O motorista me deixou a cinco enormes quarteirões da segunda entrevista, então tive que correr na chuva.
— Bom dia – lá estava eu, eu uma recepção pra lá de chique, toda molhada e atrasada. — Tenho uma entrevista, aliás, tinha uma entrevista às 10:00 com Sebastian Cole, sobre a vaga de assistente administrativa.
— Bom dia, o Sr. Cole está atrasado, deve ser o trânsito, então você está com sorte – a moça me deu um sorriso e uma piscadinha de olho, aquilo me confortou profundamente. — Então relaxa, e vai até o banheiro se secar um pouco, lá tem toalhas.
— Uau!! Você é um amor, muito obrigada… – fiquei procurando o nome dela no crachá.
— Tabita, e imagina, eu sei como é estar procurando trabalho, estou aqui há pouco mais de um mês. – Ela deu mais um sorriso e indicou o banheiro.
Quando entrei no local, percebi que a empresa era realmente muito elegante, digamos assim. Tudo de mármore preto e branco, e as toalhas de que ela falou eram de tecido, fiquei chocada. A senhora que cuidava do local me ofereceu à vontade, pude me secar um pouco, mas ainda parecia um pintinho molhado.
— Prontinho, Tabita, e agora?
— Agora você pega esse crachá de visitante, eu já fiz seu cadastro – tinha deixado meu documento com ela. – E sobe até o décimo andar. Lá tem outra recepção, não tem erro, o andar é só dela.
— Dela? – Perguntei, pela forma como ela arregalou os olhos.
— Verônica Solto, a rainha do mel – ela até fez um biquinho pra falar, na verdade, Tabita era muito legal. Depois eu pesquisei esse nome no G****e. — A vaga de assistente é para a secretária dela.
— Hummm! Tomara que eu seja essa abelhinha que ela procura. – Dei uma risada malévola e peguei o crachá.
O elevador era incrível, marrom e dourado; por dentro, tinha retratos de pinturas desses caras muito famosos, que eu não reconheço por não entender de arte, mas o teto era daquele homem de cara de bebê pelado tentando tocar o dedo de Deus.
Enfim, cada botão era decorado, como uma moeda de ouro antiga. E tocava uma música clássica, era "Lago dos Cisnes", dessa eu me lembro, meu pai amava.
— Bom dia, sou Hannah Furtado, tenho uma…
— Pode pegar uma ficha e preencher, sente-se naquela poltrona. Quando acabar, me entregue. – A mulher não tinha expressão alguma, nem o som da sua voz se alterava quando ela falava; era meio sinistro.
Me afundei no sofá, que delícia, da cor carmim. Comecei a ler o questionário, o de sempre. Aliás, tem tanta coisa que já tem nos currículos, e que também perguntam nas entrevistas, por que esses questionários enormes?
O elevador fez o barulho de sua chegada ao andar, e vocês não vão acreditar no que eu vi, aliás, quem eu vi. Era ele… Apolo, em carne e osso, mais músculos do que ossos, na verdade.
Estava lindo, de terno, todo alinhado, cabelos devidamente penteados para trás, sem nenhum fio fora do lugar. Ele olhou para direita, esquerda, pra todo lado como se procurasse algo. Depois levantou um pouco o punho do paletó e disse:
— Tudo limpo, pode subir com a abelha rainha. – Foi então que ele me viu.
Meu olhar encontrou o dele, meu coração disparou, foi tudo tão … decepcionante?!
O que foi isso? Ele pareceu tão frio, e pior, eu percebi que me reconheceu.
— Bom dia, Sra. Solto, já está tudo pronto em sua sala para a reunião com Paris… – a mulher mal saiu do elevador e a secretária ia vomitando a agenda em cima dela.
Que mulher linda, devia estar na casa dos quarenta, muito bem conservada. Quando a vi de camisa social de mangas compridas, estilo sino e um short de linho, risca de giz, acompanhados daqueles lindos scarpins vermelhos, meu queixo quase caiu no chão, mas me segurei.
— Aqui, terminei de preencher – entreguei a ficha e a mulher apenas apontou para o sofá novamente. Ela atendeu o telefone ao mesmo tempo que me atendia.
Apolo saiu da sala da abelha rainha e voltou para a recepção, ele falou alguma coisa baixinho no rádio dele e ficou na porta da sala dela. Eu me sentei bem de frente para ele dessa vez.
Percebi que ele colocava a mão no ouvido para ajustar o fone que usava. Ele procurava evitar me olhar, eu notei isso. Nós estudamos até a sétima série, no último ano da escola, ele e a família desapareceram da cidade. Ninguém soube o motivo, cada um contava uma história diferente, mas acredito eu, que seja tudo especulações.
— Sta. Hannah.
— Sim? – Eu me levantei olhando para ele, para ver qual a sua reação, quando a secretária chamou meu nome. Ele deu uma leve olhada.
Fui até a mesa dela.
— Pois não? – Dei um leve sorriso, mas estava animada por ele ter olhado.
— Sra. Solto desmarcou as entrevistas. Entraremos em contato quando ela puder.
— Mas você sabe me dizer…
— Obrigada, é só isso.
Eu não via motivo em insistir depois dessa frase, então peguei minha dignidade e fui para o elevador. Para minha surpresa, uma mão forte apertou o botão junto comigo.
— Ahhh, desculpa. – Só agora, ao lado dele, percebi o quanto ele tinha crescido, o rechonchudo Apolo, estava grande e forte. — Apertamos juntos.
Que frase idiota, mas foi o que saiu. Fora a cara de eu estava, com um sorriso bobo, nem queiram saber o que era aquilo. Graças a Deus o elevador chegou rápido e eu me enfiei lá no fundo.
— Hannah, banana – ele falou, enquanto apertava o botão para o térreo. — Há quanto tempo.
— Então, já faz um tempinho, não é? – E isso foi o que saiu da minha boca. — E aí Apolo, meu herói, quer dizer, herói da galera, da escola em geral, não meu… – Alguém me afoga numa xícara de café. Dei uma risadinha e fiquei séria pra terminar a conversa, antes que me embananasse mais.
— Então está tentando uma vaga aqui na empresa? – Ele tinha uma voz muito bonita, combinava com seu porte.
— Sim, vaga de assistente. Mas pelo jeito não … – o elevador parou e entraram mais pessoas. Foi ótimo, porque ele ficou mais perto, e deu pra sentir seu perfume delicioso. — … foi dessa vez.
— Não pense assim, a Sra. Solto é realmente muito ocupada, ela vai remarcar. – Enquanto ele falava eu só consegui comparar ele com o menino da escola, e ver o quanto ele ficou mais lindo. — Tem alguma coisa na minha camisa?
Foi então que ele começou a limpar algo que não existia, passando a mão no peitoral. Claro, porque eu estava babando na cara dura!
— Não, não, desculpa. É que percebi que você é … – olhei de baixo a cima e me vieram muitos adjetivos. — Segurança, agora.
— Sim, montei minha… – o elevador chegou no térreo. E descemos e continuamos conversando até o lobby. — Empresa há um ano e meio.
— Poxa, que legal, você é um empresário de sucesso, parabéns! – Eu espontaneamente coloquei a mão no ombro dele, odeio essa minha mania de tocar as pessoas, preciso corrigir isso, mas aqueles músculos…
— Obrigado, espero que você consiga a vaga de assistente, aí podemos conversar mais – aí ele fez um gesto com as mãos meio desajeitado, como se trocássemos socos em um ringue. – Ou você me dá seu telefone e combinamos algo, um café, um suco, refri.
Aí ficou sério de novo.
— Claro, me empresta seu celular que eu vou digitar pra você – o problema era eu pegar o objeto sem ficar tremendo, o que não aconteceu, estava visivelmente nervosa. Mas digitei mesmo assim. — Prontinho, coloquei meu nome já, Hannan sem o banana.
Agora sim, alguém deveria me afogar, antes da risada sem noção que eu dei.
— Já vou, Apolo, até mais. – Eu estendi a mão e ele veio como se fosse me dar um beijo, mas voltou. Então eu que fui dar um beijo, e fiquei no vácuo, e ele estendeu a mão. Enfim, acenei com uma continência. Isso mesmo, uma continência de exército ou marinha, o que preferirem, e saí dali antes que eu mesma me matasse!
— Fica mais um pouquinho, delícia.Detestava quando ela me tratava assim, mas fui eu que permiti essa intimidade, fazer o quê, não é?— Não posso, moça bonita, tenho que levantar cedo, se não minha patroa me come vivo… – era uma piada interna nossa. — Ahhh é! Ela é você, e você já me devora.Coloquei minha camisa e dei uma piscadinha cafajeste que elas gostam. Para falar a verdade, aquilo tudo já estava me cansando, mas eu só precisava aguentar mais alguns meses até o contrato acabar.Eu sei o que vocês estão pensando, misturar negócios com prazer, ou até mesmo que eu me vendi. Mas não julguem antes de saber que ela me contratou pelas minhas outras virtudes, meu negócio de segurança era muito recomendado, eu realmente era bom no que fazia e ralei muito para me tornar uns dos melhores na área.O prazer veio bem depois, afinal, aquela mulher não era de se jogar fora, e eu não deixo passar um bom partido.— Alô? Estou a caminho. – Era meu assistente, tinham invadido um dos escritórios qu
— Alô, mãe, acabei a segunda entrevista de hoje… – Minha mãe me ligava duas vezes em média por dia. Eu gostava disso, sentia que tinha uma amiga me apoiando em tudo que eu precisasse, pois era assim que ela agia. Ao contrário do meu pai, que só queria saber de me julgar e dizer como viver minha vida.— Não, mãe, acho que ainda não foi dessa vez, mas sabe quem eu encontrei?— Brad Pitt ou Wagner Moura? – Mamãe sonhava em encontrar um dos ídolos dela na rua e achava que eu ia achar isso o máximo para mim. Na verdade, só conheço esses nomes porque esses caras são realmente excelentes atores, mas fala sério, tô mais para Tom Holland ou Gabriel Elias.— Não, mãe, Apolo, o gatinho da escola.— O que sumiu depois dos boatos – ela ficou sabendo que algo muito grave aconteceu na casa do Apolo que fez a família se mudar. — Filha, como ele está? Vocês conversaram?Eu estava atravessando a rua, e havia muito barulho de trânsito e pessoas passando.— Não sobre isso, mas eu dei meu telefone – ela j
— Boa noite, Sr. Inácio.— Boa noite, Sta. Hannah. Como o senhor está hoje? – O motorista que me leva para a faculdade quase todos os dias.— Bem, graças a Deus, e você?— Eu preciso de um milagre para ir bem na prova.— Vou orar por você, mocinha, mas Deus só ajuda a lembrar o que você se esforçou para estudar.— Por isso que eu preciso de um milagre, Sr. Inácio. – Passei a roleta depois de ouvir a gargalhada e depois do olhar de desaprovação do meu amigo motorista. Era uma risada gostosa, solta e despreocupada. Me ajudava a seguir adiante; aquele senhor de idade avançada já me contou várias vitórias e sempre terminava com aquela gargalhada, isso me marcou.Quando cheguei no corredor, antes de entrar na sala, vi o casal se esfregando perto do bebedouro, que nojo! Letícia e Cícero, meu ex, sei lá o que era aquilo.— Boa noite, Hannah – ele falou com a mão ainda na bunda dela. — Como você está hoje? Não precisa responder, pela aparência, ainda na auto-piedade sem fim, pobre coitada.—
Meu celular me despertou, mas não era o toque do despertador, era umaligação de um número estranho.— Alô?— Por favor, Srta. Hannah Furtado. – Meu coração gelou, era voz dasecretária legal da primeira entrevista, mal podia acreditar… mas podia ser paradizer… não, não posso pensar assim. — Alô, tem alguém aí?— Oi, sou eu, desculpa, pode falar. – Que tonta, já comecei mal.— Você passou para a segunda fase da entrevista, gostaria de participar?— Sim, claro. O que devo fazer? – Levantei e corri para pegar um papel, masé claro que eu não tinha, porque na hora que se precisa, não achamos nada.Meu celular me despertou, mas não era o toque do despertador, era umaligação de um número
"Vou pedir para que desliguem seus celulares... – Aqui estou eu, e Antonellaestá impecável, como da última vez que a vi. Esse perfume dela é mesmo incrível;um dia vou perguntar... — Hannah Furtado, você pode me acompanhar? — Claro.– Eu tinha que ser a primeira, que droga. Mas tudo bem, eu vou conseguir; melhortirar o esparadrapo de uma vez. — Quantos candidatos passaram para a segundafase? — Para a vaga de secretária, só você. Os outros estão esperando outras vagas.— Yes!! – Ela parou... — Desculpe, não foi nada. – Credo, que olhar fuzilante;ela não vai com a minha cara, será?! Hummm, Nico deve ter comentado algo comela..."— Pode se sentar aqui, nesta tela; pode abrir o documento que está no Wordcomo "Teste para Vaga
Seu menino idiota, já não falei para você ajudar sua mãe… – que cheiro horrível de álcool, ele dessa vez nem consegue ficar em pé, babaca de merda — O que você está olhando, acha que essa porcaria de escola vai te ajudar a ser alguém na vida? — Se eu não for como você, já está ótimo. – Falei e saí correndo dali, tinha que ficar longe até ele desmaiar. O único problema é que, se ele não me pegasse, ele tinha que descontar em alguém. Depois de algumas horas, eu voltei para casa. O caderno estava todo rasgado, a professora era um saco, nem adiantava contar nada, ela não estava nem aí… aliás, ninguém estava. — Mãe, o que está fazendo aí no chão? – Ela colocou o dedo na boca, pedindo que eu me calasse. Seu olhar de pavor condiz com o tremor da sua mão. Tem muito sangue em suas pernas. — Mas, mãe… — Cala essa boca, moleque, o sangue não é meu. – Ela virou o rosto, e vi que estava muito machucada. — Esse desgraçado tentou me puxar enquanto se afogava no próprio sang
— Vou colocar o endereço no GPS. – Cara, nem acredito que Hannah está no meu carro, comigo… claro, né Zé mané. Vai estar no seu carro com quem?! — Você quer digitar aqui, por favor?— Claro, é bem fácil chegar lá, mas como nunca fui daqui, é melhor colocar mesmo. Deixe-me ver – enquanto ela digita, eu sinto o perfume amadeirado dela. Seu cabelo ainda tem a mesma cor, parece que nunca quis colorir, o jeito dela mesma, tão confiante e autêntica. — Prontinho.— Confeitaria Li Le Tá, nome bacana. Sua amiga vai estar lá nos esperando?— A confeitaria é dela, então… – ela torceu a boca, fica tão simpática quando faz isso. Eu liguei o carro e saímos. Ficamos um tempo em silêncio, até que os dois falamos ao mesmo tempo…— Queria pedir desc…— Eu queria pedir…Demos risada. O som do carro estava ligado baixinho, coincidência ou destino era uma música da nossa época."Love Me Like You Do" You're the light, you're the nightYou're the color of my bloodYou're the cure, you're the painYo
— Mãe, cheguei! – Todos os dias chego em casa por volta de seis da tarde e logo procuro meu filhote para dar um longo e saboroso abraço nele. — Onde está meu homenzinho aranha? — Pitchu!! Pitchu!! – Ele atira teias imaginárias em mim, estava fascinado pelos quadrinhos que comprei da última vez que passei na banca do senhor Cleison. — Você está presa na teia, mamãe. — Ohhhh, e agora, quem poderá me salvar? – Sempre misturo os personagens com Chapolin Colorado, que acompanhou minha infância na comunidade, onde minha mãe ligava no único canal que sintonizava. — Não, mamãe. Você é a malvada, ninguém vai te salvar. Eu salvo as pessoas de você.— Vem cá, seu moleque, depois que eu te pegar, alguém vai ter que te salvar dos meus beijos. – Ele saiu correndo depois de ver minhas garras apontadas para ele. Eu amo demais esse garotinho, pena que o pai seja quem ele é. — Vocês dois, parem de farra… – minha mãe sempre de mal humor, sinto por ela. Veio da cozinha com as contas nas mãos e gritan