O DESESPERO RUGIU dentro de mim, ensurdecedor como um alarme disparado diretamente em meus tímpanos. Dor, raiva e frustração se retorciam dentro do meu peito, serpenteando pelos meus nervos, sobrecarregando cada fibra do meu corpo até que o esgotamento físico e mental se tornasse inevitável. Era como lutar contra a correnteza de um mar revolto, nadar com todas as forças apenas para ser arrastada para as profundezas. O esforço era inútil.Eu estava afundando.E olhar para Karyn naquele estado fazia cada gota de resistência se esvair.A dor era lancinante. Uma dor que não vinha de ferimentos visíveis, mas que dilacerava por dentro, uma dor que me desmanchava pouco a pouco. Como se a mulher forte, astuta e inabalável que ela costumava ser tivesse desmoronado, reduzida a nada diante da cena diante de mim. Eu não sabia se a dor que sentia era a minha própria, ou a dela, mas era impossível ignorar.Há quanto tempo estávamos presas? Dois dias? Três? Não havia como saber. Mas, ao ver Karyn naq
O FOYER FOI tomado pelo caos. Caçadores emergiam de todos os lados, saltando das janelas despedaçadas e avançando pelas portas com precisão calculada. Vestidos com trajes escuros de combate, empunhando lâminas afiadas e bestas carregadas, eles se moviam com uma fúria inabalável. Vampiros rosnavam em resposta, os olhos ardendo em um brilho feroz, encurralados como feras prestes a atacar. Braddock permaneceu firme à frente de seu bando, como um predador protegendo seu ninho. O corpo gigante estava retesado, pronto para o confronto, as presas expostas num sorriso de puro ódio.— Como ousam profanar nosso domínio?! — ele rugiu, a voz reverberando pelo saguão, gotas de saliva escapando de sua boca retorcida.— Viemos tomar de volta o que nos pertence. — um dos caçadores, um homem alto e corpulento, declarou sem hesitação. A arma cintilava sob a luz instável das chamas ao redor. — Vocês já são assassinos vis, agora se tornaram ladrões também? Sua raça não passa de escória pútrida. Um erro
A MULHER RECORDAVA com nitidez a primeira vez que cruzara aqueles imponentes muros de concreto, encimados por cercas elétricas e vigiados de perto por caçadores estrategicamente posicionados nas torres de observação. A base militar, com sua estrutura austera e decadente, mantinha a mesma aparência de abandono, oculta no coração da densa floresta e esquecida nas páginas de mapas desatualizados de Nova Jersey. Naquele tempo sombrio, ela havia adentrado o local escoltada ao lado do pai, cuja presença fora requisitada com urgência devido ao desaparecimento inexplicável de seis jovens — um mistério que pairava como uma sombra sobre a região.Uma lembrança dolorosa se instalou em seu peito ao reviver aquele dia fatídico. O interrogatório que seu pai enfrentara fora mais excruciante do que as intermináveis aulas de cientologia da professora Rabello, cujo tom monótono transformava cada minuto em uma tortura silenciosa. Sentada em uma sala escura, ela observava seu pai relatar, com um pesar evi
Inverness, Escócia 1875Uma tempestade descomunal rugia desde o cair da tarde, banhando o mundo em um manto de trevas inquietantes. Nuvens pesadas e densas, de um cinza profundo como o carvão, tomavam o céu, apagando qualquer vestígio de luz. A lua e as estrelas, impotentes, foram obliteradas por essa cortina de desespero. O vento, feroz e inclemente, bradava em uivos que carregavam a essência da fúria, enquanto relâmpagos riscavam o firmamento com uma luz branca e crua, cada clarão como uma lâmina que feria os olhos. Beleza e perigo entrelaçados, anunciando que a noite não pertencia mais aos homens, mas às forças que os superavam.No vilarejo aos pés das Montanhas de Krane, a tempestade não era a única ameaça. Os moradores, encurvados sob o peso da calamidade, enfrentavam algo muito mais antigo e terrível que a ira da natureza. Um terror sombrio, quase inominável, pairava sobre eles como uma maldição, espreitando nos cantos mais profundos de suas mentes e corações.Evangeline cambalea
Parte I "Nada há de oculto que não se torne manifesto, e nada em segredo que seja conhecido e venha a luz do dia.— Evangelho de Lucas 8,17✥Adeus.Indicação de despedida; sinal, palavra, gesto ou acontecimento que assinala a partida de alguém.UMA PALAVRA QUE carrega um significado tão profundo quanto o amor, a morte e o perdão. Há momentos em que nos preparamos para a partida iminente de alguém, mas e quando a morte nos pega de surpresa? Quando chega sem aviso e nos obriga a aceitá-la, levando aqueles que, por mais mortais que sejam, deveriam ser eternos? Como saber quando estamos finalmente prontos para dizer adeus e retirar a atadura que cobre a ferida em nossos corações? O tempo não cura; ele apenas ameniza a dor, tornando as lembranças mais suaves, embora a tristeza persista, apertando nosso peito até nos sufocar. As lágrimas, então, caem, e a dor se torna mais visível.Já se passaram sete anos desde que comecei a conviver com essa dor profunda e a passar a detestar a data do m
A NOITE ESTAVA agradavelmente fresca após um dia de calor intenso. O céu, salpicado de estrelas prateadas e iluminado pela lua crescente posicionada no centro, conferia um brilho pálido ao colégio, cuja arquitetura vitoriana lembrava um castelo dos filmes de Drácula — visão que sempre me fascinava. Pouco depois da partida de Karyn, Edgar, o segurança, liberou minha passagem pelo portão de ferro. O letreiro "Jardim Prata", forjado em arco no alto das lâminas que coroavam o portão, tornava a instituição ainda mais imponente. Ao longe, pude ver alunos dispersos pelo campus, aproveitando o frescor noturno antes do toque de recolher. Eu sabia que Eve estaria entre eles, pois nunca perdia a chance de sentir a liberdade efêmera além das paredes imponentes do colégio.Como esperado, encontrei-a sob a luz amarelada de um poste colonial, sentada em um banco de frente para o jardim e de costas para o edifício que nos aprisionava diariamente. Aquele era o refúgio dela, onde podia contemplar a bele
MEU CORPO SALTOU da cama em um espasmo. O ar voltou aos meus pulmões de forma brusca e dolorida, enquanto meu peito arfava, tentando lidar com a batida frenética do meu coração. A adrenalina pulsava em minhas veias. Respirei fundo, tentando acalmar o tremor nas mãos.— Foi só um pesadelo... — pensei, ainda com a mente turva. — Um pesadelo horrível e assustador...Meus olhos correram pelo quarto, reconhecendo aos poucos os objetos familiares que pareciam, de alguma forma, distantes. O abajur apagado, a janela aberta pela metade, às cortinas afastadas, deixando os raios de sol dourados banharem o ambiente com uma claridade morna. Peguei o celular virado para baixo sobre o criado-mudo e toquei na tela. Oito e quinze da manhã.Um novo dia começava, mas algo ali estava errado.Olhei ao redor do quarto, a desconfiança crescendo como um pressentimento ruim. Minha mente se forçava a entender como e quando eu havia voltado para casa e me deitado ali. Era como tentar ver através de uma neblina e
NA MANHÃ SEGUINTE, acordei com as batidas firmes na porta do quarto, seguidas pela voz impaciente de Karyn, avisando que eu a faria atrasar para o trabalho. Levantei, ainda sonolenta, e encontrei o café da manhã já pronto sobre a mesa. Sentei em silêncio e encarei a tigela de cereal com leite, o pedaço de torta de maçã e a xícara de café. Uma refeição mecânica, quase sem sabor, feita só para cumprir tabela.Karyn estava na sala, sentada no sofá, escondida atrás do jornal enquanto esperava por mim. Quando terminei, caminhamos até o carro em silêncio, como se cada palavra represada fosse uma ameaça àquela paz superficial. Dentro do carro, a rádio local preenchia o vazio com um locutor animado, falando sobre o calor do dia e a importância do protetor solar. A cada palavra dele, o silêncio entre nós se tornava mais denso. Karyn dirigia com uma pressa calculada, como se quisesse me deixar logo para trás.Por um momento, pensei que talvez fosse mesmo uma boa ideia nos afastarmos por essa sem