2. Nayana

Apenas fico ali sem acreditar naquilo. Ele não gostou, achou que estou me expondo ao ridículo? Sério aquilo..?

Corro pro banheiro olhando a minha imagem desprezível no rosto, o meu marido estava certo, já sou velha demais pra essas coisas, é simplesmente ridículo eu querer fazer aquilo. Começo a me livrar das pulseiras e dos adornos bastante brava comigo mesma, só sirvo pra passar vergonha. Removo a maquiagem do meu rosto e tiro aquele vestido ousado, por que diabos eu fui inventar de fazer aquela porcaria? O que há de errado comigo? Quantos anos eu penso que tenho? O que minha filha pensaria de mim se ficar sabendo disso..? Desabo ali mesmo no chão do banheiro em um choro silencioso, o que mais eu faço? A minha vida acabou, eu sou tão ridícula...

Momentos depois vestindo um pijama de sempre, volto pro quarto e começo a limpar as coisas, tinha voltado a minha forma sem vida de sempre. Eu sou apenas mais uma mulher no mundo casada com um homem respeitado, não há nada de especial em mim. Nunca teve. Termino a limpeza e me deito do meu lado na cama me encolhendo no canto de costas pro homem, estou torcendo para que ele não conte nada daquilo a minha sogra pra eu não ser repreendida severamente. Fecho os olhos e apago finalmente, mas por incrível que pareça, quando abro os olhos novamente, o sol não tinha raiado lá fora. Suspiro, só me faltava essa, começar a ter insónia. Me remexo na cama me virando pra outro lado pra alongar minhas costas e então noto que o lado da cama do meu marido está vazio, franzo levemente o cenho estranhando sem saber onde ele poderia ter ido aquela hora da madrugada. Olho em direção ao banheiro e vejo que a luz está apagada assim como eu a deixei horas antes, então no banheiro ele não estava. Talvez deve ter ido beber uma água. Suspiro, pensando bem, também precisava de uma água. Talvez aquilo me iria ajudar a dormir.

Então me levanto da cama colocando um lenço sobre meus ombros e cabeça para esconder o cabelo, calço meus chinelos e saio do quarto indo em direção a cozinha. Aquela hora da madrugada, a casa está tão silenciosa que até dá medo. Quando criança, minha mãe contava que era perigoso sair a noite porque era a hora que os fantasmas acordavam e começavam a sua vida após a morte, sempre que os vivos iam dormir. Então nenhuma pessoa viva deveria ficar acordada de madrugada pra não deparar com esses seres do além senão eles levariam a pessoa com eles. Aquela história me assustava tanto quando eu era pequena, na verdade ainda me assusta, mas ao menos eu nunca tinha visto fantasma nenhum nas noites que eu não pregava os olhos ficando do lado da minha filha a noite toda quando ela ficava doente. Mas só pra prevenir, vou até o pequeno santuário da família e faço uma breve reza aos deuses, principalmente a deusa Durga para que me protegesse e também a minha filha que está na faculdade. Depois disso, me dirijo até a cozinha que também está deserta, e eu achando que Shankar estaria aqui... Dou de ombros e sirvo um copo com água pra mim, bebo um pouco e decido levar o copo pro quarto. Quem sabe eu precisaria de mais água?

Quando chego até o corredor dos quartos, rolo os olhos ouvindo o som dos gemidos da Deva vindo do quarto dela que fica do lado do meu. Um fio de luz escapava da fresta da porta que está entreaberta. Deva e seu gesto escandaloso, suspiro e me aproximo pra fechar a porta, mas então penso. Kabir, o marido dela, está viajando. Então com quem Deva estaria..? Pisco os olhos confusa. Será que Kabir voltou de madrugada? Aquilo é bem pouco provável... Então ela está traindo Kabir? Que garota mais sem noção! Abro a porta de supetão entrando no quarto afim de dizer umas boas pra aquela garota quando o que vejo em minha visão faz o meu coração parar na hora. Deva estava de quatro na cama segurando as barras da cama com as mãos. Estava totalmente nua enquanto Shankar estava por trás dela segurando na sua cintura e enfiando o... Na... Por trás... O quê..? Meu corpo todo fica mole, não percebo como o copo de água cai da minha mão. Eles já tinham me notado.

"Nayana..." Shankar se afasta de Deva ajeitando a túnica para esconder sua nudez, Deva cobre o seu corpo com o lençol. "O que está fazendo aqui? Você deveria estar dormindo!"

"Você... Vocês..." Balbucio com muita coisa acontecendo na minha cabeça. Isso não é verdade. Shankar não fez isso comigo. "Você..." Shankar se aproxima de mim e tenta segurar meu braço, mas eu não deixo. "SOLTA! NÃO ME TOQUE!" Já estou gritando de choque e raiva.

"Não grita, por favor não conte a ninguém." Ele está pedindo urgente com as mãos juntas no peito, as mesmas mãos que a momentos atrás estiveram no corpo de Deva. "Por favor Nayana, pela gente. Sou o seu marido, eu te amo." Ele suplica. Amor? Um dia você já me amou, Shankar..? Apenas derrubo no chão e dou um grito de choro bastante amargurada, eu posso aguentar a frieza dele para comigo, posso aguentar os maltratos dele, até os abusos, posso aguentar tudo, menos aquilo.

[....]

Horas depois, estou sentada no sofá da sala encarando fixamente o chão. Shankar está do outro lado sentado num outro sofá, a anciã desdentada da família está na sua poltrona de sempre, minha sogra tinha as mãos cobrindo a boca ainda surpresa pelos acontecidos, meu sogro está andando de um lado pro outro na sala sem saber como resolver aquela situação. Deva não está ali, ela provavelmente vai ser devolvida pra sua família, isso se eles aceitarem ela de volta, ou então ela será mais uma mendiga que anda pelas ruas para se envergonhar pra sempre pelos seus atos demoníacos, só estão esperando o marido dela chegar pra fazer isso. Eu só me perguntava porquê o homem também não era deserdado se também tinha errado? Provavelmente nada aconteceria a Shankar depois daquilo... Se me perguntarem o que quero que aconteça com Shankar, falarei pra matarem ele sem exitar. Quero que ele morra.

"Os Biswas tiveram melhor produção esse ano." Meu sogro está dizendo. "Ouvi dizer que estão contratando mais gente local para os negócios deles. Contando isso e fato de terem doado as cinquenta vacas para o santuário da aldeia eu diria que a gente está a um ponto de perder a eleição desse ano." Os Suryavant também detém um grande prestígio no tribunal local o que faz deles os mais indicados pra ganhar a eleição para o lugar do chefe da aldeia desse ano. Em suma, o meu sogro está preocupado com a política e a reputação da família. "Agora se esse escândalo vier a tona, não acho que nos favoreceria." Shankar solta um som de deboche e diz.

"Não é como se isso fosse o fim do mundo, pai..."

"CALE A BOCA!" Meu sogro esbraveja furioso fazendo minha sogra dar um pulinho assustada do lugar onde está sentada. "Você não está no direito de falar nada aqui!"

"A gente só... Deve tentar convencer Nayana pra não expor esse caso ainda mais pra não comprometer a reputação da família." Minha sogra intercedeu, eu me cobri mais com o meu lenço. Tem alguém nessa casa que ao menos se importa comigo? Que se dane a reputação da família, eu dediquei a minha vida toda para um casamento pra descobrir que foi tudo em vão...

"Nayana não vai contar." Shankar fala. "Ela é uma mulher inteligente e submissa que sabe resolver contendas maritais no quarto."

"Calem a boca, vocês!" A anciã fala, sua voz ríspida e acusadora bastante patente. "Bando de imprestáveis. Só me dão vergonha como família!"

"Mas mãe..." O meu sogro tentou.

"Mandei calar, Raj. Você não soube educar o seu filho a manter o amiguinho dele longe de buracos alheios, então não tente ordenar merda nenhuma aqui." Todos estão em silêncio a essa altura. "Agora estamos todos a mercê dela aqui." Apontou em minha direção com o queixo. "Deixem que ela fale e tome sua decisão."

Estou emocionada pela pessoa que sempre me julgou naquele lugar, hoje estar do meu lado. Limpo o rosto, o que eu queria? Certamente me vingar do Shankar por ter gozado com a minha cara todo esse tempo, mas eu não tinha nada contra os Suryavant. Levanto o rosto depois de um tempo, posso até sentir a tensão naquele lugar, como a família tem medo de que eu os prejudique.

"Eu... Não vou expor mais nada." Falo e eles soltam sons de alívio, Shankar até se senta com mais conforto. "Mas, eu vou embora."

"Como assim ir embora?" Shankar pergunta um tanto perplexo. "Você é minha mulher, não pode ir a lugar nenhum!"

"Filha... Você tem certeza?" A minha sogra tenta. "Você está mais acolhida aqui com a gente. E sabe o que acontece com mulheres que estão separadas dos seus maridos aqui na aldeia."

"Eu já decidi que vou embora." Balbucio me sentindo pequena demais.

"Vamos apenas... Respeitar a decisão dela." Meu sogro.

"Mas quem vai lavar os meus pés se você for embora, Nayana?" Shankar tem a ousadia. Me lavanto de uma vez e vou até o quarto fazer minha mala. Não paro de chorar, estou odiando isso.

"Você vai mesmo embora, Nayana..?" Anuska está lá me ajudando como sempre. Apenas acinto e ela me abraça me permitindo chorar mais um pouco. "Espero que tudo dê certo pra você." Ela consola.

"Eu também espero..."

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