Eu estive apaixonada por Daniel Stefano desde os meus quinze anos. Sentada na varanda da minha casa, eu observava ele cuidando do jardim. A primeira coisa que notei foi o quanto ele era alto. Eu sempre gostei de caras altos. E o cabelo... Negros, despenteados de uma forma que só aumentava o seu charme.
Ele trabalhava duro, e dava pra ver o esforço em cada movimento. O sol batia em seu rosto, e o suor escorria pela sua testa enquanto ele aparava a grama ou podava as plantas. Daniel era um garoto de dezenove anos que nunca, nem por um segundo, parecia notar a minha existência. Quando seus olhos, sempre desinteressados, se cruzavam com os meus, eu sentia um arrepio me percorrer dos pés à cabeça. Ao contrário dele, eu não conseguia esconder o quanto ele mexia comigo.
O tempo passou, mas lá estava eu, sempre atenta a ele, escondida atrás das cortinas, das árvores, do carro. Era um hábito, uma espécie de ritual, observá-lo de longe, enquanto ele se transformava de um garoto para um homem. Vinte, vinte e um, vinte e dois anos... E eu ainda suspirava ao vê-lo, meu coração dando saltos descompassados.
Às vezes, eu levava copos de água para ele. E, em todas essas ocasiões, eu tentava iniciar uma conversa, mas ele mal respondia, sempre distante. Parecia ter erguido um muro ao seu redor, um muro que eu nunca consegui atravessar. Havia algo de quebrado e solitário nele. Eu não conhecia sua história, mas uma vez meu pai comentou que Daniel sustentava a família. Ele não tinha pai, e sua mãe, segundo meu pai, se perdia na bebida.
Imaginar a vida dele me deixava inquieta. Talvez ele morasse num lugar marcado pela pobreza, onde a paz era um conceito distante. Talvez dormisse com fome, cercado por gritos e discussões. Eu queria tanto dizer a ele que ele não estava sozinho, que poderia encontrar em mim uma amiga. Mas a coragem nunca vinha, e eu permanecia invisível.
Com vinte anos, minha vida era feita de festas, faculdade e um certo conforto. Eu tentava seguir em frente, mas não conseguia esquecer o homem musculoso e bonito que ele havia se tornado. Não resistia em espiar pela janela sempre que lembrava dele.
Até que, de repente, ele sumiu. Parou de trabalhar no jardim da minha casa. Dias, semanas se passaram, e eu não o vi mais. Meu pai contratou um senhor de meia-idade para substituí-lo, mas nada preparou meu coração para a dura realidade de não ver mais Daniel.
Perguntas ecoam na minha mente: ele está bem? Como tem se virado? Tento afastar esses pensamentos, mas parece impossível. É como se eu tivesse perdido algo importante. Então, um dia, decido: preciso vê-lo. Talvez, se eu encarar sua realidade de perto, consiga esquecê-lo de uma vez por todas.
Eu sei onde ele mora, porque Rose, nossa empregada, vive no mesmo bairro que ele. Ela já comentou comigo que Daniel é seu vizinho. Mas como simplesmente aparecer lá? Só de pensar nisso, meu estômago revira. Desisto da ideia várias vezes, arranjando mil desculpas para não ir atrás dele.
Os dias passam, e eu tento, sem sucesso, seguir com minha vida sem Daniel. Mas o destino parece ter outros planos para mim. Rose está limpando meu quarto enquanto eu leio um livro, quando ela para de repente e me olha.
— Kate, você não teria algum vestido velho para doar?
Sorri, um tanto surpresa. Eu não tenho vestidos velhos; apesar de não sermos ricos, meu pai sempre fez questão de me dar o melhor. Mas eu minto:
— Sim, claro! Para quem seria?
— Para minha filha. Vai ter uma festinha no bairro, e ela está louca para ir.
Meu coração dispara. Festa no bairro dela? Daniel pode estar lá!
— Claro! Me conta como será a festa, assim eu escolho algo adequado — digo, tentando não parecer ansiosa.
Rose para de espanar os móveis e explica:
— É uma festa de rua. Vai ter música e dança, então nada muito chamativo.
Levanto animada, abro meu guarda-roupa e percorro os olhos pelos meus vestidos. Pego um azul-marinho com detalhes em branco, simples, mas elegante.
— Que tal esse?
Os olhos de Rose brilham.
— Kate, é lindo! Tem certeza?
— Absoluta. Leve para sua filha.
— Obrigada, querida — diz ela, emocionada.
— E quando é a festa?
— Amanhã à noite.
Meu coração quase salta do peito. Amanhã? Sexta-feira à noite é perfeito! Meu pai sempre sai com os amigos e só volta de madrugada.
— Que horas começa? — pergunto, tentando disfarçar o meu entusiasmo.
— Não será tarde. Mas, se quiser dar um casaquinho, sempre esfria à noite.
Dou um sorriso largo e vou buscar o casaco perfeito para acompanhar o vestido.
— Tenho um lindo aqui, vai combinar.
Eu mal consigo conter a ansiedade. Amanhã à noite, terei uma chance de ver Daniel novamente. E dessa vez, não ficarei escondida.
No dia seguinte, eu passo o dia inteiro ansiosa, incapaz de me concentrar em qualquer outra coisa. O tempo parece se arrastar. Pela manhã, tento me distrair na faculdade, mas não consigo prestar atenção nas aulas. Minha mente está longe, imaginando como será essa festa, se eu realmente vou encontrar Daniel, e, se encontrar, o que direi a ele.
Quando chego em casa, jogo a mochila no canto do quarto e vou direto para o espelho. Abro o guarda-roupa e escolho um vestido para mim. Nada muito extravagante, apenas um vestido preto simples, que cai bem no corpo e me dá confiança. Arrumo o cabelo, faço uma maquiagem leve, mas o suficiente para me sentir bonita. O coração b**e acelerado, minhas mãos tremem um pouco. Não sei o que esperar dessa noite, mas sei que estou prestes a cruzar uma linha que adiei por anos.
Meu pai sai às sete, como de costume nas noites de sexta-feira. Ele beija minha testa, se despede e diz para eu não ficar acordada até tarde. Assim que ele fecha a porta, sinto uma onda de alívio. Meu momento chegou.
De repente, me olho novamente no espelho. Vesti um traje comportado para evitar olhares curiosos, mas a verdade é que, mesmo assim, ainda me sinto sensual. Tento tirar essa sensação. Prendo um cacho rebelde para afastá-lo do rosto e solto um suspiro longo. Pronto. Está feito.Com as mãos trêmulas, mas decidida, paro de me encarar no espelho. Visto uma blusa de linha preta, pego minha bolsa e vou para a sala. Prefiro não arriscar sair com o meu carro — meu pai pode notar. Em vez disso, ligo para a central de táxis, aliviada quando o veículo chega em poucos minutos.O trajeto é longo. Parto da zona Norte, um bairro de classe média, para o extremo oposto na zona Sul, onde Daniel mora. É um lugar que só conheço de nome, nunca estive lá. Quando o táxi finalmente para, sinto o impacto imediato do cenário: ruas escuras, lixo espalhado, muros cobertos de pichações. O contraste me assusta, mas não o suficiente para me fazer voltar atrás.— Tem certeza de que é aqui? — pergunta o taxista, perce
Ele me encara como se tivesse levado um soco no estômago.— Atrás de mim? — Ele pergunta, ainda sem entender.Demoro um pouco para responder. Tomo fôlego, sinto meu coração bater acelerado.— Sim. Quando a Rose mencionou essa festa, achei que seria uma chance de falar com você, saber como você está.Os olhos de Daniel se estreitam e uma expressão angustiada toma conta do seu rosto.— Bem, já matou sua curiosidade. Como pode ver, estou bem — ele diz, com um sorriso forçado.— O que você tem feito? — insisto, ignorando seu tom distante.Ele sorri de canto, e seus olhos deslizam lentamente dos meus olhos para os meus lábios, como se estivesse tentando decifrar o que eu realmente quero. Então ele volta a olhar para mim, mais sério.— Sério isso, Kate? — Ele questiona, levantando uma sobrancelha. — Olha, seja lá qual tenha sido sua intenção ao vir aqui, nossos mundos são bem diferentes. Dá pra ver isso no seu jeito, na sua pele macia, no seu perfume delicado. Cada detalhe diz que você não
Eu me afasto, evitando seus olhos, porque sei que, se olhar para ela agora, vou ceder novamente. Sem pensar muito, pego o capacete da moto. Colocá-lo me dá uma desculpa para esconder meu rosto, para bloquear a intensidade do olhar dela.Ligo a moto e acelero antes que possa mudar de ideia, o rugido do motor preenchendo o silêncio que deixei para trás. A estrada à minha frente é apenas uma fuga, mas não consigo escapar da sensação dela, do gosto dela, da lembrança de como ela fez o mundo inteiro desaparecer por alguns segundos.Enquanto me afasto, algo dentro de mim me diz que essa batalha está longe de terminar.Não voltei para a festa. Peguei a estrada sem destino, sem saber exatamente onde ir, até que algo me impulsionou a seguir para o Larry and Penny Thompson. Estacionei minha moto na frente do parque, tirei o capacete e o de Kate do meu braço, colocando-os no banco da moto, como se fosse possível deixar toda a confusão ali. Mas, não. A noite cai e, no silêncio, eu caminho até a p
KateDepois de uma noite mal dormida, sem conseguir afastar os pensamentos sobre Daniel, aproveito as férias da faculdade para descansar. Estou sentada na espreguiçadeira em frente ao jardim, lendo Crepúsculo. Embora o livro seja maravilhoso, minha mente está distante, perdida em lembranças daquela noite. A decisão de ir atrás de Daniel ainda ressoa dentro de mim, me deixando inquieta.À tarde, meu pai chega do trabalho. Dou-lhe um sorriso e um beijo carinhoso no rosto, e ele me abraça, beijando minha testa. Ele sempre foi assim, afetuoso, mas ao mesmo tempo distante, preso à sua própria tristeza. Mesmo com a agitação que sinto por causa de Daniel, eu disfarço. Aprendi com meu pai a esconder meus verdadeiros sentimentos, a mostrar serenidade em qualquer situação. Ele busca meus olhos, e mesmo com a ansiedade me consumindo, dou-lhe um sorriso tranquilo.Olho para ele, naquele terno negro, parecendo mais um CEO poderoso do que um simples vendedor de carros. Mas há algo em sua postura qu
Vestindo apenas um short de corrida e tênis surrados, corro pela calçada, mas o crepúsculo à minha frente passa despercebido. O céu vai escurecendo, mas nem mesmo o brilho laranja do sol se põe consegue desviar minha atenção do turbilhão que toma conta de mim. Hoje é um daqueles dias em que a inquietação me consome, como se todo o peso do mundo estivesse sobre meus ombros. Então, corro. Corro para afastar os pensamentos que não param de se amontoar, corro para afogar minhas mágoas, para exorcizar essa raiva e essa solidão que me cercam. Corro até meus músculos doerem, até os pulmões gritarem por ar.Pauso, ofegante, e apoio as mãos nas pernas, puxando o ar com força, tentando recuperar o fôlego. O calor me envolve, a camisa grudada nas costas, o suor escorrendo pelo rosto. Olho para a rua e ela parece tão vazia quanto minha alma. Não há ninguém por perto. Só o som da minha respiração pesada quebrando o silêncio da noite que começa a cair.Depois de um tempo, sigo novamente. Continuo c
Eu já esperava uma reação como a dele, mas isso não significa que não me afete. Ao vê-lo parado, estático, o seu olhar fixo em mim com aquela expressão de conflito, eu fico corada. Meus lábios se entreabrem e uma respiração ofegante escapa sem querer. Ele não se move, como se as palavras que estou prestes a dizer pesassem mais que qualquer gesto.— Você sabe o que eu quero. Você! — Minha voz sai mais suave do que eu gostaria, mas a intensidade que sinto dentro de mim me faz parecer mais vulnerável do que o normal.Daniel continua parado, com os olhos em mim, sem conseguir desviar o olhar. Ele parece tão... distante, como se estivesse em guerra consigo mesmo, tentando entender o que está acontecendo. E então, ele fala, e suas palavras me cortam.— Eu? — Ele solta, sua voz carregada de incredulidade. — Dê uma olhada em tudo. É isso que eu sou e tenho a oferecer.Eu respiro fundo, como se aquelas palavras não me tocassem, mas elas me fazem questionar. Quando olho ao redor, vejo o que ele
— Eu sei. — Minha voz sai calma, quase como uma resposta que não precisa de mais palavras.Eu sei o que ele está dizendo, e, de algum modo, isso só me faz querer mais. Quero entrar no seu mundo, quero entender. Mesmo que ele ache que não tem nada a oferecer, eu sei que há mais nele do que qualquer lugar ou condição poderia mostrar.— Sabe? O que faz aqui então? Sexo? É isso que quer de mim? É esse tipo de emoção que veio procurar? — Ele questiona, os olhos se fixando nos meus, procurando alguma resposta que ele provavelmente teme encontrar.Suas palavras me ferem, me desafiam, mas não me afastam. Pelo contrário. Elas só me fazem mais determinada.— Não. Eu gosto de você e te levo a sério, apesar de toda essa feiura ao seu redor. — Digo, a intensidade da minha voz revelando a verdade que eu mesma mal consigo acreditar.Eu vejo a surpresa no rosto dele, o modo como ele parece atordoado, como se não soubesse o que fazer com as palavras que saem da minha boca. Ele balança a cabeça em nega
DanielÉ difícil ter força de vontade e lembrar por que não quero me envolver com Kate quando ela me beija desse jeito. Sinto meu corpo todo reagir; meus lábios, que deveriam afastá-la, acabam cedendo. Liberto minha boca dela por um segundo, tentando colocar algum espaço entre nós, mas antes que eu consiga expressar meu arrependimento, ela me puxa de volta, colando nossos corpos outra vez. Suas mãos firmes me envolvem, e eu sinto meu desejo crescer, latejando de uma maneira que chega a doer.Seus lábios são quentes, úmidos, e se movem sobre os meus com uma necessidade que me desarma. Mesmo louco de desejo, luto contra isso. Tento reunir argumentos para afastá-la, mas minha mente está um caos. Droga! Ela é jovem, recém-saída da adolescência, ingênua demais para entender no que está se metendo. Mesmo que eu tenha apenas dois anos a mais, já vivi o suficiente para saber que essa vida é uma selva. Eu não posso me iludir com ela, nem deixá-la se iludir comigo.Seguro seus braços e a afasto