Ótica de Daniel

Eu me afasto, evitando seus olhos, porque sei que, se olhar para ela agora, vou ceder novamente. Sem pensar muito, pego o capacete da moto. Colocá-lo me dá uma desculpa para esconder meu rosto, para bloquear a intensidade do olhar dela.

Ligo a moto e acelero antes que possa mudar de ideia, o rugido do motor preenchendo o silêncio que deixei para trás. A estrada à minha frente é apenas uma fuga, mas não consigo escapar da sensação dela, do gosto dela, da lembrança de como ela fez o mundo inteiro desaparecer por alguns segundos.

Enquanto me afasto, algo dentro de mim me diz que essa batalha está longe de terminar.

Não voltei para a festa. Peguei a estrada sem destino, sem saber exatamente onde ir, até que algo me impulsionou a seguir para o Larry and Penny Thompson. Estacionei minha moto na frente do parque, tirei o capacete e o de Kate do meu braço, colocando-os no banco da moto, como se fosse possível deixar toda a confusão ali. Mas, não. A noite cai e, no silêncio, eu caminho até a praia, tentando encontrar algo que me acalme, que me traga algum tipo de clareza. Mas tudo que tenho são ecos das palavras dela, ecoando na minha mente, confundindo-me, me desestabilizando.

Ela me procurou. Kate me procurou. E eu? Eu estou perdido em meio a isso. O que significa tudo isso? Perigo, desilusão. Eu me prometi, desde o momento em que a vi pela primeira vez, que não deixaria essas coisas entrarem na minha vida. Mas ela... Ela está quebrando todas as barreiras que eu construí, desafiando tudo que sempre foi claro e seguro para mim.

Meu corpo, agora, não está mais sob o controle que sempre tive. Os hormônios correm soltos, dominando cada parte de mim. Desde o início, eu sempre vi esse abismo entre nós, um abismo que me impediu de ceder ao desejo que eu sentia. Mas ela... Ela tem algo. Algo que me desafia a todo instante. Ela chega, exala feminilidade, sensualidade, e tudo em mim se contorce, se agita. Linda, sim, linda de um jeito doce e suave, que machuca, que me faz querer mais.

Por anos, eu mantive tudo sob controle. Mas agora, estou aqui. Confuso. Desorientado.

Deus! Eu me vi sem ação quando ela me abraçou. Quando me olhou daquele jeito, fiquei paralisado. Não sei dizer o que senti, só sei que foi algo forte e incontrolável. Raiva, talvez, por estar tão atraído por ela, e aquela luta interna que eu mantinha em silêncio, que eu controlava com tanta habilidade, de repente, desapareceu. Quando vi aqueles lábios se aproximando, algo dentro de mim quebrou. Aquele beijo que eu sempre sonhei, que eu sempre imaginei... Quando aconteceu, foi como se o chão desaparecesse. A força do sentimento foi tão grande que eu não consegui resistir. Ele me dominou de uma maneira que eu não esperava.

Passo a mão pelos meus cabelos, com raiva de mim mesmo, com raiva do abismo entre nós, que ela nunca irá perceber. Um abismo que o pai dela fez questão de me mostrar logo que comecei a trabalhar na casa deles. Eu sabia que ela olhava para mim de um jeito que não era apenas amizade, mas o pai dela, ele sabia disso também. E, por isso, me mandou embora e colocou outro em meu lugar. Como eu percebi, por que ele não perceberia?

Curso? Eu não faço curso nenhum. Não tenho dinheiro para isso. Trabalho? Faço o que posso. Lavo pratos, me jogo em lutas improvisadas, disputo trocados em ringues. Isso é o que eu sou agora. E, mesmo assim, eu estou aqui, pensando nela, imaginando o que será de mim depois de tudo isso.

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