DAVINAO cheiro de chocolate ainda pairava no ar enquanto eu olhava para o bolo sobre o balcão. A calda escorria suavemente pelas laterais, formando uma poça doce no prato. Era uma tentativa de tornar o dia menos pesado, mas nem mesmo o sabor do bolo seria capaz de dissipar a nuvem de tensão que me cercava. O som abafado de passos no corredor fez meu coração acelerar. Olhei para a porta do quarto da minha mãe, como se pudesse garantir sua segurança apenas com um olhar.Ela está dormindo, pensei. Ela tomou uma dose de calmante suficiente para fazê-la dormir até a noite de amanhã.A batida na porta me congelou. Três toques firmes, espaçados.Já está tarde, quem viria aqui?Meu primeiro pensamento foi KJ. Ele não hesitaria em aparecer na minha casa, não depois do que fez com meu pai. O homem teve a ousadia de ir ao enterro, um sorriso frio no rosto, como se nós fôssemos peões em um jogo que ele controlava. Mas o que ele quer agora?Engoli em seco e peguei a faca que estava sobre a bancad
DAVINAMinha raiva estava prestes a me consumir por completo, e ele estava fazendo isso comigo. Ele estava fazendo isso enquanto sua expressão continuava tranquila, enquanto sua respiração não sofria nenhuma alteração. Como ele consegue? Meus dentes estavam cerrados, o coração batendo forte, a vontade de colocar minhas mãos no pescoço grosso dele e apertar até que ele não pudesse mais respirar crescendo. Cada palavra dele soava como um insulto.— Você não tem o direito! — gritei, a voz tremendo de raiva. — Você não pode fazer o Gutemberg desistir!Ele me olhou, um leve sorriso, mas seu olhar era sério, impassível.— Por quê? — Ele questionou, arqueando uma sobrancelha, como se tentasse entender minha resistência. Como se aquilo fosse um jogo, algo fácil de se resolver.Aquelas palavras explodiram em minha mente antes que eu pudesse controlá-las:— Porque ele me deve! — Minha voz saiu firme, mas minha raiva não diminuiu.Meia-noite manteve o olhar fixo em mim, mas não respondeu imediat
DAVINAMeia-noite abriu a porta e, antes que eu pudesse formular mais uma pergunta ou tentar entender o que estava acontecendo, ele já estava saindo. A porta se fechou atrás dele com um leve estalo, e o silêncio tomou conta da cozinha.Eu fiquei ali, no mesmo lugar, tentando processar tudo o que tinha acontecido. Eu ainda não sabia o que ele queria de verdade, mas o que ele acabara de sugerir parecia ridículo, até absurdo. Bolo? Ele não podia estar falando sério. Mas havia algo em seu tom, algo na maneira como ele falava que me fazia sentir que ele realmente não estava brincando.Eu olhei para as mãos, ainda com os dedos ligeiramente tremendo, como se eu pudesse tocar o que ele tinha acabado de deixar para trás. Ele me deu uma tarefa, algo para fazer, mas, ao mesmo tempo, me tratou como se estivesse... me controlando. Eu não sabia o que pensar, e cada segundo que
DAVINATimmy estava me beijando com um fervor que eu nunca tinha imaginado que ele fosse capaz, e, em questão de segundos, ele tomou minha língua, roubou meu fôlego, e tudo ao redor desapareceu.Meu monstro.Foi isso que ele disse, não foi? Que ele era meu monstro. O único que eu poderia ter.Mas o que isso significava? Meu melhor amigo não pediu permissão, não havia espaço para qualquer hesitação. Ele simplesmente tomou, exigiu e roubou o que queria, como se estivesse me consumindo, e eu não queria resistir aquela onda de intensidade. Seus dedos tocavam todos os lugares certos, me fazendo perder a noção do que era real e o que era desejo reprimido. Algo dentro de mim queria que ele não parasse.Suas mãos apertaram ainda mais minha cintura, mantendo-me prisioneira de um beijo implacável, onde ele tomou mais do que eu estava pronta para dar. E, quando finalmente ele se afastou, a respiração dele ainda quente contra minha pele, os olhos dele estavam cheios de uma possessividade insana,
DAVINAEstávamos na cama, um de frente para o outro. Precisamente, Timmy estava apoiado sobre as mãos, uma de cada lado de mim, como se não quisesse invadir meu espaço, mas não conseguisse se afastar.Bom.Eu não queria que ele se afastasse.A respiração dele era lenta, mas pesada, e seus olhos não deixavam os meus. Eu podia dizer o mesmo de mim, mas não era verdade, minha respiração era frenética assim como minha pulsação.Ele abaixou a cabeça, aproximando o rosto do meu. Seus olhos percorriam meu rosto como se quisesse decorar cada detalhe. Então, sem aviso, beijou minha testa, depois desceu para a clavícula, seus lábios quentes contra minha pele. Meu corpo inteiro reagiu àquele toque, um arrepio percorrendo minha espinha, depois meus braços, pernas, ponta dos dedos.Pequenos choques.— Você é tão linda — ele sussurrou, o som rouco e grave de sua voz me fazendo fechar os olhos por um momento. — E eu amo o seu perfume.Abri os olhos e o encarei, sorrindo um pouco.— É hidratante. — s
DAVINAO cheiro de roupa esquecida e um leve perfume floral envelhecido pairava no ar. Minha mãe estava na cama, imóvel, como se o tempo tivesse parado para ela. Seus olhos estavam abertos, mas vazios, fixos no teto.O quarto estava mergulhado em penumbra. As cortinas grossas bloqueavam a luz do sol que tentava, insistentemente, atravessar as janelas.— Mãe... — Minha voz soou mais suave do que eu pretendia, quase como um pedido. Entrei no quarto com cuidado, como quem invade um santuário quebrado. Já se passou um mês. Trinta longos e sufocantes dias desde que perdemos o papai.Ela não respondeu. Nem piscou.Me aproximei da cama, inclinando-me para alcançar seu olhar.— Eu sei que está doendo, mas... eu também estou aqui, mãe. Eu preciso de você. — Meus olhos começaram a arder, mas eu segurei o choro. Alguém precisava ser forte.Mais uma vez, silêncio.Suspirei, passando a mão pelo rosto. A cada dia, a esperança de trazê-la de volta parecia diminuir. Era como se a morte do papai tivess
DAVINA—Você não deveria está aqui! — Gutemberg falou, o maxilar trancado e a voz mortal, o tipo de tom que faz a nuca arrepiar.Eu pisquei, completamente desnorteada. Não o via fazia um mês, e agora ele estava ali, na porta de Meia-noite, parecendo mais carrancudo e ameaçador do que nunca.— Eu… — as palavras simplesmente desapareceram da minha boca. — Eu só… trouxe um bolo.Ótimo, Davina. Isso definitivamente vai deixar as coisas menos estranhas.Gutemberg arqueou uma sobrancelha, mas antes que ele pudesse dizer qualquer coisa, Meia-noite apareceu atrás dele, como se o tivesse chamado com o pensamento.— Você trouxe. — ele disse, empurrando Gutemberg para o lado de forma displicente. Seus olhos semicerrados passaram por mim, do bolo nas minhas mãos até o meu rosto. Era quase como se ele estivesse com preguiça de lidar comigo, mas ainda assim curioso o suficiente para não me dispensar.— Tem morango nisso aí? — Meia-noite perguntou, apontando com o queixo para o bolo.Eu balancei a c
DAVINAO relógio parecia zombar da minha falta de paciência. A última aula do dia sempre se arrastava, mas, hoje, cada segundo parecia uma eternidade. Não era culpa do professor, ele fazia o possível para nos manter interessados, mas a sensação persistente de ser observada me tirava qualquer foco.Principalmente, porque eu sabia de onde vinham os olhares.Tom.Eu fingia não notar, mas os olhares dele eram óbvios, mesmo que ele tentasse ser discreto. Toda vez que ele achava que eu não estava olhando, lá estava ele, encarando. Antes, isso teria me feito corar. Hoje, só fazia o sangue ferver nas minhas veias.Ele tinha a audácia de me encarar assim enquanto ainda repostava fotos felizes com a noiva grávida nas redes sociais. "Nossa família está crescendo", dizia a legenda da última postagem dela.Sus