Isadora.
Logo mais à noite...Abro a porta de casa ansiosa por um banho demorado, louca para devorar um jantar e depois simplesmente cair na minha cama. Contudo, ao ver Mila em pé na minha sala com um olhar de pena as minhas energias se renovaram e corro para o segundo quarto do pequeno corredor. Paro estática ao ver minha mãe sentada na ponta da sua cama balançando o seu corpo para frente e para trás e com o olhar perdido.— Ela não está nada bem hoje! — Mila comenta parando ao meu lado.— O que houve? — Ela solta um suspiro audível.— Eu não sei. Sara simplesmente se recusou a tomar os seus remédios e começou a dizer que estava vendo seu pai no quarto. Eu quis acalmá-la, mas ela não parava de gritar e quando parou ficou assim.— Droga, Mila, por que não me ligou?— E atrapalhar o seu segundo dia de trabalho?— Mas, Mila, ela é a minha mãe!— Sim, eu sei. E você precisa desse emprego para poder ajudá-la. — Solto uma respiração alta e vou para perto da minha mãe. Ponho as mãos nos seus ombros, mas ela sequer me olha nos olhos. O seu olhar continua fixo na parede atrás de mim.— Oi, querida! — sussurro forçando um sorriso para ela. Mas nada acontece, nenhuma reação sequer. Sara simplesmente parece não estar aqui conosco. — Desculpe ter demorado tanto, mas eu já cheguei. Está vendo? — Forço uma animação que não tenho no momento.— Isadora, a Sara precisa de ajuda! — Mila insiste. Fecho os meus olhos e seguro as lágrimas. Entretanto, ela tem razão. Eu não posso ajudá-la se não consigo estar perto dela o tempo todo. — A Marisa não pode viver roubando calmantes do hospital. Ela pode perder o emprego.— Eu sei! — respondo baixinho e com desânimo.— Andei pesquisando algumas casas de repouso que tem uma mensalidade razoável e eles cuidarão direto dela para você. Deixei alguns contatos e panfletos em cima da mesa para analisar.— Obrigada, Mila! — Ergo o meu corpo e caminho para fora do quarto. Na sala, me despeço da nossa vizinha, fecho a porta e sento-me sem forças em uma cadeira da mesa de quatro lugares. Observo alguns papéis e cartas no tampo e com um suspiro cansado seguro um panfleto com o nome San Tiago Nursing Home – Casa de Repouso São Tiago e me ponho a ler deixando as lágrimas virem à tona. — Desculpa, mãe! — Baixo a cabeça e me entrego ao momento doloroso.*** Alguns dias…O lugar não é de todo ruim e as mensalidades cabem direitinho no meu bolso, e ainda me sobrará tempo para fazer alguns extras se precisar. Penso enquanto caminho pelos cômodos da casa de repouso ao lado de Larissa Krill, a administradora do lugar. Um quarto só para ela com banheiro, um guarda-roupa pequeno e uma cama de solteiro próximo de uma janela larga de onde poderá apreciar um belo e convidativo jardim. O quarto não é muito espaçoso, porém, é bem iluminado e o contato com a natureza poderá ajudá-la. Larissa me garante um acompanhamento com psicólogo e outros profissionais. Contudo, separar-me da minha única família está me matando por dentro.— E então? — A mulher me encara em expectativa através dos óculos de grau e antes de lhe responder, olho mais uma vez para o pequeno e aconchegante cômodo.— Eu gostei! — digo por fim e ela me abre um meio sorriso. — Quando posso trazê-la?— Primeiro, precisa preencher alguns documentos e uma ficha com todos os dados de sua mãe. É necessário sabermos os mínimos detalhes sobre ela, Isadora. Depois, você precisa pagar a primeira mensalidade adiantada. É só uma forma que encontramos de arcar com alguns gastos iniciais e então poderá trazê-la.— Está bem, farei isso o mais rápido possível! Obrigada, Larissa!Saio da casa de repouso satisfeita, embora com o coração apertado no peito, mas com a consciência de que será o melhor para ela. Agora precisarei de mais um emprego para garantir a minha sobrevivência e quitar a hipoteca da nossa casa, e quem sabe poderemos voltar a morar nela? Ao chegar em casa dedico-me a lhe fazer companhia pois a terei por perto por poucos dias, então quero aproveitar o máximo de tempo que teremos juntas. À noite preencho uma longa ficha tendo o cuidado de não esquecer alguma informação e janto sozinha como tenho feito nos últimos dias. Dona Sara passou o dia inteiro divagando e isso é preocupante. O adiantamento da mensalidade foi a coisa mais fácil de se conseguir e acredite, fiquei surpresa com isso, mas o meu chefe facilitou bastante esse quesito. Preciso lembrar-me de agradecê-lo na segunda. O início da semana foi a parte mais difícil da minha vida. Após deixá-la na casa de repouso e de ter a certeza de que ficaria bem fui direto para a D’Angelo, e como imaginei a minha cabeça estava o tempo todo focada em minha última decisão. Até pensei em voltar atrás e ir tirá-la de lá, mas e depois?— O que você fez dessa vez?! — Peter pergunta com um tom preocupante assim que entra na copa. Eu simplesmente o fito sem reação alguma, afinal eu não sei dizer se fiz algo de errado realmente. Provavelmente sim, mas não tenho certeza.— Eu… não sei! — gaguejo desnorteada. Deus, eu não posso me dar ao luxo de perder esse emprego! Repito em forma de oração pois agora eu tenho uma responsabilidade a mais.— Por que a pergunta? — Forço-me a perguntar. O homem solta uma respiração alta e se aproxima um pouco mais.— O Senhor D’Angelo deseja vê-la em sua sala, agora! — disse com um tom sério demais. Merda, agora eu tenho certeza de que fiz algo errado! Mas foi tão grave ao ponto de o chefão pedir para me ver?Heitor.— Olha ele aí! — Tadeu, o meu assessor pessoal diz entrando em meu escritório. Essa sua alegria espontânea demais me faz revirar os olhos pois eu sei que aguarda boas notícias da minha última reunião em família. Nascer no berço de ouro da D’Angelo traz algumas coisas muito, muito boas: sucesso, dinheiro, mulheres gostosas e a extravagância das festas, embora tenha o seu lado todo ruim também. As mulheres sempre te olham como se você fosse um enorme pote de ouro no final do arco-íris. Você não tem a liberdade de ir e vir, e tem todo o peso de um império sobre os seus ombros. — Então, como foi lá? Está mais milionário do que ontem, ou… — Rio com sarcasmo.— Você não vai acreditar, mas a minha mamãezinha deixou uma exigência no seu testamento. Acredita que ela exigiu um casamento com amor e todas aquelas frescuras possíveis?— Puta merda! — resmunga e puxa uma cadeira para se sentar. — No que ela estava pensando?— Ela quer me castigar, simplesmente impor a sua vontade sobre mim
Heitor.Horas mais tarde...Entro em casa recebendo o seu habitual silêncio e após livrar-me da gravata vou até o bar de canto, e me sirvo uma generosa dose de uísque. Depois, aproximo-me de uma parede de vidro e observo as ruas com suas luzes brilhantes, e suas pontes que parecem enlaçar a cidade. Daqui não se ouve nada, tudo parece calmo demais, mas o trânsito caótico diz o contrário. Bebo mais um gole da minha bebida e decido ir para o segundo andar da cobertura, e em seguida para o quarto principal. Tomo um banho demorado, ponho uma roupa confortável e ligo para o restaurante do hotel para pedir o meu jantar. Enquanto aguardo me tranco no escritório e abro a ata de contabilidade da D’Angelo. Há alguns meses descobrimos que nosso chefe da contabilidade estava realizando alguns pequenos furtos na empresa. Claro que exigi sigilo sobre o assunto, pois não quero o meu nome nas fofocas dos tabloides, menos ainda ser visto como um empresário fraco e desatento. Foi exatamente por isso que
— Bom dia, eu me chamo Isadora! O Senhor D’na...— É claro! O Senhor D’Angelo está lhe aguardando. — Não retribuo a cordialidade do sorriso da secretária que gentilmente abre a porta para mim, pois estou tão nervosa que nem sei como reagir nessa hora. O que eu poderia fazer, suplicar que não me demita? Humilhar-me para que ele tenha piedade de mim? Não! O meu pai sempre nos ensinou que devemos ter um pouco de integridade e se eu tiver que permanecer neste emprego será aceitando os meus erros e consertando-os da maneira que puder. E por fim, se ele não me aceitar em sua empresa eu encontrarei outro emprego, certo? Droga, a coisa não é tão fácil assim, Isadora! Você está desesperada e isso é um fato! Adentro um escritório extremamente espaçoso e bem iluminado, e não consigo evitar de observar os detalhes dos móveis claros em um contraste perfeito com o preto e o cinza chumbo da decoração. Atrás de uma mesa de mogno imponente está um homem jovem demais para um cargo tão importante. Moren
Isadora— Isadora, tudo bem com você? — Emma pergunta preocupada assim que entro na copa. Ignoro a sua preocupação e vou direto para a sala do meu chefe, e assim que entro Peter se levanta da sua cadeira. Ele não esconde um olhar preocupado e imediatamente vem até mim.— Isadora, o que houve?! — Sem pensar duas vezes corro para os seus braços e choro ali por algum tempo até me sentir aliviada. Sinto-o afagar as minhas costas com carinho e quando finalmente me recomponho, me afasto dos seus braços e me sinto constrangida.— Me desculpe por isso, Peter! — digo sem olhar nos seus olhos.— Não precisa se desculpar, querida. Quer me falar sobre o que aconteceu? — Embora eu precise muito desabafar com alguém, faço não com a cabeça.— Será que pode me dispensar por hoje? Desculpe, é que eu não tenho condições de trabalhar! — Ele solta o ar audível.— Só porque estou vendo que você não está nada bem, mas terá que compensar amanhã. — Concordo com outro aceno de cabeça.— Eu prometo! Obrigada,
Isadora— Senhorita Dixon? — Uma voz feminina disse assim que atendi a ligação.— Sim, quem é?— Eu me chamo Lena. Sou a secretária do Senhor D’Angelo e estou ligando para avisar que estarei enviando um pacote em algumas horas para o seu endereço. — Franzo a testa.— Que pacote? — procuro saber.— À noite um motorista irá buscá-la. Esteja pronta! — Que droga, por que eles precisam fazer tanto mistério com tudo?! Solto uma respiração profunda pela boca e quando penso em insistir na minha interrogação a ligação é encerrada. Bando de idiotas! Resmungo mentalmente e volto para o meu banho. Uma hora e meia depois a campainha começa a tocar e ao abrir a porta encaro um homem com uniforme de entregador. Ele apenas me entrega uma caixa branca e grande, e me estende um papel para assinar. Entro em casa e movida pela curiosidade tiro a tampa da caixa e afasto os papéis de seda para encontrar um exuberante vestido longo e preto, e um par de saltos altos. Rio com sarcasmo. Quem ele pensa que é? O
IsadoraApós assinar o contrato com o Senhor D’Angelo em poucos dias tudo começou a acontecer em minha vida e como um passe de mágica. Um telefonema do banco falando que a hipoteca da casa onde nasci e cresci já estava quitada, os credores que simplesmente sumiram da minha porta e minha mãe que foi transferida para uma clínica particular especializada em oncologia. Finalmente estava respirando aliviada! Os passos seguintes seriam cronometrados. D’Angelo e eu teríamos uma cessão de fotos que contaria a nossa "história de amor" e seu assessor cuidaria dos boatos do casamento do tão cobiçado "Leão dos negócios". No final, ele olhou nos meus olhos e disse: prepare-se para a melhor parte! Perguntei-me se havia algo melhor que deitar a minha cabeça no travesseiro e dormir o sono dos justos sem lágrimas, sem lamentos e sem pensar no dia seguinte? Com certeza não haveria.— Pronto, a sua mãe já está bem acomodada e será que podemos conversar agora? — Doutora Monique Toledo disse ao se aproxim
IsadoraAlguns dias depois…O casamento dos sonhos de qualquer garota. Penso olhando para o longo vestido branco todo em renda francesa, com uma gola alta e delicada, e as mangas que se arrastam por todo o meu braço. Uma linda e delicada coroa cravejada com minúsculas pedrinhas de brilhantes segura um coque cheio que imita lindas pétalas castanhas escuras. Ansiosa, solto um suspiro baixinho e quase imperceptível.— Faz assim com a boca. — O maquiador pede após passar o batom de um tom vermelho suave que combina perfeitamente com a maquiagem para o dia. — Perfeita! — Ele cantarola batendo palmas freneticamente me fazendo abrir um meio sorriso. Não demora muito e estou segurando um buquê de lindos lírios brancos com minúsculos jasmins cor de rosa e entrando em uma igreja toda ornamentada com as mesmas flores, além de tules e laços de seda da mesma cor. Entretanto, nos incontáveis bancos tem um pequeno número de pessoas. Um órgão anuncia a minha entrada e logo todos têm os seus olhos em
Isadora— Acorde, nós já chegamos! — Abro os meus olhos e mesmo desfocados encaro a fachada de uma casa toda de madeira escura, com enormes janelas de vidros transplantes e me ajeito no banco traseiro do carro para ver melhor o perímetro ao nosso redor. Pequenos postes iluminam um pequeno e encantador jardim. Assim que a porta se abre o motorista me ajuda a sair e o perfume das flores-do-campo me envolvem, seguido do vento frio da madrugada.— Onde estamos? — indago, observando a graciosa varanda com um peitoril de madeira escura como o resto da casa e…— Em uma das minhas casas de veraneio. — Ele diz tirando as chaves do bolso da calça. Olho para trás para ter certeza. Árvores altas e juntas demais e pelo barulho que vem lá de trás aqui não tem praias e não vejo piscinas em nenhum lugar.— Isso não me parece uma casa de veraneio — ralho e volto o meu olhar para ele, porém, Heitor não está mais ao meu lado. — Oh, seu idiota, vai me deixar aqui fora? — rosno irritada, quando o vejo den