é tipo um sermão. um esporro.

TINA é um grande recipiente de madeira utilizado como banheira.

CHOUPANA casa humilde, geralmente feitas de palhas e madeiras.

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