CristianoÀ noite, Emilly está ajeitando a cozinha e me deito em uma espreguiçadeira pensando em minha conversa com Isaac. Ao mesmo tempo que é tentadora a ideia de tentar amarrá-la em mim com um compromisso, o inferno que meu relacionamento com Júlia se tornou antes mesmo de eu descobrir a traição, me faz ser menos emocional e mais racional nesse momento.Emilly se aproxima e se senta entre minhas pernas. Envolvo seu corpo com os braços. Seu perfume é delicioso, uma combinação de fragrâncias florais perfeita. Ao mesmo tempo em que acaricio sua pele macia, beijo seu cabelo úmido. Vanessa para em nossa frente e faz uma de suas dancinhas loucas.— Vou indo, amores. Vocês vão ficar?— Mais um pouquinho — aviso. O lugar parece um paraíso, quero aproveitar o máximo que puder.Ela se despede de Emilly com um abraço.— Vou ajudar o Marquinho no bar. — Se estica para me dá um beijo no rosto e acena à caminho do carro. — Até amanhã, pombinhos.Depois de uns quinze minutos que os convidados se
EmillyNão consigo dormir. Como se não bastasse minha própria insônia, Cris também revira inquieto pelo resto da madrugada.Ele se levanta primeiro, fica um tempo sentado na beirada da cama e finjo que estou dormindo. Depois de um tempo vai para o banheiro, onde se tranca por longos minutos. Literalmente me arrasto para fora do colchão, como se tivesse uma bigorna pesada sobre meus ombros. Aproveito esse tempo para arrumar minhas coisas. Meu coração parece se quebrar em diversos pedacinhos a cada peça de roupa que enfio na bolsa.Quando Cris volta para o quarto, para no batente da porta observando o que faço e fica imóvel, encostado no umbral por um tempo. Embora eu deseje me aproximar e abraçá-lo, mantenho a distância, sem parar de arrumar minhas coisas. Forço um sorriso e faço uma piada na esperança de aliviar a tensão.— Acho que vou levar essa camiseta para mim. — Ergo a camiseta dele, que usei por alguns dias aqui. Cris move, quase que imperceptivelmente, os lábios, nem dá para c
CristianoEla se foi. — Penso, sentado no carro em frente à casa de Vanessa.Eu deixei Emilly na cozinha e atravessei a sala sentindo que meu interior se desmoronava. Como se houvesse algo comprimindo meu peito, estilhaçando meu coração. Tranquei a porta do banheiro e apertei a pia com a mesma força com que trinquei os dentes, lutando contra o desejo ardente de chorar, gritar, quebrar alguma coisa, como se isso fosse aliviar a dor. Quando voltei para a sala e vi que Emilly tinha saído com suas coisas sem se despedir, a raiva que sentia aumentou. Não dela, mas de toda essa situação de merda. Saí de casa para trabalhar impaciente como há muito tempo não me sentia. Vanessa percebe de longe que meu humor não está dos melhores. Entra no carro, tentando desvendar o motivo do meu estresse logo cedo, mas não quero falar. Discutimos por eu não aceitar passar na padaria, e quando chegamos na DP, saio do carro deixando as chaves na ignição.— Se quiser, volte lá sozinha. — Viro as costas e entr
EmillyO carro some da minha vista e confesso que me assusto com o tamanho da dor que pesa sobre mim. A garganta se fecha e me falta ar. É como se os pulmões estivessem se comprimindo. Achei que havia chorado tudo o que podia, mas as lágrimas jorram sem controle algum. Encosto atrás de uma coluna fora da visão de quem passa pela rua e tento me controlar antes de sair do prédio.É quando ouço a voz de Alex atrás de mim.— Emilly?No susto, me viro rápido, e a dor aumenta ao ver a forma complacente com que me olha. Sim, estou digna de pena, por isso ajeito o cabelo e passo o dorso da mão pelo rosto, tentando secá-lo.— Oi, Alex. — O fio de voz que sai não parece nada com a minha.— Conseguiu encontrar o Cris?— Sim, acabou de sair. — Aponto a rua me obrigando a sorrir e fingir que não está doendo demais.— Que bom que veio, ele estava arrasado pensando que iria embora sem te ver.Olho na direção do portão e volto a encará-lo. Seu olhar é tão terno, que sou incapaz de mentir ou sequer om
EmillyNosso tempo juntos foi pouco para justificar como me sinto. Como pode alguém significar tanto na minha vida, em tão pouco tempo? Mas foi assim que aconteceu. Cris tinha um jeito de me olhar inigualável. A gente se comunicava e se entendia dessa forma, mesmo sem palavra alguma. Ele fazia com que eu me sentisse única, especial. E sofro muito a sua ausência. Até que foi ficando mais fácil. Ou, talvez, eu esteja fingindo tão bem, que até mesmo me convenço de que superei.Depois de vê-lo com Samantha na capital, pensei tanto sobre isso. Todos os argumentos e motivos que me deu para terminarmos foram esquecidos e sufocados pela ideia de que terminou para voltar com aquela mulher. Tentei ser indiferente, paquerar, sair com uns caras, mas falhei como se estivesse estragada para outros homens.Afundei-me no trabalho, ampliei a empresa e, no tempo vago, me ocupo no ginásio, treinando as lutas que os policiais ensinam aos adolescentes. Depois do trauma que Alberto criou em mim, saber me d
CristianoMeses depois...Como sempre, estamos em frente ao D’ângelo Grill, com Gustavo fazendo piadas sobre casamento e polícia, e Alex tentando me acalmar, tanto das piadas de Gus quanto da situação geral. Conferi o bolso da jaqueta quatro vezes e as alianças estão na caixinha preta camurçada como deixei.Quando Vanessa bate no meu braço e indica o outro lado da rua com o queixo, um frio estranho misturado a uma sensação quente, rodopia em minha barriga. Emilly está chegando. Viro e, ao vê-la, abro um largo sorriso. Ela está perfeita. Aliás, ela é perfeita.Olha para os dois lados, esperando uma brecha no trânsito para atravessar a avenida e levo um susto quando um garoto passa atrás dela correndo. Ele quase a derruba no chão ao puxar sua bolsa. Antes que ela reaja ao susto e grite, estou correndo atrás do meliante. Atravesso a avenida sem pensar, espalmando as mãos diante dos carros e parando o trânsito. Os motoristas freiam buzinando alto e me xingam, mas eu só enxergo aquele meni
EmillyMeu maior problema é essa mania de assistir a filmes com finais felizes e imaginar que na vida real possa ter finais assim também. Sentada sozinha no sofá da sala, devorando uma barra imensa de chocolate, há uma hora tento parar de chorar depois de desligar a televisão. Nunca mais vou assistir a filmes de romance. Sempre me fazem lembrar dele e imaginar como seria se estivesse aqui. O que estaríamos fazendo ou onde estaríamos fazendo... ao mesmo tempo que é bom lembrar, não é nada legal. Dói demais.Seis meses depois que ele se foi, era pra eu estar bem. Não era? Deveria estar feliz e tocando minha vida, contudo, a realidade é essa, qualquer gatilho me leva ao fundo do poço, jogada no sofá ou no pufe, devorando uma enorme barra de chocolate meio amargo.Ninguém pode me condenar por ter me apegado tanto, nunca fui de me jogar de cabeça em um relacionamento. Acontece que aquele homem me deixou sem defesa em um curto prazo de tempo, sugou minha alma e absorveu todo meu autocontro
Cristiano Quando decidi entrar para a polícia, ainda estudava direito, pesquisei sobre o trabalho, funções e salário. Isso me encheu os olhos, me deixou deslumbrado. Então me matei de estudar, passei no concurso e em todos os testes físicos e psicológicos sem qualquer auxílio do meu pai e suas influências. Aí, na prática, descobri que não é nada como imaginei. E não estou reclamando por estar encostado no carro, em frente à padaria Pão Nosso De Cada Dia, uma das melhores de Serra dos Anjos, esperando a Vanessa comprar o lanche para todo o departamento. Imagina, isso não é nada perto das tardes em que o chefe me coloca para atender telefone como se eu fosse recepcionista. Nada contra essa função, acontece que eu não sou recepcionista, porra. Nem presto serviço de delivery, como estou fazendo nesse momento. Com os braços cruzados, olho o relógio no pulso só para implicar com a Vanessa quando ela voltar. Entrou há vinte minutos com a lista de brioches, croissants e coxinhas que fizeram