Isadora
— Isadora, tudo bem com você? — Emma pergunta preocupada assim que entro na copa. Ignoro a sua preocupação e vou direto para a sala do meu chefe, e assim que entro Peter se levanta da sua cadeira. Ele não esconde um olhar preocupado e imediatamente vem até mim.
— Isadora, o que houve?! — Sem pensar duas vezes corro para os seus braços e choro ali por algum tempo até me sentir aliviada. Sinto-o afagar as minhas costas com carinho e quando finalmente me recomponho, me afasto dos seus braços e me sinto constrangida.
— Me desculpe por isso, Peter! — digo sem olhar nos seus olhos.
— Não precisa se desculpar, querida. Quer me falar sobre o que aconteceu? — Embora eu precise muito desabafar com alguém, faço não com a cabeça.
— Será que pode me dispensar por hoje? Desculpe, é que eu não tenho condições de trabalhar! — Ele solta o ar audível.
— Só porque estou vendo que você não está nada bem, mas terá que compensar amanhã. — Concordo com outro aceno de cabeça.
— Eu prometo! Obrigada, Peter! — Saio imediatamente da sua sala e minutos depois do prédio.
***
Assim que alcanço a calçada do lado de fora da D’angelo Corporation, caminho apressada para a parada de ônibus e vou direto para a clínica. Preciso olhar nos olhos da minha mãe e saber por que ela me escondeu algo tão importante assim de mim. Não pode ser verdade. O destino não pode ser tão cruel assim comigo.
— Bom dia, eu preciso ver a minha mãe! — falo assim que entro na recepção da San Tiago Nursing Home,
— Ah, Senhorita Dixon? A Senhora Muller deseja vê-la. Nós tentamos ligar, mas você não atendia o telefone...
— Eu quero ver a minha mãe! — insisto, mas a garota respira fundo atrás do balcão e me lança um olhar impulsivo.
— A Senhorita precisa ir para a sala senhora Muller agora. Por favor, venha por aqui!
— Eu sei onde fica a sala a Senhora Muller! — rebato com impaciência a interrompendo e saio pisando dali. Assim que alcanço o corredor, abro a porta sem ao menos bater e entro. Assim que me vir Larissa se põe de pé e me mostra uma cadeira em frente a sua mesa.
— Precisamos conversar, Dixon! — Ela diz com um tom sério demais. — A sua mãe apresentou um quadro muito sério essa manhã e por isso precisamos fazer alguns exames de urgência. Por que não pôs na ficha que Sara tinha câncer? — Fico gelada no mesmo instante. Então é verdede!
— Porque eu não sabia — sibilo quase sem voz. — Pelo menos não até alguns minutos atrás. É operável? — Procuro saber.
— Ainda não sabemos. Estamos esperando alguns resultados para termos mais detalhes sobre a sua doença. Mas, o problema é que não podemos mantê-la aqui, Isadora. — Oh Deus, ainda mais essa! Resmungo internamente.
— Eu posso vê-la agora? — interpelo com a voz trêmula.
— Senhorita Dixon, ouviu o que acabei de falar?
— Sim, eu ouvi! Eu só… quero vê-la. — Ela suspira alto, mas concorda.
— Tudo bem, venha comigo! — A mulher se levanta da sua cadeira e eu faço o mesmo, seguindo-a para fora da sua sala. — Optamos por sedá-la porque ela estava muito agitada e falava coisas sem nexo. — Larissa informa assim que entramos no quarto. Só então percebo o quão a sua pele está pálida e que os seus cabelos perderam o seu brilho. Como não percebi esses sinais antes?
— Pode nos deixar a sós? — peço baixinho sem tirar os meus olhos de cima dela.
— Claro, querida! Mas não demore, além de não ser o horário de visitas ela precisa descansar. — Apenas assinto e me acomodo na ponta do colchão. Seguro a sua mão e a olho em silêncio por um tempo.
— Oh, mãe, por que não me contou? Teríamos lutado juntas contra isso — resmungo, sentindo um nó sufocar a minha garganta.
Fico um tempo ali perdida em meus próprios pensamentos e em um silêncio doloroso. Fiquei tão dormente com essa notícia que nem percebi o momento exato que deixei a clínica e tão pouco sei como cheguei em casa. Só me lembro de acordar no meio da tarde entre os destroços de móveis e quadros quebrados. Os livros estavam todos fora das suas prateleiras e os porta-retratos com os vidros estilhaçados. Imagens minhas gritando enlouquecidamente vem à minha mente e logo em seguida a voz de Mila desesperada batendo na minha porta e gritando o meu nome. Solto um resmungo e me levanto do chão sentindo o meu corpo dolorido e surrado, e caminho desnorteada para o meu quarto. Tomo um banho frio e demorado, e vou para a cozinha para comer algo. Na geladeira encontro apenas água, uma fatia de bolo e um pouco de leite. Bufo irritada e viro-me para sair do cômodo encontrando no balcão um embrulho de pano. Vou até ele e o abro, suspirando na sequência. Fito a porção de macarrão quatro queijos e embora esteja frio sinto a minha boca salivar. Mila. Penso abrindo um meio sorriso. Pego o prato e os talheres e vou para a mesa. Meus olhos caem em cima do envelope branco e do cartão retangular do senhor D’Angelo.
Não! Penso. Não chegarei a este ponto.
Forço-me a comer e depois me dedico a arrumar a minha bagunça. Onde eu estava com a cabeça quando destruí a sala inteira? À noite tento assistir algo, mas nada prende a minha atenção e a minha cabeça parece girar fora de órbita. Após uma ducha rápida, visto um pijama de flanela e antes de ir para o quarto para mais uma sessão de tortura mental, olho na direção da mesa. Vou até lá, encarei o envelope e bufo audivelmente, forçando-me a ir para cama. Pela manhã não fui para a empresa como havia prometido para Peter. Eu simplesmente não tenho cabeça para o trabalho. Eu sei que o deixei na mão, mas antes isso do que fazer alguma besteira e ser demitida de uma vez. Pela primeira vez na vida resolvi correr. Ouvi dizer que ajuda a clarear a mente e a pensar melhor. Confesso que me senti bem melhor com o exercício, porém, nada limpou os meus pensamentos turvos. Eu só conseguia pensar que eles foram covardes comigo. Todos eles. Sim, me apunhalaram pelas costas e me largaram à beira de um abismo para sobreviver sozinha. Meu pai não tinha o direito de morrer assim. O Alex não tinha o direito de me abandonar e Dona Sara não tinha o direito de me esconder algo tão sério. Enfim, continuo afundada na lama! Após alguns longos minutos entro em casa, tomo um banho relaxante e penso em ir para a casa de repouso. Eu preciso resolver essa situação, mas como? Olho para o maldito envelope outra vez e como se fosse atraída por ele aproximo-me da mesa e puxo uma cadeira. Seguro o envelope e o olho sentindo o meu coração acelerar no peito. E após respirar profundamente me encorajo a abri-lo. Logo os meus olhos correm pelas letras negras sem ler uma palavra sequer. O largo e depois o seguro de novo. Vamos Isadora, você precisa resolver isso, você precisa dessa solução! Nas próximas horas fico presa a leitura de um contrato completamente absurdo e começo a anotar algumas cláusulas que com certeza eu não aceitaria. À medida que o lia o meu corpo tremia, a minha mente ansiava e meu subconsciente gritava: essa é a sua chance de se reerguer, garota! Não sei quanto tempo levei para lê-lo, avaliá-lo e fazer as devidas anotações, mas só parei quando o meu estômago roncou alto e fui preparar algo para comer. Meu maior dilema veio logo após finalizar a minha leitura. Eu tinha que ligar para o Senhor D’Angelo para termos a reunião que me prometeu, mas para isso eu levei pelo menos três horas de uma luta covardemente constante, até finalmente tomar coragem e ligar. E para a minha surpresa o seu advogado me atendeu e pediu para aguardar as próximas horas. Ri sem vontade.
Esse homem é mesmo um ridículo idiota!
Isadora— Senhorita Dixon? — Uma voz feminina disse assim que atendi a ligação.— Sim, quem é?— Eu me chamo Lena. Sou a secretária do Senhor D’Angelo e estou ligando para avisar que estarei enviando um pacote em algumas horas para o seu endereço. — Franzo a testa.— Que pacote? — procuro saber.— À noite um motorista irá buscá-la. Esteja pronta! — Que droga, por que eles precisam fazer tanto mistério com tudo?! Solto uma respiração profunda pela boca e quando penso em insistir na minha interrogação a ligação é encerrada. Bando de idiotas! Resmungo mentalmente e volto para o meu banho. Uma hora e meia depois a campainha começa a tocar e ao abrir a porta encaro um homem com uniforme de entregador. Ele apenas me entrega uma caixa branca e grande, e me estende um papel para assinar. Entro em casa e movida pela curiosidade tiro a tampa da caixa e afasto os papéis de seda para encontrar um exuberante vestido longo e preto, e um par de saltos altos. Rio com sarcasmo. Quem ele pensa que é? O
IsadoraApós assinar o contrato com o Senhor D’Angelo em poucos dias tudo começou a acontecer em minha vida e como um passe de mágica. Um telefonema do banco falando que a hipoteca da casa onde nasci e cresci já estava quitada, os credores que simplesmente sumiram da minha porta e minha mãe que foi transferida para uma clínica particular especializada em oncologia. Finalmente estava respirando aliviada! Os passos seguintes seriam cronometrados. D’Angelo e eu teríamos uma cessão de fotos que contaria a nossa "história de amor" e seu assessor cuidaria dos boatos do casamento do tão cobiçado "Leão dos negócios". No final, ele olhou nos meus olhos e disse: prepare-se para a melhor parte! Perguntei-me se havia algo melhor que deitar a minha cabeça no travesseiro e dormir o sono dos justos sem lágrimas, sem lamentos e sem pensar no dia seguinte? Com certeza não haveria.— Pronto, a sua mãe já está bem acomodada e será que podemos conversar agora? — Doutora Monique Toledo disse ao se aproxim
IsadoraAlguns dias depois…O casamento dos sonhos de qualquer garota. Penso olhando para o longo vestido branco todo em renda francesa, com uma gola alta e delicada, e as mangas que se arrastam por todo o meu braço. Uma linda e delicada coroa cravejada com minúsculas pedrinhas de brilhantes segura um coque cheio que imita lindas pétalas castanhas escuras. Ansiosa, solto um suspiro baixinho e quase imperceptível.— Faz assim com a boca. — O maquiador pede após passar o batom de um tom vermelho suave que combina perfeitamente com a maquiagem para o dia. — Perfeita! — Ele cantarola batendo palmas freneticamente me fazendo abrir um meio sorriso. Não demora muito e estou segurando um buquê de lindos lírios brancos com minúsculos jasmins cor de rosa e entrando em uma igreja toda ornamentada com as mesmas flores, além de tules e laços de seda da mesma cor. Entretanto, nos incontáveis bancos tem um pequeno número de pessoas. Um órgão anuncia a minha entrada e logo todos têm os seus olhos em
Isadora— Acorde, nós já chegamos! — Abro os meus olhos e mesmo desfocados encaro a fachada de uma casa toda de madeira escura, com enormes janelas de vidros transplantes e me ajeito no banco traseiro do carro para ver melhor o perímetro ao nosso redor. Pequenos postes iluminam um pequeno e encantador jardim. Assim que a porta se abre o motorista me ajuda a sair e o perfume das flores-do-campo me envolvem, seguido do vento frio da madrugada.— Onde estamos? — indago, observando a graciosa varanda com um peitoril de madeira escura como o resto da casa e…— Em uma das minhas casas de veraneio. — Ele diz tirando as chaves do bolso da calça. Olho para trás para ter certeza. Árvores altas e juntas demais e pelo barulho que vem lá de trás aqui não tem praias e não vejo piscinas em nenhum lugar.— Isso não me parece uma casa de veraneio — ralho e volto o meu olhar para ele, porém, Heitor não está mais ao meu lado. — Oh, seu idiota, vai me deixar aqui fora? — rosno irritada, quando o vejo den
IsadoraPela manhã acordo um tanto animada e mais cedo do que esperada. Tomo um banho rápido, visto uma minissaia plissada e escolho uma blusa com um nó na altura do meu umbigo e por fim, calço um par de tênis. Amarro os meus cabelos em um rabo de cavalo e ponho os óculos sol. Logo estou saindo do quarto e do corredor também. Na sala encontro o meu "marido" mexendo em uma espingarda. Ele alisa o objeto com bastante esmero e o analisa minuciosamente. Passo meus olhos rapidamente pela calça caqui no seu corpo, pelo coturno negro e subo encontrando uma camisa verde-folha com os três primeiros botões abertos, mostrando parcialmente um peitoral desprovido de pelos. Respiro fundo e adentro a sala chamando a sua atenção para mim. Como esperava o senhor D’angelo para o que estava fazendo e seus olhos percorrem com avidez pelas minhas vestes. É possível notar o brilho em suas retinas e o vejo pressionar os lábios. Mantenho-me séria, mas a minha vontade é de rir com tal provocação. Homens! Con
IsadoraApós um banho longo e quentinho ponho uma roupa confortável e igualmente quente, e saio do quarto de hóspedes. Logo na entrada da sala posso ouvir o som do fogo crepitando na lareira e para a minha surpresa Heitor teve o cuidado de forrar um cobertor grosso e macio no chão e bem próximo ao calor do fogo. Ao me aproximar noto duas taças vazias e uma bandeja com salada, legumes e a carne que caçamos mais cedo. Sofisticado de maneira surpreendente. Penso,— Senta aqui — Ele pede batendo levemente no espaço ao seu lado e em silêncio me acomodo, apreciando o calor bem-vindo. — Você disse que nunca comeu carne de cervo antes. Experimenta, tenho certeza de que você vai gostar. — É difícil não o fitar com admiração. Heitor é o homem extremamente bonito e atraente. E droga a sua pele fica ainda mais bonita com o brilho dourado do fogo. Ele pega uma porção da carne com o auxílio de um garfo e o leva à minha boca.— Hum! — Solto um gemido apreciativo ao sentir o sabor e a maciez da carne
IsadoraTrilhas, banho de cachoeira, escaladas, caças, jantares e brindes ao calor da lareira. Pensando bem direitinho a nossa lua de mel nem foi tão ruim assim. E eu posso até dizer que conheci um lado do Senhor D’angelo que ele faz questão de esconder. Longe dos negócios ele não passa de um jovem surpreendente que tem um bom papo e um sorriso fácil. E que sorriso!— Sairemos em poucos minutos! — Heitor avisa dando duas batidinhas na porta do meu quarto.— Ok! — grito para ele me escutar e foco em arrumar as minhas malas.Então, à primeira vista esse lugar me assustou e muito, e eu fiquei puta da vida só de pensar que ficaria presa aqui sem um celular, TV ou qualquer coisa que pudesse me distrair. Entretanto, confesso que sentirei falta daqui e de toda essa natureza. Dos seus sons e até mesmo da sua companhia, afinal quando voltarmos para a cidade ele voltará a ser o Senhor D’angelo outra vez. Eu sei que sim. — Por Deus, mulher o que está fazendo aí dentro?! — Ele rosna irritado e eu
IsadoraUma semana depois…Deixo o meu corpo cair livremente em cima do colchão macio e solto o ar pela boca de modo audível. Sim, eu estou completa e inteiramente entediada e isso em pouco menos de uma semana! Já conhecia cada andar dessa casa, cada cômodo e cada detalhe da sua decoração como a palma da minha mão, e já não sei mais o que fazer para manter a minha mente ocupada. Desde que voltamos da nossa "lua de mel" Heitor praticamente não para em casa. Salvo na hora de dormir e isso acontece quando eu já estou dormindo e no dia seguinte ele sai antes de eu acordar. Com certeza esse é o contrato perfeito. Nada de cobranças e nada de pegar no meu pé. Simplesmente estou de vida boa e no final de tudo isso ainda recebo uma boa grana pelo meu trabalho. Que saco! O meu celular faz um sinal de mensagem e rapidamente pulo para fora da cama. Um sorriso gigante se abre nos meus lábios quando vejo que se trata da doutora Monique e ansiosa a abro para ler. Na sequência dou alguns pulinhos ani