EmillyO carro some da minha vista e confesso que me assusto com o tamanho da dor que pesa sobre mim. A garganta se fecha e me falta ar. É como se os pulmões estivessem se comprimindo. Achei que havia chorado tudo o que podia, mas as lágrimas jorram sem controle algum. Encosto atrás de uma coluna fora da visão de quem passa pela rua e tento me controlar antes de sair do prédio.É quando ouço a voz de Alex atrás de mim.— Emilly?No susto, me viro rápido, e a dor aumenta ao ver a forma complacente com que me olha. Sim, estou digna de pena, por isso ajeito o cabelo e passo o dorso da mão pelo rosto, tentando secá-lo.— Oi, Alex. — O fio de voz que sai não parece nada com a minha.— Conseguiu encontrar o Cris?— Sim, acabou de sair. — Aponto a rua me obrigando a sorrir e fingir que não está doendo demais.— Que bom que veio, ele estava arrasado pensando que iria embora sem te ver.Olho na direção do portão e volto a encará-lo. Seu olhar é tão terno, que sou incapaz de mentir ou sequer om
EmillyNosso tempo juntos foi pouco para justificar como me sinto. Como pode alguém significar tanto na minha vida, em tão pouco tempo? Mas foi assim que aconteceu. Cris tinha um jeito de me olhar inigualável. A gente se comunicava e se entendia dessa forma, mesmo sem palavra alguma. Ele fazia com que eu me sentisse única, especial. E sofro muito a sua ausência. Até que foi ficando mais fácil. Ou, talvez, eu esteja fingindo tão bem, que até mesmo me convenço de que superei.Depois de vê-lo com Samantha na capital, pensei tanto sobre isso. Todos os argumentos e motivos que me deu para terminarmos foram esquecidos e sufocados pela ideia de que terminou para voltar com aquela mulher. Tentei ser indiferente, paquerar, sair com uns caras, mas falhei como se estivesse estragada para outros homens.Afundei-me no trabalho, ampliei a empresa e, no tempo vago, me ocupo no ginásio, treinando as lutas que os policiais ensinam aos adolescentes. Depois do trauma que Alberto criou em mim, saber me d
CristianoMeses depois...Como sempre, estamos em frente ao D’ângelo Grill, com Gustavo fazendo piadas sobre casamento e polícia, e Alex tentando me acalmar, tanto das piadas de Gus quanto da situação geral. Conferi o bolso da jaqueta quatro vezes e as alianças estão na caixinha preta camurçada como deixei.Quando Vanessa bate no meu braço e indica o outro lado da rua com o queixo, um frio estranho misturado a uma sensação quente, rodopia em minha barriga. Emilly está chegando. Viro e, ao vê-la, abro um largo sorriso. Ela está perfeita. Aliás, ela é perfeita.Olha para os dois lados, esperando uma brecha no trânsito para atravessar a avenida e levo um susto quando um garoto passa atrás dela correndo. Ele quase a derruba no chão ao puxar sua bolsa. Antes que ela reaja ao susto e grite, estou correndo atrás do meliante. Atravesso a avenida sem pensar, espalmando as mãos diante dos carros e parando o trânsito. Os motoristas freiam buzinando alto e me xingam, mas eu só enxergo aquele meni
EmillyMeu maior problema é essa mania de assistir a filmes com finais felizes e imaginar que na vida real possa ter finais assim também. Sentada sozinha no sofá da sala, devorando uma barra imensa de chocolate, há uma hora tento parar de chorar depois de desligar a televisão. Nunca mais vou assistir a filmes de romance. Sempre me fazem lembrar dele e imaginar como seria se estivesse aqui. O que estaríamos fazendo ou onde estaríamos fazendo... ao mesmo tempo que é bom lembrar, não é nada legal. Dói demais.Seis meses depois que ele se foi, era pra eu estar bem. Não era? Deveria estar feliz e tocando minha vida, contudo, a realidade é essa, qualquer gatilho me leva ao fundo do poço, jogada no sofá ou no pufe, devorando uma enorme barra de chocolate meio amargo.Ninguém pode me condenar por ter me apegado tanto, nunca fui de me jogar de cabeça em um relacionamento. Acontece que aquele homem me deixou sem defesa em um curto prazo de tempo, sugou minha alma e absorveu todo meu autocontro
Cristiano Quando decidi entrar para a polícia, ainda estudava direito, pesquisei sobre o trabalho, funções e salário. Isso me encheu os olhos, me deixou deslumbrado. Então me matei de estudar, passei no concurso e em todos os testes físicos e psicológicos sem qualquer auxílio do meu pai e suas influências. Aí, na prática, descobri que não é nada como imaginei. E não estou reclamando por estar encostado no carro, em frente à padaria Pão Nosso De Cada Dia, uma das melhores de Serra dos Anjos, esperando a Vanessa comprar o lanche para todo o departamento. Imagina, isso não é nada perto das tardes em que o chefe me coloca para atender telefone como se eu fosse recepcionista. Nada contra essa função, acontece que eu não sou recepcionista, porra. Nem presto serviço de delivery, como estou fazendo nesse momento. Com os braços cruzados, olho o relógio no pulso só para implicar com a Vanessa quando ela voltar. Entrou há vinte minutos com a lista de brioches, croissants e coxinhas que fizeram
EmillyGosto dessa camiseta de algodão; seu tamanho extra gigante me deixa confortável e é o que uso quando trabalho em casa. Despojada, me sento na ampla sala iluminada pela claridade alaranjada do fim de tarde que invade através das enormes janelas de vidro. Apoio os cotovelos sobre a mesa de madeira, olhando para a taça de vinho da qual bebi apenas a metade durante a hora e meia em que estou aqui.A porta se abre e abro um sorriso ao ver Evans entrar. Assim que me vê, do outro lado da sala faz uma careta revirando os olhos e caminha até o sofá onde deixa a pasta de trabalho.— Meu Deus, bebendo a essa hora?! Você se olhou no espelho? Que cabelo é esse?! Parece que foi vomitada pelo vaso sanitário.Realmente posso imaginar a tragédia que estou e ajeito o coque desarrumado que prendi com um hashi que achei na gaveta de talheres. Eu exagero no look para sair de casa, mas adoro um desleixo quando posso. Hoje estou um pouco mais largada do que o habitual, deve ser essa ansiedade que me t
Cristiano Em frente ao D´angelo, o bar que frequento com os caras que moram no mesmo prédio que eu, conversamos descontraídos e Alexandre nos conta sobre os desastrados paramédicos que revezam plantão com ele e seu parceiro Dilton na ambulância do SAMU de Serra dos Anjos. Pelo que ouvi, nenhum treinamento no mundo, tornaria os caras do outro plantão, competentes como o Alex. O cuidado e presteza que meu amigo tem com seus socorridos é algo surreal, tão admirável, que tem sido notícia no jornal local e alguns blogueiros falaram a respeito. Eu mesmo o testemunhei em ação algumas vezes e fiquei admirado. Comecei esse assunto porque vi os outros caras em ação também, e estou apavorado.— Só pra vocês entenderem — Alex junta as mãos diante da testa —, não puseram o colar cervical na vítima. — Faz uma pausa nos olhando perplexo. Ele não é de falar de seus colegas, é um homem muito sério e introvertido, mas a situação é tão caótica, que o aborreceu de verdade. Além disso, fico feliz que est
EmillyA semana passou voando e a segunda-feira começa agitada com a organização de um evento beneficente ao qual estou engajada. Preciso de café logo cedo, e como o da padaria que fica embaixo do apartamento onde moramos é divino, e o dono, tio de Evans, nos dá excelentes descontos, é para lá que descemos todas as manhãs para o desjejum. Sentados à mesa perto da parede de vidro onde sempre ficamos, minha cabeça dá uma viajada enquanto ouço Evans falar sobre seu namoro, olho o movimento de pessoas e automóveis que passam pela avenida, pensando naquele maldito pen-drive. Será que é seguro ficar com aquilo? E se Margot falar com mais alguém a respeito e disser que o entregou a mim? Eu não faço ideia do que tem nele, não tentei abri-lo, nem perdi meu tempo, ela avisou que está criptografado e eu não faço ideia de qual é a senha. Além do mais, Margot pediu que o guardasse enquanto estivesse ausente em uma viagem, e me fez garantir que eu o manteria seguro.“Ninguém pode saber desse pen dr