GUTEMBERG A penumbra do ambiente parecia refletir o estado da minha alma, enquanto o som do chuveiro vindo do andar de cima preenchia o silêncio incômodo. Meia-noite estava no banho, e eu aproveitava o intervalo para falar com Timmy. Mas minha mente ainda estava presa no caos que havíamos acabado de deixar para trás.— Não é sempre assim, cara? — Timmy resmungou, inclinando-se contra a parede com os braços cruzados. Ele parecia calmo, mas eu sabia que era um disfarce. Todos usávamos um.Eu não respondi imediatamente. Em vez disso, passei a mão pelo rosto, sentindo o suor misturado com a poeira e o cheiro que insistia em grudar, ferroso, nauseante. O cheiro do sangue. Ele estava em minhas roupas, em minha pele. Não importava quantas vezes isso acontecesse, nunca conseguia me acostumar.O tiroteio ainda estava fresco na minha mente. Os gritos de terror. Aqueles segundos finais quando a pessoa percebe que chegou o fim. O pânico nos olhos delas. O tipo de pânico que não deveria mais me a
GUTEMBERGTimmy parou de andar, encarando-me com olhos arregalados, como se tivesse levado um soco. E então, para meu completo espanto, ele começou a gargalhar. Uma risada descontrolada, quase maníaca, que encheu o cômodo de uma energia desconcertante.Ele esfregou o rosto com as mãos e me lançou um olhar carregado de incredulidade.— Você não pode estar falando sério. Você gosta dela? — Ele balançou a cabeça, ainda rindo.—Isso não é da sua m*****a conta.— rosnei de volta, não reconhecendo minha própria voz.De onde veio tanta raiva? — Sim, isso é da minha m*****a conta. Sabe o porquê? Porque você não tem o direito de dizer isso. — Ele respirou fundo, tentando se acalmar, mas falhando miseravelmente.— Não, você não pode. Você não tem esse direito. Não depois de tudo que você fez. Depois de travar aquela guerra infantil com ela. Depois de... — Ele fez um gesto amplo com as mãos, como se tentasse englobar tudo o que havia acontecido entre nós. — Depois de tudo isso.Eu apenas dei de om
DAVINAO cheiro de chocolate ainda pairava no ar enquanto eu olhava para o bolo sobre o balcão. A calda escorria suavemente pelas laterais, formando uma poça doce no prato. Era uma tentativa de tornar o dia menos pesado, mas nem mesmo o sabor do bolo seria capaz de dissipar a nuvem de tensão que me cercava. O som abafado de passos no corredor fez meu coração acelerar. Olhei para a porta do quarto da minha mãe, como se pudesse garantir sua segurança apenas com um olhar.Ela está dormindo, pensei. Ela tomou uma dose de calmante suficiente para fazê-la dormir até a noite de amanhã.A batida na porta me congelou. Três toques firmes, espaçados.Já está tarde, quem viria aqui?Meu primeiro pensamento foi KJ. Ele não hesitaria em aparecer na minha casa, não depois do que fez com meu pai. O homem teve a ousadia de ir ao enterro, um sorriso frio no rosto, como se nós fôssemos peões em um jogo que ele controlava. Mas o que ele quer agora?Engoli em seco e peguei a faca que estava sobre a bancad
DAVINAMinha raiva estava prestes a me consumir por completo, e ele estava fazendo isso comigo. Ele estava fazendo isso enquanto sua expressão continuava tranquila, enquanto sua respiração não sofria nenhuma alteração. Como ele consegue? Meus dentes estavam cerrados, o coração batendo forte, a vontade de colocar minhas mãos no pescoço grosso dele e apertar até que ele não pudesse mais respirar crescendo. Cada palavra dele soava como um insulto.— Você não tem o direito! — gritei, a voz tremendo de raiva. — Você não pode fazer o Gutemberg desistir!Ele me olhou, um leve sorriso, mas seu olhar era sério, impassível.— Por quê? — Ele questionou, arqueando uma sobrancelha, como se tentasse entender minha resistência. Como se aquilo fosse um jogo, algo fácil de se resolver.Aquelas palavras explodiram em minha mente antes que eu pudesse controlá-las:— Porque ele me deve! — Minha voz saiu firme, mas minha raiva não diminuiu.Meia-noite manteve o olhar fixo em mim, mas não respondeu imediat
Gutemberg (Fantasma).— Fantasma, acorde.— Alguém cutuca meu braço e pela firmeza do toque posso dizer que não é uma mulher. Murmuro alguma coisa e puxo o lençol, cobrindo metade do meu rosto.— Acorda! Aqui não é motel, não.Espere, talvez seja uma mulher.Essa voz…—Meu marido está vindo, você precisa ir!— Eu puxo o lençol para baixo, avistando um par de pernasvirado e feminino, sorte minha, subindo a captura do olhara camisa curtae entãoa comissão de frente. Foda-se! Os dois melões são então cheio que estão quase pulando na minha cara e exigindo uma mordida. Oh! Eles têm marcas de biquíni.Adoro essas marcas.—Você é casada, linda?— Abro um sorriso indecente, passando a língua entre os lábios sem me desviar do lindo par de seios.— OK… está brincando com a minha cara?— Ela diz, adquirindo uma expressão irritada que me faz querer revirar os olhos, mas permaneço neutro, apenas olhando para ela e esperando por uma resposta.— Sério?—Fala, com as duas sobrancelhas levantadas.— O que é sé
DAVINAO cheiro doce da calda de morango que a vovó fez ainda é forte quando entro na cozinha, apesar de tudo estar limpo e desinfectado. Ela disse que este é um bolo especial, pois faz parte de uma grande encomenda que recebeu, e que o dinheiro será usado para alugar um espaço comercial para abrir sua padaria. Como uma formiga atrás de um doce, sigo meu perfume favorito até rastrear o recipiente de plástico transparente, estampado com o logotipo exclusivo de sua marca. Que eu mesmo fiz no celular, na bancada de mármore que separa a parte do fogão da mesa que usamos para as refeições. Pergunto ao exagerado laço rosa que ela coloca em todos os seus pedidos e leio o nome escrito na cobertura do bolo.Amber.A irmã do meio do traficante local. Bem, não qualquer mafioso, o mais assustador que conheço.Eu sabia que ela estava fazendo aniversário hoje, fui acordada pela queima de fogos que o irmão organizou exclusivamente para a data, mas não sabia que era a vovó quem estava preparando todos
DAVINAPerdi a noção do tempo que passei olhando para a porta, mas já fazia alguns minutos. Muitos minutos.Enxuguei minhas lágrimas, peguei o bolo da Amber e fui até a casa do diabo. O medo que normalmente sinto quando passo por homens armados que guardam o caminho até a casa de Blake não estava lá como sempre, meus sentidos estavam entorpecidos pelo que minha irmã acabara de fazer. Os doces que vovó fez já haviam sido entregues, junto com os cupcakes e salgados, então não precisei fazer mais de uma viagem. Porém, a pessoa que deveria me receber não estava lá e tive que pedir ajuda ao meu amigo de infância.A última pessoa no mundo com quem eu queria conversar agora.—Você estava chorando.— Não era uma pergunta, mas neguei.—Tenho que ir. — disse assim que recebi o resto do dinheiro.—Eu conheço você, Davina— Timmy agarrou meu braço suavemente, mas com força suficiente para me fazer parar e olhar para ele.—Sua impressão.—Murmurei, já arrependido de ter pedido sua ajuda.—Duvido. Éra
GUTEMBERG (Fantasma)Todo governo tem leis.Todo crime tem um propósito.Toda sociedade tem regras.É pura lógica, estamos tão obcecados com a ideia de liberdade que não vemos o óbvio. Ainda somos os mesmos. Acontece que é muito mais. É fácil fingir que não há controle. As leis do mundo do crime são simples, mas aqui há uma coroa, espinhosa e ensanguentada, um cinto de munição embaixo da cabeça, e cada decisão é minimamente pensada para causar o menor impacto. O que também significa que as ordens do rei devem ser obedecidas.Limpo a garganta, coçando a nuca enquanto Timmy limpa sua pistola. Como se a noite passada nunca tivesse existido.—Você está bem?— ele pergunta com um sorriso provocante nos lábios, feliz o suficiente para me fazer opinar quantas vezes ele já participou de torturas. Muitos devem ser a resposta. Para alguém como Timmy, nascido e criado na pobreza, os episódios de violência surgem naturalmente. Mas não para mim.Tento não parecer que estou prestes a vomitar só de o